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ALFABETIZAÇÃO NA EDUCAÇÃO INFANTIL?

PROBLEMATIZAÇÕES A PARTIR DOS MULTILETRAMENTOS

Jaqueline Maria Coelho Maciel 1; Rogério dos Santos Pereira2

Palavras-chave: Educação Infantil; Letramento; Alfabetização; Multiletramentos.

Introdução

A escolha pelo título deste projeto é decorrente das inquietações da prática pedagógica
com crianças de 5/6 anos. Estas inquietações foram provocadas com as leituras de Walter
Benjamin, e por isso sua contribuição é válida, pois, nos aponta caminhos a partir da
rememoração para refletir sobre as práticas de alfabetização e letramento com crianças
pequenas, considerando as memórias e experiências da pesquisadora. No processo de
rememoração de sua trajetória como aluna de educação infantil, auxiliar de sala do município
de Florianópolis e professora de uma escola particular da Rede Municipal a pesquisadora
buscará compreender essas práticas para encontrar caminhos para outras através do
multiletramento.
A hipótese é que a alfabetização é vista como um processo mecânico à aquisição da
leitura e escrita, e por isso menos ou nada importante na Educação Infantil, pois, não
ponderam a ludicidade das crianças e as expõem às práticas de exercícios mecânicos e de
memorização. Por outro lado, o letramento dos quais envolve práticas sociais ao mesmo
tempo em que oportuniza à leitura e escrita, também recebe críticas, principalmente quando
comparados com as práticas de alfabetização da pré-escola entre as décadas de 80/90, bem
como das práticas realizadas nas instituições particulares.
Magda Soares (2004) afirma que,

Dissociar alfabetização e letramento é um equívoco porque, no quadro das atuais


concepções psicológicas, lingüísticas e psicolingüísticas de leitura e escrita, a
entrada da criança (e também do adulto analfabeto) no mundo da escrita ocorre
simultaneamente por esses dois processos: pela aquisição do sistema convencional
de escrita – a alfabetização – e pelo desenvolvimento de habilidades de uso desse
sistema em atividades de leitura e escrita, nas práticas sociais que envolvem a língua
escrita – o letramento. Não são processos independentes, mas interdependentes, e
indissociáveis: a alfabetização desenvolvesse no contexto de e por meio de práticas
sociais de leitura e de escrita, isto é, através de atividades de letramento, e este, por
sua vez, só se pode desenvolver no contexto da e por meio da aprendizagem das
relações fonema–grafema, isto é, em dependência da alfabetização. (SOARES,
2004, p. 14)

Com esta afirmação e as hipóteses apresentadas podemos fazer alguns


questionamentos: Por que alguns anos atrás utilizava-se o termo alfabetização para práticas na
Educação Infantil e hoje não se utiliza? Por que se usa o termo letramento na Educação
Infantil se este não deve ser dissociado da alfabetização? Por que no âmbito da Educação
Infantil pública as crianças, com raras exceções, não se apropriam da aquisição convencional
da escrita? Por que as crianças da rede particular, em grande maioria, dominam o código
escrito na transição para o primeiro ano? Por que as crianças das escolas particulares precisam
de livros que ocupem praticamente maior parte do tempo na sala de aula? Será que os

1
Mestranda linha ECO/UFSC E-mail: jaqueatitude@gmail.com
2
Orientador linha ECO/UFSC E-mail: rogeriosantosp@gmail.com
professores de Educação Infantil têm a clareza do que é alfabetizar e letrar? As práticas com
crianças na Educação Infantil são realmente letramento ou ainda são carregadas de
“alfabetização”? O que os professores de Educação Infantil podem fazer para a alfabetização
e o letramento ocorrer simultaneamente, respeitando a criança em seu desenvolvimento
independentemente do local onde se encontra?
Para compreender a importância de investigar as práticas na Educação Infantil, é
possível nos alicerçarmos nas leituras das teses de Benjamin sobre o conceito de história, dos
quais apontam que não podemos olhar a história apenas como sombras do passado, como
conhecimento do que já aconteceu e intermediado por aqueles que a escrevem. Para ele
entrecruzam o messianismo judaico e o materialismo histórico.
Assim, a justificativa deste projeto é entender as práticas de alfabetização e letramento
na Educação Infantil a partir das rememorações, encontrando no silêncio das vozes um index
secreto para não nos desvencilharmos daquilo que o materialismo histórico nos proporciona.
Compreendemos que, para encontrar a força messiânica apontada por Walter Benjamin o
caminho possível pode ser o multiletramento na perspectiva de construir uma memória
coletiva com todas as vozes. Para encontrarmos estas vozes precisamos compreender a
pedagogia dos multiletramentos que será embasada pela proposta do New London Group, do
qual aponta Pereira (2014, p. 90),
O termo Multiletramentos (Multiliteracies) surgiu a partir das discussões do New
London Group, um coletivo de pesquisadores de língua inglesa dedicados ao estudo
dos letramentos. Em 1994, o grupo reuniu-se pela primeira vez durante uma semana
em New London, uma pequena cidade localizada no nordeste dos Estados Unidos da
América (EUA). O encontro fez parte de um projeto internacional que buscava
considerar os desafios para o ensino do letramento em um então futuro próximo que
anunciava grandes transformações culturais, sociais, políticas, tecnológicas,
linguísticas, comunicacionais. (PEREIRA, 2014, p. 90)

É possível compreender neste primeiro momento que, multiletramentos é um termo


praticamente novo, mas que se preocupa com os processos de letramentos nos dias de hoje,
pois, já vivenciamos as grandes transformações apresentadas pelos estudiosos do New London
Group, e outras transformações na escola vem ocorrendo e das quais outros podem ocorrer
com a implantação da BNCC3. Neste sentido, precisamos tomar nosso lugar como
pesquisadores para repensarmos algumas práticas e não corrermos o risco de voltar para
velhas práticas do uso da cartilha, quando muitas editoras já se apresentam na defesa da
BNCC para tomar o lugar que é dos especialistas, causando retrocessos a educação.
Deste modo, apresentamos como objetivo deste projeto analisar as perspectivas de
superação da dicotomia alfabetizar e letrar no desenvolvimento de uma proposta de
multiletramentos a partir do contexto cultural das crianças e da cultura local.
Para alcançar esse objetivo geral partiremos de objetivos específicos, dos quais o
primeiro será, rememorar as práticas pedagógicas com crianças de 5/6 anos, sendo este nosso
marco contextual do qual nos apresentará subsídios para reflexão e as justificativas para essas
práticas. Para tal, precisamos de um marco referencial que será buscado no segundo objetivo,
pesquisar no portal CAPES as referências produzidas na área a partir das palavras-chave,
contextualizando-as com o marco contextual e contribuindo para a construção do marco
conceitual. Para a elaboração da proposta de multiletramentos apresento o terceiro objetivo
que é conhecer os contextos culturais das crianças, ou seja, saber de onde falam. Será possível
também saber quais tecnologias digitais fazem parte de seus contextos. Outro objetivo que
será importante para construção da proposta é contextualizar a cultura local que essas crianças
estão inseridas. Por último e não menos importante o objetivo que está relacionado

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Base Nacional Comum Curricular, recentemente aprovada pelo Conselho Nacional da Educação.
diretamente à proposta de multiletramentos e ao objetivo geral que é observar e analisar se a
partir da relação com o outro, no espaço da intersubjetividade e na mediação semiótica, as
crianças podem se apropriar de outras práticas historicamente construídas, entre estas a
escrita.

Metodologia
Por se tratar de uma pesquisa social utilizaremos a metodologia científica, como forma
de vislumbrar novos conhecimentos da realidade social a partir das práticas de
letramento/alfabetização com crianças de 5/6 anos no contexto da Educação Infantil.
No que se refere a natureza da pesquisa, segundo Gil (2008), entende-se como uma
pesquisa aplicada, mesmo com traços de pesquisa pura. Pois, ao entendermos as práticas e o
que levou a elas, podemos contribuir apresentando caminhos para novos fazeres e quem sabe
a superação da dicotomia alfabetizar e letrar.
Todavia, o foco da pesquisa não se concentrará nas teorias, porém, estas farão parte do
processo para aprofundamento e conhecimento sobre as práticas de alfabetização e letramento
com crianças de 5/6 anos, importante também para conceituar as palavras-chave e elaborar a
proposta de multiletramentos.
É preciso deixar claro, a partir das considerações de Gil (2008) sobre a pesquisa social,
que não é a intenção da pesquisa aqui apresentada desenvolver outra teoria ou conhecimento,
nem reafirmar uma ou outra. Mas, através de uma proposta fundamentada na teoria será
possível buscar caminhos para aplicar, utilizar e praticar alguns conhecimentos com ênfase
nos multiletramentos, e quem sabe traçar caminhos para prática pedagógica ao analisar as
perspectivas de superação da dicotomia alfabetizar e letrar, contribuindo com a educação das
crianças pequenas.
Trata-se também de uma pesquisa de Mídia Educação como aponta Rivoltella (2009),
pois, a pesquisadora busca rever as práticas partindo da rememoração, incluindo aqui as
práticas no campo de pesquisa do qual atua como auxiliar de sala. Nesta rememoração
faremos um movimento de escovar a história a contrapelo, buscando nas intervenções
realizadas refletir sobre as práticas de alfabetização e letramento, bem como a inserção das
tecnologias digitais que vem se constituindo na Educação Infantil e nesse contexto local ao
longo do tempo. A pesquisa no âmbito da Mídia Educação, como aponta Rivoltella (2009,
p.128), “possui respostas de antemão (que encontra na pesquisa educativa sobre as mídias),
portanto, já sabe que existe uma relação entre representação das mídias e aprendizagem [...]”.
Assim, entende-se que já se tem algumas respostas de antemão, como por exemplo, que as
crianças de Educação Infantil participam de propostas pedagógicas de letramento, de
alfabetização e do uso das mídias. Portanto, será possível formular hipóteses para o
multiletramento.
Com relação ao ponto de vista da pesquisa apontado por Rivoltella (2009), este projeto
apresenta um discurso de focalização epistemológica, já que a intenção é dar sentido as
práticas de alfabetização e letramento a partir dos multiletramentos. Para isso, será preciso
uma leitura crítica do que já está posto, negociando significados com as crianças a partir de
suas leituras de mundo.
Quanto a abordagem do problema será uma pesquisa qualitativa, isso porque, ao
fazermos a relação do que já está posto e a subjetividade dos sujeitos envolvidos não se tem a
pretensão de fazer estatísticas, mas, de buscar a interpretação dos fenômenos e atribuir
significados a partir da abordagem. Neste caso, como assinala Gil (2008) será uma pesquisa
exploratória já que pretende se familiarizar com um problema, sendo este, os processos de
alfabetização e letramento na Educação Infantil, e não temos hipóteses precisas e
operacionalizáveis a partir dos multiletramentos.
Quanto aos procedimentos técnicos como aponta Malheiros (2011) será uma pesquisa-
ação, porém, com traços de pesquisa bibliográfica, documental e de levantamento. Pesquisa
ação porque parte de uma proposta de multiletramentos com intervenção da pesquisadora,
envolvendo crianças, professores e a comunidade, da qual pode culminar com o conhecimento
de uma estratégia de aprendizagem e superar a dicotomia alfabetizar e letrar a partir da
construção de sentidos. A pesquisa bibliográfica também contribuirá na pesquisa com a
finalidade de identificar na literatura disponível as contribuições científicas sobre a
alfabetização e letramento. Além disso, nos permitirá dialogar com o problema da pesquisa,
conceituar algumas palavras e analisar as perspectivas. Já a pesquisa documental aparecerá na
pesquisa porque será preciso conhecer um pouco sobre o contexto do campo de pesquisa e
pretende-se fazer esse levantamento a partir do Projeto Político Pedagógico e quem sabe
relatos de professores que atuam há mais tempo na instituição. Por fim os traços de pesquisa
de levantamento porque precisaremos conhecer de onde falam as crianças, ou seja, conhecer
sua cultura. Para isso, em um primeiro momento iremos a campo para observar os grupos dos
quais a intervenção será realizada, crianças de 5/6 anos, e para coleta de dados do contexto
cultural das crianças que será realizado com a aplicação do instrumento questionário
semiestruturado com as famílias, identificando o local de origem e reconhecendo sua cultura
para travar diálogo com as crianças. Será importante saber também o tempo de permanência
na cidade e no bairro, bem como o modo como a família provê sua subsistência, já que a
instituição recebe alunos de diferentes cidades e estados do país.

Resultados esperados

Espera-se apresentar um breve histórico dos processos de letramento e alfabetização


na Educação Infantil e ampliar o conhecimento sobre os materiais produzidos na área de
alfabetização e letramento a partir do desenho da pesquisa.
Os resultados encontrados no portal CAPES a partir das palavras-chave: alfabetização,
letramento, educação infantil e multiletramentos (ver tabela). Deste resultado nos limitamos a
28 trabalhos de interesse para pesquisa pelo título e palavras-chave. Com a leitura dos
resumos nos limitamos a 18 trabalhos e agora passaremos a ler os trabalhos completos para
selecionar quais realmente são significativos para pesquisa. Além destes, consideraremos
outros dois trabalhos que não foram encontrados na página do CAPES.

RESULTADOS ENCONTRADOS PORTAL CAPES PALAVRAS INDIVIDUAIS


ALFABETIZAÇÃO LETRAMENTO MULTILETRAMENTO MULTILETRAMENTOS
2996 1642 49 74

RESULTADOS DAS PALAVRAS COMPOSTAS CONFORME APRESENTADO


ALFABETIZAÇAO LETRAMENTO EDUCAÇÃO MULTILETRAMENTOS
EDUCAÇÃO INFANTIL EDUCAÇÃO INFANTIL
INFANTIL
415 125 4

ALFABETIZAÇÃO E LETRAMENTO ALFABETIZAÇÃO, LETRAMENTO, EDUCAÇÃO


INFANTIL
334 93

Outro resultado que espera-se encontrar com a pesquisa é apresentar as crianças do campo
seu contexto cultural/social e o contexto histórico-cultural em que estão inseridas,
sensibilizando-as para modos de ver, sentir, conhecer, experimentar e transformar o mundo;
A partir da proposta de multiletramentos e da sensibilização (ver, sentir, conhecer,
experimentar e transformar) espera-se também levar as crianças a construir novos significados
e conhecimentos a partir das relações com o outro, no espaço da intersubjetividade e na
mediação semiótica. E a partir destes significados e conhecimentos que estas crianças possam
descobrir e se apropriar de outras práticas sociais historicamente construídas, entre essas a
escrita.

Conclusões

Almejamos que as rememorações apresentadas pela pesquisadora, bem como a


contribuição das leituras apresentadas, sejam uma oportunidade de reflexão para outros
pesquisadores.
Além disto, ansiamos levar outros professores a desenvolverem pesquisas na área da
Educação Infantil que contribuam para dicotomizar alfabetizar e letrar.
A partir da proposta de multiletramentos esperamos que as crianças possam vivenciar
uma experiência da qual possam identificar sua cultura e a cultura local em que estão
inseridas, exercitando outros modos de ver, sentir, conhecer e experimentar o mundo,
apropriando-se também de outras linguagens.

Referências

BENJAMIN, Walter. O anjo da história. Organização e tradução de João Barrento. – Belo


Horizonte: Editora Autêntica, 2012.

FREIRE, Paulo. Carta de Paulo Freire aos professores. Estudos avançados. 15 (42) 2001.
Acesso em 03/03/2018.

GAGNEBIN. Jeanne Marie. Limiar, aura e rememoração: ensaios sobre Walter Benjamin.
São Paulo: Editora 34, 2014 (1ª edição).

GIL, Antônio Carlos. Métodos e Técnicas de Pesquisa Social. São Paulo. Editora Atlas S.A.
6ª Edição, 2008.

GRUPO DE NOVA LONDRES. A Pedagogy of Multiliteracies: Designing Social Futures. In


COPE, B.; KALANTZIS, M. (Ed.). Multiliteracies: literacy learning and the design of social
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MALHEIROS, Bruno Taranto. Metodologia da Pesquisa em Educação. Rio de Janeiro:LTC,


2011.

PEREIRA, Rogério Santos. Multiletramentos, tecnologias digitais e os lugares do corpo na


educação. UFSC/Florianópolis/SC, 2014.

RIVOLTELLA, Pier Cesare. Mídia educação e pesquisa educativa. Perspectiva,


Florianópolis, v. 27, n. 1, 119-140, jan./jun. 2009 http://www.perspectiva.ufsc.br Acesso em
25/03/2018.

SOARES, Magda. Letramento e alfabetização: as muitas facetas. Revista Brasileira de


Educação nº 25, jan-abril 2004, pp 5-17 Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa
em Educação. Rio de Janeiro – Brasil.

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