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III – Mais que a sentença draconiana — que impõe ao réu pena que,
de muito rigorosa, antes parece perpétua —, é para recear a que
condena o inocente. Gênero de desgraça grande é esse, que, por
evitá-lo, o emprego de diligência, ainda em seu grau máximo, sempre
se teve por muito pouco.
A condenação do inocente à pena última não raro meteu em
escrúpulo até a corações empedernidos. De Nero, monstro coroado,
refere com efeito Suetônio que, certo dia, em que o convidaram a
assinar uma condenação capital, disse: “Tomara não soubesse escrever!”(6)
Outro tanto passou com o imperial Pedro II. Constando-lhe que Mota
Coqueiro, a quem se dera morte no patíbulo, fora vítima de erro
judiciário, no mesmo ponto mandou quebrar a pena com que lhe
negara pedido de clemência e “nunca mais quis assinar nenhuma
condenação”(7).
A todos assusta e angustia o espectro do erro, no entanto mais
àqueles que foram investidos da terrível quão bela função de julgar,
que é atributo próprio só da Divindade.
De feito, julgando sempre, estão os juízes, mais que ninguém,
sujeitos à tirania implacável dessa contingência humana que é o erro.
Não é tudo. Ouçamos a esse varão abalizado em virtudes e
letras, de quem justamente se orgulha e ufana a Magistratura
brasileira, Eliézer Rosa, cujas palavras vêm aqui de molde: “Nos
tribunais, o medo de errar é muito mais oprimente que num juiz de primeiro grau.
Saibam todos que é esta uma imensa e dolorosa verdade. Ser relator dum feito é
terrivelmente penoso, pela consciência que tem de que seu voto pode ser
acompanhado e, por mais e melhor que tenha pensado em acertar, o insidioso erro
pode esconder-se na pureza de seu pensamento”(8).
Este mesmo temor de errar foi, decerto, o que inspirou à
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Notas
Carlos Biasotti
Desembargador aposentado do TJSP e ex-presidente da Acrimesp