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1. INTRODUÇÃO
Trata-se de um projeto de ação didático-pedagógica desenvolvido junto ao Núcleo de
Ensino da Unesp/Franca, em parceria com a Escola Estadual “Mário D’Elia”, no período
compreendido entre maio e dezembro de 2002. O objetivo primeiro foi propiciar aos alunos da rede
pública de ensino o contato e a exploração da linguagem do cinema como documento histórico e
recurso didático para o ensino de história.
O projeto integra-se ao quarto ciclo dos Parâmetros Curriculares Nacionais, cujo eixo
temático consiste na “História das representações e das relações de poder” e seus subtemas:
nações, povos, lutas, guerras e revoluções. O tema indicado, pela professora de história da classe,
para ser desenvolvido na 7ª série B do Ensino Fundamental, foi a Revolução Industrial.
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Professora doutora do Departamento de Educação, Ciências Sociais e Política Internacional da FHDSS/UNESP –
Franca/SP.
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Aluna do 4º ano do Curso de História e bolsista do Projeto.
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Aluna do 4º ano do Curso de História e bolsista do Projeto.
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Lembrando oportunamente as colocações de Lambert:
Na busca de novos caminhos para o ensino da disciplina, o filme insere-se como fonte
documental. Sustenta tal postura as concepções da Nova História, segundo a qual afirma Jacques Le
Goff:
Ampliou o campo do documento histórico; substituiu a história fundada
essencialmente nos textos, no documento escrito, por uma história baseada numa
multiplicidade de documentos: escritos de todos os tipos, documentos figurados,
produtos de escavações arqueológicas, documentos orais, uma estatística, uma curva
de preços, uma fotografia, um filme, uma ferramenta, um ex-voto são para a história
nova, documentos de primeira ordem ( 1990, p.28 ).
Para os críticos de diferentes matizes é uma técnica a ser avaliadas segundo padrões
variados... para os produtores é, antes de tudo, um capital em movimento... e para os
diretores independentes é uma arte e uma técnica a serem manipulados com
diferentes finalidades, satisfação artística, atrativo profissional ou meio de vida,
estímulo criacional, móvel de competição aos Festivais... (1967, p. 24).
O certo é que o cinema vem exercendo uma expressiva influência cultural no mundo,
não só pelas salas de cinema, mas também pelo acesso a fitas de videocassete em nosso ambiente
doméstico. A este respeito, manifesta-se Azzi:
O vídeo trouxe uma mudança qualitativa para quem gosta de cinema.É fundamental
para quem quer se aprofundar num filme. É muito útil para a crítica, que pode ver o
filme mais de uma vez, evitando erros de avaliação. O vídeo é como se fosse uma
mariola particular, em que você pode parar, voltar, ver novamente. O vídeo transforma
o filme em um livro (1996, p. 5).
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Considerando-se, por outro lado, o peso da influência da linguagem do cinema em
nossos alunos, que à guisa de entretenimento são levados, salvo raras exceções, a uma apreciação
acrítica e , por via de conseqüência, a uma visão direcionada, o projeto buscou tratar a linguagem
cinematográfica como fonte documental e instrumento didático-pedagógico privilegiado para o ensino
de História. O objetivo que nos moveu foi despertar o senso crítico e ético do aluno, quer para a
compreensão do passado , em um mundo na era da comunicação , quer sobre o que está disponível
em audiovisual no mercado , ou seja, aguçar o senso crítico do aluno-expectador, para que ele não
seja levado, pela força da comunicação imagem-som, a tirar conclusões precipitadas. Cuidou-se,
ademais, para que os filmes não se prestassem a mera ilustração de aula expositiva. Buscou-se,
sobretudo, trabalhar o conhecimento, unindo-se teoria e prática, a história ensinada e a história
vivida. Destacou-se a projeção não como uma reprodução do real, mas como um discurso, uma fonte
que requer ser tratada considerando as semelhanças e diferenças entre filmes com a mesma
temática e outras fontes.
As ligações do cinema com a história podem ser analisadas sob três aspectos: história
do cinema, história no cinema e cinema na história. A primeira ocupa-se da historiografia do cinema,
vista como uma disciplina de metodologia própria, tal qual a história da literatura, história da música,
história do teatro e assim por diante. A segunda utiliza os filmes como meio de representação do
passado, quando, então, os filmes são vistos como fontes documentais para a história. O terceiro e
último apresenta o papel do cinema na história, ou seja, sua propaganda política, a ideologia que
passa, o conteúdo sociopolítico e cultural expressos na imagem.
Todo filme, desde que analisado criticamente, pode ser utilizado como recurso didático
pelo professor, pois “a natureza da análise independe, assim, tanto do gênero cinematográfico
(documentário, reconstrução, reconstituição) como da época em que ele se situa”, nos adverte Ferro
(1989, p. 66).
A pesquisa não pretendeu investigar verdades históricas com relação ao filme e sim
verossimilhanças com a produção cenográfica e a fonte escrita, a fim de levar os alunos a uma
reflexão entre o concreto e o abstrato; entre o real e o imaginário, na busca do conhecimento, no
caso específico, da história. Dessa forma, “A utilização da linguagem cinematográfica no ensino de
história” apresenta-se como uma nova opção metodológica no ensino dessa disciplina.
2. O PROJETO
A tarefa de se trabalharem conteúdos da disciplina de História por meio da linguagem
cinematográfica sempre aparenta ser uma tarefa simples e incapaz de propor uma inovação. No caso
específico deste projeto, o que se pretendeu foi justamente propor inovações metodológicas a
respeito de atividades relacionadas ao cinema e ao conteúdo de História.
Antes de iniciar o trabalho de projeção e análise dos filmes com a 7ª sérieB do período
da tarde da Escola Estadual “Mário D’Elia”, marcamos uma reunião que tinha como objetivo
apresentar o Projeto ao corpo docente, à professora-coordenadora e à diretora(s) e levá-los a
conhecer as atividades programadas de pesquisa, a ação didático-pedagógica e a elaboração de
material didático, que seriam realizadas até o final do ano letivo. Notamos, nesta reunião, que os
professores, em geral, acolheram de maneira bastante positiva a intenção de realização do projeto na
escola, demonstrando que, ao contrário de muitas escolas estaduais, estão abertos às novas
tendências que os alunos universitários apresentam dentro da escola.
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- Enfocar cenas que funcionem como fio condutor para o tema proposto, a partir dos
filmes “As aventuras de Oliver Twist”, “Germinal” e “Tempos Modernos”;
- Refletir e comentar sobre as mesmas e comentá-las através de uma abordagem
crítica;
- Relacionar as mesmas a um contexto histórico específico (século XIX, XX e XXI);
- Elaborar um panorama geral destes séculos;
- Analisar, com base nas projeções e em textos, as questões centrais expostas nos
filmes;
- Notar a importância de ter conhecimentos sobre autores, diretores e produtores de
uma história que constitui um filme;
- Propor a renovação do ensino de História a partir do contato com a linguagem
cinematográfica.
OLIVER TWIST
O filme projetado para os alunos foi dirigido pelo diretor Tony Bill que se baseou no
clássico da literatura inglesa de Charles Dickens. Ainda criança, Oliver se vê sozinho nas ruas de
Londres e é acolhido por uma gangue de pequenos ladrões. Preso por causa de um crime que não
cometeu, Oliver luta bravamente para provar sua inocência, escapar das garras do bando e encontrar
a família que sempre desejou.
É preciso ressaltar que o filme foi projetado em uma aula dupla e trabalhado com os
alunos em outra, em novo horário. A classe foi dividida em seis grupos com seis participantes cada.
Nesse dia, estavam presentes 36 alunos. Foram entregues os textos com os quais cada grupo
deveria trabalhar.Cada aluno recebeu uma pasta para arquivar todo material a ser entregue e
também produzido.
O texto do primeiro grupo trazia informações sobre a obra literária de Charles Dickens,
bem como sobre este escritor britânico. Fazia referência também sobre o diretor do filme “As
Aventuras de Oliver Twist”, Tony Bill. Com base no texto e no filme visto, este grupo deveria analisar
a maneira como Tony Bill retratou Oliver Twist em seu filme e verificar se foi fiel à obra original de
Dickens.
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século XIX. O sexto grupo teve como incumbência estabelecer um paralelo entre um depoimento de
um menino de rua com a situação de Oliver Twist.
GERMINAL
Na segunda parte, para uma análise histórica, levamos trechos da obra O Manifesto
Comunista de Marx, a fim de comparar a vida e as condições dos operários, que o filme mostra, por
intermédio de alguns escritos históricos e políticos da época. O texto foi distribuído para cada aluno, a
fim de que pudesse ser lido individualmente para, em seguida, atentar-se para os aspectos
essenciais do texto.
Para melhor avaliar o desempenho dos alunos no trabalho com os dois primeiros
filmes, ou seja, “Oliver Twist” e “Germinal”, resolvemos vê-los novamente, com o objetivo de entender
por que tiveram melhor desempenho nas atividades do segundo, “Germinal”. Concluímos que os
alunos tiveram maior dificuldade em analisar “Oliver Twist”, levados pela própria dinâmica do filme,
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que apresenta um enredo de fácil compreensão; personagens divertidos, infantis e com bastante
movimento nas cenas, o que não prendeu tanto a atenção das crianças, como era esperado. Outro
fator que pode não ter ajudado na aula é que resolvemos não pedir anotações sobre o filme4, o que
gerou maior dificuldade com o trabalho de comparação com os textos. Um outro problema notado na
exploração do filme “Oliver Twist” foi com relação à metodologia de grupos. Ao mencionar que teriam
de formar grupos (grupos que não seriam com os quais estão habituados a trabalhar), notamos que a
reação dos alunos não foi receptiva à idéia de realizar um trabalho com outros colegas, o que tornou
o resultado menos eficiente.
Para Lindgren:
TEMPOS MODERNOS
4
Não solicitamos anotações sobre o filme, justamente para verificar como seria o desempenho dos alunos na aula em que
teriam de trabalhar cenas do filme, com textos elaborados.
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Entretanto, algo semelhante ocorreu como a aula sobre o filme “Oliver Twist”, onde os alunos
deveriam trabalhar em grupos; notamos que o desempenho destes poderia ter sido melhor se
tivessem trabalhado individualmente ou em duplas, por exemplo.
3. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Embora curto o espaço de tempo e em que pesem as dificuldades encontradas
mormente com relação ao horário das aulas, eventuais desencontros entre o calendário da escola
trabalhada e da faculdade, questões relativas à disponibilidade da aparelhagem de projeção, alguns
resultados podem ser elencados, e positivos:
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Riolando Azzi afirma que:
Quanto à utilização dos filmes com finalidade pedagógica, não só o professor tem
oportunidade de ver o filme mais de uma vez, podendo extrair com mais clareza os
conteúdos educativos que deseja enfatizar, como também os alunos podem realizar
um trabalho mais aprimorado de pesquisa e descoberta sob a orientação do professor,
aproveitando ao máximo a grande riqueza cultural contida na produção
cinematográfica (1996, p. 6).
4. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
AZZI, RIOLANDO. Cinema e educação; orientação pedagógica e cultural de vídeos II. São Paulo:
Paulinas, 1996. (filmes em Cartaz)
BRASIL. Secretaria de Educação Fundamental. Parâmetros Curriculares Nacionais: História. Brasília:
MEC/SEF, 1998.
COSTA, ANTÔNIO. Compreender o cinema. Trad. Nilson Moulin Louzada. Rio de Janeiro: Globo,
1987.
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_______. Cinema e história. Trad. Flávia Nascimento. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1992.
LAMBERT, H. M. F. C. Cinema e historiografia: as versões da escravidão. In: História. Franca.
UNESP, 1990.
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LE GOFF, JACQUES. A história nova. Trad. Eduardo Brandão. São Paulo: Martins Fontes, 1990.
ROCHA, A. P. O filme: um recurso didático no ensino de História? São Paulo: FDE. Diretoria Técnica,
1992.
SÁ, IRENE TAVARES. Cinema e educação. Rio de Janeiro: Agir, 1967.
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