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ESTUDO DIRIGIDO

FATORES QUE AFETAM A ABSORÇÃO DOS FÁRMACOS

A absorção de fármacos a partir de uma forma farmacêutica administrada


pela via oral é um processo complexo e pode sofrer influência de diversos
fatores, dentre eles destacam-se:

Fatores fisiológicos: superfície de absorção; pH dos líquidos do TGI; trânsito no


TGI; influência dos alimentos; presença de sais biliares; presença de enzimas;
volume dos líquidos do TGI; estabilidade do fármaco nos líquidos presentes;
mecanismo do transporte através das membranas das células do TG e estado
de enfermidade do paciente.

Fatores físico-químicos: solubilidade aquosa, lipofilicidade, peso e tamanho


molecular, pKa, polimorfismo, complexação, estabilidade do fármaco nos
líquidos corporais;

Fatores relacionados às características farmacêuticas: forma farmacêutica,


excipientes e adjuvantes farmacotécnicos, tecnologia envolvida na obtenção
do produto farmacêutico.

A participação desses fatores nas características de biodisponibilidade do


fármaco é observada, principalmente, quando a forma farmacêutica é sólida
(cápsulas, comprimidos, comprimidos revestidos, drágeas, etc), uma vez que,
nestes casos, fazem-se necessárias etapas como desintegração e dissolução
do fármaco, determinando assim sua liberação, para a posterior absorção.

Biofarmacotécnica – Profa. Cristina Helena dos Reis Serra

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Nos próximos itens serão abordados os fatores que influenciam a dissolução e
absorção do fármaco a partir da forma farmacêutica quando esta é
administrada pela VIA ORAL (principal via de administração de
medicamentos).

Fatores fisiológicos

Vários fatores fisiológicos do trato gastrintestinal (TGI) podem influenciar a


absorção dos fármacos. Dentre eles destacam-se: superfície de absorção; pH
dos líquidos do TGI; trânsito no TGI; influência dos alimentos; presença de sais
biliares; presença de enzimas; volume dos líquidos do TGI; estabilidade do
fármaco nos líquidos presentes; mecanismo do transporte através das
membranas das células do TGI.

Superfície de absorção
O TGI tem aproximadamente 6 metros de
comprimento e apresenta quatro regiões
principais: esôfago, estômago, intestino
delgado e intestino grosso ou cólon. O
processo de absorção ocorre principalmente
no intestino delgado, que é dividido em três
porções: duodeno (200 a 300 mm de
comprimento), jejuno (aproximadamente 2 m
de comprimento) e íleo (aproximadamente 3
m de comprimento). Os fármacos são
principalmente absorvidos no duodeno e na
porção proximal do jejuno.

A parede do intestino delgado é bastante vascularizada e os vasos sanguíneos


recebem sangue da artéria mesentérica superior, por meio das arteríolas
ramificadas. O sangue que deixa o intestino delgado é conduzido pela veia
porta-hepática para a circulação sistêmica, passando pelo fígado. Assim,
denomina-se de metabolização pré-sistêmica quando os fármacos são
degradados no fígado antes de atingirem a circulação sistêmica.

O cólon é a parte terminal do TGI e tem aproximadamente 1,5 m de


comprimento. Apresenta menor capacidade de absorção que o intestino
delgado, já que não possui as vilosidades. O cólon tem elevado número e
variedade de bactérias que participam de várias reações metabólicas, tais
como: hidrólise de ácidos graxos e redução de fármacos de sua forma
conjugada inativa para a forma ativa.

O intestino delgado apresenta maior eficiência de absorção em relação ao


estômago e intestino grosso, com uma superfície de absorção de até cerca
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de 200 m2, em função das vilosidades, microvilosidades e dobras de Kerckring.
A superfície das vilosidades é constituída por células epiteliais, sobretudo por
enterócitos, sendo estas as células envolvidas nos processos de absorção. Os
enterócitos são células polarizadas que apresentam um lado apical (voltado
para o lúmen do intestino) e outro lado basal ( lado da mucosa e da
circulação sistêmica). Tal característica torna a absorção de fármacos nesta
porção muito mais eficiente.

Figura - Visão macroscópica das vilosidades intestinais (Adaptado de


GABRIELRBRUNOABIOIFES, 2014).

Figura - Demonstração da estrutura de um


enterócito (Adaptado de JOHNSON, 2005).

Absorção dos fármacos no intestino -Mecanismos


O transporte de fármacos através dos enterócitos é um processo dinâmico e
complexo. Vários são os mecanismos de permeação envolvidos, tais como:
transporte passivo (TP), que pode ocorrer através das membranas dos
enterócitos (de forma transcelular) ou entre os enterócitos (de forma
paracelular) e o transporte ativo (TA), que se dá por meio de transportadores.
A grande maioria dos fármacos é absorvida principalmente por difusão
passiva.

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Transporte Passivo (TP)
Via Transcelular - A maioria dos fármacos de caráter lipofílico é absorvida por
difusão passiva transcelular. Este transporte é determinado principalmente
pelas propriedades físico-químicas do fármaco (pKa, lipofilicidade, tamanho
da molécula e ligações de hidrogênio), pelas propriedades biofísicas da
membrana do enterócito e pelo gradiente de concentração do fármaco pela
membrana. Exemplos de fármacos que são transportados por esta via:
propanolol, naproxeno, cetoprofeno, estradiol, testosterona.

Via Paracelular - Devido à grande barreira imposta pelas junções oclusivas, a


via paracelular só é possível para fármacos hidrofílicos de pequeno ou
moderado tamanho molecular. Vários estudos têm relatado aumento da
permeabilidade do fármaco em função da coadministração de um
modulador de absorção, incluindo agentes tensoativos, quelantes de cálcio,
ciclodextrinas, e quitosanas. Estas substâncias aumentam a permeabilidade de
fármacos de baixa permeabilidade, principalmente abrindo as junções
oclusivas. A absorção do fármaco por via paracelular é mais expressiva nas
porções superiores do intestino delgado. Exemplos de fármacos que são
transportados por esta via: cimetidina, atenolol, loperamida, furosemida.

Transporte Ativo
Via Carreador/Influxo - A absorção do fármaco mediada por transportadores
ocorre por meio de processo ativo ou por difusão facilitada e é um processo
saturável. Neste mecanismo o transporte dos fármacos poderá ocorrer contra
um gradiente de concentração e envolverá transportadores ou carreadores e
consumo de energia. Os carreadores podem estar presentes tanto do lado
apical da membrana como no lado basolateral. Exemplos de fármacos que
são absorvidos por meio de transportadores: cefalexina, captopril, levodopa.

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Via carreador/Efluxo - os transportadores de efluxo mediam o transporte do
fármaco no sentido oposto, isto é, a partir da membrana basolateral da célula
para o seu lado apical, resultando na secreção do fármaco. A glicoproteína-P
(P-gp) é o maior representante dos transportadores de efluxo de fármacos. A
sua atividade tende a aumentar progressivamente do estômago para o cólon
e tal fator deve ser considerado no desenvolvimento de formas farmacêuticas
de libertação prolongada. A baixa biodisponibilidade de alguns fármacos tem
sido atribuída à ação destes transportadores de efluxo. Um grande número de
fármacos, incluindo inibidores da protease (indinavir, ritonavir, saquinavir) e
fármacos anti-neoplásicos (paclitaxel e vimblastina) têm sido identificados
como substratos para a glicoproteína-P.
Endocitose - mediada por receptor também desempenha um papel na
absorção. A endocitose é um mecanismo de transporte pelo qual as
substâncias são ativamente absorvidas através da formação de vesículas da
membrana plasmática. Este transporte é especialmente importante para a
permeação de macromoléculas. Existem três formas principais de endocitose:
pinocitose, fagocitose, e endocitose mediada pelo receptor.

pH dos líquidos do TGI

O pH dos líquidos varia consideravelmente ao longo do trato gastrintestinal. O


pH dos líquidos gástricos é altamente ácido (1,0 a 3,0), devido à elevada
concentração de ácido clorídrico. A porção duodenal, por sua vez, apresenta
valores de pH que variam de 2,5 a 6,5. Entretanto, estes valores podem sofrer
variação a cada minuto, dentro de uma faixa de 1 a 7, no estado de jejum, e
de 3 a 7, após as refeições.

O Quadro abaixo apresenta os valores de pH no duodeno, jejuno e íleo, nos


estados de jejum e após alimentação.

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O pH gastrintestinal pode influenciar a absorção de fármacos afetando a sua
estabilidade química ou sua dissolução. A maioria dos fármacos são ácidos
fracos (20%) ou bases fracas (75%). Portanto, a dissolução destes dependerá
do pKa da molécula e do pH do meio.

Lembrando que a forma ionizada (dissociada) é mais hidrossolúvel que a


forma não ionizada.

A absorção do ácido salicílico (pKa=3) é maior no intestino apesar da forma


dissociada estar em maior porcentagem nesta porção, em função do pH (6,8).
Isto ocorre em função da superfície de absorção do intestino, que é mais
apropriada para absorção do que a do estomago.

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Outros fatores biológicos – Trânsito no TGI; volume dos líquidos no TGI,
presença de alimentos, de enzimas e de sais biliares

Trânsito no TGI

O esvaziamento gástrico, que consiste no tempo que uma forma


farmacêutica leva para atravessar o estômago, também é denominado de
tempo de residência gástrica ou velocidade de esvaziamento gástrico e em
situações consideradas normais, este tempo varia de cinco minutos a duas
horas. O esvaziamento gástrico tem um papel fundamental na determinação
do tempo de retenção de uma forma farmacêutica sólida no estômago.
Prolongar o tempo de retenção gástrica de uma forma farmacêutica constitui
uma importante abordagem para fármacos cuja absorção ocorre
principalmente na porção superior do TGI.

O tempo de permanência no intestino delgado é determinado pela motilidade


intestinal, conduzida por dois tipos principais de movimento intestinal: o
propulsor e o de mistura. A velocidade de trânsito intestinal determina o tempo
de permanência do fármaco ou da forma farmacêutica no intestino delgado.
Sendo o intestino delgado o principal sítio de absorção da maioria dos
fármacos no trato gastrintestinal, o tempo de trânsito entre o estômago e o
cólon é um importante fator para a biodisponibilidade de fármacos. Assim,
quanto maior o tempo de contato do fármaco com seu sítio de absorção,
maior será a quantidade absorvida. Normalmente, o tempo de trânsito do
fármaco varia entre 3 – 4 horas em indivíduos sadios.

Esse parâmetro será especialmente importante para as formas farmacêuticas


de liberação lenta (formas de liberação prolongada e controlada), formas
farmacêuticas com revestimento gastrorresistente, fármacos que se dissolvem
lentamente nos líquidos intestinais e fármacos que são absorvidos por
transporte mediado por carreadores.

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Por exemplo, a velocidade de dissolução do fármaco, a partir de um
comprimido, deverá ser suficiente para garantir a adequada solubilização e
liberação do fármaco no local adequado para a sua absorção. No caso de
fármacos classificados como fracamente solúveis (solubilidade menor que 100
μg/mL) quando a velocidade de dissolução for mais lenta que o tempo de
trânsito intestinal desse fármaco, a biodisponibilidade pode ser incompleta.

Com relação ao trânsito de medicamentos no cólon, este pode variar de 2 a


48 horas e depende das formas farmacêuticas administradas, de padrões de
alimentação e de doenças existentes. Na maioria das pessoas o tempo de
trânsito da boca até o ânus ultrapassa 24 horas.

Presença de sais biliares

A secreção de bile no intestino delgado resulta em uma substancial


concentração de sais biliares e lecitina, os quais favorecem a formação de
micelas, o que pode favorecer a dissolução e absorção de fármacos.

Volume

O volume de líquidos no TGI, disponível para a dissolução dos fármacos,


depende: da quantidade de líquido co-administrado com o medicamento e
das secreções e do fluxo de água através da superfície do intestino.
Aproximadamente 2 litros de água são ingeridos diariamente, entretanto, isto
pode variar em função das condições climáticas, peso corporal, atividade e
hábito pessoal. As secreções das glândulas salivares, fígado e pâncreas, bem
como as secreções do estômago, são recebidas pela porção inicial do
duodeno. Essas secreções endógenas totalizam um volume aproximado de 6
litros diários.

Fatores físico-químicos

O processo de absorção de um fármaco administrado por via oral, na forma


farmacêutica sólida, vai depender, principalmente, da quantidade de
fármaco dissolvida nos líquidos do TGI e da velocidade com que ocorre este
processo de dissolução, ou liberação. Entretanto, a liberação/dissolução do
fármaco, após a administração de um comprimido, por exemplo, será
precedida do processo de DESINTEGRAÇÃO (conforme ilustrado na figura
abaixo). A dissolução do fármaco vai ser determinada pela capacidade do
fármaco se solubilizar nos líquidos corporais, ou seja, na água. Assim, o
parâmetro SOLUBILIDADE é de fundamental importância para o
desenvolvimento farmacotécnico de medicamentos.

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DESINTEGRAÇÃO

DISSOLUÇÃO

ABSORÇÃO

Solubilidade - refere-se à quantidade máxima que um determinado soluto


dissolve-se em um determinado solvente. Geralmente expressa em grama de
soluto dissolvido em mililitros de solvente.

A solubilidade aquosa é dependente das características moleculares dos


fármacos e da capacidade desta molécula formar pontes de hidrogênio com
a molécula de água. Geralmente a solubilidade aquosa é diretamente
proporcional ao número de pontes de hidrogênio que podem ser formadas
com água. O Quadro abaixo apresenta exemplos de compostos orgânicos e
suas respectivas solubilidades.

Nesse contexto, dentre as propriedades físico-químicas que influenciam a taxa


de dissolução das partículas do fármaco, destacam-se: pKa do fármaco e pH
do meio; polimorfismo, superfície e tamanho de partícula.

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pKa do fármaco e pH do meio

Considerando-se que aproximadamente 95% das moléculas dos fármacos


constituem de ácidos fracos ou bases fracas, o conhecimento do pH e do pKa
é fundamental para o desenvolvimento farmacotécnico, visto estar
diretamente relacionado com a solubilidade do fármaco e,
consequentemente, com a dissolução.

De acordo com o princípio de partilha de pH, moléculas polares e ionizadas


são mais solúveis em água, porém, mais lentamente absorvidas do que as não-
ionizadas. Segundo esta hipótese, é provável que um fármaco fracamente
ácido seja mais bem absorvido no estômago, onde se encontra na forma não
ionizada, enquanto que um fármaco fracamente básico seja absorvido no
intestino, onde prepondera a forma não ionizada.

Contudo, na prática, outros fatores devem ser levados em consideração. Por


exemplo, a superfície de absorção que é consideravelmente maior do
intestino delgado consegue mais do que compensar o elevado grau de
ionização de fármacos fracamente ácidos nos valores de pH intestinal. Além
disso, o tempo de residência mais prolongado no intestino delgado é tido
como um elemento que favorece a absorção de ácidos fracos nesse sítio.

O aumento nas velocidades de dissolução e de absorção tem sido relatado,


quando fármacos, de caráter lipossolúvel, são administrados na forma de sais
ou em associação com sistema tampão. A administração de fármacos na
forma de sal sódico, como no caso dos barbituratos e do naproxeno, tem
permitido uma absorção mais rápida e maior eficácia. Porém, fatores como
estabilidade química, higroscopicidade, facilidade de produção e
cristalinidade, devem ser considerados quando se faz a seleção da forma sal
do fármaco.

Polimorfismo

Muitos fármacos podem existir em duas ou mais formas cristalinas diferentes.


Essa propriedade é denominada polimorfismo e cada forma cristalina é
conhecida como polimorfo. Os diferentes cristais polimórficos apresentam
distintas propriedades físico-químicas, tais como: ponto de fusão, difração de
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raios X e solubilidade. Os polimorfos podem existir na forma de solvatos,
hidratos e amorfos. Solvatos são formas cristalinas que contêm, ou não,
quantidades estequiométricas de um solvente, sendo que, quando o solvente
é água, são denominados hidratos. A forma amorfa consiste de arranjos
moleculares desordenados, não possuindo uma estrutura cristalina definida.

A forma polimórfica com baixa energia livre será mais estável, enquanto que
aquelas menos estáveis ou metaestáveis tenderão a se transformar na forma
mais estável, o que vai depender das diferenças de energia entre as formas
estáveis e metaestáveis. Diante disto, a identificação da forma polimorfa de
menor energia durante o desenvolvimento de um novo fármaco, torna-se
imprescindível, uma vez que esta é, na maioria das vezes, a forma mais
quimicamente estável e não irá se converter em outra forma polimórfica
durante a armazenagem do produto.

Do ponto de vista farmacêutico, o efeito do polimorfismo sobre a solubilidade


é particularmente importante, uma vez que tal propriedade é responsável por
alterações na dissolução dos fármacos no TGI. Os polimorfos mais solúveis são
os metaestáveis, que tenderão a se transformar nas formas estáveis, porém
menos solúveis. Exemplo clássico da influência do polimorfismo na
biodisponibilidade é o caso do palmitato de cloranfenicol, que apresenta
perfis de dissolução significativamente diferentes para suas três formas
polimórficas.

Na Figura abaixo, observa-se perfis de dissolução (dissolução (%) x tempo


(min)) distintos obtidos a partir de comprimidos contendo glimepirida-Forma
polimórfica I (menor taxa de dissolução) e glimepirida-Forma polimórfica II
(maior taxa de dissolução).

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O fármaco também pode existir na forma amorfa, que é comumente mais
solúvel que a correspondente forma cristalina. Essas características podem
causar diferenças significativas na biodisponibilidade quando o fármaco é
administrado na forma sólida.

A novobiocina, por exemplo, que na forma amorfa é rapidamente absorvida


após a administração em suspensão aquosa, é terapeuticamente ineficaz
quando administrada na forma cristalina pelo fato de não ser absorvida.

A Figura abaixo apresenta os perfis de decaimento plasmático (Figura A) e a


Quantidade acumulada na urina em função do tempo (Figura B) obtidos a
partir de voluntários aos quais foram administrados 400 mg da rifaximina na
forma AMORFA e na forma POLIMÓRFICA.

As formas solvatadas e não-solvatadas de um fármaco também exibem


diferenças na solubilidade e nas taxas de dissolução. Portanto, é razoável
esperar que essas formas possam apresentar diferenças na biodisponibilidade,
principalmente no caso daqueles fármacos pouco solúveis, que possuem
biodisponibilidade limitada pela taxa de dissolução. Geralmente, quanto mais
solvatado o cristal, menor sua solubilidade e menor sua taxa de dissolução. É o
caso da ampicilina (Figura abaixo).

Por esta razão, os compostos hidratados apresentam menor solubilidade e


velocidade de dissolução em água, em relação aos seus análogos anidros.

A Figura abaixo apresenta os perfis de dissolução e de decaimento plasmático


da ampicilina na forma anidra e na forma hidratada. E, conforme pode ser
observado, a forma anidra apresenta maior taxa de dissolução e também
maior concentração sérica.

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Porém, existem exceções, como é o caso da eritromicina e da
carbamazepina, em que a forma mais hidratada apresenta maior solubilidade
e velocidade de dissolução em água, em relação aos seus análogos anidros.

Além dos problemas relacionados à dissolução e, portanto, à


biodisponibilidade, o polimorfismo pode promover alterações na estabilidade
física e química das formulações farmacêuticas. Dessa forma, são de
fundamental importância a identificação e o controle de polimorfos, tanto na
fase de desenvolvimento do produto como durante o período de
comercialização.

Superfície e tamanho da partícula

O aumento na área da superfície de contato com o líquido do TGI acarretará


em aumento da velocidade de dissolução, uma vez que partículas do
fármaco estarão intimamente umedecidas. Assim, a redução do tamanho das
partículas resultará em aumento da velocidade de dissolução e de absorção,
o que alterará o perfil de biodisponibilidade do fármaco.

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São exemplos de fármacos para os quais a redução de tamanho de partícula
proporcionou maior absorção e, portanto, maior biodisponibilidade: digoxina,
nitrofurantoína, tolbutamida, naproxeno, ibuprofeno, fenacetina.

Figura. Dissolução do metronidazol em água com partículas de diferentes


tamanhos (Lauwo, 1965 apud Banakar, 1992) (adaptado).

As Figuras abaixo apresentam a Dissolução e Biodisponibilidade da fenacetina


com diferentes tamanhos de partículas.

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Fatores relacionados à forma farmacêutica, adjuvantes e tecnologia
farmacêutica

As formas farmacêuticas, bem como os adjuvantes farmacotécnicos


empregados para sua composição, além da tecnologia envolvida na
produção têm grande influência sobre a velocidade de dissolução e de
absorção dos fármacos e, por consequência, na biodisponibilidade.

Forma farmacêutica e vias de administração

Conforme descrito anteriormente, a absorção de um fármaco depende de


sua dissolução nos líquidos do TGI. Quando fármacos são administrados na
forma de solução oral, estes estarão disponíveis para a absorção, uma vez que
já se encontram dissolvidos nesta forma farmacêutica. Para outras formas
farmacêuticas como, suspensão, cápsulas, comprimidos, a absorção deverá
ser precedida de outras etapas, tais como a liberação e a dissolução do
fármaco a partir da forma farmacêutica.

Desse modo, o número de potenciais barreiras para a absorção será maior


quanto maior for o número de etapas que precedem a absorção. Assim, a
biodisponibilidade de um fármaco tende a diminuir conforme a seguinte
ordem de classificação da forma farmacêutica:

solução aquosa > suspensão aquosa > formas farmacêuticas


sólidas (pós, cápsulas, comprimidos, comprimidos revestidos).

As soluções são formas farmacêuticas adequadas quando absorção rápida e


completa é requerida. A biodisponibilidade dos fármacos em soluções pode
ser afetada pelos seguintes aspectos: estabilidade do fármaco nos líquidos do
TGI; formação de complexo entre o fármaco e algum excipiente;
incorporação do fármaco em micelas.

Suspensões são empregadas normalmente para veicular fármacos insolúveis


ou pouco solúveis em meio aquoso. Alterações na biodisponibilidade de
fármacos administrados na forma de suspensão podem estar relacionadas
com: tamanho das partículas; forma cristalina do fármaco; complexação do
fármaco com algum excipiente; agentes tensoativos que normalmente
favorecem a dissolução; substâncias que aumentam a viscosidade, as quais
retardam a dissolução e interferem no esvaziamento gástrico e na motilidade
intestinal.

A influência dos parâmetros físico-químicos é sobretudo maior quando a forma


farmacêutica é sólida, ou seja: cápsulas, comprimidos, comprimidos
revestidos, drágeas, entre outras. As cápsulas de gelatina mole normalmente
veiculam fármacos em solução ou em suspensão, o que determina dissolução
e liberação mais rápida, conforme discutido nos itens anteriores. A
biodisponibilidade dos fármacos veiculados em cápsulas de gelatina dura
será, geralmente, melhor ou igual àquela obtida pela administração em
comprimidos, já que as pequenas partículas do fármaco não são submetidas
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aos processos de compressão. As cápsulas de gelatina dissolvem-se
rapidamente nos líquidos do TGI, liberando seu conteúdo, que se dispersa e,
assim, favorece a dissolução do fármaco. Entretanto, a velocidade de
dissolução é dependente de uma série de fatores, tais como: solubilização do
invólucro de gelatina; velocidade dos processos de desagregação e
dissolução do conteúdo da cápsula.

Os comprimidos são formas farmacêuticas obtidas por compressão de uma


mistura de excipientes com o fármaco. Podem ser comprimidos simples,
revestidos, bucais, sublinguais, efervescentes, mastigáveis. Os comprimidos
correspondem às formas farmacêuticas que apresentam maiores problemas
com relação à biodisponibilidade, em função de fatores relacionados à
tecnologia de fabricação e aos adjuvantes empregados. Para que o fármaco
seja liberado desta forma farmacêutica são necessárias as etapas de
desagragação, desintegração e dissolução.

Adjuvantes farmacotécnicos

Fármacos normalmente são administrados associados a substâncias


designadas de adjuvantes farmacotécnicos, cujas principais funções são:
permitir e facilitar a obtenção da forma farmacêutica; assegurar a
estabilidade química e microbiológica; aumentar a aceitabilidade por parte
do paciente e proporcionar a adequada liberação do fármaco. Entre os
adjuvantes estão: agentes desintegrantes, diluentes, lubrificantes, agentes
suspensores, agentes emulsionantes, flavorizantes, edulcorantes, corantes,
estabilizantes químicos, entre outros.

Adjuvantes farmacotécnicos foram considerados inertes durante muitos anos,


já que eram destituídos de ação terapêutica ou biológica. Contudo,
atualmente vários estudos descritos na literatura têm apontado a capacidade
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destas substâncias para influenciar os processos de dissolução e de absorção.
Alguns exemplos destas evidências serão apresentados nos próximos tópicos.

Os diluentes, por exemplo, são caracterizados como adjuvantes inertes e não


reagentes com as substâncias ativas ou outros adjuvantes. Normalmente são
utilizados em grande quantidade na produção de formas farmacêuticas
sólidas, como, cápsulas e comprimidos. Dentre os principais exemplos de
diluentes destacam-se: lactose, celulose, manitol e fosfato de cálcio.

O manitol é um diluente conhecido por diminuir o tempo de trânsito


gastrintestinal, resultando em uma passagem mais rápida do medicamento
pelo intestino. Para fármacos que tenham problemas de dissolução, a inclusão
de um agente como o manitol na formulação farmacêutica poderá diminuir a
biodisponibilidade do fármaco em questão.

Um exemplo clássico do efeito que os diluentes podem exercer sobre a


biodisponibilidade dos fármacos foi o caso da troca de diluentes em cápsulas
contendo fenitoína. A simples substituição do sulfato de cálcio diidratado por
um outro diluente, a lactose, levou uma série de pacientes à intoxicação por
fenitoína, em função do aumento da biodisponibilidade do fármaco.

Tanto os comprimidos como as cápsulas requerem a adição de lubrificantes


em suas formulações para reduzir o atrito entre o pó e as superfícies dos
equipamentos empregados na produção. São os principais exemplos de
lubrificantes de caráter hidrofóbico destacam-se: estearato de magnésio,
ácido esteárico, parafina líquida. Dentre os lubrificantes de caráter hidrofílico
estão: laurilsulfato de sódio e polietilenoglicol.

Na maioria das vezes, os lubrificantes são de natureza hidrofóbica e dificultam


a molhabilidade do fármaco, diminuindo, desta forma a sua velocidade de
dissolução. Esse resultado é principalmente observado quando o fármaco
também possui características hidrofóbicas, o que prejudica razoavelmente a
dissolução.
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O estearato de magnésio é normalmente utilizado como lubrificante nas
operações de compressão e de enchimento de cápsulas. Caso o conteúdo
do estearato de magnésio estiver acima de 1%, pode ocorrer aumento do
tempo de desintegração de comprimidos provocando interferência na
velocidade de dissolução.

Por outro lado, os lubrificantes de caráter hidrofílico, como lauril sulfato de


sódio e oleato de sódio, por possuírem propriedades tensoativas, não
retardam a dissolução dos fármacos. A Figura abaixo ilustra o efeito de
lubrificantes sobre a velocidade de dissolução do ácido salicílico os perfis de
dissolução. Estearato de magnésio – hidrofóbico; laurel sulfato de sódio –
hidrofílico.

Os desintegrantes são adicionados em formulações visando facilitar a


desagregação da massa comprimida, aumentar a área superficial e promover
a dissolução. Um comprimido que falha na hora de desintegrar ou que
desintegra lentamente pode resultar em uma absorção incompleta ou em
uma demora do início de ação do fármaco. Dentre os principais exemplos de
desintegrantes destacam-se: amido, celulose, polivinilpirrolidona cruzada,
glicolato sódico de amido e carboximetilcelulose sódica.

Estudos têm mostrado que derivados de celulose melhoram a desintegração,


mas podem retardar a dissolução pelo simples mecanismo do aumento de
viscosidade e, portanto, diminuição da difusão das moléculas do fármaco. A
utilização dos chamados superdesintegrantes, substâncias bastante hidrofílicas
com alta capacidade de molhabilidade, em concentrações adequadas, tem
permitido a obtenção de formulações com ótimos perfis de dissolução, apesar
de conterem fármacos pouco solúveis.

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O revestimento de comprimidos representa uma barreira física entre a forma
farmacêutica e os líquidos do TGI. O emprego de polímeros hidrofóbicos ou
insolúveis na água (etilcelulose, resinas acrílicas, como Eudragit®RS e
Eudragit®E) reduz substancialmente a liberação do fármaco, podendo afetar
a absorção e a biodisponibilidade. Muitos trabalhos têm relatado o uso destes
polímeros no revestimento de núcleos para formulação de formas de
liberação prolongada. Por outro lado, a utilização de polímeros solúveis em
água, tais como, a hidroxipropilmetilcelulose, não acarreta efeitos significativos
sobre a desintegração.

Tecnologia envolvida na produção

Os processos envolvidos na fabricação dos medicamentos também podem


influenciar a dissolução e a biodisponibilidade. Comprimidos obtidos por
compressão direta, granulação via seca ou via úmida podem apresentar
comportamentos in vitro e in vivo diferentes. Aspectos como forma e
condições de secagem do granulado, tempo de mistura ou agitação,
velocidade e força de compressão também podem alterar significativamente
o desempenho da forma farmacêutica no organismo. Fatores tecnológicos
como tipo de processo, tempo e velocidade de agitação, tipo de
granulação, temperatura de secagem e força de compressão podem
influenciar a biodisponibilidade de um fármaco.

BIBLIOGRAFIA

1. ALLEN, L.V., Popovich, n. g., ANSEL, H. C. 8 ed. Formas farmacêuticas e sistema


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Biofarmacotécnica – Profa. Cristina Helena dos Reis Serra

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