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METODOLOGIA DA PROBLEMATIZAÇÃO: UMA EXPERIÊNCIA EM

CONSTRUÇÃO NO CURSO DE PEDAGOGIA.

Jadir Gonçalves 1 - UEG-GO


Elton Castro 2 - UEG-GO
Sônia Bessa3 - UEG-GO

Eixo – Ensino e Práticas nas Licenciaturas


Agência Financiadora: Pró-reitoria de Pesquisa e Pós Graduação da UEG

Resumo

A metodologia de problematização é considerada ativa, aplicável em várias áreas do


conhecimento desde o ensino superior a educação básica. Pressupõe um estudante ativo,
autônomo, capaz de aprender por si mesmo. O professor assume um papel de orientador, uma
postura importante na condução metodológica do processo, e não mais como fonte central de
informação. Esse relato de experiência tem como objetivos apresentar o trabalho com a
metodologia de problematização em disciplinas do curso de pedagogia da UEG - Campus
Formosa. Trata-se de um estudo em andamento. Participaram 99 estudantes do 3o e 4o anos do
curso de pedagogia das disciplinas de conteúdos e métodos do ensino de Ciências (4o),
Matemática (3o) e História (4o). A carga horária das disciplinas é de 72 horas na modalidade
presencial. Dos estudantes foi solicitado comprometimento, habilidade para trabalhar em grupo,
tomar decisões na sua esfera de atuação imediata, organização, autonomia e capacidade
reflexiva. Os estudantes não estavam acostumados a iniciar o estudo a partir do conhecimento
prático, o que causou estranheza inicialmente. Eles saíram de uma situação prática de
investigação para a busca dos referenciais. O tratamento dado a informação e conhecimento
representou uma mudança significativa na visão dos estudantes. No discurso dos estudantes é
possível inferir que o conhecimento derivou de um ato pessoal e autobiográfico. O processo
tem proporcionado uma experiência produtiva em termos de aprendizagem e crescimento
pessoal dos estudantes. Foi alterada a visão tradicional de professor, de transmissor de
conhecimento para um professor mediador. Em todos os relatos dos estudantes verifica-se uma
visão positiva da metodologia.

Palavras-chave: Ensino aprendizagem. Metodologia problematização. Ensino Superior.

1
Doutor em História: Cultura religiosa pela Universidade Federal de Goiás (UFG). Professor titular da
Universidade Estadual de Goiás (UEG) – Campus Formosa. Membro do LIMA - Laboratório de Inovação em
Metodologias Ativas. E-mail: jadirueg@gmail.com.
2
Doutor em Química pela Universidade de Brasília. Professor titular da Universidade Estadual de Goiás (UEG)
– Campus Formosa. Membro do LIMA - Laboratório de Inovação em Metodologias Ativas. E-mail:
eltonkastro@gmail.com.
3
Doutora em Educação: área de Psicologia Desenvolvimento e Educação - UNICAMP-SP. Professora titular do
curso de pedagogia da Universidade Estadual de Goiás UEG. Membro do LIMA - Laboratório de Inovação em
Metodologias Ativas. E-mail: soniabessa@gmail.com.

ISSN 2176-1396
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Introdução

Esse relato é o resultado de um estudo pioneiro na Universidade Estadual de Goiás


(UEG) - Campus Formosa, na aplicação da metodologia de problematização para estudantes do
curso de pedagogia. Esse estudo surgiu a partir da insatisfação de três professores da instituição:
uma professora do curso de pedagogia, um professor do curso de história e um do curso de
química. Cada professor com sua formação específica, mas com o desafio de formar professores
para a Educação Básica e o forte desejo de romper com paradigmas pré-estabelecidos no
modelo tradicional e buscar inovações no ensino superior. O objetivo desse relato é apresentar
o trabalho com a metodologia de problematização nas disciplinas nas disciplinas de conteúdos
e processos de ensino de história, matemática e ciências. São disciplinas do curso de pedagogia
da UEG voltadas ao ensino de Matemática, história e ciências no nível I do ensino fundamental.
Os professores que atuam nessas disciplinas, não são necessariamente pedagogos, mas
especialistas em suas respectivas áreas. O que atua na disciplina de conteúdos e processos de
ensino de história é doutor em história, o de conteúdos e processos de química é doutor em
química e a professora de conteúdos e processos de matemática, é pedagoga com doutorado em
educação matemática. As formações são distintas, mas os três professores estavam com o forte
intuito de renovar sua prática pedagógica.
Após um período de estudo e pesquisa optou-se pela metodologia da problematização
com o arco de Maguerez. Berbel (1995, 1996) foi a primeira a utilizar o termo "metodologia da
problematização com o arco de Maguerez", a qual Berbel (2012) chama de terceira versão. Esse
método foi difundido inicialmente por Bordenave e Pereira (2010), que associa a outros
referenciais teóricos de inspiração construtivista. Berbel (1996) associou a metodologia de
problematização com o conceito de práxis, o que a coloca bem próximo do contexto da
formação inicial do curso de pedagogia. Ela compreende que na metodologia de
problematização o problema é a própria realidade ou uma parcela da mesma, apreendida como
problema real a ser resolvido ou melhorado mediante a ação conjunta. O objetivo é levar o
estudante a tomar consciência de seu mundo e agir intencionalmente para transformá-lo com
vistas a uma sociedade melhor. Nesse sentido,

A Metodologia da Problematização tem uma orientação geral como todo método,


caminhando por etapas distintas e encadeadas a partir de um problema detectado na
realidade. Constitui-se uma verdadeira metodologia, entendida como um conjunto de
métodos, técnicas, procedimentos ou atividades intencionalmente selecionados e
organizados em cada etapa, de acordo com a natureza do problema em estudo e as
condições gerais dos participantes. (BERBEL, 1998. p.144)
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A metodologia de problematização com o arco de Maguerez pressupõe um aluno ativo,


protagonista do processo de construção do conhecimento. O professor assume um papel de
orientador, um papel importante na condução metodológica do processo, e não mais como fonte
central de informação ou de decisão das ações como em modelos anteriores. Dessa forma os
estudantes observam uma parcela da realidade, definem um problema de estudo até a realização
de algum grau de intervenção naquela parcela da realidade, a fim de contribuir para a sua
transformação. Nesse contexto a teoria e a prática são elementos importantes. Berbel (2012, p.
18) afirma que: "[...] teoria e prática se articulam desde o início, visto que tanto a teoria quanto
a prática considerada e realizada se apresentam em níveis variados de elaboração, dependendo
das condições concretas de que dispomos em cada grupo". O estudante vai tomar um recorte da
realidade como ponto de partida e de chegada em seu estudo, reconhecer a constante relação
entre teoria e prática ao longo do percurso em cada estudo; considerar a realidade concreta para
aprender com ela e para nela intervir, em busca de soluções para seus problemas; conscientizar-
se da complexidade dos fenômenos sociais; entre outras. Para Berbel (2012) esse é um grande
desafio imposto a alunos e professores em qualquer nível, e em especial no ensino superior, por
que exige determinação, conhecimento da metodologia e conviver com a realidade de um
caminho que não se coaduna com tendências modernas de educação.
A metodologia de problematização com o arco de Maguerez vai além de uma
metodologia ativa é uma alternativa de ensino reflexivo e construtivo, apresentando um
referencial teórico-metodológico que pode ajudar o professor no seu trabalho com o
conhecimento teórico-prático, que se complementa com a transformação da realidade. A
metodologia de problematização está estruturada em cinco etapas que se desenvolvem a partir
da realidade ou um recorte da realidade: 1) Observação da realidade; 2) pontos-chave; 3)
teorização; 4) hipóteses de solução e 5) aplicação à realidade (prática).

Metodologia

Esse relato de experiência pretende descrever a inserção da metodologia de


problematização em três disciplinas metodológicas do curso de pedagogia da Universidade
Estadual de Goiás - UEG, Campus Formosa. O trabalho com a metodologia de problematização
iniciou-se no ano de 2016 com duas disciplinas e em 2017 foi ampliado em mais duas
disciplinas, o que caracteriza esse estudo como em andamento. Participaram um total de 99
estudantes, sendo 66 do 4o ano e 33 do 3o ano. Duas disciplinas são no 4o ano, conteúdos e
processos de ensino de ciências (33 estudantes), conteúdos e processos do ensino de história
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(33), e no 3o ano a disciplina de conteúdos e processos do ensino de matemática (33). A carga


horária de todas as disciplinas é de 72 horas com todas as aulas na modalidade presencial no
período matutino. O planejamento foi feito em conjunto pelos três professores das respectivas
disciplinas. Na apresentação e em algumas aulas os três professores estiveram juntos,
apresentando as disciplinas e participando ativamente das discussões com os estudantes. Por
tratar-se de um trabalho conjunto foi necessário que todos os professores entendessem os
conteúdos dos demais, o que tornou possível a visão de conjunto sobre a temática da
metodologia de problematização. Foram necessários exercícios constantes de leitura, a partir
do olhar dos diferentes professores.

Resultados e discussão

Será feita uma descrição da aplicação da metodologia de problematização nas


disciplinas do curso de pedagogia. A ideia inicial foi partir de situações cotidianas do ensino
das respectivas disciplinas nas áreas de ciências, matemática e história nos anos iniciais do
ensino fundamental I, problematizando a realidade.

Conteúdos e processos do ensino de matemática

Esta disciplina no curso de pedagogia prepara os futuros professores a trabalhar com a


aritmética nos anos iniciais: a construção do número, as estruturas aditivas e multiplicativas são
conteúdos importantes dessa disciplina. A abordagem restringe-se a forma, sem adentrar-se no
conteúdo, por conta da limitação da carga horária. O ensino de matemática seja nos anos
iniciais ou em toda a educação básica, pela sua característica de abstração, favorece a inserção
de desafios, jogos, e situações problemas. Contudo o ensino é na maioria das vezes tratado
como uma narrativa de fatos e dados tal qual a maioria das disciplinas "as aulas fundamentam-
se, predominantemente, na comunicação do professor ao aluno, mediada quase sempre pelo
livro e, algumas vezes, por outros recursos didáticos" (NOGUEIRA, 2013. p.1).
Predispor os estudantes a gostar da disciplina é o primeiro desafio a ser vencido, em
qualquer faixa etária, para tanto a disciplina de conteúdos e processos do ensino de matemática
foi organizada com a proposta de inserir no primeiro momento situações em que os estudantes
pudessem investigar o pensamento da criança quanto a construção do pensamento lógico
matemático e levantar uma problemática a partir da observação da realidade, conforme proposto
por Berbel (1995, 2012).
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A disciplina foi dividida em dois módulos. Foram propostas duas atividades


investigativas no primeiro módulo e duas no segundo. Em cada um dos módulos o estudante
deveria ir a campo coletar dados sobre a realidade da aprendizagem de crianças de 5, 8 e 10
anos. A primeira atividade proposta diz respeito a noção de quantidades e a segunda de inclusão
de classes. As duas primeiras atividades permitem verificar as formas como as crianças
constroem a noção de número, identifica a presença de relações termo a termo necessárias a
construção da noção de adição, e se tem ou não a reversibilidade de pensamento necessária a
compreensão das operações aritméticas. As duas atividades subsequentes do segundo módulo
aborda o valor posicional e as estruturas multiplicativas, envolvendo a operação inversa e a
correlativa.
Após a aplicação da primeira atividade com crianças de 5, 8 e 10 anos, os estudantes
ficaram surpresos com os resultados. Verificaram que crianças de 8 e 10 anos ainda não haviam
construído a noção de número, não percebiam a parte e o todo e tinham dificuldades até mesmo
nas relações termo a termo. A partir dessa constatação surgiram os seguintes problemas: "como
as crianças constroem a noção de quantidade", "como as crianças compreendem a inclusão de
classes", "o que fazer quando tem crianças com aprendizagens diferentes na mesma sala de aula
no ensino da matemática", "sequenciação e seriação: relações necessárias para construção do
número na educação matemática", "como ajudar crianças a construir uma rede de relações
numéricas", "o conhecimento lógico matemático e a noção de seriação, conservação e
classificação", "como as crianças constroem os conceitos matemáticos".
A construção dos problemas representou um desafio para os estudantes. Eles
começaram a compreender que a metodologia de trabalho tradicional pode ou não garantir a
construção do número, já na discussão embrionária da realidade os estudantes perceberam a
necessidade de buscar formas alternativas ao modelo transmissivo, corroborando a posição de
Cunha (2008, p.17) quando pontua: "as inovações que se procurou afirmar no campo acadêmico
enfrentam toda a dificuldade decorrente da presença paradigmática dominante".
Na apresentação da coleta de dados os estudantes começaram a inferir que o conceito
de número, não é passível de ser ensinado diretamente, uma vez que constituem parte do
desenvolvimento, assim como a capacidade de compreender que uma quantidade de objetos
não muda se mudarmos as suas configurações espaciais, nesse caso a conservação de
quantidade. Com surpresa verificaram que crianças de 5 anos são capazes de contar
sequencialmente e de forma correta, mas pode desconhecer a conservação de quantidade. Esse
fato representou novidade para todos os estudantes já a partir do contato inicial com a realidade.
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Após a elaboração dos pontos chaves a partir dos problemas, os estudantes foram para
a terceira fase da metodologia da problematização que é a teorização. Nessa fase foi
disponibilizados livros do acervo dos professores, artigos, vídeos, e foi reservado a biblioteca
e o laboratório de informática para os estudantes. Estes se reuniram em grupos de no máximo
6 componentes. A professora ficou a disposição e interagia nos grupos lançando contra
argumentos, recomendando literatura etc.
Durante a fase de levantamento das hipóteses os estudantes começaram a perceber que
as hipóteses que eles haviam levantado inicialmente não se confirmavam na teorização e que
deveriam reorganizá-las. Esse período foi de muito questionamento, pois muitos estavam em
conflito ao perceberam que suas ideias iniciais não se confirmavam na literatura. Nessa fase os
estudantes perceberam quão pouco conheciam sobre os temas em questão e cogitaram na
possibilidade de voltar a intervir na realidade.
Houve uma constatação que os problemas apresentados pelas crianças quanto às
operações aritméticas, são muito semelhantes as suas próprias dificuldades enquanto estudantes
do ensino fundamental: dificuldades com o cálculo mental, a compreensão da tabuada, a
multiplicação e divisão. Eles fizeram inferências que a não aprendizagem das crianças
investigadas e a sua própria aprendizagem foi em decorrência de métodos mecânicos com
ênfase no treinamento destituídos de ação e compreensão.
Esse é um estudo em andamento e ainda não foi concluído o segundo módulo. Contudo,
ao final do primeiro módulo todos os grupos apresentaram nos relatórios de pesquisa a
importância da inserção de metodologias ativas como brincadeiras, jogos, desafios e situações
problemas no ensino da aritmética a fim de promover uma aprendizagem mais significativa. O
papel da interação social na construção do conhecimento lógico matemático também foi
considerado pelos estudantes e para justificar essa argumentação eles buscaram o aval da
literatura.
Sair do modelo de ensino baseado na transmissão do conhecimento é um desafio para
os professores, e representa um caminho na busca da inovação educacional. Para Cunha (2008,
p. 18), "As inovações [...] se materializam pelo reconhecimento de formas alternativas de
saberes e experiências, nas quais imbricam objetividade e subjetividade, senso comum e
ciência, teoria e prática, [...] anulando dicotomias e procurando gerar novos conhecimentos
mediante novas práticas.
Após a apresentação dos seminários foi feita uma auto avaliação com os estudantes e
foi solicitado que estes descrevessem sua ação em cada um dos passos da metodologia da
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problematização ao longo do semestre. Em todos os relatos dos estudantes verifica-se uma visão
positiva da metodologia.

Conteúdos e processos do ensino de História

A disciplina de História provoca certo “desconforto” em discentes do curso de


pedagogia. A maioria das estudantes afirma que se trata de uma disciplina “repetitiva” e
“desinteressante” em seu conteúdo e nas metodologias utilizadas. Esta disciplina, no curso de
Pedagogia, tem por objetivo principal, preparar os futuros docentes para trabalharem com a
construção do conhecimento histórico nos anos iniciais do ensino fundamental.
A abordagem restringe-se aos aspectos mais concretos na construção da noção de tempo
no ensino fundamental, sem aprofundar nos elementos teóricos e metodológicos da dimensão
da temporalidade, em função da limitação da carga horária da disciplina. O ensino de História,
tanto nos anos iniciais, como em toda a educação básica, pela sua característica de abstração
progressiva do tempo histórico, favorece as práticas docentes baseadas em desafios e situações
problemas que privilegiem a experiência vivida das crianças. Contudo, os processos de ensino
são, na maioria das vezes, tratados como uma narrativa de fatos e dados de modo que “as aulas
fundamentam-se, predominantemente, na comunicação do professor ao aluno, mediada quase
sempre pelo livro e, algumas vezes, por outros recursos didáticos” (NOGUEIRA 2013 p. 01).
Nessas condições, observamos que nas aulas de História, os usos e abusos de métodos
exclusivamente expositivos visando “simplesmente ‘passar a matéria’ como se apresentasse um
monólogo diante de uma plateia silenciosa e apática” (FERMIANO, 2014 p.11)
Entre os principais desafios do professor de História no ensino fundamental, destacamos
a necessidade de se conceber os estudantes como sujeitos históricos, partindo sempre de sua
realidade concreta para trabalhar os conteúdos. Assim, a disciplina Conteúdos e processos do
ensino de História foi organizada com a proposta de estruturar situações em que as estudantes
do curso de Pedagogia pudessem investigar os níveis de percepção das crianças quanto a
construção do raciocínio histórico e suas noções de tempo individual e tempo social,
problematizando a partir da observação de sua realidade no ambiente escolar, conforme
proposto por Berbel (1995, 2012).
A disciplina foi dividida em dois módulos e foram propostas duas atividades
investigativas no primeiro módulo e duas no segundo. Em cada um dos módulos o estudante
deveria ir a campo coletar dados sobre a realidade da aprendizagem de crianças de 5, 8 e 10
anos. Na primeira atividade deveria ser verificada a noção de tempo histórico das crianças em
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sua dimensão individual. As duas primeiras atividades permitem verificar como as crianças
constroem a noção de tempo identificando as relações necessárias para sua estruturação. As
atividades subsequentes do segundo módulo se propõe a investigar a passagem da concepção
de tempo individual para tempo social de crianças de 9 e 10 anos, objetivando compreender
como elas assimilam e incorporam a dimensão do tempo coletivo de sua rotina diária. Nestes
termos, a investigação trabalha a capacidade dessas crianças de realizar raciocínios comparados
de suas relações sociais cotidianas de maneira correlativa e valorativa, posicionando-se a partir
das ações dos “outros” que participam de sua rotina diária.
Após a aplicação da primeira atividade com crianças, as estudantes verificaram que
crianças de 8 e 10 anos ainda não haviam construído a noção de temporalidade, não percebiam
a sequência cronológica de suas rotinas, além da perspectiva individual e tinham dificuldades
para diferenciar o “novo” do “velho”. A partir dessa constatação surgiram os seguintes
problemas: “como as crianças constroem a noção de tempo?” “Como compreendem a
“passagem” do tempo?” “Como constroem os conceitos temporais em sua dimensão individual
e social?” A partir da construção desses problemas as estudantes perceberam que a metodologia
da prática docente tradicional poderia ou não garantir a construção da concepção de tempo.
Na apresentação da coleta de dados as estudantes inferiram que o conceito de tempo,
não poderia ser ensinado diretamente, pois se tratar de uma categoria de conhecimento que é
construído a partir da vivência da criança. Da mesma forma, ela desenvolve a capacidade de
perceber que sua rotina se insere em uma configuração coletiva e socialmente pela participação
de outras pessoas em seu cotidiano. Verificaram também que crianças de 05 anos podem ser
capazes de perceber a estrutura sequencial de sua rotina cotidiana, embora ainda em uma
perspectiva egocêntrica.
Após a elaboração dos pontos chaves, as estudantes se concentraram no processo de
teorização, terceira fase da metodologia da problematização. Nessa etapa, organizadas em
grupos de 6 componentes buscaram suporte teórico em livros, artigos, vídeos. O professor ficou
à disposição dos grupos durante todo o processo de aplicação da metodologia da
problematização, acompanhando o desenvolvimento da pesquisa, a análise dos dados coletados
e a produção do relatório final.
Após o levantamento das hipóteses as estudantes perceberam que as mesmas não se
confirmavam na teorização e que seria preciso reorganizá-las. Depois muito questionamento
perceberam que suas ideias iniciais não se confirmavam na bibliografia disponível, sendo
necessário retornar ao ambiente escolar e observar novamente na realidade das crianças.
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Observou-se que os problemas apresentados pelas crianças quanto a concepção de


tempo eram semelhantes em todas as faixas etárias, como: dificuldades com o sequenciamento
de sua rotina cotidiana, especialmente as atividades coletivas, pois as crianças apresentavam
uma “visão” individual e egocêntrica de suas rotinas. No mesmo sentido, percebeu-se que as
crianças entendiam o “novo” como sendo algo positivo, embora tutelado e limitado pela
supervisão do “velho” que era compreendido como feio, descartável e sem valor. Nesses
termos, observa-se a contradição dialética na percepção das crianças que mesmo sendo
tuteladas e supervisionadas pelos “velhos” apresentam uma visão negativa sobre o mesmo,
entendido aqui em sua dimensão humana, histórica, moral e ética. Assim, seria necessário
aprofundar as investigações objetivando compreender como foi construído esse tipo de
valoração sobre o “velho” e como essa percepção se consolidou no imaginário das crianças.
Nesses termos, as estudantes inferiram que a “culpa” pela não aprendizagem das crianças
investigadas decorre da ênfase na utilização de métodos tradicionais que apontam para uma
espécie de “treinamento” sem considerar a ação como sujeitos das crianças.
A título de considerações provisórias, destacamos que a maioria dos grupos destacaram
em seus relatórios a importância das metodologias ativas como: brincadeiras, desafios e
situações problemas para o ensino da História de modo a promover uma aprendizagem mais
significativa.
Após a apresentação dos seminários foi feita uma auto avaliação com as estudantes e
foi solicitado que descrevessem sua ação em cada um dos passos da metodologia da
problematização ao longo do primeiro módulo. De uma maneira em geral, as estudantes do
curso de Pedagogia apresentaram uma visão positiva da metodologia da problematização.

Conteúdos e processos do ensino de ciências

A apreensão demonstrada pelas estudantes com relação à matemática aparece também


quando se trata dos conteúdos de ciências, principalmente os relacionados com à física e à
química. Um dos motivos para isto pode residir nos primeiros anos de estudo, nos quais os
conteúdos não foram trabalhados de forma adequada, o que acarretaria no agravamento da
formação ao longo do tempo. No primeiro dia de aula, as estudantes já deixaram transparecer a
preocupação com relação aos assuntos que seriam expostos na disciplina sobre conteúdos e
processos no ensino de ciências. Esta disciplina visa preparar os estudantes de pedagogia para
trabalhar temas que envolvam química, física e biologia.
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A disciplina foi dividida em dois módulos. No primeiro módulo, foi trabalhado um tema
estruturante na área de química, o ciclo da água. No segundo, foi elencado o tema tempo e
espaço como tema estruturante. Em cada módulo as estudantes de pedagogia se dividiram em
grupos. Cada grupo visitou um ano escolar, do primeiro ao quinto ano, para verificar a
compreensão das crianças sobre estados físicos, transições de fase, as etapas biogeoquímicas
que envolvem o ciclo da água, etc., através de um roteiro no qual as estudantes realizaram um
experimento envolvendo os estados físicos da água. Durante as mudanças de fases as crianças
eram questionadas sobre o que havia ocorrido, se elas já haviam visto água naquele estado na
natureza. A sondagem se deu de forma a perceber o que elas sabiam e os fatos que elas não
conseguiam explicar. A partir destas observações, vários pontos foram levantados, tais como:
as crianças não realizavam experiências (práticas); havia somente o uso do livro didático para
a explicação do fenômeno; e ausência de correlação teoria-prática-natureza.
A maior surpresa citada pelas estudantes de pedagogia foi o não entendimento da
passagem da água do estado líquido para o gasoso por parte de todas as crianças entrevistadas,
seguido do desconhecimento do calor. Portanto, estes dois pontos-chave foram escolhidos pela
turma para serem trabalhados. Na terceira etapa, as estudantes fundamentaram suas observações
por meio de livros do acervo dos professores, artigos, vídeos, etc. Foi reservado o laboratório
de informática para os estudantes. O professor ficou a disposição dos estudantes nesse
momento, forneceu esclarecimentos, interagiu com os grupos lançando contra argumentos,
recomendando literatura, etc.
As estudantes de pedagogia, no passo seguinte, retornaram às escolas com o intuito de
testar a hipótese de solução para os problemas que elegeram, fazendo o mesmo experimento de
forma diferente. Neste momento, elas realizaram uma simulação do ciclo da água por meio do
aquecimento do gelo contido em um recipiente transparente, tampado com plástico-filme. As
crianças puderam perceber, através desse experimento, que a água não “desaparecia”, e sim,
evaporava de forma lenta, associando o processo à formação das nuvens. Por fim, as estudantes
apresentaram um relatório sobre o trabalho desenvolvido e, de forma geral, consideraram a
metodologia importante para a proposição de alternativas para o ensino-aprendizagem nos anos
iniciais, haja vista que na primeira etapa do ensino fundamental as prioridades são o letramento
e a matemática. Ainda assim, o pouco tempo dedicado ao ensino de ciências é usado de forma
que as crianças não têm contato de fato com os fenômenos da natureza. A prática pedagógica
para trabalhar esses conteúdos acontece de forma mecânica, com uma abordagem que enfatiza
a memorização, sem despertar a curiosidade nas crianças, motivando seu aprendizado, muitas
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vezes impedindo que elas compreendam tais fenômenos. O segundo módulo ainda está em
andamento, como as estudantes realizando as observações da realidade das crianças do 1º ao 5º
ano escolar.

Considerações finais

Romper com a supremacia da teoria precedendo a prática já é uma mudança impactante,


significa desvincular-se da ideia de que o conhecimento mais importante pode não está
necessariamente nos livros ou no discurso do professor, mas que deve ser buscado e construído
pelo próprio aluno num contexto de problematização e pesquisa. A situação problema proposta
no início da disciplina permitiu a passagem da ação a compreensão. Cada grupo teve contato
com diferentes fontes, contudo, houve similaridade no processo de compreensão e construção
do conhecimento. Cada estudante construiu seu conhecimento a partir de suas próprias
vivencias e interação com o novo conteúdo. A troca de pontos de vista com os colegas e a
mediação dos professores foram etapas consideradas fundamentais para os estudantes o que
favoreceu o crescimento pessoal e aumento da autoestima. O processo vivenciado na
metodologia da problematização tem proporcionado uma experiência produtiva tanto em
termos de aprendizagem como de crescimento pessoal dos estudantes. O que se verificou no
decorrer do semestre ainda me andamento foi uma ruptura do modelo tradicional e a emergência
de mudanças nas práticas tradicionais de ensinar e aprender. Com este relato acreditamos ter
construído alguns passos a mais como uma contribuição a ser acrescentada aos conhecimentos já
existentes a respeito da metodologia da problematização e permite verificar que essa metodologia
se aplica a diferentes áreas do conhecimento com aprendizagem significativa, interessante e
reflexiva.

REFERENCIAS

BERBEL, N.A.N. Metodologia da Problematização: uma alternativa metodológica apropriada


para o Ensino Superior. Semina: Ciências Sociais e Humanas. 1995; Ed. Especial 16: 9-19.
1995.

______. Metodologia da problematização no ensino superior e sua contribuição para o plano


da praxis. Semina: Ciências Sociais e Humanas Londrina, v. 17, número especial, p. 7-17,
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diferentes caminhos? Interface, Botucatu, v. 2, n. 2, p. 139-154, fev./1998.
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BERBEL, N.A.N. A Metodologia da Problematização em três versões no contexto da didática


e da formação de professores. Rev Diálogo Educ.. 2012; 12: 103-20. 2012.

BORDENAVE, J.D.; PEREIRA, A. M. Estratégias de ensino aprendizagem. 30a ed.


Petrópolis: Vozes, 2010.

CUNHA, Maria Isabel. Pedagogia Universitária: energias emancipatórias em tempos


neoliberais. Junqueira e Marins Editores. 2008.

FERMIANO, M. B. SANTAROSA, Adriane. Ensino de História para o fundamental I. São


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NOGUEIRA, Clélia. A Formação de Professores que Ensinam Matemática e os Conteúdos


Escolares. Revista Scheme. Volume 5 – Edição Especial – Set/2013 284. 2013.

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