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Todavia, esta defesa pretende mostrar, data venia, ousa divergir do entendimento
esposado pelo IRMP.
E os senhores verão que estes autos não dão qualquer base ou fundamento para o IRMP
afirmar que houve inequívoco o intuito de ceifar a vida, da vítima dos autos. Aliás, a bem
da verdade, o que houve foi uma fatalidade, que não participou o réu, e que o que se
seguiu na instrução processual, tanto na fase inquisitorial, quanto na fase judicial, foi
um emaranhado que não se consegue chegar a lugar algum, um imbróglio que não dá
respaldo a se condenar quem quer que seja.
ESTE ABACAXI.
102/3 - NA COLA
Em primeiro lugar, deve-se aqui buscar a verdade dos fatos. Com todo o respeito,
todavia, a denúncia ministerial, mente, mas mente feio, e sem dó. E isso, senhores,
jamais se deve fazer, principalmente em um processo, onde quem está sendo julgado,
não é um animal escorraçado, mas, um ser humano, que tem seus direitos garantidos e
assegurados pela Constituição Federal e demais legislação esparsa.
Neste particular, convém mencionar que, o novel jurisconsulto Heider Fiuza de Oliveira
Filho, em seu brilhante artigo Princípio da Verdade Real no Processo Penal, afirma que,
o primeiro ponto a ser mencionado quando se fala na finalidade da prova criminal é a
questão da verdade1.
1
FILHO, Heider Fiuza de Oliveira. Princípio da Verdade Real no Processo Penal. Disponível em:
http://www.viajus.com.br/viajus.php?pagina=artigos&id=1125&idAreaSel=4&seeArt=yes. Acesso em:
09/03/2016.
Mencionado jurista ainda firma que, a doutrina clássica sustenta que o processo penal
busca, por intermédio da prova, a "verdade real2".
Para o novel mestre, na seara jurídico-penal, o julgador terá chegado à sua verdade,
quando, à vista do exame das provas, detiver robusta convicção (juízo de certeza) de
que seu julgado corresponde efetivamente à realidade do fato criminoso3.
Como os senhores chegarão a plena convicção para emitirem vossa r. decisão, se TEMOS
INÚMERAS CONTRADIÇÕES NOS DEPOIMENTOS, INCLUSIVE DE TESTEMUNHAS
SIGILOSAS, QUE PRESENCIARAM OS FATOS DOS AUTOS.
Podemos com isso, sem sombra de dúvidas afirmar categoricamente que, não há base
ou fundamento algum para se colocar o réu ou os trigêmeos univitelinos, na cena do
crime dos autos.
MEDO CONTEMPORÂNEO
Aos senhores nobres jurados que formam o Conselho de Sentença, lhes cabe julgar os
crimes dolosos contra a vida, ou seja, aqueles crimes, em que é patente a intenção do
agente de matar. Sejam estes crimes tentados ou consumados.
2
Idem
3
Idem
Importante ressaltar que as mesmas responsabilidades que recaem sobre qualquer
magistrado de qualquer instância ou grau de jurisdição, ao proferir sua decisão, também
lhes recai de igual forma.
Sabe-se que, o juiz ao julgar acima de tudo deve ser imparcial. A imparcialidade do juiz
é pressuposto de validade do processo, devendo o juiz colocar-se entre as partes e acima
delas (RÉU X SOCIEDADE), sendo esta a primeira condição para que possa o magistrado
exercer sua função jurisdicional.
A imparcialidade do juiz é uma garantia de justiça para as partes e, embora não esteja
expresso na Constituição Federal, é uma garantia constitucional.
O juiz ao julgar, deve se esvaziar de seus mais profundos sentimentos, medos fobias, e
ater-se aos fatos que lhe trazidos pelo processo.
Referida psicóloga citando o pai da Psicanálise Sigmund Freud, afirma que o medo
contemporâneo, enquanto mal-estar, atinge como um todo, populações urbanas
principalmente, sem levar em conta a classe e a posição social, expressando-se através
de fenômenos como stress, depressão, episódios psicossomáticos, etc.6
4
Luciana Oliveira dos Santos. O Medo Contemporâneo. Acesso em: 13/07/2015. Disponível em:
http://www.scielo.br/pdf/pcp/v23n2/v23n2a08.pdf.
5
Ibidem
6
Ibidem
7
Freud, S., La Neurastenia y la Neurosis de Angustia (Sobre la Justificación de Separar de la Neurastenia Cierto
Complejo de Síntomas a Título de "Neurosis de Angustia") in: SCARPATO, Artur Thiago. Síndrome do Pânico: uma
Abordagem Psicofísica. Revista Hermes, São Paulo, número 3, 1998.
8
Mauro Guilherme Pinheiro Koury. Medos urbanos e mídia: o imaginário sobre juventude e violência no Brasil
atual. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S0102-69922011000300003&script=sci_arttext.
Acesso em: 13/07/2015.
O novel jurista RANGEL, discursando acerca do medo contemporâneo, patrocinado pela
mídia, afirma que:
No Brasil, determinadas capitais como Rio de Janeiro e São Paulo,
protagonizam cenas de violência, para o mundo todo por meio da
mídia, o que por si só, causa certo impacto no turismo e,
consequentemente, na economia, pois se difunde o medo de que
esses lugares são instáveis e perigosos para qualquer empreitada
de mercado, moradia, investimento econômico9...
Abro um parêntesis aqui, somente para discorrer acerca de nosso querido Estado, tido
como e 2º mais violento do Brasil, conforme menciona o sítio na internet
www.g1.globo.com, utilizando como parâmetro o Mapa da Violência de 201410.
Discurso, aliás, que agrada o IRMP, em sua tese de acusação. Todavia, senhores, não
podemos jamais, utilizar destes discursos, como “esfarrapada” desculpa, para sair
condenando quem quer que seja, sem utilizar critérios mínimos de ponderação. Sem ao
menos se atentar para o conjunto de provas que instruem os autos.
Afirmar sem provar, é falácia. Pois, alegar e não provar é o mesmo que nada alegar.
Quem afirma isso é a jurisprudência senhores.
9
RANGEL, Paulo. Tribunal do Júri: visão linguística, histórica, social e jurídica. 4ª ed. ver. e atual. até 2 de julho de
2012. São Paulo: Atlas, 2012.
10
ES tem queda de homicídios, mas é o 2º mais violento, diz pesquisa. Disponível em:
http://g1.globo.com/espirito-santo/noticia/2014/05/es-tem-queda-de-homicidios-mas-e-o-2-mais-violento-diz-
pesquisa.html. Acesso em: 14/07/2015.
11
Os estados em que a mulher corre mais perigo - ES é o pior. Acesso em: 14/07/2015. Disponível em:
http://exame.abril.com.br/brasil/noticias/espirito-santo-e-o-estado-brasileiro-que-mais-mata-mulheres.
Como exemplo, cito aqui um julgado de nosso Tribunal de Justiça capixaba, tendo como
relator, o eminente desembargador Carlos Henrique Rios do Amaral, ao relatar seu voto
em uma brilhante decisão. Senão vejamos, verbis:
APELAÇAO CÍVEL Nº 024.039.005.749. RELATOR: DES. CARLOS
HENRIQUE RIOS DO AMARAL. ACÓRDAO APELAÇAO CÍVEL
SUPOSTA PRESSAO PARA FAZER ACORDO. AUSÊNCIA DE PROVA.
[...] Não há prova nos autos que garantam a afirmação da
recorrente. Existe um nexo íntimo entre o ônus de provar e o ônus
de alegar, de modo que ...alegar e não provar, é o mesmo que
nada alegar. Negado provimento ao recurso12.
Este ônus da prova, incumbe ao autor da Ação Penal, in casu, o IRMP, que deve
fundamentar e bem embasar suas provas, para que não haja o mínimo resquício de
dúvidas no julgador. Pois aqui, no Processo Penal, vige a máxima: “na dúvida, deve o
julgador decidir a favor do réu, pelo princípio in dubio pro reo”.
Juarez Pereira e Dora Pereira, em importante lição acerca deste tema, afirmam que:
Sendo o acusado presumivelmente inocente e cabendo o ônus
probatório ao acusador, é necessário, para a imposição de uma
sentença condenatória, que se prove, além de qualquer dúvida
razoável, a culpa do acusado. Subsistindo dúvida, tem-se que a
acusação não se desincumbiu do ônus que lhe cabe, restando
inafastável a absolvição do réu, já que, sem demonstração cabal
de sua culpa, prevalece a inocência presumida. Nesta acepção,
12
TJ-ES - AC: 24039005749 ES 24039005749. Relator: CARLOS HENRIQUE RIOS DO AMARAL. Data de Julgamento:
26/06/2007. PRIMEIRA CÂMARA CÍVEL. Data de Publicação: 27/08/2007
13
FILHO, Fernando Homem de Mello Lacerda. PROVA - BREVÍSSIMO COMENTÁRIO. Acesso em: 14/07/2015.
Disponível em: http://www.advogado.adv.br/artigos/2000/homemdemello/prova.htm.
pode-se dizer que a presunção de inocência confunde-se com o in
dubio pro reo14. (sem grifos no original)
Importante mencionar que, quando apontamos 1 (um) dedo para acusar alguém: “1
(um) dedo, aponto para o próximo, 3 (três) dedos aponto para mim mesmo, e 1 (um)
dedo, aponto para cima, para os céus, que na dicção do Salmista Davi, em Salmos,
capítulo 33, versículos 13 e 14 “é a morada, habitação de Deus”.
14
PEREIRA, Juarez Maynart; PEREIRA, Dora Maynart. Decisão de pronúncia e presunção de inocência: in dubio pro
reo ou in dubio pro societate?. Revista Jus Navigandi, Teresina, ano 19, n. 3852, 17 jan. 2014. Disponível
em: <http://jus.com.br/artigos/26439>. Acesso em: 13 jul. 2015.
15
Ou seja, falta de cuidado, zelo, ou simplesmente negligência, na fase administrativa do
processo, em suma, na condução do inquérito policial, que sem sombra de dúvidas desaguará
em uma denúncia ministerial falha, desde seu nascedouro, que indubitavelmente
contaminará, poluirá, todo o iter processual, produzindo uma decisão judicial manchada pela
pecha da ilegalidade.
16
TJ-SC-ACR: 399071 SC 1988.039907-1. Relator: Ernani Ribeiro. Data de Julgamento: 29/04/1991. Primeira Câmara
Criminal. Data de Publicação: DJJ: 8262. Data: 31/05/91. Pág. 14.
objeto de julgamento e que, por tal razão, sabem que aquilo foi
dito pela acusação (ou pela defesa) é verdadeiro, mesmo que a
prova dos autos não sejam tão convincentes assim.
Resumindo: “Ao julgar, devem os jurados, esvaziar-se dos seus medos contemporâneos,
fruto das pregações midiáticas. De suas paixões, emoções, experiências próprias, ou de
terceiros, e com o equilíbrio emocional apropriado que o momento exige, coadunado à
temperança, julgar pela razão. Jamais pela emoção”.
Para que não tenhamos decisões equivocadas, manchadas pelas emoções humanas
exteriorizadas, que indubitavelmente colocará atrás das grades um inocente. Trazendo
grave ofensa ao princípio da dignidade humana, bem como aos demais princípios do
17
RANGEL, Paulo. Tribunal do Júri: visão linguística, histórica, social e jurídica. 4ª ed. ver. e atual. até 2 de julho
de 2012. São Paulo: Atlas, 2012.
18
Ou seja, típico da multidão admirada com o discurso midiático.
19
COUTINHO, Jacinto Nelson de Miranda. Segurança Pública e o direito das vítimas. In: RÚBIO, David Sanchez;
FLORES, Joaquim Herrera; CARVALHO, Saio de (org). Direitos humanos e globalização: Fundamentos e
Possibilidades desde a teoria critica. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2004.
direito que a todos abarca, incluso àquele que está neste momento assentado na
cadeira dos réus.
PEDIDOS
Por todo o exposto, requer o reconhecimento da legítima defesa, causa excludente da
ilicitude (art. 23, II, do Código Penal), com a consequente ABSOLVIÇÃO do acusado.