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Instituto Federal de Goiás

Wesley Vieira de Souza

Representatividade a partir da operação historiográfica

Goiânia
2019
Representatividade a partir da operação historiográfica

“A História tem história”

De relance o subtítulo dessa seção aparenta ser redundante, mas o sentido é


compreendido a partir do momento em que entende-se que a historiografia passou
por uma construção. Apesar que não é objetivo central desse ensaio a discussão
entorno das modificações do sentido da História, esse primeiro momento é apenas
um introdutório para chegar a discussão central.

O que significa história? A resposta mais sensata para essa pergunta talvez
seja que ela possua um sentido polissêmico. A História como campo disciplinar
específico, assumiu diversos sentidos ao longo do tempo. No século XIX o sentido da
História estava apoiado em uma cientificidade inspirado nos métodos das ciências
naturais. Já no século XX, mais especificamente após a Escola dos Annales, novas
questões foram colocadas, uma expansão nas fontes históricas possibilitaria um
tratamento mais aprofundado, consequentemente acarretaria em historiografias mais
ricas e abriria novos problemas para uma pesquisa. As novas mudanças mostrava
cada mais que as ciências humanas, não deveria (e não deve) estar pautada nos
mesmos métodos colocados pelas ciências naturais, principalmente porque são
objetos de estudos distintos.

O campo disciplinar específico da História passa ter uma série de novas


questões para serem estudadas. Esse campo possui sua legitimidade por possuir uma
metodologia própria que vai desde a pesquisa até a escrita. Atentando-se a isso De
Certeau em sua obra A Escrita da História aborda em um dos seus capítulos a “A
operação historiográfica”, de acordo com o autor, apesar das limitações, encarar a
história como uma operação é compreende-la como uma relação entre lugar,
procedimentos de análise e a construção do texto. Sendo o primeiro ponto o objeto de
análise desse ensaio.
A influência do lugar social na pesquisa

“Toda pesquisa historiográfica se articula com um lugar de produção sócio-


econômico, político e cultural” (Certeau, 2006, p. 66). O lugar de produção descrito
pelo autor direciona o historiador em sua pesquisa, nesse sentido o problema que
será levantado serão aqueles na qual o indivíduo está submetido. O que levaria então
um historiador a pesquisar determinado tema? As condições sociais em que um
historiador está inserido certamente será um eixo norteador para sua pesquisa, mas
a história possui um sentido amplo, sendo um deles a quebra de uma tradição, com
isso a motivação de um historiador pode ser mais profunda, por exemplo uma
pesquisa de classes historicamente subalternas.

Como foi abordado, a escolha por determinado tema pode estar intrinsicamente
ligado a vivencia do próprio historiador, visando uma explanação nas condições que
ele pode estar inserido. Por exemplo, uma mulher inserida em uma sociedade
patriarcal, pode se sentir atraída por pesquisa movimentos de igualdade de gênero,
um homossexual o movimento LGBT e um negro as lutas raciais. Mas qual seria a
relevância de estudar tais movimentos para a sociedade? De acordo com Reis “Para
a sociedade moderna, um conhecimento é valido por sua utilidade” (Reis, 1996, p.
88), portanto um conhecer somente por conhecer que não tenha um resultado
palpável não é reconhecido, mas o autor completa

“O conhecimento do passado parece inútil, pois o atual não repete o


acontecido. Por outro lado, o conhecimento do acontecido é uma “referência”
para o atual, que deixa de experimentar sua atualidade em silêncio e
isolamento. A história tem, portanto, uma utilidade pragmática de valor
incalculável: estabelece o diálogo entre os homens passados, em suas
situações e soluções específicas, e os homens do presente, em seus
problemas específicos” (Reis, 1996, p. 89)

A especificidade da história é tamanha, o resgate do acontecido, levando em


consideração a sua singularidade, como uma referência para o atual, coloca uma
função norteadora para o presente. Portanto o lugar que o historiador ocupa é
essencial para o levantamento desses problemas, principalmente com intuito de
romper com visão tradicional da história.
A escrita

Se o lugar social que um historiador ocupa define a orientação da sua pesquisa,


a sua escrita deve-se ser atentada sobre alguns aspectos. O primeiro aspecto seria o
que a Djamila Ribeiro chama de lugar de fala, a autora destaca que não se sabe a
origem do termo especificamente, ela aponta que é provável que tenha surgido com
a discussão sobre feminist stand point (ponto de vista feminista). Ambos os termos
refere-se ao sujeito propriamente dito, quando este faz um discurso por exemplo sobre
o racismo, se ele é apenas uma pessoa por fora dessa realidade ou se é alguém por
dentro, que vive na pele essa discriminação. Mas qual é a importância do lugar de
fala? De acordo com a autora

“Ao reivindicar os diferentes pontos de analises e a afirmação de que um dos


objetivos do feminismo negro é marcar o lugar de fala de quem as propõem,
percebemos que essa marcação se torna necessária para entendermos
realidades que foram consideradas implícitas dentro da normatização
hegemônica.” (Ribeiro, 2017)

De acordo com a autora, dar espaço para quem tem o lugar de fala é importante
visto que teríamos o “testemunho” de quem realmente sofre as pressões sociais na
pele. Prost em sua obra Doze lições sobre a História escreve um capitulo onde ele
apresenta algumas características do texto de História, em uma dessas características
ele diz

“O texto de história apresenta uma segunda característica que merece ser


mencionada: a exclusão da personalidade do historiador. O eu é proscrito; no
máximo, aparece, às vezes, no prefacio quando o autor – mesmo que se trate
de Seignobos – explicita suas intenções. Todavia, tendo iniciado a abordagem
do assunto, o eu desaparece.” (Prost, 2008, p. 238)
Mesmo que o historiador tenha sua intencionalidade na pesquisa, no sentido
de querer comprovar sua tese, este também possua sua carga de subjetividade, ele
precisará manter a sua neutralidade na escrita. Obviamente essa neutralidade
abordada é somente na escrita, pois no geral, a intencionalidade do autor já é
colocada desde da escolha do tema, até na seleção de fontes.

O segundo aspecto destacado, seria a investigação da instituição que o


historiador está submetido. De Certeau vai dizer que a instituição torna possível um
determinado conhecimento e o determina (Certeau, 2006, p. 70), dentro dessa
perspectiva, o lugar institucional será aquele que vai permitir, apoiar determinado
assunto, ou silenciar, onde o autor trata como não-dito. Estando totalmente articulado
com o lugar social, o lugar institucional serve como uma forma de orientar a pesquisa,
onde além das suas intencionalidades na seleção do problema e fonte este também
está submetido a isso.

Pensar o lugar institucional, abre espaço para a discussão daqueles que vão
legitimar o trabalho do historiador. O historiador produz uma escrita, essa será
desenvolvida a partir de uma metodologia que vai desde a pesquisa, até a escrita,
mas quem avalia esse produto final? Essa avaliação ocorre no espaço denominado
como “pares”, ou seja, outros historiadores avaliam o trabalho para legitima-lo dentro
do campo historiográfico.

Foram abordados somente dois pontos na qual é uma preocupação na hora da


escrita e da pesquisa por determinado autor, apesar que obviamente existem outros
pontos de analises. Esse pontos destacados estão ligados ao lugar social. A
compreensão desses pontos é importante para ter uma dimensão de quem é o
indivíduo que está escrevendo, se a escrita possui uma carga além das pesquisas, ou
seja as vivencias no meio social que orienta e estimula todo seu trabalho. E no aspecto
do lugar institucional é se a instituição na qual o historiador está submetido possui
uma postura que permitiria uma abordagem mais aprofundada do assunto ou se a sua
postura seria restritiva, isso explicaria o porquê abordar de determinada maneira e
não de outra.
Conclusão

“O falar não se restringe ao ato de emitir palavras, mas de poder existir.


Pensamos lugar de fala como refutar a historiografia tradicional e a hierarquização de
saberes consequente da hierarquia social” (Ribeiro, 2017). Com o afastamento da
história de uma perspectiva positivista, abriu-se um leque de possibilidade de
pesquisas, consequentemente esse espaço foi ganhando seu valor para legitimidade
de uma luta e a partir daí é necessário uma cautela na investigação para tentar
entender as intencionalidades do autor na pesquisa em questão. Apesar da
abordagem somente no ponto “lugar social”, a leitura da “operação historiográfica” do
De Certeau é essencial para todos da área das ciências humanas, por ele
proporcionar recursos para exploração em uma pesquisa histórica pautado em
diversas especificidades.
Bibliografia
Certeau, D. (2006). A Escrita da História. Rio de Janeiro: Editora Forense Universitária.

Prost, A. (2008). Doze lições sobre a história. (G. J. Freitas, Trad.) Belo Horizonte: Autêntica.

Reis, J. C. (1996). A História entre a filosofia e a ciência. São Paulo: Atica S.A.

Ribeiro, D. (2017). O que é lugar de fala? Belo Horizonte: Letramento.

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