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UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO

FEUSP – FACULDADE DE EDUCAÇÃO


PROJETO DE PESQUISA

Nível: Mestrado
Linha de Pesquisa: Sociologia da Educação
Aluno: Daniel Monteiro da Silva
Orientador: Prof°. Dr. Elie George Guimarães Ghanem Junior

Título:
SISTEMAS DE AVALIAÇÃO NA EDUCAÇÃO NÃO-FORMAL – QUANDO A
ESCOLA SE TORNA UM CONTRA-EXEMPLO

APRESENTAÇÃO

Desde muito cedo me percebo direta ou indiretamente envolvido com questões sócio-
culturais, atuei no movimento cineclubístico na década de 80 na cidade de Osasco SP, na
ocasião da fundação do Cineclube Mazzaroppi, que se ampliou, tornando-se um centro
cultural com direito a uma biblioteca comunitária que promovia debates sobre cinema e
literatura nacionais. Foi minha primeira experiência no campo da educação não-formal, tão
marcante que viria a influenciar decisivamente meu futuro profissional.
Transitando pelos campos da educação e da cultura e freqüentando cursos de toda
natureza, encantei-me pela filosofia, graduei-me e posteriormente me tornei professor,
atuando na rede pública e privada. Apesar da atuação como profissional da educação, nunca
abandonei inteiramente a atividade de “animador cultural” e continuei freqüentando
associações de bairro, sindicatos, cooperativas e ONG´s, que tinham em comum o fato de
serem espaços privilegiados de educação não-formal. E foi precisamente atuando como
educador numa ONG situada no bairro do Campo Limpo, zona sul da cidade de São Paulo,
que pude presenciar uma “aparente” contradição. O público alvo dos projetos sócio-
educativos desenvolvidos por esta entidade era — em sua maioria — também alunos da escola
pública onde eu atuava como professor, de modo que podia observá-los transitando entre os
dois espaços e para a minha surpresa, constatei que se tratava de comportamentos bem
distintos num e noutro lugar.

1
Indagando-os sobre o porquê de tanta diferença no comportamento dentro da escola e
na ONG, recebia como resposta algo como “o que nós aprendemos aqui, não conseguíamos
aprender na escola” ou “a professora aqui explica melhor que na escola”. Esta situação
começou a me intrigar. Observando o discurso dos dirigentes da ONG Ação Comunitária
percebi que tanto a elaboração dos projetos, como a preparação das atividades, e até a
formação dos educadores, eram sempre pensados tendo a escola como um exemplo negativo.
Tudo começava tendo como pano de fundo um sentimento comum que afirmava: nós não
somos escola!. Outra característica que me chamou a atenção foi à sofisticação e o cuidado
com que as avaliações eram elaboradas, uma vez que a instituição precisava prestar contas em
primeiro lugar para os financiadores dos projetos. Esta experiência me levou a refletir sobre a
relação ambígua que algumas ONGs mantinham com a escola pública, o que me motivou a
apresentar o presente projeto de pesquisa.

1. Resumo:

Este projeto apresenta um estudo de caso envolvendo três organizações não


governamentais de diferentes tamanhos, tendo como ponto comum o trabalho com programas
sócio-educativos para crianças e adolescentes na cidade de São Paulo. Levantamos a
necessidade de examinar quais são os critérios e mecanismos de avaliação adotados nos
programas desenvolvidos por estas instituições. É sabido que existe uma crescente pressão
sobre as entidades da sociedade civil , exercidas pelos diversos agentes envolvidos nestes
programas e projetos , para provar a efetividade de suas ações 1. Temos notícia de alguns
trabalhos que analisam os instrumentos de monitoria e avaliação da gestão de projetos sociais
que estão sendo desenvolvidos e implantados, no sentido de dar visibilidade aos impactos
sociais gerados pelas intervenções das organizações do terceiro setor na sociedade. Nosso
trabalho tem como foco o campo da avaliação da aprendizagem, aspecto que dentro das
organizações do terceiro setor temos pouca informação.
Ao analisarmos o discurso predominante dentro de algumas destas organizações,
pertencentes ao terceiro setor, notamos a existência de uma forte conotação negativa quando
relacionado à educação formal, no que diz respeito às suas práticas e seu modus operandi.

1
Principalmente porque em muitos casos se trata de gestão de recursos públicos

2
Nossa pesquisa visa examinar se a mesma lógica negativa se estende aos critérios de
avaliação da aprendizagem — adotados pela educação formal — e quais propostas
alternativas são sugeridas ou implementadas por estas organizações.

Palavras-chave: terceiro setor; avaliação da aprendizagem; programas sociais; metodologias


de avaliação; educação não-formal.

2. Objeto:

Ao analisarmos os objetivos de projetos entendidos como educação social,


implantados e geridos por organizações do terceiro setor, percebemos que a maioria das
propostas que atendem a população caracterizada como “excluídos” pretendem, na maioria
das vezes, apenas “inseri-los” no mercado de trabalho. Entendemos que um projeto bem
estruturado deve conceber a educação como promotora de mecanismos de inclusão social,
donde “inclusão” representa as formas de acesso aos direitos de cidadania, que resgatam
alguns ideais importantes para a humanidade, como o de civilidade, tolerância e respeito ao
outro2.
Como estão sendo avaliados estes indicadores dentro das instituições do chamado
terceiro setor que trabalham tendo como foco a educação? O presente trabalho pretende
investigar a existência destes instrumentos de avaliação, suas metodologias e suas e
características. Para tanto nos propomos a acompanhar o trabalho pedagógico realizado em
diferentes organizações do terceiro setor (pelo menos três instituições de diferentes tamanhos),
que mantenham projetos sociais com ênfase na educação e assim podermos investigar que
mecanismos internos de avaliação são aplicados nos seus programas e projetos, e que tipo de
relação mantém com as metodologias de avaliação tidas como “tradicionais” presentes na
educação formal, apresentando suas diferenças e semelhanças.

2
GOHN, M. G. Educação não-formal e cultura política. 3. ed. São Paulo: Cortez, 2005.

3
3. Justificativa:

É sabido que a partir da década de 90, com a democracia restabelecida, houve uma
enorme ampliação do terceiro setor no Brasil. O crescente “protagonismo dos cidadãos” e de
suas organizações é um fenômeno não apenas brasileiro, mas que em nosso país é herdeiro das
mobilizações e lutas dos movimentos sociais. Num movimento de mão dupla, também o setor
governamental iniciou uma nova forma de relacionamento com a sociedade que se
concretizou em parcerias eficazes com os outros setores da economia em especial com o
terceiro setor. Estas entidades que se situam “entre o público e o privado” estão sendo
percebidas como parceiras cada vez mais efetivas do Estado, contribuindo em diversas áreas
notadamente com programas e projetos de educação não-formal paralelos ou complementares
à escola. Atualmente é grande o número de organizações e entidades que atuam no chamado
terceiro setor, número que segundo a ABONG3 não pára de crescer, por esta razão, nos parece
oportuno conhecermos cada vez mais os seus estatutos e sua eficácia naquilo que se propõem
como promessa4, a saber:

“A renovação do espaço público, o resgate da solidariedade e da cidadania, a


humanização do capitalismo e, se possível, a superação da pobreza”.

A proposta de nosso trabalho é particularmente investigar, se aquelas organizações e


entidades que trabalham na área de educação, efetivamente cumprem sua missão de inclusão
social e notadamente de que instrumentos e expedientes se utilizam para atingir este fim.
Existem trabalhos elaborados e pesquisas em andamento5 no que se refere à gestão
destas organizações, há também um esforço crescente para se obter instrumentos de monitoria
e avaliação de impactos sociais gerados pelas intervenções de ações do terceiro setor na
sociedade: leia-se avaliação de processo e avaliação de impacto. Acreditamos, porém ser de
grande relevância para a sociedade conhecermos para além destes indicadores, os mecanismos
de que lançam mão, as próprias organizações, para medir a sua eficácia, ainda mais se
considerarmos que muitas delas são beneficiadas com recursos públicos. Queremos examinar
particularmente que metodologias de avaliação da aprendizagem estão sendo aplicadas aos

3
Associação Brasileira de Organizações Não-Governamentais, 2000
4
FALCONER, Andres Pablo. A promessa do terceiro setor:Um Estudo sobre a Construção do Papel
das Organizações Sem Fins Lucrativos e do seu Campo de Gestão.São Paulo, FEA USP. 1999.
5
Elaborados no âmbito das faculdades de Administração (FEA-USP,FGV)

4
programas de educação não-formal no terceiro setor, investigando sua gênese, suas bases
epistemológicas, empíricas, históricas e sociais.

4. Objetivos:

Pretendemos com o presente projeto de pesquisa analisar as práticas presentes nas


organizações do terceiro setor, notadamente na apropriação, compreensão e utilização dos
instrumentos e metodologias de avaliação. Partimos do pressuposto de que este termo pode
ser entendido de modo amplo, a saber: como avaliação de processo e avaliação de impacto
conforme aponta CARVALHO, 2003. Dando ênfase ao conceito de avaliação de processo e
delimitando o espaço particular de ensino e aprendizagem, queremos identificar que métodos
estão sendo utilizados no interior dos programas sócio-educativos em curso no terceiro setor
(quando os são) e assim podermos apontar a distância existente entre o discurso e a prática
dentro destas organizações, evidenciando assim as contradições presentes em diversas
abordagens de projetos da área social, notadamente os de educação não-formal.
Nossa hipótese é a de que o discurso depreciativo que muitas vezes, sem exageros,
invalida as práticas da educação formal no que concerne a seus instrumentos e seus
mecanismos — particularmente no que concerne à avaliação — não se traduz necessariamente
em alternativas plausíveis dentro destes programas.

5. Metodologia e fontes:

Após a caracterização e conceituação do objeto desta pesquisa e definido os principais


conceitos que nos guiarão no curso desta investigação, a saber: educação formal e não-
formal, avaliação escolar, espaço de aprendizagem, avaliação de processo e avaliação de
impacto, isso a partir do levantamento da bibliografia disponível (ainda em curso), partiremos
para a coleta de informações referentes às organizações pesquisadas, analisando seus estatutos
sociais, atas, regimentos internos, visão, missão, e os documentos onde constam os programas
ou projetos educacionais que estão em curso no interior destas organizações. Uma vez
selecionados os programas e/ou projetos a serem analisados, partiremos para uma segunda
etapa que consistirá em entrevistas com os educadores, coordenadores e gestores dos

5
programas além do público alvo – beneficiários diretos dos programas educativos – a fim de
confrontar perspectivas diferentes de três momentos chaves: elaboração-execução-resultado.

Assim poderemos analisar claramente estas etapas e focar nossa atenção no momento
final – preocupação e foco principal deste trabalho - que é o momento da avaliação,
observando como ela foi realizada, em que momento, com quais instrumentos e expectativas.
Uma vez de posse destes dados, pretendemos confrontá-los com as metodologias de avaliação
que ocorrem hoje, no interior de nossas escolas.

6. BIBLIOGRAFIA:

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formal a partir da década de 1990 no Brasil. São Paulo. 2005 (dissertação de mestrado)

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6
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