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“É possível que tenhais acreditado, ó cidadãos, que eu tenha sido condenado por
pobreza de raciocínio, com os quais eu poderia vos persuadir, se eu tivesse acreditado
que era preciso dizer a fazer tudo, para evitar a condenação. Mas não é assim. Cai por
falta, não de raciocínios, mas de audácia e imprudência, e não por querer dizer-vos
coisas tais que vos teria sido gratíssimas de ouvir, choramingando, lamentando e
fazendo e dizendo muitas outras coisas indignas, as quais, certo, estais habituados a
ouvir de outros.”
E os censura por considerar que a sua acusação prejudicará a cidade, que ficará
conhecida por sentenciar um sábio à morte.
“A mim, de fato, ó juízes - uma vez que, chamando-vos juízes vos dou o nome
que vos convém - aconteceu qualquer coisa de maravilhoso. Aquela minha voz habitual
do daimon em todos os tempos passados me era sempre freqüente e se oponha ainda
mais nos pequeninos casos, cada vez que fosse para fazer alguma coisa que não
estivesse muito bem.
Ora, aconteceram-me estas coisas, que vós mesmos estais vendo e que, decerto, alguns
julgariam e considerariam o extremo dos males; pois bem, o sinal do deus não se me
opôs, nem esta manhã, ao sair de casa, nem quando vim aqui, ao tribunal, nem durante
todo o discurso. Em todo este processo, não se opôs uma só vez, nem a um ato, nem a
palavra alguma”
Sócrates interpreta essa não intervenção do daimon como a prova de que está
agindo da forma correta. E que o resultado daquele julgamento seria bom para ele, a
morte poderia ser uma benção. Esta significaria ou fim de todas as suas preocupações,
ou a mudança para um lugar aonde encontraria a alma de pessoas justas e ilustres, como
Hesíodo e Homero. Neste lugar ele também encontraria heróis e os verdadeiros juízes, e
poderia continuar questionando as pessoas na busca por alguém mais sábio que ele.
“E disso tenho uma grande prova: que, por muito menos, o habitual signo, o
meu daimon, se me teria oposto, se não fosse para fazer alguma coisa de bom.
Passemos a considerar a questão em si mesma, de como há grande esperança de que
isso seja um bem.(...)
Se, ao contrário, a morte é como uma passagem deste para outro lugar, e, se é verdade
o que se diz que lá se encontram todos os mortos, qual o bem que poderia existir, ó
juízes, maior do que este? Porque, se chegarmos ao Hades, libertando-nos destes que
se vangloriam serem juízes, havemos de encontrar os verdadeiros juízes,(...) e tantos
outros deuses e semideuses que foram justos na vida; seria então essa viagem uma
viagem de se fazer pouco caso? Que preço não sereis capazes de pagar, para
conversar com Orfeu, Museu, Hesíodo e Homero?”
“Mas também vós, ó juízes, deveis ter boa esperança em relação à morte, e
considerar esta única verdade: que não é possível haver algum mal para um homem de
bem, nem durante sua vida, nem depois da morte”
“(...)o que hoje aconteceu, no que a mim concerne, não é devido ao acaso, mas é
a prova de que para mim era melhor morrer agora e ser libertado das coisas deste
mundo. Eis também a razão por que a divina voz não me dissuadiu, e por que, de minha
parte, não estou zangado com aqueles cujos votos me condenaram, nem contra meus
acusadores. Não foi com esse pensamento, entretanto, que eles votaram contra mim, que
me acusaram, pois acreditavam causar-me um mal.”
Por último Sócrates faz um pedido: “Quando os meus filhinhos ficarem adultos,
puni-os, é cidadãos, atormentai-os do mesmo modo que eu os vos atormentei, quando
vos parecer que eles cuidam mais das riquezas ou de outras coisas do que da virtude.
E ,se acreditarem ser qualquer coisa não sendo nada, reprovai-os, como eu a vós: não
vos preocupeis com aquilo que não lhes é devido. E, se fizerdes isso, terei de vós o que é
justo, eu e os meus filhos.”
Na verdade o que Sócrates desejava era que seus filhos fossem educados segundo
a verdade, a qual ele praticou durante a sua vida. Em sua ausência a sociedade os
educaria, dizendo não ao o que eles acreditavam, de forma que os fariam perceber que
algumas coisas que as pessoas geralmente valorizam são na verdade fúteis.
Sócrates se despede com uma das frases mais famosas atribuídas a ele:
“Mas, já é hora de irmos: eu para a morte, e vós para viverdes. Mas, quem vai para
melhor sorte, isso é segredo, exceto para deus.”
Frases atribuídas a Sócrates que expressam a autonomia, universalidade e
radicalidade da filosofia socrática