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Educação em Portugal
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Análises realizadas à produção sociológica portuguesa, designadamente, através dos congressos da Associação
Portuguesa de Sociologia, de 1988 a 1996 (Lobo, 1996) ou até 2000 (Pinto, 2004) mostram, desde o primeiro
congresso, a presença de comunicações subordinadas à análise sociológica da educação.
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escolares. Esta temática marcará, assim, a sua presença na sociologia da educação portuguesa
desde o início.
Destacam-se, no final dos anos 60 e início de 70, os já referidos trabalhos do GIS que
se interrogarão sobre a composição social da população universitária e a selectividade deste
sistema de ensino (por exemplo, Nunes, 1968a; 1968b; 1970). Nos anos 70 e 80 surgem
múltiplos estudos sobre acesso e insucesso em função da classe social (por exemplo, Cruzeiro
e Antunes, 1976; Grácio e Miranda, 1977; Benavente e Correia, 1981; Costa e Machado,
1987). No final dos anos 80, no I congresso da APS constam várias apresentações na área da
sociologia da educação predominantemente centradas nas desigualdades, com temas como
educação e mobilidade social, sucesso escolar, classes sociais e final da escolaridade
obrigatória ou práticas educativas femininas (cf. Afonso, 2005).
Outros temas, particularmente a análise das políticas educativas (cf. Afonso, 2005), irão
ganhar um crescente relevo, eclipsando parcialmente o potencial espaço da análise das DSE,
sobretudo no campo das ciências da educação. Se recorrermos à análise conjunta das
comunicações dos congressos quer da Associação Portuguesa de Sociologia, quer da
Sociedade Portuguesa de Ciências da Educação (SPCE), entre 1985 e 2000, realizada por
Abrantes (2004), podemos observar que as apresentações sobre o tema “insucesso/abandono,
classes e reprodução” surgem muito mais frequentemente nos congressos da APS do que nos
da SPCE. Como refere Abrantes (2004: 122), “A investigação em educação a partir do campo
sociológico parece dominada por dois temas fortes: ‘insucesso/abandono, classes e
reprodução’ e ‘ensino superior, formação profissional e educação de adultos’” (estes dois
temas representam 36% das comunicações apresentadas na APS, sendo o primeiro tema o
mais representado com 19%). No campo das ciências da educação, dominam os temas
“sistema educativo e política(s) educativa(s)” e “cultura organizacional de escola” (os dois
temas ocuparam 44% das comunicações da SPCE, tendo o tema referente ao
insucesso/abandono uma presença de apenas 11%).
Ao longo das duas últimas décadas serão publicadas variadas obras que abordam
diferentes dimensões das DSE, das quais destacamos, sem carácter exaustivo, alguns
trabalhos que envolvem a apresentação de resultados empíricos: Abrantes (2003); Almeida e
Vieira (2006); Balsa et al. (2001); Benavente et al. (1994); Casa-Nova (2002); Diogo (2008);
Fonseca (2001); Grácio (1997); Lopes (1996); Morais (1992); Seabra (1999); Sebastião
(2009); Silva (1999); Silva (2003); Stoer e Araújo (1992); Vieira (2003); Vieira et al. (2003).
Escasseiam, no entanto, trabalhos que tracem um estado da arte das DSE em Portugal
(alguns contributos podem ser encontrados em Benavente et al., 1994; Sebastião, 2009). Para
isto concorre o facto desta linha de investigação apresentar muitas limitações entre nós, como
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é apontado por Sebastião (2009): a falta de indicadores estatísticos de nível nacional sobre as
origens sociais dos alunos, impossibilitando a realização de estudos sobre a evolução das DSE
no nosso país; a preponderância de estudos de caso sobre as DSE no âmbito da sociologia da
educação; o volume reduzido de estudos sobre DSE, comparativamente com o de outros
países. Por esta razão, Sebastião (2009: 17) afirma que o interesse pelas DSE no nosso país “é
ainda raro” e que “No caso português a situação foi bastante diferente já que, por razões de
contexto histórico, a abordagem da problemática foi bastante circunscrita. A necessidade
transforma-se assim num desafio, já que das insuficiências e vazios de conhecimento e
informação se prefigura um vasto campo de investigação a desenvolver.” (p. 19).
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Embora esta secção já existisse e tivesse uma coordenação própria, mas sem reconhecimento no organigrama
da APS. Refira-se também a existência desta secção na SPCE, tendo sido realizadas algumas iniciativas
conjuntas entre estas duas secções.
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trabalhar sobre as DSE, o encontro da SSE/APS veio, igualmente, mostrar que, paralelamente
à emergência de novos objectos, este tema continua a marcar presença na sociologia da
educação portuguesa.
Foram consideradas apenas as comunicações apresentadas nas actas, ou seja, aquelas
em relação às quais dispomos de texto (APS, 2000; APS, 2004; APS, 2008; SSE/APS, 2009),
de autores que trabalham em Portugal3. No caso dos congressos da APS contemplaram-se as
comunicações da área temática relativa à educação, designada “Reorganização dos saberes,
ciência e educação”, em 2000; “Educação e aprendizagens”, em 2004; e “Educação e
aprendizagens sociais”, em 2008. No caso do encontro da Secção de Sociologia da Educação
foram considerados apenas os textos apresentados na oficina “Educação e desigualdades:
processos e resultados escolares”.
Seleccionaram-se os trabalhos que incidem em fenómenos que dizem respeito às DSE,
independentemente dos autores fazerem esta identificação. Contudo, seleccionar os textos que
versam sobre DSE do corpus constituído pelas comunicações de sociologia da educação não
se apresenta como uma tarefa fácil. Dada a centralidade e abrangência deste campo de
investigação na sociologia da educação, nem sempre são claras as fronteiras entre o que se
situa no âmbito das DSE e o que fica de fora.
De forma a estabelecer critérios de selecção, considerámos, por um lado, o percurso
desde campo de investigação, do qual procurámos dar conta sumariamente numa primeira
parte deste texto, e, por outro, o próprio conceito de DSE, enquanto forma de desigualdades
sociais. A desigualdade social pode ser definida como a distribuição desigual de recursos
entre os membros de uma sociedade que é produto das suas estruturas sociais (não tendo na
sua génese factores naturais ou puramente individuais), gerando sentimentos de injustiça
(Bihr e Pfefferkorn, 1995, cit. por Duru-Bellat, 2003: 1). Deste modo, as desigualdades
sociais face à educação têm sido definidas como desigualdades de carreira (acesso a um
determinado nível de ensino ou orientação na carreira escolar), bem como de sucesso
(resultados, aquisição de conhecimentos, etc.) em função da origem social (classe social,
género, pertença étnica, etc.) dos indivíduos. Se o núcleo clássico das DSE se situava na
relação entre origem social (enquanto classe social ou nível de escolaridade dos pais)4 e
acesso ou sucesso escolar, como se viu, novas variáveis e problemáticas vão
progressivamente sendo incorporadas. Na figura 1 procuramos esquematizar várias dimensões
de análise das DSE, a partir do núcleo duro constituído pela relação entre origem social e
3
Excluem-se as comunicações de investigadores estrangeiros, fenómeno que é notório a partir de 2004,
registando um número considerável de casos em 2008, entre os quais surgem trabalhos no âmbito das DSE.
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Na literatura americana a análise das DSE inclui também a análise da pertença étnica, contrariamente aos países
europeus.
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trajectória escolar (A), apresentando depois um conjunto de dimensões-satélite que, embora
saindo desse núcleo, têm vindo a ser articuladas com as DSE e que estão presentes nas
comunicações que analisámos:
(i) à cabeça, as políticas educativas que, como vimos, têm sido apontadas como um
dos temas com maior pujança na sociologia da educação portuguesa (Afonso, 2005), pelo seu
impacto nas DSE (B), de forma estrita (B1) ou de forma mais abrangente, considerando a
relação entre famílias e escolas (B2);
(ii) a montante das trajectórias escolares, para além da origem social em sentido mais
estrito, têm vindo a impor-se novos fenómenos, como as desigualdades de género na
escolarização e o modo como essas interferem na relação entre origem social e trajectória
escolar; bem como as desigualdades relativas à pertença étnico-nacional (C);
(iii) a jusante das trajectórias escolares, a relação entre diplomas/formação e a inserção
socioprofissional, assim como o tema da aprendizagem ao longo da vida que surge como uma
segunda oportunidade para os que abandonaram a escola (D);
(iv) como aprofundamento de nível meso e micro têm vindo a considerar-se as
dinâmicas familiares (E); a organização escolar (F); a relação escola-família (G); as
experiências juvenis (H).
Políticas educativas
B1 B2
Esc
ola
E F
G
Dinâmicas Organização
familiares escolar
H
Experiências juvenis
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Todas as comunicações dizem respeito à apresentação global ou de momentos
diferentes de investigações (reflexões/revisão de literatura ou apresentação de resultados). A
esmagadora maioria dos trabalhos apresenta resultados de pesquisas em curso ou concluídas.
No que respeita à metodologia (ver Quadro 1), a utilização de um único método ocupa a
maioria dos casos, destacando-se o recurso exclusivo ao inquérito por questionário que
representa quase ¼ dos trabalhos apresentados. A análise documental ou a etnografia
apresentam-se como minoritárias. A utilização de métodos mistos refere-se aos trabalhos que
recorrem a uma combinação de dois ou mais métodos, sendo o recurso aos pares inquérito por
questionário/entrevista ou análise documental/estatística os mais frequentes.
Quanto às dimensões de análise das DSE (ver Quadro 4), as comunicações que se
localizam no núcleo clássico das DSE (A), centrando-se na análise da relação entre origem
social e trajectórias escolares, são predominantes, se comparadas individualmente com cada
uma das outras dimensões. Entre essas dominam estudos sobre as escolhas escolares ao nível
do ensino superior e sobressai, pela ausência, o (in)sucesso, um tema que tem ocupado um
lugar relevante na sociologia da educação portuguesa.
Porém, quase 3/4 dos textos situam-se fora do núcleo central das DSE, incorporando
dimensões e perspectivas que têm vindo a contribuir para ampliar e aprofundar a análise das
DSE. Evidenciam-se, em primeiro lugar, com 17%, os estudos situados a jusante de A (D)
que analisam a relação entre qualificações e emprego, condição social futura, bem como os
sistemas de formação que têm por objectivo proporcionar segundas oportunidades a quem
abandonou o ensino regular, predominando o primeiro tipo. Em segundo lugar (14%),
destacam-se os textos cujo objecto não se cinge a uma acepção restrita de origem social,
considerando o género e/ou a pertença étnico-nacional. Com menor peso (10%) surgem as
comunicações que contemplam as dimensões B (impacto das políticas educativas em A) 5, E
(contributo das dinâmicas familiares para A), H (análise das DSE através de uma abordagem
5
Todas estas participações se incluem na dimensão B1, com excepção de um caso que se reporta à dimensão B2.
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às experiências estudantis/juvenis). Por fim, os trabalhos que perspectivam as DSE através do
contexto escolar (F) e da relação escola-família (G) são numericamente pouco expressivos.
Do exercício atrás empreendido importa reter várias conclusões. Em primeiro lugar, a
modéstia e circunscrição do mesmo, tanto mais que se analisa apenas uma pequena fracção da
produção portuguesa sobre DSE.
Em segundo lugar, a sociologia das DSE está, hoje, longe de se encerrar naquilo que
constituiu a sua abordagem clássica. A par da detecção de regularidades sociais, uma
importante parcela de trabalhos concentra-se nos processos de produção das DSE,
ramificando-se numa miríade de dimensões.
Em terceiro lugar, esta ramificação de dimensões traduz-se, na maior parte dos casos,
em especialização. São raras as comunicações que relacionam simultaneamente múltiplas
dimensões, articulando, por exemplo, organização escolar e dinâmicas familiares, ou ainda,
políticas educativas, organização escolar e dinâmicas familiares. Não surgem trabalhos a
articular um conjunto de outras dimensões, por exemplo, experiências juvenis, organização
escolar e dinâmicas familiares. Isto significa que a abordagem das DSE é feita sobretudo de
uma forma parcelar, o que constitui um limite à construção de um conhecimento sistemático e
global sobre este fenómeno. Paralelamente, ao nível metodológico, a escassa utilização de
métodos mistos de produção e análise de dados surge, igualmente, como uma limitação nesse
sentido.
Em quarto lugar, é notório um interesse especial pelo ensino superior. Este interesse
reflecte as mais recentes evoluções dos sistemas educativos europeus, trazendo para a agenda
científica novos fenómenos e novas formas de desigualdade. Mas, simultaneamente, acaba
por eclipsar as modalidades tradicionais das DSE (por exemplo, a escolarização das
populações rurais) que continuam a ser um traço de uma sociedade de modernidade tardia
como a portuguesa. Os imperativos da internacionalização da ciência, apesar de surgirem
pouco espelhados nas comunicações em análise, na medida em que poucas são aquelas que se
situam para além do território nacional, poderão, em contrapartida, concorrer para esse
fenómeno, pela imposição das agendas de investigação.
Por fim, destacam-se múltiplos sinais de vitalidade no estudo das DSE em Portugal,
nomeadamente, o facto de todos os trabalhos analisados serem referentes a investigações em
curso ou concluídas, e a grande maioria apresentando resultados empíricos recentes,
contribuindo para a acumulação de conhecimentos sobre as DSE em Portugal; a existência de
um número significativo de estudos que apresenta dados de grande escala; a multiplicação de
dimensões de análise das DSE; e a utilização de metodologias diversificadas.
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2. A relação escola-família em Portugal: um olhar sociológico
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É bem mais frequente encontrar estudos que se assumem como sendo investigação-acção do que etnografia
crítica (a questão da relação entre estes dois conceitos e outros próximos não cabe aqui).
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Note-se que o uso de genealogias e de diários, a par de outros dispositivos como jogos, brincadeiras e
narrativas contadas pelas crianças sobre o seu quotidiano, constituem o que uma equipa de investigação – onde
se incluem, para além de Stoer e Araújo, Luiza Cortesão, José Alberto Correia e Maria José Casa-Nova, entre
outros – apelidou de dispositivos pedagógicos ou dispositivos de diferenciação pedagógica com vista à
promoção do conhecimento da cultura local e passagem do monocultural ao intercultural (cf., por exemplo,
também Cortesão et. al., 1995).
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Em 1995 António Joaquim Esteves dá à estampa um interessante conjunto de textos sob
o título genérico de Jovens e Idosos – Família, Escola e Trabalho. Não se centrando sobre a
interface escola-família, perpassa, no entanto, por ela e inclui um olhar assumidamente
sociológico. Em 1997 Ramiro Marques brinda-nos, de novo, com um conjunto de reflexões
sobre escolas e famílias, intitulado Professores, Famílias e Projecto Educativo. No mesmo
ano Rui Santiago faz sair A Escola Representada pelos Alunos, Pais e Professores, um estudo
sobre representações sociais.
Em 1999 Teresa Seabra publica Educação nas Famílias – Etnicidade e Classes, um dos
poucos estudos sociológicos que cruza educação, famílias e etnicidade. No mesmo ano
Cristina Gomes da Silva faz sair Escolhas Escolares, Heranças Sociais, um estudo
sociológico sobre as escolhas no final do ensino obrigatório (9º ano), também inovador.
No ano 2000 vemos Anne Marie Fontaine dar à estampa Parceria Família-Escola e
Desenvolvimento da Criança, um conjunto de textos dispersos e de autoria variada,
resultantes de comunicações apresentadas num colóquio. No ano seguinte Ramiro Marques
oferece-nos mais um conjunto de reflexões intituladas Educar Com Os Pais. Ainda em 2001
Maria Adelina Villas-Boas publica Escola e Família – Uma Relação Produtiva de
Aprendizagem em Sociedades Multiculturais, um estudo que partilha com o seguinte, de
Maria José Casa-Nova (2002), a questão da interligação ente etnicidade e educação. Esta
última autora tem a particularidade de se debruçar sobre o grupo étnico que demonstra um
maior grau de dificuldade de adaptação ao processo de escolarização, o dos ciganos. Em
Etnicidade, Género e Escolaridade – Estudo em Torno das Socializações Familiares de
Género numa Comunidade Cigana da Cidade do Porto esta investigadora proporciona-nos
uma obra de reflexão sociológica, tal como acontece com a já mencionada de Teresa Seabra
(1999).
Ainda em 2002 vemos sair O Jardim de Infância e a Família – As Fronteiras da
Cooperação, de Maria Luísa Homem, que apresenta a singularidade de se debruçar sobre a
relação escola-família no contexto da educação de infância. Também neste ano Manuel Pinto
proporciona-nos uma interessante reflexão sobre Televisão, Família e Escola e Teresa
Sarmento e Joaquim Marques publicam A Escola e os Pais, resultante de um projecto
investigação levado a cabo por uma equipa de dez elementos.
Em 2003, Maria Manuel Vieira publica Educar Herdeiros – Práticas Educativas da
Classe Dominante Lisboeta nas Últimas Décadas, um estudo sociológico aprofundado sobre
um tema pouco comum. No mesmo ano, esta autora publica, em conjunto com Joaquim
Pintassilgo e Benedita Portugal e Melo a colectânea Democratização Escolar, Intenções e
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Apropriações, que integra textos de diversos autores, incluindo três sobre famílias e escola de
Maria Manuel Vieira, Teresa Seabra e Isabel Neves.
Em 2004 temos várias obras. Manuela Ferreira, com “A Gente Gosta É de Brincar
Com Os Outros Meninos” – Relações Sociais Entre Crianças num Jardim de Infância, tem a
particularidade de se centrar nas crianças, analisando os vários tipos de interacções que
estabelecem no jardim de infância – quer entre si, quer com adultos vários – enquanto
relações sociais. É uma obra que se reivindica do olhar da Sociologia da Infância e que, como
tal, aborda a especificidade do acto de etnografar crianças, incluindo os obstáculos
epistemológicos particulares criados por este tipo de situação.
Irene Santos, com Quem Habita os Alunos? – A Socialização de Crianças de Origem
Africana, procura levar-nos a entender como se desenrola o quotidiano de crianças – na sua
maioria de origem africana – que vivem em bairros de minorias étnicas – Alto da Cova da
Moura, Outurela, Portela – dos arredores de Lisboa. Para além da perspectiva das crianças,
confere igualmente relevo à sua relação com a escola e as famílias.
Neusa Gusmão, em Os Filhos da África em Portugal – Antropologia,
Multiculturalidade e Educação, desenvolve um trabalho etnográfico num bairro negro dos
arredores de Lisboa, onde procura “olhar para a realidade dos negros africanos em Portugal”
(página 20), uma realidade que não se pode afirmar virgem de investigação, mas onde parece
continuar a existir um défice sobre a mesma, não deixando de ser curioso ser uma antropóloga
brasileira a proporcionar este interessante contributo para o melhor conhecimento deste
aspecto da realidade social portuguesa.
Em 2006 é publicada a excelente análise sociológica de Ana Nunes de Almeida e Maria
Manuel Vieira intitulada A Escola em Portugal e que inclui uma parte sobre escola, famílias e
crianças.
Em 2008 sai Escola/Família/Comunidade, obra publicada pelo Conselho Nacional de
Educação com as comunicações do Seminário homónimo, ocorrido no final de 2007 e que
contou com os contributos de especialistas vários como Abílio Amiguinho, Don Davies,
Maria Adelina Villas-Boas, Maria Emília Brederode Santos, Pedro Silva, Rui Canário e
Teresa Sarmento. Também neste ano Jorge Adelino Costa, António Neto-Mendes e
Alexandre Ventura publicam Xplica, Investigação sobre o Mercado das Explicações, que
vem colmatar uma área com défice de investigação empírica, a das explicações. Para além
destes autores temos, entre outros, o contributo do sociólogo Almerindo Janela Afonso.
Conclusão
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Os autores do livro são: Ana Matias Diogo, Ida Wentzel Winther, Joaquim Marques, Maria Eulália de Faria
Henriques, Maria Gracinda Sousa, Maria José Casa-Nova, Maria Manuel Vieira, Maria Manuela Ferreira, Maria
Mendel, Pedro Silva, Susana Faria, Teresa Sarmento, Teresa Seabra e Virgínio Sá. Contém um Prefácio de
Ramiro Marques.
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relação escola-família, pois a sociologia mostrou inicialmente uma maior preocupação com o
conhecimento separado das duas instituições sociais centrais (apanágio de uma sociologia da
educação e de uma sociologia da família) do que com a sua interface.
Como sabemos, historicamente, a sociologia da educação sempre foi maioritariamente
uma sociologia do mundo escolar. Não constitui um acaso que na análise sociológica da
relação escola-família sempre tenha predominado a instituição escolar como porta de entrada.
Temos estado, de facto, mais perto de uma relação escola-família do que família-escola. Na
análise deste fenómeno-fronteira têm predominado o olhar e as preocupações da sociologia da
educação e não tanto da sociologia da família (embora esta dê sinais de presença crescente).
É certo que a sociologia da relação escola-família não se tem confinado à questão das
desigualdades. Estas têm, em muitos casos, estado mais implícitas do que explícitas. No
último caso temos, por exemplo, os estudos que se centram na influência das classes sociais,
do género e das etnias. No primeiro temos todos os outros tipos de estudos, quer os que se
dedicam ao estudo da dimensão colectiva de actuação (associações de pais ou representantes
parentais em órgãos das escolas, por exemplo), quer os que se centram nos diferentes actores
sociais (um exemplo é o da preocupação crescente com a perspectiva desse actor social
central da relação e durante tanto tempo “esquecido”, que são as crianças; entender estas
como um actor social – repto deixado por Perrenoud já em 1987 – cruza, por exemplo, as
preocupações da florescente sociologia da infância16).
Parece-nos pertinente sublinhar que a multiplicidade crescente de objectos de estudo,
no âmbito desta relação, é sinal de um dinamismo que não pode ser escamoteado. Durante
bastante tempo a relação aqui em causa foi entendida como a da interacção entre pais e
professores, como se estes dois actores sociais esgotassem a complexa teia de actores e
interacções presentes na relação. Temos vindo, assim, a assistir à preocupação com a pesquisa
do papel desempenhado na relação, por exemplo, pelo director, pela organização escolar,
pelos pais-professores, pela comunidade, pela autarquia, pelo espaço para os pais na escola,
pelos trabalhos para casa, pela (não) articulação entre associações de pais e de estudantes,
pelas TIC, etc. Nalguns destes casos julgamos mesmo estar perante preocupações inéditas no
panorama internacional.
A diversificação de metodologias constitui outro traço caracterizador. Nas obras citadas
deparamo-nos com estudos centrados em questionários e, num dos casos, com tratamento
estatístico sofisticado, enquanto noutros encontramos pesquisas de cariz etnográfico ou
etnometodológico. As pesquisas de cariz “misto” são também uma constante. Aliás, é notória
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Curiosamente, a sociologia da juventude continua a primar pela relativa invisibilidade no estudo da relação
escola-família e não obstante algumas obras emblemáticas no campo da educação como são, por exemplo, as de
João Teixeira Lopes (1996) e Pedro Abrantes (2003).
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a preocupação com a articulação entre os “níveis” macro, meso e microssociológicos da
relação, tanto mais que as desigualdades se revelam em todos eles17.
Podemos talvez concluir este conjunto de ideias dando conta que o estudo da relação
escola-família em Portugal, incluindo a preocupação com as desigualdades sociais, está bem
presente na sociologia da educação e parece vir a sofrer a influência crescente de outros ramos
da sociologia (por exemplo, da família e da infância), a par da de outros campos disciplinares,
desde logo o da antropologia. Estamos perante uma área de pesquisa que vem demonstrando
um crescendo e uma renovação que não podemos ignorar.
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