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Universidade Católica de Santos


Mestrado em Direito

AUTONOMIA MUNICIPAL NAS REGIÕES


METROPOLITANAS

Mauro Haddad Nieri

Santos
2009
2

Universidade Católica de Santos


Mestrado em Direito

AUTONOMIA MUNICIPAL NAS REGIÕES


METROPOLITANAS

Mauro Haddad Nieri

Projeto apresentado a Banca de


Qualificação do Programa de
Mestrado em Direito da Universidade
Católica de Santos, como requisito
parcial para obtenção do grau de
Mestre em Direito. Área de
concentração: Direito Ambiental
Orientador: Prof. Dr. Edson Ricardo
Saleme
3

Santos
2009
4

À Sophia e Priscila,

mulheres da minha vida!


5

Agradeço a Deus, Pai Todo Poderoso, e


ao Senhor Jesus, Autor e Consumador
da minha fé, pelas oportunidades da
minha vida e pela capacidade para
aproveitar cada uma delas.

À minha família: pais e irmãos

À minha querida Priscila, por todo apoio


e compreensão e também pelas
palavras sempre colocadas no momento
certo e na dose exata.

Aos mestres de ontem e de hoje, sem


exceção, que ajudaram a forjar o
homem e o operador do direito que me
tornei.

Aos funcionários da Unisantos que


colaboraram nesse período,
principalmente Cátia, pelas cobranças e
sugestões precisas.
6

RESUMO

A presente dissertação tem como objetivo a analise da autonomia municipal nas

regiões metropolitanas. A criação dessas regiões está prevista na Constituição

Federal para integrar a organização, o planejamento e a execução de funções

públicas de interesse comum, porém não existe regulamentação do dispositivo, o

que gera divergência doutrinária e dúvidas na gestão dessas regiões: a sua

institucionalização, pelos estados, afetaria a autonomia desses municípios na

medida em que os efeitos da conurbação não respeitam fronteiras municipais?

Palavras-chave: regiões metropolitanas, municípios, estados, autonomia,

planejamento.
7

ABSTRACT

This dissertation aims to analyze the municipal autonomy in metropolitan areas. The

creation of these regions is expected in the Federal Constitution to integrate the

organization, planning and execution of public functions of common interest, but

there is no regulation of the device, which creates doubts and doctrinal divergence in

the management of these areas: its institutionalization, by states , would affect the

autonomy of municipalities to the extent that the effects of the conurbation not

respect municipal borders?

Keywords: metropolitan areas, cities, states, autonomy, planning.


8

Sumário

1–
Introdução............................................................................................
.....................................9

2 – Entidades Federativas no
Brasil................................................................................................14

2.1 – Conceito de
Federalismo..............................................................................................................
14

2.2 –
Histórico...................................................................................................................
.....................17

2.3 – Federalismo
Brasileiro..................................................................................................................
18

2.4 – Repartições de
Competências......................................................................................................22

2.4.1 – Federalismo Fiscal (competência


tributária).............................................................................25

2.4.2 – Competências
Ambientais.........................................................................................................27

2.4.2.1 – Competência Legislativa


Ambiental........................................................................................27

2.4.2.1.1 – Competência Legislativa Ambiental da


União.....................................................................27

2.4.2.1.2 – Competência Legislativa Ambiental dos Estados-


membros................................................27

2.4.2.1.3 – Competência Legislativa Ambiental do Distrito


Federal......................................................29

2.4.2.1.4 – Competência Legislativa Ambiental dos


Municípios...........................................................29

2.4.2.2 – Competência Material


Ambiental...........................................................................................30

2.4.2.2.1 – Competência Material da


União..........................................................................................31
9

2.4.2.2.2 – Competência Material dos Estados-


membros.....................................................................31

2.4.2.2.3 – Competência Material do Distrito


Federal..........................................................................32

2.4.2.2.4 – Competência Material dos


Municípios................................................................................32

2.4.2.2.5 – Competência Material


Comum............................................................................................33

2.5 – A
União........................................................................................................................
.................34

2.6 – Os Estados
Membros...................................................................................................................
.34

2.6.1 –
Autoorganização.......................................................................................................
.................35

2.6.2 –
Autolegislação..........................................................................................................
..................37

2.6.3 –
Autogoverno.............................................................................................................
.................37

2.6.4 – Auto-
administração...........................................................................................................
........38

2.7 – Os
Municípios................................................................................................................
...............39

2.7.1 – Lei Orgânica


Municipal..............................................................................................................41

2.8 – O Distrito
Federal.....................................................................................................................
....42

2.9 – Os
Territórios.................................................................................................................
...............43
10

2.10 – Outras Previsões de Descentralização e


Desenvolvimento........................................................43

3 – Regiões
Metropolitanas......................................................................................
......................46

3.1 –
Conceito...................................................................................................................
.....................46

3.2 –
Histórico...................................................................................................................
.....................50

3.2 – Regiões Metropolitanas na Constituição de


1988........................................................................53

3.2.1 – Funções Públicas de Interesse


Comum......................................................................................68

4 – A região Metropolitana da Baixada


Santista.............................................................................73

4.1 – A Divisão Regional na Constituição do Estado de São Paulo de


1989..........................................73

4.2 – As Regiões Metropolitanas na Constituição do Estado de São Paulo de


1989.............................77

4.3 – A Lei Complementar Estadual


760/94..........................................................................................79

4.4 – A Região Metropolitana da Baixada


Santista................................................................................81

4.4.1 – Histórico e Instituição da Região Metropolitana da Baixada


Santista.......................................81

4.4.2 – Caracterização
Regional.............................................................................................................88

5– Competências Urbanísticas nas Regiões


Metropolitanas...........................................................91

5.1 – Breves palavras sobre Direito


Urbanístico....................................................................................91

5.2 – O planejamento
regional..............................................................................................................96

5.2.1 – O Plano Metropolitano Integrado de Desenvolvimento da


RMBS..........................................103

6–
CONCLUSÕES........................................................................................
..................................106
11

7–
BIBLIOGRAFIA.......................................................................................
..................................111

1. Introdução

As primeiras cidades apareceram ou se formaram por volta do ano 3.500 a.C.,

entre os rios Tigre e Eufrates, região conhecida como Mesopotâmia. Evoluindo, num

processo permanente de transformação e concentração populacional, até chegar às

megalópoles que abrigam milhões de pessoas nos dias de hoje.

Essa transformação ocorreu de forma mais acentuada e significativa a partir da

metade do séc. XIX, mais precisamente como reflexo da chamada Revolução

Industrial, que mudou definitivamente a forma como o homem vivia e se relacionava

com o território da cidade, de forma que o fenômeno da urbanização é tipicamente

moderno1, passando a ser definitivamente o habitat do homem2.

Percebe-se que o ser humano tem uma tendência natural a viver em sociedade,

sendo inerente a ele a associação. Nos dizeres de Édis Milaré,

É inerente aos seres humanos associar-se e morar em cidades, tão


inerente quanto a própria linguagem que a humanidade desenvolveu,
continuadamente, para comunicar-se dentro de sua espécie e, assim,
criar culturas e civilizações. Nesse sentido, a cidade, através dos
1
Silva, José Afonso da Silva, Direito Urbanístico Brasileiro. São Paulo: Malheiros, 2008, p.
19-20.
2
Milaré, Édis. Um Ordenamento Jurídico para a Qualidade de Vida Urbana, in Direito
Urbanístico e Ambiental, Estudos em homenagem ao Professor Toshio Mukai. Agrelli,
Vanusa Murta e Silva, Bruno Campos (org). Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2008, p. 37.
12

tempos, é a expressão da linguagem e da cultura das intermináveis


gerações que se têm sucedido ao longo da história.3

Evidentemente, não nos cabe aqui, contar toda a história das cidades e de sua

evolução. Basta-nos os dados apresentados por Scarlato e Pontin 4, que indicam que

a população do planeta chegou ao seu primeiro bilhão no início do século XIX, o

segundo depois de 125 anos, o terceiro após 33 anos, o quarto 14 anos depois e o

quinto bilhão foi atingido 13 anos depois em 1987. Importante salientar, também,

que, se em 1800 apenas 5% da população mundial vivia nas cidades, no ano 2000,

com a população passando a casa dos 6 bilhões, 50% deles viviam nos centros

urbanos, sendo que existiam 19 cidades com mais de 10 milhões de habitantes e 22

entre 5 e 10 milhões de moradores.5

No Brasil, como no resto do mundo, a industrialização gerou a urbanização

acelerada e descontrolada, sendo que José Afonso da Silva, aponta que a

população urbana do Brasil era de cerca de 32% do total em 1940, 45% em 1960,

mais de 50% em 1970 e atingiu 70% na década de 80 do século passado,

basicamente como fruto do êxodo rural, originando uma urbanização crescente e

prematura deteriorando o ambiente urbano e gerando problemas de ordem social,

como a carência de habitações, desemprego, violência e insegurança e problemas

de higiene e saneamento básico, que refletem em problemas crônicos de saúde

pública.6

3
Milaré, Édis. Op. Cit., 2008, p. 37.
4
Scarlato, Francisco Capuano e Pontin, Joel Arnaldo. O ambiente urbano. São Paulo:
Atual, 1999, p. 10.
5
Morand-Deviller, Jaqueline. A cidade sustentável, sujeito de direito e de deveres. In
Políticas Públicas Ambientais: estudos em homenagem ao Professor Michel Prieur. D´Isep,
Clarissa Ferreira Macedo, Nery Junior, Nelson e Madauar, Odete (Orgs.). São Paulo:
Editora Revista dos Tribunais, 2009, p. 348.
6
Silva, Jose Afonso da. Op. cit. p. 27.
13

Nesse sentido, José Roberto Marques7, identifica como modalidades de

degradação ambiental urbana: I) a poluição do solo; II) a poluição da água; III) a

poluição do ar; IV) a poluição sonora; V) a poluição visual; VI) a degradação da flora;

e VII) a degradação da fauna.

Contudo, não podemos esquecer que a urbanização acelerada, as


engrenagens das economias nacionais, o pluralismo das culturas e
as opções políticas mais disparatadas tornaram o mundo moderno
extremamente complexo. E essa complexidade reflete-se, de cheio,
na organização das cidades e na vida cotidiana dos cidadãos das
grandes aglomerações e metrópoles de todos os países, em
particular dos que constituem o chamado terceiro mundo.
Eis um grande desafio, talvez o maior de todos, que se levanta
perante o Poder Público e as comunidades urbanas: todos
precisam, com urgência, encontrar o seu caminho, repensar a sua
existência e reorganizar a própria convivência, isso se traduz, em
parte, no exercício da cidadania, para o qual o Direito tem valiosos
subsídios a oferecer (grifo nosso).8

A percepção do professor Édis Milaré de que passa pelo Poder Público a solução

desse problema é a mesma de José Afonso da Silva, ao afirmar que este (Poder

Público) “procura transformar o meio urbano e criar novas formas urbanas”, pela

urbanificação que é o “processo deliberado de correção da urbanização, consistente

na renovação urbana”.9

Esse processo só é possível, por meio do planejamento, da execução de políticas

públicas eficientes e do Direito.

Por esse motivo, a Constituição Federal e o Estatuto da Cidade, garantem o


direito a cidades sustentáveis, preocupadas com as presentes e as futuras
gerações. Para esse objetivo o planejamento urbano, de acordo com as regras do
Direito Constitucional, Ambiental e Urbanístico é primordial. A dúvida é como fazer
esse planejamento quando as cidades crescem e ocorre a conurbação, derrubando
fronteiras e divisas de municípios, criando um grande conglomerado urbano formado
por vários municípios? Atualmente nesses grandes conglomerados as pessoas
7
Marques, José Roberto. Meio Ambiente Urbano. Rio de Janeiro: Forense Universitária.
2005. p. 117 e seguintes.
8
Milaré, Édis. Op. cit. p. 38.
9
Silva, José Afonso da. Op. Cit. P. 27.
14

moram em uma cidade, trabalham em outra e podem estudar em uma terceira,


sendo que as horas vagas o lazer e as horas vagas são aproveitados em outra
cidade.

A Constituição Federal no artigo 25, parágrafo 3°, garante aos estados-membros


o direito de instituir essas regiões metropolitanas, formadas “por agrupamentos de
municípios limítrofes, para integrar a organização, o planejamento e a execução de
funções públicas de interesse comum”.10

Não existe até o momento uma regulamentação do dispositivo, cabendo a cada


um dos estados definir sua própria política de instituição dessas entidades regionais,
gerando um vácuo jurídico, que suscita dúvidas sobre a competência, limites, área e
forma de atuação das regiões metropolitanas.

A autonomia dos municípios que formam uma região metropolitana é afetada


pela institucionalização da mesma? Quais as competências das regiões
metropolitanas e de que forma se conciliam com os interesses municipais?

São perguntas que pretendemos enfrentar ao longo do presente trabalho,


tomando como paradigma a Região Metropolitana da Baixada Santista (RMBS), que
surgiu da conurbação de nove municípios litorâneos11 do Estado de São Paulo12.

Some-se a esse conglomerado urbano o maior porto do hemisfério sul presente


geograficamente em três dos nove municípios da região, responsável por cerca de
30% de todo o comercia exterior brasileiro, um pólo petroquímico e siderúrgico, uma
grande extensão territorial de áreas de proteção ambiental por conta de encostas,
mangues, mananciais e do bioma da Mata Atlântica.

Criou-se a RMBS sob a égide do novo ordenamento constitucional, no ano de


199613, sob a influencia de uma cidade-pólo (Santos) abrangendo nove municípios
envoltos em problemas e dificuldades ambientais e urbanísticas, de infra-estrutura,
circulação e outros decorrentes das características geográficas, econômicas e
sociais da região. Na esteira da criação da RMBS, o Estado criou ainda a Agência

10
Grifo nosso.
11
Embora Cubatão não seja exatamente um município litorâneo encontra-se na região
estuarina
12
Bertioga, Cubatão, Guarujá, Itanhaém, Mongaguá, Peruibe, Praia Grande, Santos e São
Vicente.
13
Lei Complementar Estadual nº 815, de 30 de julho de 1996.
15

de Desenvolvimento da Baixada Santista (AGEM), o Conselho de Desenvolvimento


da Baixada Santista (CONDESB) e o Fundo de Desenvolvimento da Baixada
Santista (FUNDEB), formando um sistema metropolitano de planejamento e
execução das funções públicas de interesse comum.

Qual a função das Regiões Metropolitanas? Qual sua natureza jurídica? Como
elas podem ajudar com a preocupação da Constituição Federal e do Estatuto da
Cidade na busca por um meio ambiente equilibrado, de uma sadia qualidade de vida
e de cidades sustentáveis?

Responder a essas e outras perguntas é o objetivo do presente trabalho. Para


tanto será estudada a doutrina sobre o assunto, buscar respostas na jurisprudência
e com pesquisas de campo e entrevistas com os agentes e atores envolvidos com o
processo de regionalização da Baixada Santista. A principal dificuldade, sem dúvida
é a baixa produção científica sobre o tema, principalmente após a Constituição de
1988, e o fato de que trataremos principalmente com agentes políticos e não
técnicos da Ciência do Direito (Constitucional, Ambiental e Urbanístico) durante as
pesquisas.

No primeiro capítulo o fenômeno do Federalismo, o tratamento constitucional


reservado aos entes federados e o modelo de divisão de competências estipulado
no Texto Constitucional vigente no País serão objetos de análise.

No segundo, observar-se-á a questão previsão constitucional para que Estados


criem, por meio de lei complementar, Regiões Metropolitanas, formadas por
municípios limítrofes, para integrar a organização, o planejamento e a execução de
funções públicas de interesse comum.14

No terceiro capítulo o processo de criação da Região Metropolitana da Baixada


Santista será objeto de pesquisa, assim como suas características, os órgãos que
formam sua organização, de que forma se relacionam com os municípios, focando
principalmente nas funções da Agem, por ser o órgão responsável pelo
planejamento e pela execução dos projetos responsáveis pelo desenvolvimento
sustentável da região.

14
Constituição Federal, art. 25, § 3°.
16

No quarto, e último, a questão das competências urbanísticas das regiões


metropolitanas e a possibilidade ou não delas instituírem um plano urbanístico
próprio na busca do desenvolvimento sustentável será, também, objeto de pesquisa.

2. Entidades Federativas no Brasil

2.1Conceito de Federalismo

A Constituição de 1988, em seu art. 1º15 manteve como forma de Estado o

federalismo16. Essa escolha do constituinte de 88 reflete a evolução histórica das

Constituições republicanas brasileiras e, de certo modo, até mesmo do Brasil

Monarquista, como veremos adiante.

Esse termo, basicamente está ligado à divisão de poderes e competências entre

os entes federados e a autonomia destes, assegurando, assim, o respeito e a

integração entre sociedades heterogenias. Nas palavras de Sergio Sérvulo da

15
“Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e
Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem
como fundamentos (...)”
16
Silva, José Afonso da. Comentário Contextual à Constituição. São Paulo: Malheiros
Editores. 2008, p. 33.
17

Cunha, na federação “o poder do governo se distribui por várias instâncias

concêntricas”.17

Originário nos Estados Unidos da América, os conceitos modernos de federação

e federalismo evoluíram ao longo do tempo e mudam conforme a realidade local 18,

ganhando contornos locais nos Estados onde foi adotado, e representa segundo

Pedro Estevam Alves Serrano

A busca por uma forma de Estado que apresentasse às pessoas um


sistema equilibrado que viabilizasse a liberdade, um governo sólido,
estável e honesto, bem como a manutenção da paz entre grupos
ocupantes de territórios diversos sob o manto de um governo único
(...). 19

Outro aspecto fundamental do federalismo é a descentralização. Oposto ao

Estado unitário, o qual, via de regra, todo o poder está concentrado no governo

central, no federalismo impera a autonomia dos membros da federação com

competências estabelecidas no texto constitucional, assegurando, assim, não só a

descentralização político-administrativa como, também, legislativa.

Dessa maneira, cada uma das esferas federativas possui um rol próprio de
competências, que salvo hipótese de delegação, deve exercer com exclusão das
demais. Assim, basicamente, as competências privativas da União estão
enumeradas nos art. 21 e 22, as municipais encontram-se arroladas no art. 30 e
as estaduais no art. 25, todos da Constituição Federal.20

Como bem define Zulmar Fachin, não existe entre os membros da federação,

teoricamente, qualquer tipo de hierarquia, podendo cada membro exercer todas as

17
Cunha, Sergio Sérulo da. Fundamentos de Direito Constitucional, São Paulo: Saraiva.
2004. Vale ressaltar e observar a diferenciação que o autor faz entre os termos “ente”,
“entidade” e sua escolha pelo termo “instâncias”. Porém, usaremos nesse trabalho, por
vezes, os três termos com o mesmo significado, conforme a doutrina majoritária.
18
Ver Araujo, Luiz Alberto David e Nunes Junior, Vidal Serrano. Curso de Direito
Constitucional, São Paulo: Saraiva, 2008, p.26.
19
Serrano, Pedro Estevam Alves Pinto. Região Metropolitana e seu regime constitucional.
Ed. Verbantim, 2009, p.28.
20
Araujo, Luiz Alberto David e Nunes Junior, Vidal Serrano. Curso de Direito
Constitucional, São Paulo: Saraiva, 2008, p.26
18

competências que lhe foram atribuídas pelo Texto Constitucional, e que, ao reverso,

nenhum deles poderá exercer competências pertencentes exclusivamente a outro

ente federativo21.

Já Alexandre de Morais declara que o mínimo necessário para a caracterização

de um Estado federal é a previsão constitucional deste, com suas partes

indissociáveis e o abandono de certas competências administrativas, legislativas e

tributárias e ressalta ainda oito princípios que devem estar previstos na Constituição

que são: i) nacionalidade única; ii) repartição de competências; iii) capacidade

tributária dos entes federado; iv) auto-organização e autonomia constitucional; v)

excepcionalidade e taxatividade dos casos de intervenção federal; vi) participação

dos estados membros no legislativo (Senado Federal22); vii) possibilidade de criação

de novos estados; e viii) a existência de um órgão jurisdicional para interpretação e

proteção da Constituição Federal.23

Outra lembrança do mesmo autor24 é que o constituinte de 88, no art. 60, § 4º,

vedou expressamente a possibilidade de apreciação de proposta de emenda

constitucional tendente a abolir a forma federativa do Estado brasileiro.

Dessa forma, a abolição do sistema federativo, no caso brasileiro, só seria

possível por meio de uma Assembléia Constituinte originária e nunca por meio de

emenda ou reforma constitucional. Outros países além do Brasil segundo citam

Celso Ribeiro Bastos e Ives Gandra Martins que fazem a mesma proteção do

21
Fachin, Zulmar. Direito Constitucional. São Paulo: Editora Método, 2008, p. 353
22
No Brasil, cada estado-membro e o Distrito Federal contam com a mesma
representação no Senado Federal, 3 senadores cada, independente do número de
habitantes. Aqui, reside uma crítica na colocação do Professor Alexandre de Morais. Os
Municípios brasileiros são, por comando constitucional, entes federativos, no entanto, não
possuem representação no Poder Legislativo Federal (Senado ou Câmara Federal). Assim,
essa não seria uma característica primordial para a existência de um Estado federal.
23
Moraes, Alexandre de. Direito Constitucional. São Paulo: Atlas, 2002, p. 267.
24
Moraes, Alexandre de. Op. cit. P.267
19

Princípio Federativo são a Angola (art. 38), Costa Rica (art. 195), Cuba (art. 141),

Dinamarca (art. 42 e 88), Espanha (art. 167), Filipinas (art. IX, seção 1.4), Finlândia

(art. 95), Noruega (art. 73) e Suriname (art. 72).25

O Constituinte outorgou por meio desse dispositivo a segurança e a estabilidade

necessárias ao pacto federativo, que poderá, dessa forma, ser emendado ou

reformado, mas não abolido de nosso sistema constitucional.

Assim, podemos trabalhar com o conceito de federalismo como forma de

organização político-administrativa descentralizada de governo que prevê a

autonomia e a auto-organização de seus entes, garantida pela estabilidade

constitucionalmente prevista.

2.2 Histórico

Embora Napoleão Bonaparte tenha dividido o território francês em

departamentos, com poderes administrativos, sob a orientação de delegados do

poder central26, o Estado Federal como conhecemos hoje nasceu, com a

constituição dos Estados Unidos da América, em 1787. Naquele momento histórico,

as 13 colônias independentes se reuniram, formando uma Confederação, para lutar

por objetivos comuns.

Essa forma confederativa, porém, mostrou-se frágil e inadequada, sendo que com

o passar do tempo, foi sendo concebido um sistema pelo qual não haveria cessão

plena da soberania em favor de um governo central unitário e, também, as

características e identidades sócio-culturais e políticas de cada colônia estaria

comprometido.
25
Bastos, Celso Ribeiro; Martins, Ives Gandra. Comentários à Constituição do Brasil. São
Paulo: Saraiva, 1988. V.4. Tomo I, p. 357
26
Cunha, Sérigo Servulo da. Fundamentos de Direito Constitucional, São Paulo: Saraiva,
2004, p. 405
20

Dessa forma, buscou-se um sistema em que o governo central não concentrasse

muitos poderes, conferindo-se autonomia política aos Estados membros. Com o

advento de uma Constituição e nela a previsão de separação dos poderes

(Executivo, Legislativo e Judiciário), capacitando com autonomia cada estado-

membro, sendo que a divisão política ocorreu de acordo com a divisão geográfica

existente27.

Bem coloca Marcos Mendes que o objetivo dos founding fathers era uma forma

de reduzir a autonomia política e militar de cada um dos estados e evitar a eclosão

de uma luta fratricida, criando um governo central forte, detentor do monopólio

militar, reduzindo o poder dos estados e assegurando que diferentes culturas e

tradições religiosas convivessem dentro de um mesmo país28.

Assim, no pacto federativo originou-se a Constituição de 1787, com a

consagração da autonomia dos entes federados e a igualdade de participação entre

os estados integrantes, em um verdadeiro e clássico exemplo de federalismo por

agregação, onde os Estados que já existiam antes da Federação unem-se para

assim formar um novo Estado Federal, o qual reconheceria a autonomia das outras

unidades de poder29.

2.3 Federalismo Brasileiro

Como já comentado, mesmo antes da proclamação da República e da definição

constitucional de Estado Federal, o Brasil já havia experimentado a descentralização

político-administrativa.

27
Serrano, Pedro Estevam Alves Pinto, Op. Cit., p. 28-30.
28
Mendes, Marcos. Federalismo Fiscal, in Economia do Setor Público no Brasil. Campus
Editora, p. 422. O autor lembra ainda o exemplo atual do Canadá que manteve unido
canadenses de origem inglesa e francesa graças ao federalismo.
29
Zulmar Fachin. Direito Constitucional, São Paulo: Editora Método, 2008, p. 347
21

No Brasil colonial, desde as concessões das capitanias hereditárias, com D. João

III a descentralização foi muito acentuada, sendo que em cada fazenda ou porção

territorial teria seu controle por meio de um poder central, sendo que no Brasil, a

base do Município foi a propriedade rural, com um sistema quase feudal.30

Já durante o Império, embora o Estado fosse unitário, núcleos locais de poder

foram estabelecidos para facilitar o atendimento de interesses de cada região.

Na Constituição de 1931, embora unitária, já aparece traços de descentralização,

com a fim da vitaliciedade do Senado e a autonomia municipal. Durante o período

imperial, a intenção de um governo central forte foi o de manter, principalmente, a

unidade territorial do Império, que só foi possível após as sucessivas revoltas

ocorridas no período por conta do fechamento da Assembléia Constituinte de 23.

Consolidado esse período e com o declínio do segundo império, apareceram com

força os anseios populares pela federação como solução dos problemas do País31.

Em 1834, com a Lei n. 16, as províncias, ainda sob o poder central, passaram a

deter poder legislativo e de tutela sobre os municípios. Em 1840, com a edição da lei

de interpretação ao ato adicional n. 105, reforçou o centralismo e subtraiu grande

parte das prerrogativas das províncias, concentrando ainda mais o poder no governo

central.

Com o enfraquecimento do modelo monarquista, os ideais republicanos e

federalistas passaram a ganhar espaço no cenário político nacional até a

proclamação da República, em 15 de novembro de 1889 e a assinatura, pelo

governo provisório, do Decreto nº 1, escrito por Rui Barbosa que, no seu art. 2º,

30
Serrano, Pedro Estevam Alves Pinto. Op. Cit. p. 31.
31
Lustosa, Isabel. Revista Rumos: Os Caminhos do Brasil em Debate, publicação da
Comissão para as Comemorações do V Centenário do Descobrimento do Brasil, n.2,
mar./abr., 1999, p. 27 e 28.
22

estabeleceu a Federação ao determinar que “as províncias do Brasil, reunidas pelo

laço da federação, ficam constituindo os Estados Unidos do Brasil”.

Ratificou-se o entendimento pela Constituição Provisória da República outorgada

em 22 de julho de 1890, em seu art. 1º determinava que “a nação brasileira,

adotando como forma de governo a República Federativa, proclamada pelo Decreto

nº 1 de 15 de novembro de 1889, constitui-se por união perpétua e indissolúvel entre

as antigas Províncias em Estados Unidos do Brasil”.

Dos textos pode-se reparar a influência do modelo norte-americano e desde já a

presença da idéia de estabilidade do princípio federativo.

Porém, embora influenciada pelo modelo norte-americano, a federação brasileira

não obedeceu o mesmo processo de formação.

Enquanto o federalismo norte-americano foi formado pelo processo da agregação,

no qual os Estados soberanos abriram mão dessa soberania por meio de um pacto

federativo, no Brasil tratou-se da descentralização por segregação de um Estado

unitário, o que causou a distribuição e a divisão de competências entre os entes

federativos, sendo que os processos foram inversos, sem, contudo, alterar o

resultado: descentralização e divisão de competências.32

Embora instituído desde a primeira Constituição republicana, o federalismo

brasileiro passou por momentos distintos ao longo da história, oscilando momentos

de maior ou menos grau de descentralização33, até a Constituição atual de 88.

32
Araujo, Luiz Alberto David e Nunes Junior, Vidal Serrano. Curso de Direito
Constitucional, São Paulo: Saraiva, 2008, p.258
33
Pedro Serrano demonstra em sua obra como em momentos de ditaduras ou após
golpes de Estado ocorreram movimentos de centralização do poder e em momentos de
maior democracia foram acompanhados da descentralização. Serrano, Pedro Estevam
Alves Pinto. Região Metropolitana e seu regime constitucional. Ed. Verbantim, 2009, p.33-
38
23

Com o término do período militar, que durava desde o golpe de 1964 e a

redemocratização, em 1985, uma nova Assembléia Constituinte foi convocada,

sendo que o texto final foi promulgado em 5 de outubro de 1988, mantendo o

princípio federativo e os ideais de descentralização político-administrativo, inovando

nesse sentido ao incluir entre os entes federados os municípios, repartindo, assim,

as competências entre União, Estados, Distrito Federal e Municípios.

Até então, todas as Constituições anteriores embora outorgassem governo

próprio e autonomia aos municípios, os estados é que tinham o poder de criar e

organizar os municípios.34

Desde o Texto Constitucional de 1988, o município passou a ter as mesmas

características federativas dos demais entes federados, a saber, a auto-organização,

autogoverno e auto-administração.

No ensinamento de Alexandre de Morais,

Dessa forma, o município auto-organiza-se através de sua Lei


Orgânica Municipal e, posteriormente, por meio da edição de leis
municipais; autogoverna-se mediante a eleição direta de seu prefeito,
vice-prefeito e vereadores, sem qualquer ingerência dos Governos
Federal e Estadual; e, finalmente, auto-administra-se, no exercício de
suas competências administrativas, tributárias e legislativas,
diretamente conferidas pela Constituição Federal.35

Porém, embora os municípios tenham sido elevados de forma expressa, artigos

1º e 18 da CF, à condição de ente federativo, a doutrina não é unânime nesse

sentido, devendo ser registrada a posição de José Afonso da Silva, para quem os

Municípios não são efetivamente entes integrantes do sistema federativo.

34
Bercovici, Gilberto. Dilemas do Estado Federal Brasileiro. Porto Alegre: Livraria do
Advogado, 2004, p. 55.
35
Morais, Alexandre de. Op. cit. p. 274.
24

Resumidamente, argumenta em suas obras36, que embora dotados de autonomia

político-constitucional não integram, necessariamente, o conceito de “ente

federativo”, pois, se os municípios não existissem ou desaparecessem, a federação

continuaria a existir, pois esta é uma união de estados e não de municípios.

Afirma, também, que os municípios não são representados no Legislativo Federal,

sendo que somente os estados membros, por meio do Senado Federal, são

unidades representadas.

Além disso, afirma que a intervenção nos municípios é decretada pelos estados,

demonstrando a dualismo da federação, e por fim, argumenta que a criação,

incorporação, fusão e desmembramento de municípios serão feitos mediante lei

estadual, num período pré-determinado em lei complementar federal (art. 18, § 4º), e

dependerão de consulta plebiscitária das populações envolvidas.

Rebatem brilhantemente tais argumentos Luiz Alberto David Araujo e Vidal

Serrano Nunes Júnior37, no sentido de que os municípios possuem competências

próprias, capacidade de auto-organização. Das características típicas do

federalismo, a única não presente nos municípios seria a capacidade de se fazer

representar no Senado Federal, não afetando sua posição de ente federado prevista

expressamente no texto da Constituição Federal.

Fazem ainda uma ampla leitura do texto constitucional, citando os artigos 1º; 18;

21, I; 13, caput; 12, I,a; 12; e que dessa forma, a Constituição Federal de 88

agraciou estados, Distrito Federal e os municípios com autonomia, além da entidade

central que é a União.

36
Silva, José Afonso da. Comentário Contextual à Constituição. São Paulo: Malheiros,
2008, p. 249-250.
37
Araujo, Luiz Alberto David e Nunes Junior, Vidal Serrano. Op. cit. p. 255 - 257.
25

Esse também é o entendimento de Pedro Serrano que após considerar a inclusão

dos municípios no rol dos entes federados pela Constituição Federal uma

“singularidade substancial”, afirma que “o Município aparece como membro efetivo

da ordem federal, com autonomia administrativa e legislativa”.38

2.4 Repartição de Competências

Como anteriormente observado, no federalismo ocorre a descentralização do

poder central. Esse fenômeno exsurge por meio da distribuição de competências

entre os entes federados, que no caso brasileiro, antes da proclamação da

República e da adoção do federalismo estavam concentrados no órgão central.

Assim, cada esfera de poder federativo possui um rol próprio de competências

estabelecido na Constituição Federal.

Dessa forma, a autonomia das unidades federativas, no ensinamento de

Alexandre de Morais, pressupõe repartição de competências legislativas,

administrativas e tributárias39, sendo, por esse motivo pedra basilar e ponto nuclear40

da noção de Estado Federal.

Na definição de José Afonso da Silva, competência é a

faculdade juridicamente atribuída a uma entidade ou a um órgão ou


agente do Poder Público para emitir decisões. Competências são as
diversas modalidades de poder de que se servem os órgãos ou
entidades estatais para realizar suas funções.41

Nesse sentido a Constituição de 88 fixou um sistema em que existe a combinação

entre competências exclusivas e privativas com competências comuns e

38
Serrano, Pedro Estevam Alves Pinto. Op. cit. p. 39.
39
Moraes, Alexandre de. Op. cit. p. 287.
40
Barruffini, José Carlos Tosetti. Direito Constitucional 2. São Paulo: Saraiva, 2007, p. 12.
41
Silva, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. São Paulo: Malheiros,
2002, p. 477.
26

concorrentes, buscando, dessa forma, reforçar o sistema federativo gerando o

equilíbrio típico necessário a esse sistema.42

Assim, o principio que norteia a repartição de competências entre os entes

federativos adotado pela Constituição é o principio da predominância do interesse,

sendo que cabe à União as de predominância de interesse geral, aos Estados

referem-se as matérias de predominante interesse regional e aos municípios

aqueles assuntos de interesse local, sendo que o Distrito Federal acumula aquelas

de interesse regional e o interesse local, exceção prevista no art. 22, XVII da

Constituição43.

Segundo José Afonso da Silva, o sistema adotado pela Constituição de 88 é

complexo, misturando competências exclusivas e privativas com competências

comuns e concorrentes, que busca o equilíbrio federativo

por meio de uma repartição de competências que se fundamenta na


técnica da enumeração dos poderes da União (arts. 21 e 22), com
poderes remanescentes para os Estados (art. 25, § 1º) e poderes
definidos indicativamente para os Municípios (art. 30), mas combina
com essa reserva de campos específicos (nem sempre exclusivos,
mas apenas privativos), possibilidades de delegação (art. 22,
parágrafo único), áreas comuns em que se prevêem atuações
paralelas da união, Estados, Distrito Federal e Municípios (art. 23) e
setores concorrentes entre União e Estados em que a competência
para estabelecer políticas gerais, diretrizes gerais ou normas gerais
cabe à União, enquanto se defere aos Estados e até Municípios a
competência suplementar (grifo do autor)44.

A Constituição apresenta, para tanto, uma divisão material, administrativa e

legislativa, sendo que no critério horizontal estão definidas as privativas de cada


42
Nesse sentido ver: Silva, José Afonso da. Op. cit.. São Paulo: Malheiros, 2002, p. 477;
Barruffini, José Carlos Tosetti. Op. cit.. São Paulo: Saraiva, 2007, p. 13; e Serrano, Pedro
Estevam Alves Pinto. Op. cit. p. 66.
43
Art. 22. “Compete privativamente à União legislar sobre: (...) XVII - organização
judiciária, do Ministério Público e da Defensoria Pública do Distrito Federal e dos
Territórios, bem como organização administrativa destes”.
44
Silva, José Afonso da. Op. cit. p. 477
27

ente federativo, e um critério vertical, onde as competências podem ser exercidas

concomitantemente por mais de um ente federativo.

No sentido horizontal o Texto Constitucional enumerou as competências federais

deixando para os Municípios aquelas de interesse predominantemente local,

cabendo aos Estados-membros aquelas remanescentes.

Já no sentido vertical, além das competências comuns (art. 23) 45, existem aquelas

que são concorrentes, quando a Constituição delega a competência da mesma

matéria a mais de um ente, sendo que à União caberá a fixação de normas gerais e

aos estados a complementação dessas normas, sem excluir, no entanto a

possibilidade dos estados legislarem na ausência de norma federal, nesse caso,

exercendo sua competência suplementar.

Nesse caso, quando a União legislar sobre esses assuntos, por meio de lei

federal, ocorrendo assim a superveniência, a lei estadual perderá sua eficácia (§§ 1º,

2 º, 3 º e 4º do art. 24).46

2.4.1 Federalismo Fiscal (competências tributárias)

Outro aspecto importante observado no federalismo brasileiro é o chamado

federalismo fiscal.

As obrigações estatais e as competências político-administrativas definidas pela

Constituição requerem recursos financeiros para que sejam cumpridas. Nesse

sentido, foram estabelecidas expressamente competências tributárias para cada

ente federativo.

45
O parágrafo único do referido artigo prevê, ainda, que a cooperação entre União,
Estados, Distrito Federal e Municípios deve ser regulada por meio de lei complementar,
visando o equilíbrio do desenvolvimento e do b m estar em âmbito nacional.
46
Ver Ferreira Filho, Manoel Gonçalves, Curso de Direito Constitucional. São Paulo:
Saraiva, 2001, p. 58.
28

Dessa forma, a divisão das receitas tributárias tem por objetivo o equilíbrio

financeiro (despesas e receitas) de cada ente federativo e a realização efetiva dos

objetivos do federalismo, quais sejam, a manutenção do equilíbrio entre os entes

federados e a autonomia de cada um deles, além de uma eficiente prestação de

serviço por parte do estado.

Nas palavras de Mauro Santos Silva

A adoção do federalismo fiscal implica distribuição de competências


constitucionais fiscais entre os diferentes níveis de governo, para que
cada um, de modo autônomo, e na medida de suas competências e
capacidade de financiamento, possa construir desenhos
institucionais capazes de disciplinar os procedimentos de
contribuição e gestão tributária, transferências fiscais, composição e
dimensão da despesa.47

Assm, as competências tributárias estabelecidas na Constituição não são

concorrentes, isto é, quando um ente da federação tem capacidade tributária48,

exclui outro, sob pena de bi-tributação e desequilíbrio fiscal, o que geraria

desarmonia entre os entes federados, pondo em risco todo o sistema.

A repartição de competências fiscais e tributárias e de metas pela Constituição

visa garantir uma maior eficiência na Administração pública, pois os entes federados

sub-nacionais (Estados, Municípios e o Distrito Federal), possuem um maior

conhecimento das necessidades da sua população local do que o ente central.

Assim a execução de tais metas e obrigações passa a ser possível por meio da

obtenção de recursos próprios. Esses recursos são captados, em sua maioria, por

meio de tributos, previstos no art. 145 e seguintes da Constituição de 88.

47
Silva, Mauro Santos, Nova Economia, Belo Horizonte, janeiro-abril de 2005, p.119
48
Entendida como capacidade de instituir tributo com base na competência
constitucional. Artigo 145 e seguintes da Constituição.
29

A principal questão no que diz respeito à organização do sistema fiscal e tributário

é a definição rigorosa de competências que devem ser designadas a cada nível de

governo, isto é, o grau de autonomia que permita o alcance de uma situação Pareto-

eficiente49.

2.4.2 Competências Ambientais

Como vimos anteriormente as competências podem ser divididas em dois grupos

e em subclasses: I – competência material, que pode ser: a) exclusiva (art. 21); e b)

comum (art. 23); II – competência legislativa, que pode ser: a) exclusiva (art. 25, §§

1º e 2º); b) privativa (art. 22); c) concorrente (art. 24); e d) suplementar (art. 24, § 2º).

2.4.2.1 Competência Legislativa em Matéria Ambiental

É a capacidade de determinado ente federativo elaborar leis a respeito de

questões que envolvam o meio ambiente.

2.4.2.1.1 Competência Legislativa da União

Cabe à União legislar privativa e concorrentemente sobre o meio ambiente. Como

privativo podemos entender aquilo que seja próprio da pessoa, particular 50. Nesse

caso o art. 22 da Constituição, estabelece as competências legislativas privativas da

União ao prescrever em seus incisos quais os assuntos onde somente a União

poderá legislar. Entre eles, estão aqueles relacionados ao meio ambiente, a saber, o

inciso IV sobre águas, o XII ao se referir a jazidas, minas e outros recursos naturais

49
Pareto-eficiente é um conceito de economia desenvolvido pelo economista italiano
Vilfredo Pareto, que afirma que uma situação é ótima quando não pode ser melhorada
sem afetar outras condições.
50
Freitas, Vladimir Passos de. A Constituição Federal e a Efetividade das Normas
Ambientais. São Paulo, Editora Revista dos Tribunais, 2005, p. 55
30

e o inciso XXVI que trata de atividades nucleares de qualquer natureza. Essa

reserva, assegura Vladimir Passos de Freitas, é justificada por se tratarem de

hipóteses de interesse predominantemente nacional51.

2.4.2.1.2 Competência Legislativa dos Estados-mebros

A competência legislativa dos Estados está prevista no art. 24 da Carta

Constitucional que diz ser concorrente da União, Estados, Distrito Federal e

Municípios a competência para legislar sobre florestas, caça, pesca, fauna,

conservação da natureza, defesa do solo e dos recursos naturais, proteção do meio

ambiente e controle da poluição (inciso VI); proteção ao patrimônio histórico, cultural,

artístico, turístico e paisagístico (inciso VII); e responsabilidade por dano ao meio

ambiente, ao consumidor, a bens e direitos de valor artístico, estético, histórico,

turístico e paisagístico (inciso VII).

Importante observação faz Vladimir Passos de Freitas nesse ponto:

Nos §§ 1º ao 4º, o constituinte deixou explicito que, no âmbito da


legislação concorrente, cabe a União estabelecer normas gerais; que
esta competência não exclui a dos estados em caráter suplementar;
que inexistindo normas gerais da União, os Estados exercerão a
competência legislativa plena, para atender às suas peculiaridades; e
que a superveniência de lei federal sobre normas gerais suspende a
eficácia da lei estadual, no que lhe for contrária. 52

Podemos então concluir que a competência dos Estados não é própria, mas

concorrente, quando pertencer aos dois entes federais ou por exclusão, quando não

for privativa da União.

Importante salientar, também, a diferença entre competência supletiva e

complementar. Fala-se em competência complementar na hipótese do § 2º art. 24,

quando os Estados poderão pormenorizar aqueles princípios gerais estabelecidos

51
Freitas, Vladimir Passos de.Op. cit., p. 56
52
Freitas, Vladimir Passos de. Op. cit. p. 57
31

na legislação federal. Já a competência suplementar está prevista no § 3º do mesmo

artigo que garante aos Estados para, na ausência de lei geral da União, suprir a falta

dessas normas por meio de legislação estadual, a fim de atender suas necessidades

e particularidades regionais.

2.4.2.1.3 Competência Legislativa do Distrito Federal

Com a constituição Federal de 88 o Distrito Federal passou a ser pessoa política

tendo, assim, competência para legislar sobre determinados assuntos. Essa

capacidade é ampla, abrangendo as competências estaduais e municipais. Dessa

forma, cabe ao Distrito Federal legislar de forma concorrente com a União, como

previsto no art. 24 e também nas previsões de competências municipais previstas no

art. 30 do Texto Constitucional.

2.4.2.1.4 Competência Legislativa dos Municípios

A competência municipal para legislar é aquela prevista no art. 30 da

Constituição, e não aquela prevista no art. 23, que trata tão somente da competência

comum para atuar na proteção e preservação do meio ambiente.

Porém, é fonte de grande controvérsia na doutrina pátria.

Isso devido ao fato de que o legislador constituinte no inciso I do art. 30, embora

não se refina especificamente ao meio ambiente pode ser aplicado ao garantir

competência aos Municípios naqueles assuntos de interesse local.


32

Então duas correntes se formam, a primeira defende a tese de que o interesse

local não pode se sobrepor aos interesses de outros entes federativos, não podendo

o Município legislar sobre questões que extrapolem os seus interesses53.

Já o professor Paulo Affonso Leme Machado, ao citar Celso Bastos, Hely Lopes

Meireles e José Cretella Júnior, defende que o interesse local não se caracteriza

pela exclusividade, mas pela predominância, não podendo a União prejudicar o

direito dos munícipes a uma sadia qualidade de vida e ao meio ambiente

ecologicamente equilibrado ao procurar a proteção de um determinado ecossistema

ou procurar a vantagem em todo o território nacional. Se isso ocorrer, segundo o

doutrinador, tal diploma legal seria inconstitucional. 54

Assim, acreditamos que a competência do Município é concorrente com a da

União e dos estados prevalecendo sua legislação naquilo que for de seu

predominante interesse local respeitando-se sua autonomia e não contrapor

expressamente diploma legal que defina regras gerais sobre determinado assunto,

podendo ser mais restritiva que a norma geral, conforme seu interesse, mas não se

sobrepondo a tudo.

Segundo o Ministério do Meio Ambiente, em seu Roteiro Básico, o município

poderá legislar sobre meio ambiente no que se refere: a) licenciamento ambiental; b)

plano diretor do Município; c) lei de uso e ocupação do solo; d) código de obras; e)

código de posturas; f) legislação tributária municipal; e g) lei orçamentária

Municipal.55
53
Sobre essa posição ver: Ferreira Filho, Manoel Gonçalves. Comentários à Constituição
brasileira. Vol.2, p.218; Quintanilha, Ellen de Castro. Ensaio dobre competência do
município para legislar sobre meio ambiente. Boletim de Direito Municipal, p. 37 e Greco,
Leonardo. Competências constitucionais em matéria ambiental. RT, vol. 687, p. 30.
54
Leme Machado, Paulo Affonso. Direito Ambiental Brasileiro. Malheiros Editores, São
Paulo:2009, p. 31.
55
Brasil. Ministério do Meio Ambiente. Administração Municipal para o Meio Ambiente.
Roteiro Básico. p. 19.
33

2.4.2.2 Competência Material

Segundo Vladimir Passos de Freitas, a competência material é aquela que atribui

aos entes capacidade de fiscalizar e impor sanção em casos de descumprimento da

norma. E “é identificada pelo uso dos verbos ‘prover’, ‘editar’, ‘autorizar’, ‘promover’,

‘administrar’ e ‘organizar’”.56

O art. 23 da Constituição Federal elenca os casos de competência material

comum entre União, Estados, Distrito Federal e Municípios.

No referido art. 23, o constituinte atribuiu de forma comum a obrigação de

“proteger os documentos, as obras e outros bens de valor histórico, artístico e

cultural, os monumentos, as paisagens naturais notáveis e os sítios arqueológicos”

(inciso III); “impedir a evasão, a destruição e a descaracterização de obras de arte e

de outros bens de valor histórico, artístico ou cultural” (inciso IV); “proteger o meio

ambiente e combater a poluição em qualquer de suas formas” (inciso VI); bem como

“preservar as florestas, a fauna e a flora” (inciso VII).

2.4.2.2.1 Competência Material da União

A competência material da União está prevista no art. 21, incisos IX (elaborar e

executar planos nacionais e regionais de ordenação do território e de

desenvolvimento econômico e social), XIX (instituir sistema nacional de

gerenciamento de recursos hídricos e definir critérios de outorga de direitos de seu

uso) e o inciso XX (instituir diretrizes para o desenvolvimento urbano, inclusive

habitação, saneamento básico e transportes urbanos) da Constituição e pressupõe

56
Freitas, Vladimir Passos de. Op. cit. p. 70.
34

uma atividade do Poder Executivo e decisões governamentais além da utilização da

máquina pública57.

2.4.2.2.2 Competência Material dos Estados-membros

Ao definir explicitamente as competências da União e dos municípios, e delegar

aos estados somente a competência em matéria remanescentes, o constituinte

acabou por restringir o campo de atuação dos estados. A Constituição Federal nos

art. 25 define as atividades dos Estados-membros, sendo que o art. 26 define quais

bens a eles pertencem.

Porém, o art. 25, § 2º, reserva aos Estados o direito de exploração do gás

canalizado direta ou indiretamente por meio de concessão e a fiscalização da

atividade.

Não obstante as restrições impostas pela Constituição, os estados têm

competência para agir de forma administrativa, conforme decisão do STJ58 em que

manteve sanção imposta pelo Estado de São Paulo com base em legislação federal,

que assim decidiu:

EMENTA: Processual civil. Poluição. Meio Ambiente. Execução.


Extinção. Legitimidade ad causam.

Permitindo a Lei 6.938/81 a aplicação de multas por parte da


autoridade estadual, com base em legislação federal, patente a
legitimidade da Fazenda Pública para a causa.

2.4.2.2.3 Competência Material do Distrito Federal

Em nada inovou o constituinte sobre a competência material do Distrito Federal,

sendo que as considerações feitas sobre a competência legislativa são aqui também

57
Almeida, Fernanda Dias Menezes. Competências na Constituição de 1988. 2 a edição.
Atlas. São Paulo: 2000 p.91.
58
Superior Tribunal de Justiça, Recurso Especial 48.753-6/SP, relator Min. Américo Luz, j.
08.03.1995, DJ 17.04.1995.
35

válidas. Wladimir Passos de Freitas ressalta, no entanto, a importância histórica e

estética da Capital Federal.59

2.4.2.2.4 Competência Material dos Municípios

Como assegura José Afonso da Silva60, a competência municipal reside muito

mais “no âmbito da execução de leis protetivas do que no de legislar sobre o

assunto”, não sendo, porém, expressivas aquelas privativas ao município.

Porém, existem casos onde é possível exemplificar o interesse exclusivo de um

município, como na proteção do patrimônio histórico que poderá ser objeto de zelo e

fiscalização privativa de determinado município.61

2.4.2.2.5 Competência Material Comum.

No art. 23, o constituinte elencou exemplificadamente (números apertus) um rol

de competências comuns dos entes federativos, sem exceção.

Nesse artigo o constituinte utilizou vários verbos que representam ações típicas

da atividade material como zelar (inciso I), cuidar (inciso II), proteger (inciso III),

proporcionar (inciso V), preservar (inciso VII), fomentar (inciso VIII) e outros. São

comuns sem limites específicos e podem ser executadas em cooperação entre os

entes ou até mesmo de forma individualizada por meio de políticas públicas locais,

sendo que os incisos III, VI e VII são aqueles que fazem referencia ao meio

ambiente e nos interessa no presente trabalho.

É importante ressaltar, que nesse campo de competências comuns, pouco

importa quem é o titular ou o detentor do domínio do bem ou quem legislou a

59
Freitas, Wladimir Passos de. Op. cit. p. 72.
60
Silva, José Afonso da. Op. cit. p. 79.
61
Freitas, Wladimir Passos de. Op. cit. p. 72
36

respeito, sendo a competência material comum todos podem atuar na preservação

da flora e da fauna, proteger o patrimônio histórico e cultural ou combater a poluição.

O Parágrafo único do art. 23 da CF estabeleceu a possibilidade de Leis

complementares fixarem normas para a cooperação entre a União e os Estados, o

Distrito Federal e os Municípios, tendo em vista o equilíbrio do desenvolvimento e do

bem-estar em âmbito nacional.

2.5 A União

A União figura no pacto federativo como entidade autônoma ao lado de Estados,

Distrito Federal e Municípios, sendo pessoa jurídica de Direito Público Interno. Não

é, portanto, o conjunto dos demais entes federativos, como pode sugerir o uso do

designativo e não se confunde com o Estado Federal, esse sim, constituído pela

União, Estados e Municípios e Distrito Federal, detentor de soberania e pessoa

jurídica de Direito Internacional, podendo agir em nome próprio ou em nome de toda

a Federação quando se relaciona no plano internacional com outros Estados.62, 63

Esse mal entendido pode ser desfeito com a leitura do art. 18 do Constituição que

estabelece que a organização político-administrativa da República Federativa do

Brasil compreende a União, Estados, Distrito Federal e Municípios, todos

autônomos, nos termos da Constituição (grifo nosso).64

62
Moraes, Alexandre de.Curso de Direito Constitucional. São Paulo: Atlas, p. 269
63
“O Estado Federal – a República Fderativa do Brasil – é que é a pessoa jurídica de
Direito Internacional. Na verdade, quando se diz que a União é pessoa jurídica de Direito
Internacional, não se está dizendo bem, mas quer-se referir a duas coisas: (a) as relações
internacionais da República Federativa do Braisl realizam-se por intermédio de órgãos da
União, integram a competência desta, conforme dispõe o art. 21, incs. I a IV; (b) os
Estados federados não tem representação nem competência em matéria internacional,
nem são entidades reconhecidas pelo Direito Internacional, são simplesmente de direito
interno.”. Silva, José Afonso. P. 492 e 493.
64
Silva, José Afonso da. Op. Cit. p. 490-491
37

A Constituição, mantendo o conceito de descentralização e regionalização

permitiu à União a possibilidade da criação de Regiões de Desenvolvimento e ainda

os a criação de organismos regionais de desenvolvimento, como será comentado.

2.6 Os Estados-membros

Os Estados surgiram no ordenamento jurídico pátrio com a proclamação da

República e o surgimento da primeira Constituição republicana, mas desde a

colonização, com as feitorias e posteriormente com as capitanias hereditárias que

foram transformadas em províncias a idéia de unidades administrativas já estava

presente.

Com a adoção do regime federativo, os Estados-membros foram dotados de

autonomia política e administrativa, com a previsão, no art. 25 da Constituição

Federal65, da adoção de Constituições e legislação próprias, além de garantida a

representação própria no Senado Federal no art. 46.66

Essa autonomia caracteriza-se pela capacidade de auto-organização, capacidade

de legislar, autogoverno e auto-administração. Segundo Anna Cândida da Cunha

Ferraz, “a inexistência de qualquer desses elementos é suficiente para desfigurar a

unidade federada como tal”.67

2.6.1 Auto-organização

Como auto-organização entende-se a capacidade do Estado-membro criar um

subsistema jurídico por meio de uma Constituição própria, formadora da estrutura

65
Art. 25. Os Estados organizam-se e regem-se pelas Constituições e leis que adotarem,
observados os princípios desta Constituição.
66
Art. 46. O Senado Federal compõe-se de representantes dos Estados e do Distrito
Federal, eleitos segundo o princípio majoritário
67
Ferraz, Anna Cândida da Cunha. Poder Constituinte do Estado-membro. São Paulo:
Revista dos Tribunais, 1979, p. 54.
38

jurídica das unidades federadas, inserindo-se sua respectiva estrutura

organizacional, sempre respeitando os princípios e limites constitucionais federais,

que regulam a sua existência.68

Esse poder decorrente do Estado-membro não é originário, estando, portanto,

sujeito ao poder soberano mais alto e delimitado pela Constituição Federal, que

impõe aos constituintes estaduais a observância de limites, previstos no art. 34, VII

do Texto Constitucional.69 A inobservância desse dispositivo causará, portanto, a

intervenção federal no Estado-membro que, porventura, venha a desobedecer ao

ordenamento constitucional vigente.

Além disso, ensina Anna Cândida da Cunha Ferraz70 que a Constituição Estadual

deverá seguir os seguintes limites:

a) Princípios, explícitos ou não, que retratem o sistema constitucional do País,

como o principio republicano, a eletividade, a tripartição dos poderes, inclusive com

relação ao processo legislativo, direitos fundamentais e etc.;

b) Princípios relativos à Federação que se estendam aos estados-membros, a

exemplo de questões relativas a repartição de rendas, impostos estaduais,

autonomia municipal etc.;

68
Cf. José Afonso da Silva, Op. cit. p. 589 – 590; Alexandre de Moraes, Op. cit. p, 270; Luiz
Alberto David Araujo e Vidal Serrano Nunes Júnior, Op. cit. p. 205; Pedro Serrano, Op. cit.
p 82 e 83.
69
Art. 34. A União não intervirá nos Estados nem no Distrito Federal, exceto para: (...)VII -
assegurar a observância dos seguintes princípios constitucionais: a) forma republicana,
sistema representativo e regime democrático; b) direitos da pessoa humana; c)
autonomia municipal; d) prestação de contas da administração pública, direta e indireta.
e) aplicação do mínimo exigido da receita resultante de impostos estaduais,
compreendida a proveniente de transferências, na manutenção e desenvolvimento do
ensino e nas ações e serviços públicos de saúde.
70
Ferraz, Anna Cândida da Cunha. Op. cit. p. 134.
39

c) Preceitos específica e diretamente destinados aos Estados-membros, tais

quais os atinentes à organização do Poder Judiciário e do Ministério Público

estaduais, instituições de regiões metropolitanas etc.

Já José Afonso da Silva71, alerta para a controvérsia doutrinária a cerca da

natureza jurídica das Constituições estaduais, citando, por exemplo, Manoel

Gonçalves dos Santos que o chama de Poder Constituinte Decorrente, decorrendo

do originário, sendo, portanto, criação do Poder Constituinte Originário, que é a fonte

da Constituição e não sujeito a limites preexistentes. É, segundo o autor, a diferença

entre soberania e autonomia, não sendo possível, no entendimento dele, a outorga

da Constituição Estadual.

Em contra partida, Anna Cândida da Cunha Ferraz, argumenta que a outorga é

justificada no caso das constituições dos estados-membros. Segundo ela a outorga

“consiste no estabelecimento da constituição do estado-membro por declaração

unilateral do agente do Poder Constituinte” e que ela é “entregue ao Estado para ser

cumprida e observada pelo povo e pelos governantes”. Baseia sua tese no direito

comparado e no estudo histórico dos casos e exemplos de estados federados.

Completa:

Na base de tal outorga, todavia, há sempre um ato de outorga inicial,


provindo do Poder Central dado o caráter já salientado de poder de
segundo grau inerente ao Poder Constituinte Decorrente, a qual é
concebida ou com fundamento na própria Constituição Federal, ou
com base em ato do Poder Constituinte Originário. Tal ato de outorga
inicial – esse sim, compatível com o Estado Federal – pode ter maior
ou menor amplitude, condicionando em grau menor ou maior o
exercício do Poder Decorrente (grifo da autora).72

2.6.2 Autolegislação

71
Silva, José Afonso da. Op. cit. p. 590 – 591.
72
Ferraz, Anna Cândida da Cunha. Op. cit. p. 104.
40

Segundo José Afonso da Silva73, o principio da autolegislação, assim como o da

auto-organização está previsto no caput do art. 25 da Constituição Federal, segundo

o qual cada estado membro poderá, por meio de sua Assembléia Legislativa, adotar

suas leis observando-se os princípios e limites constitucionalmente definidos.

2.6.3 Autogoverno

Outra característica dos estados-membros é a capacidade de autogoverno,

revelada pela autonomia da escolha direta dos representantes dos poderes

executivos e legislativos e de possuírem autoridades próprias sem subordinação às

autoridades centrais e capacidade para exercer suas funções fundamentais, já que a

Constituição Federal prevê expressamente a existência dos poderes Legislativos

(art. 27) por meio das assembléias legislativas, do Executivo (art. 28) que é exercido

pelo Governador e do Judiciário (art. 125), por meio de cada Tribunal de Justiça.

A própria Carta Federal indica a eletividade do Governador e do Vice-Governador,

bem como dos representantes do Poder Legislativo e estabelece regras para sua

composição, e, da mesma forma, determina as diretrizes da organização judiciária.

2.6.4 Auto-Administração

Por fim, a auto-administração é o exercício das competências administrativas

asseguradas pela Constituição, especialmente aquelas do art. 25, § 1º, para que o

estado-membro possa gerir seu orçamento e exercer seu poder de polícia dentro de

seu território sem interferência ou subordinação em relação a outros entes

federativos, em especial a União.74

73
Silva, José Afonso da. Op. cit. p. 589
74
Cf. José Afonso da Silva, Op. cit. p. 590; Alexandre de Moraes, Op. cit. p. 273; Pedro
Estevam Alves Pinto Serrano, Op. cit. p. 83-84.
41

Dentro dessa capacidade de auto-administração, o constituinte garantiu o direito

de que os estados-membros possam, por meio de Lei complementar estadual de

iniciativa do governador do estado, criar regiões metropolitanas, aglomerações

urbanas e microregiões.75

2.7 Municípios

O município é, nas palavras de Pedro Estevam Alves Pinto Serrano, “a

organização política primária e nuclear ocorrida no processo histórico de evolução

da sociedade humana”.76

Na prática, é no município que o cidadão vive e é nele que enfrenta seus

problemas e dificuldades, sendo, “entidade política, de existência prevista como

necessária, com autonomia e competência rigidamente estabelecida”.77

No Brasil colonial e imperial os municípios tiveram lugar de destaque na

organização político-administrativa, sendo que, com a proclamação da república e a

Constituição de 1891 houve uma reversão desse cenário, pois excluiu as

competências dos municípios para fortalecer os estados-membros, já que naquele

momento foi implantado o Federalismo como união de estados, até então chamados

de províncias.
75
Art. 25, § 3º - “Os Estados poderão, mediante lei complementar, instituir regiões
metropolitanas, aglomerações urbanas e microrregiões, constituídas por agrupamentos
de municípios limítrofes, para integrar a organização, o planejamento e a execução de
funções públicas de interesse comum.”
76
Serrano, Pedro E. A. Pinto. Op. cit. p. 88.
77
Ferreira Filho, Manoel Gonçalves. Curso de Direito Constitucional. São Paulo: Saraiva,
2001, p. 68
42

Desde então, essa situação – de maior ou menos autonomia – alterou conforme o

viés político do governo central, sendo que em momentos de maior democracia

aumentou a autonomia dos municípios, diminuindo nos momentos de autoritarismo e

centralização do poder no governo central.

O atual Texto Constitucional inovou ao elevar os Municípios à categoria de

entidade federativa indispensável ao sistema federativo, garantindo plena

autonomia, não sendo conhecida, nas palavras de Paulo Bonavides78, nenhuma

“forma de união federativa contemporânea onde o princípio da autonomia municipal

tenha alcançado grau de caracterização política e jurídica tão alto e expressivo”

como o previsto no nosso ordenamento constitucional e “o mais considerável avanço

de proteção e abrangência já recebido por esse instituto em todas as épocas

constitucionais de nossa história”.

A base constitucional positiva desse entendimento encontra-se na conjunção dos

arts. 1º, 18, 29, 30 e 34, VII, c, formando a pedra angular da autonomia municipal

com uma segurança nunca antes experimentada pelos legisladores constituintes,

inclusive determinando ao poder constituinte decorrente a garantia da autonomia

municipal (art. 34, VII, c), sendo que a inobservância desse preceito implica em

intervenção federal no respectivo estado-membro, tal a importância que foi

reservada pelo constituinte originário aos municípios.

Além de sua autonomia, Manoel Pacheco Ferreira Filho79, destaca que a

Constituição vigente garante aos municípios competências da mesma forma prevista

à União, podendo, inclusive, impor-se ao ordenamento federal dentro de sua esfera,

78
Bonavides, Paulo. Curso de Direito Constitucional. São Paulo: Malheiros, 2000, p. 311 e
314.
79
Ferreira Filho, Manoel Gonçalves. Op. cit. p. 68
43

envolvendo ai, competências legislativas e administrativas e que aos estados-

membros restou a competência remanescente.

Celso Ribeiro Bastos define município como “pessoa jurídica de direito público

interno, dotado de autonomia assegurada na capacidade de autogoverno e da

administração própria”.80

Assim como os estados, a autonomia municipal caracteriza-se pela capacidade

de auto-organização e legislação própria, autogoverno e auto-administração.

José Afonso da Silva81, ao comentar a autonomia municipal define autonomia

como “capacidade ou poder de gerir os próprios negócios, dentro de um círculo

prefixado por entidade superior” e que a autonomia se resume em quatro

capacidades:

a) Capacidade de auto-organização, mediante a elaboração de lei

orgânica própria;

b) Capacidade de autogoverno, pela eletividade do Prefeito e do

Vereadores às respectivas Câmaras Municipais;

c) Capacidade normativa própria, ou capacidade de autolegislação,

mediante a competência de elaboração de leis municipais sobre áreas

que são reservadas à sua competência exclusiva e suplementar;

d) Capacidade de auto-administração (administração própria, para manter

e prestar os serviços de interesse local.

2.7.1 Lei Orgânica Municipal

80
Bastos, Celso Ribeiro. Curso de Direito Constitucional. São Paulo: Saraiva, 2000, p. 311.
81
Silva, José Afonso. Op. cit. p. 620, 621.
44

O legislador Constituinte originário garantiu aos municípios a capacidade de se

auto-organizar por meio de uma lei orgânica municipal. É nela que o legislador

municipal irá exercer sua competência constitucionalmente definida, exclusiva ou

complementar, de acordo com o interesse local e observando-se os limites impostos

na Constituição Federal.

Nas palavras de Pedro Estevam Alves Pinto Serrano pode-se definir a lei orgânica

como

o meio pelo qual o município funda seu próprio subsistema jurídico,


organizando-se como pessoa política de Direito Píblico, sendo
vetada a produçõ de normas em seu interior contrárias à Constituição
Federal e Estadual e sobre matérias de competência legislativa
exclusiva da união ou do Estado-membro.82

Para José Afonso da Silva83 é espécie de constituição municipal.

Porém, acreditamos ter a lei orgânica, verdadeira natureza de constituição

municipal. Constituição é um simplesmente um nome, mas é a pedra angular onde o

restante do sistema jurídico encontra seu fundamento de validade. Nesse sentido

nos alinhamos àqueles que acreditam ser a lei orgânica verdadeiramente uma

constituição municipal84.

2.8 Distrito Federal

Garantido pela constituição como ente federativo, o Distrito Federal, goza, como

os outros entes da tríplice capacidade de auto-organização, autogoverno e auto-

administração, sendo vedada, no entanto, a sua divisão em municípios. Dessa

forma, embora não seja um Estado-membro ou um Município, tem as mesmas

competências legislativas e tributárias destes entes federativos, excetuando-se a de

82
Serrano, Pedro Estevam Alves Pinto. Op. cit. p. 117.
83
Silva, José Afonso. Op. cit. p. 622.
84
Cf. Regina Maria acedo Nery. Direito Municipal. São Paulo: Revista dos tribunais, 2005,
p. 88 e, Pedro Estevam Alves Pinto Serrano. Op. cit. p. 118
45

organização do Poder Judiciário, do Ministério Público e da Defensoria Pública do

Distrito Federal e dos Territórios que é de competência exclusiva da União, por força

do art. 22, XVII.85

Se auto-organizará por meio de lei orgânica aprovada pela Câmara Legislativa

que a promulgará observando-se, como no caso dos estados-membros e dos

eunicípios, os limites e princípios estabelecidos no Texto Federal e terá capacidade

de autolegislação dentro da capacidade legislativa equiparada à de estados e

municípios.

Seu governo será exercido pelo Governador, eleito diretamente pelo povo,

observando-se o previsto no art. 77 da Constituição Federal, da mesma forma

ocorrendo para os Deputados Distritais, sendo que compete privativamente à União

organizar e manter o Poder Judiciário o que afeta, parcialmente, a sua autonomia.86

Também sua capacidade de auto-administração compreende a possibilidade do

DF de exercer suas competências administrativas, legislativas e tributárias

constitucionalmente previstas sem qualquer interferência da União ou de outros

entes federativos.

2.9 Territórios

O estudo dos Territórios, previstos na Constituição Federal no art. 18, § 2º, é

irrelevante para o presente estudo por dois motivos: a) não integram o pacto

federativo, isto é não são entes federativos e b) não existe atualmente nenhum

território, sendo que aqueles que existiam à época da promulgação da Constituição

foram elevados à categoria de Estados-membros.


85
Art. 22. Compete privativamente à União legislar sobre: XVII - organização judiciária, do
Ministério Público e da Defensoria Pública do Distrito Federal e dos Territórios, bem como
organização administrativa destes
86
Moraes, Alexandre de. Op. cit. p. 281.
46

2.10 Outras Previsões de Descentralização e Desenvolvimento

Além das unidades autônomas (União, Estados, Distrito Federal e Municípios), a

Constituição Federal em seu art. 4387, possibilitou a criação, pela União, de regiões

de desenvolvimento, com base em um complexo geoeconômico e social com o

intuito de erradicar as desigualdades regionais.

Trata-se de outra inovação na história constitucional brasileira, visto que embora

tímida, é a primeira previsão constitucional das regiões de desenvolvimento.

Na visão de Paulo Bonavides88, a adoção das regiões de desenvolvimento pelo

constituinte originário de 1988 é verdadeiro “sopro renovador na comunhão dos

seres autônomos que compõem a organização político-administrativa propriamente

dita do Estado brasileiro”, sendo indicativo de uma nova instância federativa.

Porém, atualmente, tal arranjo será meramente administrativo e não conta com

autonomia ou competências legislativas, ao contrário do que acontece com os entes

federativos.

No entanto, são importantes ferramentas para o desenvolvimento regional em um

país de vasto território e de desigualdades latentes.

Da mesma forma, no art. 174, § 1º, o constituinte estabeleceu, por meio de lei, o

planejamento regional como ferramenta de desenvolvimento.89

87
Art. 43. Para efeitos administrativos, a União poderá articular sua ação em um mesmo
complexo geoeconômico e social, visando a seu desenvolvimento e à redução das
desigualdades regionais
88
Bonavides, Paulo. Op. cit. p.324.
89
Art. 174. Como agente normativo e regulador da atividade econômica, o Estado
exercerá, na forma da lei, as funções de fiscalização, incentivo e planejamento, sendo
este determinante para o setor público e indicativo para o setor privado. § 1º - A lei
estabelecerá as diretrizes e bases do planejamento do desenvolvimento nacional
equilibrado, o qual incorporará e compatibilizará os planos nacionais e regionais de
desenvolvimento.
47

Essas regiões não estão limitadas territorialmente a um único estado, podendo

abranger vários estados, no todo ou em parte. Essas entidades não restringem, de

forma alguma, a autonomia dos estados-membros ou dos municípios.

As agências que auxiliam o desenvolvimento regional são a SUDENE

(Superintendência de Desenvolvimento do Nordeste)90 e a SUDAM

(Superintendência de Desenvolvimento da Amazônia)91, SUFRAMA

(Superintendência da Zona Franca de Manaus)92 e SUDECO (superintendência de

Desenvolvimento do Centro-Oeste)93

Além das Regiões de Desenvolvimento, o constituinte previu a criação das

Regiões Metropolitanas, aglomerações urbanas e microrregiões conforme o disposto

no art. 25, § 3º, como veremos adiante.

90
Superintendência de Desenvolvimento do Nordeste, criada pela Lei Complementar nº
125, de 03/01/2007.
91
Superintendência de Desenvolvimento da Amazônia, criada pela Lei Complementar
N°124, de 3/01/ 2007.
92
Superintendência da Zona Franca de Manaus, criada pelo Decreto-lei n° 288 de
28/02/1967.
93
Superintendência de Desenvolvimento do Centro-Oeste, criada pela lei n° 5.365 de
1/12/1967.
48

3 Regiões Metropolitanas

3.1 Conceito

A criação de Regiões Metropolitanas foi a forma que a Constituição Federal de

1988 encontrou para enfrentar os problemas advindos da alta concentração urbana

e o crescimento desenfreado das cidades, prosseguindo no processo em busca de

descentralização (política e administrativa), desenvolvimento e equilíbrio regional

que o constituinte originário previu com a criação das regiões de desenvolvimento

previstas nos artigos 43 e 174, § 1º da Constituição Federal.

Com o surgimento de núcleos urbanos decorrente da crescente industrialização e

o chamado êxodo rural, trabalhadores deixaram o campo para se fixar em

residências urbanas e buscar trabalho naquelas urbes. Isso ocorreu de forma

desequilibrada, gerando ocupação desordenada e transformações do solo urbano

provenientes da abrupta intervenção humana.


49

A busca pela proximidade de centros econômicos e produtivos mais dinâmicos fez

com que o entorno desses núcleos urbanos fossem se agregando, formando

grandes aglomerados urbanos. Gerou-se um único e grande ajuntamento urbano

desrespeitando limites geográficos ou divisões político-administrativas. Esse

fenômeno gerou conurbações94 de diferentes dimensões redundando nas atuais

Regiões Metropolitanas, embora aquela não seja essencial para a criação destas.

Contudo, mesmo municípios conurbados podem integrar a mesma Região

Metropolitana.

Para Pedro Estevam Alves Pinto Serrano

Com o passar dos anos as regiões urbanas passaram a ser mais


populosas que as áreas agrícolas, em que a migração em busca de
melhores oportunidades econômicas, empregos e meios de
subsistência retiraram as pessoas do campo e causaram um colapso
no sistema urbano [...]. Esse acumulo de pessoas e o crescimento
das áreas urbanas foram o propulsor natural para a formação das
chamadas áreas conurbadas ou Regiões Metropolitanas em sua
acepção urbanística.(grifo nosso)95

Segundo Maurício Cadaval e Alexandre Gomide,

metropolização é o processo de expansão urbana caracterizado pela


intensificação dos fluxos econômicos e sociais e dos vínculos
culturais entre cidades vizinhas, que desenvolvem relações mais ou
menos intensas de interdependência.96

Para Eros Grau, região metropolitana é

o conjunto territorial intensamente urbanizado, com marcante


densidade demográfica, que constitui um pólo de atividade
econômica, apresentando uma estrutura própria definida por funções
privadas e fluxos peculiares, formando, em razão disso, uma mesma
comunidade socio-econômica em que as necessidades específicas

94
Essa expressão foi criada por Patrik Geddes em 1915 para definir a cidade de Londres e
as cidades que a cercavam no livro Cities in evolution. Ver Eros Roberto Grau, Regiões
Metropolitanas. São Paulo: Buhatsky, 1974, p. 14.
95
Serrano, Pedro Estevam Alves Pinto. Região Metropolitana e seu regime constitucional.
São Paulo: Editora Verbatim, 2009, p. 127-128.
96
Cadava, Maurício E. Guimarães e Gomide, Alexandre. Mobilidade urbana em regiões
metropolitanas. In: Fonseca, Rinaldo B, Dananzo, Áurea e Negreiros, Rovena (orgs.). Livro
verde: desafios para a Região Metropolitana de Campinas. Campinas: Uicamp/IE/Nesur,
2002.
50

somente podem ser, de modo satisfatório, atendidas através de


funções governamentais coordenada e planejadamente
exercitadas.97

Já José Afonso da Silva define região metropolitana como um “conjunto de

municípios cujas sedes se unem com certa continuidade urbana em torno de um

município-pólo”. 98

Na maioria das vezes essas regiões apresentam um município central, ao redor

do qual gravitam os demais municípios circundantes, motivados pela intensidade

econômica e social desenvolvida naquele pólo de atração. O município central, em

regra, torna-se a sede da Região Metropolitana.

Conforme Hely Lopes Meirelles99, as regiões metropolitanas são adotadas em

várias partes do mundo para a solução de problemas urbanos e interurbanos de

grandes cidades do mundo, como é o caso de Paris, Los Angeles, São Francisco,

Toronto, Londres e Nova Délhi e pode ser resumida como a delimitação de uma

zona de influência da metrópole, sob uma única administração, que planeje de forma

integrada e conjunta serviços, obras e atividades que sejam de comum interesse

para que as necessidades da população sejam plenamente atendidas.

O autor continua e afirma que a região metropolitana “não se erige em entidade

estatal intermediária entre o Estado e os Municípios”, pois o arranjo federativo

escolhido pelo legislador constituinte não comporta uma nova entidade política.100

Cabe ressaltar, que embora envolva necessariamente mais de um município, a

instituição da região metropolitana não pode, de forma alguma, ferir a autonomia

97
Eros Roberto Grau. Op. cit. p.25-26.
98
Silva, José Afonso. Curso de Direito Constitucional Positivo. São Paulo: Malheiros, 2002,
p. 645.
99
Meirelles, Hely Lopes. Direito Municipal Brasileiro. São Paulo: Malheiros, 2001, p.82-83.
100
Meirelles, Hely Lopes. Direito Municipal Brasileiro. São Paulo: Malheiros, 2001, p.83.
51

municipal, sob pena de interferir nas competências, legislativas ou materiais, desse

ente federativo, o que seria notadamente inconstitucional.

Nas palavras de Regina Maria Macedo Nery Ferrari101:

é essencial que a implantação da Região Metropolitana não venha a


obstaculizar a atuação estadual ou municipal e que não aniquile a
autonomia dos Municípios pela absorção de atividades de seu
interesse local. [...] Desta forma, à Região Metropolitana podem ser
atribuídos poderes administrativos e financeiros capazes de permitir
o planejamento e a execução de obras e serviços de sua
competência.

Esse novo conceito imposto pela atual Constituição prevê além da cooperação, a

coordenação entre os entes federados envolvidos no planejamento e execução das

funções estatais de interesse comum dos Estados e dos Municípios que fazem parte

das Regiões Metropolitanas.

Não há sentido, como bem observou Pedro Estevam Alves Pinto Serrano, em

acreditar que a Constituição tenha, de alguma forma, subtraído ou diminuído a

autonomia municipal e sua competência em favor dos estados membros (trata-se,

portanto, de dois entes federados e sem hierarquia entre si), por ato de inteira

discricionaridade legislativa dos Estados-membros.

Entendimento diverso tem Alaôr Caffé Aleves sobre o tema. Segundo ele, a

instituição da região metropolitana por lei complementar “define os limites da

autonomia municipal no âmbito urbano regional metropolitano”. Diz que as funções

públicas de interesse comum da região metropolitana não são de exclusiva

competência local e não são da mesma forma, de exclusiva competência do Estado.

101
Ferrari, Regina Maria Macedo Nery. Direito Municipal. São Paulo: Revista dos Tribunais,
2005, p. 94.
52

Complementa: “o que não é do Município nem da união, é do Estado em razão da

competência residual (sic) deste”.102

Atualmente existem no país 40 aglomerações urbanas divididas entre regiões

metropolitanas, regiões integradas de desenvolvimento, colar metropolitano, área de

expansão metropolitana e núcleos metropolitanos, envolvendo 482 municípios que

em 2004 representavam 106 milhões de habitantes ou cerca de 58% da população

brasileira e o PIB (produto interno bruto) de R$ 1,139 bilhões e o PIB per capita de

R$ 10.713,63.103

3.2 Histórico

A Constituição Federal de 1937 previa em seu art. 29 a possibilidade de que

municípios se organizassem para a formação de aglomerados com o intuito de

melhorar a prestação de serviços:

Art. 29 – Os municípios de mesma região podem agrupar-se para a


instalação, exploração e administração de serviços públicos comuns.
O agrupamento, assim constituído, será dotado de personalidade
jurídica para seus fins

Páragrafo único – Caberá aos estados regular as condições em que


tais agrupamentos poderão constituir-se, bem como a forma de sua
administração.

Sem dúvida, trata-se de uma embrião das regiões metropolitanas tais quais

conhecemos hoje, porém essa possibilidade constitucional nunca chegou a se

efetivarem na prática, uma vez que o período político vivido no país à época não

permitiu tal arranjo entre os municípios, visto que os interesses ditatoriais acabavam

102
Alves, Alaôr Caffé. Regioes Metropolitanas, Aglomerações urbanas e Microrregiões:
novas dimensões constitucionais da organização do Estado brasileiro, p. 18-19.
103
Fonte: Governo do Estado de São Paulo. Secretaria de Estado dos Transportes
Metropolitanos. Regiões Metropolitanas do Estado de São Paulo. 2008, p.29.
53

por centralizar o poder e oprimiam os avanços constitucionais de autonomia

municipal ou de descentralização política e administrativa.104

Sendo que a constituição do regime seguinte, de 1946 não fez qualquer

referência em seu texto acerca da possibilidade de agrupamento de municípios com

o intuito de possibilitar e organizar seu desenvolvimento.

No direito pátrio as regiões metropolitanas surgiram, tais quais as conhecemos

hoje, na Constituição de 1967 que facultou a União sua instituição por meio de lei

complementar no art. 157, §10.105

A Emenda nº 848, do Senador Eurico Rezende, foi a responsável pela introdução

no texto da Carta Constitucional de 1967 do conceito metropolitano, pois já naquela

época representava uma realidade urbanística que não poderia ser ignorada pelos

administradores

(...) nem omitidas no planejamento regional. Por regiões


metropolitanas entendem-se aqueles Municípios que gravitam em
torno da grande cidade, formando com esta uma unidade sócio-
econômica, com recíprocas implicações nos seus serviços urbanos e
interurbanos. Assim sendo, tais serviços deixam de ser de exclusivo
interesse local, por vinculados estarem a toda a comunidade
metropolitana. Passam a constituir a tessitura intermunicipal
daquelas localidades, e, por isso mesmo, devem ser planejadas e
executadas em conjunto por uma administração unificada e
autônoma, mantida por todos os municípios da região, na
proporcionalidade de seus recursos, e se estes forem insuficientes,
hão de ser contemplados pelo Estado e até mesmo pela União,
porque os benefícios também se estendem aos governos estaduais e
federal. Eis por que a Emenda propõe o reconhecimento
constitucional dessa realidade, possibilitando a unificação dos
serviços intermunicipais de regiões metropolitanas, subvenção
estadual e federal, se necessário, para o pleno atendimento da
imensa população que se concentra nessas regiões.106

104
Cf. Pedro Estevam Alves Pinto Serrano. Op. cit. p. 131.
105
Art. 157, § 10: A União, mediante lei complementar, poder á estabelecer regiões
metropolitanas, constituídas por Municípios que, independentemente de sua vinculação
administrativa, integrem a mesma comunidade sócio-econômica, visando à realização de
serviços de interesse comum.
106
Toshio Mukai. O regime Jurídico Municipal e as Regiões Metropolitanas. São Paulo:
Sugestões Literárias, 1976, p. 75-76.
54

Já a Emenda Constitucional nº 1 de 1969 trata do assunto no art. 164, mantendo

a redação de 67.

Podemos observar da leitura dos dispositivos constitucionais que o constituinte do

período autoritário ainda empreendeu um viés centralizador ao definir que a

instituição das regiões seria feita pelo poder central, isto é, pela União, sem

participação dos estados-membros ou municípios envolvidos, restringindo o campo

de atuação apenas a realização de serviços de interesse comum.

Porém, somente em 1973, com a Lei Complementar nº 14 de 18 de junho daquele

ano foram criadas as primeiras regiões metropolitanas com base no texto

constitucional, quais sejam São Paulo, Belo Horizonte, Porto Alegre, Recife,

Salvador, Curitiba e Fortaleza.

Em 1º de julho de 1974, por meio da lei complementar nº 20 foi criada a Região

Metropolitana do Rio de Janeiro após a fusão dos estados da Guanabara e do Rio

de Janeiro.

E em 3 de novembro de 1975 a Lei Complementar nº 27 alterou a redação do art.

2º da Lei Complementar nº 14 de 73.

Através desse conjunto de leis foi estabelecido um formato de gestão por meio de

dois Conselhos: um Deliberativo e outro Consultivo.

A composição adotada pela legislação federal para todas as regiões

metropolitanas do território nacional traduziu uma presença hegemônica dos

poderes executivos estaduais na gestão das regiões metropolitanas. No caso do

Conselho Deliberativo foi determinada uma composição de seis membros,

nomeados pelo governador do estado, devendo um deles, ser indicado a partir de


55

lista tríplice organizada pelo prefeito da capital do estado e outro, pelos demais

municípios integrantes da unidade metropolitana, de forma que o estado era

representado por quatro membros, num total de seis, sendo os dois restantes um

representante da capital do estado e o outro um representante dos municípios.

O outro Conselho, por ser de natureza consultiva tinha o poder de decisão

extremamente reduzido em face do Conselho Deliberativo, e era composto pelos

prefeitos, ou um representante, de cada um dos municípios contemplados na

circunscrição da região, sob a direção do presidente do Conselho Deliberativo.

Esse modelo de gestão definido pelo legislador federal logo foi taxado de

centralizador e pouco representativo das realidades locais, pela dependência da

criação das unidades por meio de lei complementar federal e pela hegemonia dos

executivos estaduais na gestão.

A adoção desse modelo ensejou sérias dificuldades na vinculação entre as

decisões dos Conselhos Deliberativos e as orientações dos Consultivos.

Até o advento da Constituição de 1988, esse foi o arcabouço jurídico basilar das

regiões metropolitanas no ordenamento jurídico pátrio. Não se pode negar que era,

sim, um sistema metropolitano centralizado e representava o momento político de

exceção pelo qual o Pais passava, com profundo retrocesso na democracia e com

um viés claramente centralizador dos processos de tomada de decisões.

3.3 Regiões Metropolitanas na Constituição Federal de 1988

Com o enfraquecimento do período militar uma nova tendência político-

administrativa passou a vigorar no Estado brasileiro. Essa tendência foi consolidada

com a promulgação da Constituição Federal de 1988, que inovou em vários


56

aspectos, inclusive ao instituir um novo paradigma para as regiões metropolitanas,

inaugurando, nas palavras de Alaôr Caffé Alves107, o novo Texto “inaugura uma nova

e significativa dimensão do nosso federalismo de integração”, sendo que o

constituinte deu um tratamento “profundamente diferenciado”. O constituinte

reconheceu o Federalismo Cooperativo, sendo que as regiões metropolitanas é um

exemplo dessa cooperação entre os níveis de poder num mesmo espaço territorial.

A primeira e sintomática alteração no tratamento dado às regiões metropolitanas

foi a transferência de sua previsão do campo da “Ordem Econômica” para o § 3º, do

art. 25 no Título III, relativo à organização político-administrativo do Estado.

Aparentemente simples, essa mudança representa um novo paradigma na

organização e na gestão das regiões metropolitanas e vem na esteira de uma

profunda alteração na organização federativa, com a inclusão dos municípios no rol

dos entes federativos (e sua conseqüente autonomia) e na descentralização

administrativa com a adoção das regiões de desenvolvimento e o novo conceito de

metropolização.

Assim, o texto constitucional confere aos estados-membros a competência para a

criação das regiões metropolitanas com a seguinte redação:

Art. 25. § 3º - Os Estados poderão, mediante lei complementar,


instituir regiões metropolitanas, aglomerações urbanas e
microrregiões, constituídas por agrupamentos de Municípios
limítrofes, para integrar a organização, o planejamento e a execução
de funções públicas de interesse comum.

Essa nova redação trouxe substanciais inovações. Se por um lado, fez do estado-

membro o titular da criação, mediante a elaboração de lei complementar, das

unidades regionais (regiões metropolitanas, aglomerações urbanas e microrregiões),


107
Alves, Alaôr Caffé. Regiões Metropolitanas, Aglomerações Urbanas e Microrregiões:
novas dimensões constitucionais da organização do Estado brasileiro. In Temas de Direito
Ambiental e Urbanístico. São Paulo: Max Limonad, p. 13.
57

respondendo às criticas de excesso de centralização do estatuto anterior, por outro,

ampliou o número de figuras correspondentes às unidades regionais, formalizando

as categorias das aglomerações urbanas e microrregiões.

Essa inovação mostrou-se, ainda, de grande utilidade e pioneirismo, no sentido

de possibilitar a organização regional em qualquer parte do país, sem a necessidade

do uso obrigatório da região metropolitana, o que acabaria por se constituir num

bloqueio ao desenvolvimento regional e a busca da igualdade com que o constituinte

de 1988 norteou seus trabalhos, por meio da adoção de microrregiões e

aglomerações urbanas, de acordo com o interesse do estado-membro.

Ao adotar essa nova redação e criar novas categorias de organização regional

além das regiões metropolitanas, foi possível a qualificação dentro desta categoria

apenas daquelas regiões realmente dotadas de funções e estruturação claramente

metropolitanas. Sendo que as demais podem ser enquadradas em outras categorias

de acordo com a vontade do legislador estadual.

Esse foi o entendimento, por exemplo, do constituinte estadual do Ceará 108, que

além de diferenciar os processos de descentralização109 e integração regional, que

realiza-se com a aglutinação de municípios limítrofes com as seguintes

discriminações:

a) Região metropolitana: formada pelos Municípios de Fortaleza (capital do

estado) e adjacentes que sejam atingidos pela conurbação;

b) Microrregiões: formadas pelos municípios que tenham em comum

peculiaridades fisiográficas e sócio-culturais;


108
Cf. Silva, José Afonso. Direito ambiental Urbanístico. São Paulo: Malheiros, 2008, p.
158.
109
Como descentralização o constituinte entendeu a individualidade do Município, com
sua auto-organização e autogoverno.
58

c) Aglomerados urbanos: definidos como agrupamentos de municípios limítrofes

que possuam função pública de interesse comum.

O Texto Federal substituiu, ainda, a figura da finalidade a que se destina a

organização regional, ampliando-a e conferindo-lhe maior rigor conceitual na

formulação: para integrar a organização, o planejamento e a execução de funções

públicas de interesse comum.

Como a Constituição Federal outorgou o direito de instituição das regiões

metropolitanas aos estados-membros por meio de lei complementar estadual e não

conferiu a elas a categorização de ente federativo, sendo, portanto, uma forma de

descentralização meramente administrativa, e não política, existe um problema

quanto à sua natureza jurídica e a autonomia municipal.

Ainda, Caffé Alves, defende que a autonomia dos municípios metropolitanos é

prejudicada pela criação da região metropolitana, por lei complementar estadual,

fundamentada nas Constituições – estadual e federal.

Segundo seu escólio, a compulsoriedade da relação regional, imposta aos

municípios pela própria lei complementar que cria a região metropolitana,

prejudicaria sua autonomia, que em suas palavras os Municípios “podem negar-se a

participar da gestão das funções ou serviços regionais, mas terão de suportar as

intervenções indispensáveis ao seu provimento, em prol do interesse regional”.110

Nesse sentido, o Supremo Tribunal Federal, declarou inconstitucional dispositivo

da Constituição do Estado do Espírito Santo que previa consulta plebiscitária para a

inclusão de Municípios nas Regiões Metropolitanas do Estado, retirando uma

competência que foi atribuída ao Estado por mandamento constitucional.

110
Alves, Alaôr Caffé. Op. Cit. p. 25
59

EMENTA: - AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. 2.


CONSTITUIÇÃO DO ESTADO DO ESPÍRITO SANTO, ART. 216,
§1º. CONSULTA PRÉVIA, MEDIANTE PLEBISCITO, ÀS
POPULAÇÕES DIRETAMENTE INTERESSADAS, PARA CRIAÇÃO
DE REGIÕES METROPOLITANAS E AGLOMERAÇÕES URBANAS.
3. IMPUGNAÇÃO EM FACE DO ART. 25, § 3º, DA CONSTITUIÇÃO
FEDERAL. PREVISÃO DE PLEBISCITO, PARA INTEIRAR-SE O
PROCESSO LEGISLATIVO ESTADUAL, EM SE TRATANDO DE
CRIAÇÃO OU FUSÃO DE MUNICÍPIOS, "UT" ART. 18, § 4º, DA LEI
MAGNA FEDERAL, NÃO, PORÉM, QUANDO SE CUIDA DA
CRIAÇÃO DE REGIÕES METROPOLITANAS. 4. RELEVÂNCIA
DOS FUNDAMENTOS DA INICIAL E "PERICULUM EM MORA"
CARACTERIZADOS. CAUTELAR DEFERIDA, PARA SUSPENDER,
"EX NUNC", A VIGÊNCIA DO PARÁGRAFO § 1º DO ART. 216, DA
CONSTITUIÇÃO DO ESTADO DO ESPÍRITO SANTO. 5. AÇÃO
DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE PROCEDENTE.
DECLARADA A INCONSTITUCIONALIDADE DO § 1º DO ART. 216,
DA CONSTITUIÇÃO DO ESTADO DO ESPÍRITO SANTO. (ADI 796.
RELATOR(A): MIN. NÉRI DA SILVEIRA, JULGAMENTO:
02/02/1998 . ÓRGÃO JULGADOR: TRIBUNAL PLENO.
PUBLICAÇÃO DJ 17-12-1999 PP-00002).

Ora, se o Texto Magno não previu qualquer tipo de consulta aos municípios ou

às populações envolvidas, delegando ao legislador complementar estadual a

competência para criar as regiões metropolitanas e definir quais municípios

integrariam as respectivas regiões, não poderia o constituinte derivado estadual

modificar seu conteúdo.

O mesmo Supremo Tribunal Federal conferiu legitimidade para que a Assembléia

Legislativa para incluir municípios na lei complementar estadual que irá criar a região

metropolitana e definir deles farão parte ou não da unidade regional.

EMENTA: AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. REGIÃO


METROPOLITANA. INTERESSES COMUNS. PODER
LEGISLATIVO ESTADUAL. LEGITIMIDADE. MUNICÍPIOS
LIMÍTROFES. LEI COMPLEMENTAR. VÍCIO FORMAL E MATERIAL
NA LEI. INEXISTÊNCIA. INOBSERVÂNCIA AO ARTIGO 63 DA
CONSTITUIÇÃO FEDERAL. ALEGAÇÃO IMPROCEDENTE. 1.
REGIÃO METROPOLITANA. MUNICÍPIOS LIMÍTROFES.
OBSERVÂNCIA DO DISPOSTO NO ARTIGO 25, § 3O, DA CARTA
FEDERAL, QUE FACULTA AO ESTADO-MEMBRO CRIAR
REGIÕES ADMINISTRATIVAS COMPOSTAS DE MUNICÍPIOS
LIMÍTROFES, DESTINADAS A REGULAR E EXECUTAR
FUNÇÕES E SERVIÇOS PÚBLICOS DE INTERESSES COMUNS.
60

2. CRIAÇÃO DE REGIÕES METROPOLITANAS. EXIGÊNCIA DE


LEI COMPLEMENTAR ESTADUAL. INCLUSÃO DE MUNICÍPIO
LIMÍTROFE POR ATO DA ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA.
LEGITIMIDADE. CONSTITUI-SE A REGIÃO ADMINISTRATIVA EM
UM ORGANISMO DE GESTÃO TERRITORIAL COMPARTILHADA
EM RAZÃO DOS INTERESSES COMUNS, QUE TEM NO ESTADO-
MEMBRO UM DOS PARTÍCIPES E SEU COORDENADOR, AO
QUAL NÃO SE PODE IMPUTAR A TITULARIDADE DOS
SERVIÇOS EM RAZÃO DA UNIDADE DOS ENTES ENVOLVIDOS.
AMPLIAÇÃO DOS LIMITES DA REGIÃO METROPOLITANA. ATO
DA ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA. VÍCIO DE INICIATIVA.
INEXISTÊNCIA. 3. LEI COMPLEMENTAR. EXISTÊNCIA DE
LIMITES TERRITORIAIS. OBSERVÂNCIA DOS REQUISITOS
CONSTITUCIONAIS. INOCORRÊNCIA DE VÍCIO FORMAL OU
MATERIAL. 4. VIOLAÇÃO AO ARTIGO 63, I, DA CONSTITUIÇÃO
FEDERAL. INCLUSÃO DE MUNICÍPIO NO ÂMBITO DA REGIÃO
METROPOLITANA INSTITUÍDA. AUMENTO DE DESPESA EM
PROJETO DE INICIATIVA DO PODER EXECUTIVO.
INEXISTÊNCIA. A ALOCAÇÃO DE RECURSOS FINANCEIROS
ESPECÍFICOS NO ORÇAMENTO ESTADUAL E MUNICIPAL É
DESTINADA À ORGANIZAÇÃO, PLANEJAMENTO E GESTÃO DA
REGIÃO METROPOLITANA, NO ÂMBITO DA QUAL ESTÁ
INSERIDO O MUNICÍPIO LIMÍTROFE. 5. DESPESA FIXA
VINCULADA À REGIÃO METROPOLITANA. AUSÊNCIA DE ÔNUS
MAIOR PARA O ESTADO NA REALIZAÇÃO DE OBRAS E
SERVIÇOS. OBRIGATORIEDADE DE PRÉVIA AUTORIZAÇÃO
ORÇAMENTÁRIA ESPECÍFICA. OB SERVÂNCIA. AÇÃO JULGADA
IMPROCEDENTE. (ADI 2809, REL.: MIN. MAURÍCIO CORRÊA
JULGAMENTO: 25/09/2003, ÓRGÃO JULGADOR: TRIBUNAL
PLENO. PUBLICAÇÃO DJ 30-04-2004 PP-00028).

Essa gestão metropolitana deve ser feita por representantes dos dois níveis de

poder – estadual e municipal. Caffé Aleves entende que

na verdade, o poder constituinte inaugurou uma nova figura em


nossa federação, constituída por ente público administrativo regional,
de caráter territorial e intergovernamental, sem força legislativa, mas
com estrutura suficiente para garantir a integração indispensável ao
tratamento das funções públicas de interesse comum.111

Avança ao afirmar que

O importante é considerar que, em matéria de função publica de


interesse comum, o Município fica adstrito a tolerar sua excussão em
seu território, vez que, se ela realiza e concretiza de certo modo o
interesse local, ela é também de interesse regional, não podendo
sofrer solução de continuidade sob pena de prejudicar os outros
Municípios limítrofes [...] O território, nesse caso, é definido não por
um espaço soberano (somente próprio do Estado Nacional), mas sim
111
Alves, Alaôe Caffé. Op. Cit., p. 23.
61

por um espaço identificado em razão de funções governamentais de


diferentes níveis operacionais, incidentes sobre o mesmo território
[...] se a função pública a ser realizada é de caráter regional, não
pode o Município impedi-la, a pretexto de que será em seu
‘território’.112

Salienta que a implantação da Região metropolitana tem um objetivo funcional,

qual seja, o de integrar os municípios na organização, planejamento e execução das

funções públicas de interesse comum, garantindo aos Municípios a participação das

decisões que envolvam essas atividades.113

Esse é o entendimento dos Tribunais, que reconhecem que o interesse

metropolitano, comum aos municípios que integram a Região Metropolitana, se

sobrepõe aos interesses locais.

Essa linha de raciocínio foi adotada pelo Tribunal de Justiça de São Paulo em

decisão pronunciada em Agravo de instrumento em Ação Popular que decidiu que o

estado não usurpou a competência do Município de São Paulo ao efetuar as obras

da linha “4” do Metrô.

AGRAVO DE INSTRUMENTO - LICITAÇÃO REFERENTE À LINHA


"4" DO METRÔ - NÃO OCORRÊNCIA DE USURPAÇÃO DA
COMPETÊNCIA MUNICIPAL, POR SE TRATAR DE OBRA QUE
ATINGE A "REGIÃO METROPOLITANA” - ESTADO AGE POR
EXPRESSA ATRIBUIÇÃO CONSTITUCIONAL - DECISÃO
MANTIDA, E AGRAVO IMPROVIDO. (AI N° 535.562 -5/9,
RELATOR: DES. JOÃO A. DE VINCENZO, ÓRGÃO ESPECIAL,
JULGADO EM 28/11/2006).

No voto o relator reconheceu o direito do Estado de são Paulo

outorgar concessão para exploração da sobredita Linha 4 do Metrô,


por não estar ocorrendo usurpação da competência municipal,
levando em conta o fato desse tipo de transporte urbano, não estar
limitado exclusivamente ao território da Capital, senão que está
interligado aos trens da Companhia Paulista de Três Metropolitanos -

112
Alves, Alaôr Caffé. Op. Cit. p. 25-26.
113
Alves, Alaôr Caffé. Op. Cit. p. 26.
62

CPTM - conectando as linhas do metrô, com as linnhas que


ultrapassam as fronteiras municipais.

Passa então o autor a fazer um estudo da autonomia municipal em face do

interesse metropolitano, iniciando com a consideração que a autonomia municipal

está baseada e se refere particularmente ao interesse local e que no caso das

regiões metropolitanas não existe atividades, serviços ou obras que sejam de

exclusivo interesse local, sendo “inequivocamente de interesse comum numa região

metropolitana, como a de São Paulo, por exemplo, devendo ser de competência

regional e não do Município isolado”.114

Lembra que a autonomia municipal está prevista nos arts. 29, 30 e 31 da CF e

que essa autonomia relaciona-se com a competência do município, sendo que na

questão metropolitana, na qual múltiplos governos autônomos estão envolvidos, a

questão deverá ser tratada de forma que os interesses regionais e locais se inter-

relacionem, de forma que

em matéria urbanística e em relação à prestação de serviços de


interesse comum, de caráter regional, o Município metropolitano tem,
pela atual Constituição, o poder de regulá-los em nível local,
supletivamente, naquilo que couber em relação ao interesse local,
obedecidas as diretrizes e parâmetros fixados em nível estadual e
federal.115

Assegura que se a Constituição fez a previsão das figuras regionais no título

“Organização do Estado”, quis dar tratamento diferenciado às mesmas sendo que o

interesse local e o regional metropolitano devem estar “coordenados ou integrados”,

já que exercem funções de interesse comum, “podendo e devendo” o município

participar da administração regional e da regulação normativo-legal, o que era

vedado pelo ordenamento constitucional anterior.


114
Alves, Alaôr Caffé. Op. Cit. p. 27.
115
Alves, Alaôr Caffé. Op. Cit. p. 29.
63

Desse modo, a passagem da competência para regular sobre


determinadas matérias, do plano local para o plano regional, não se
faz por mero arbítrio do legislador estadual, o que seria francamente
inconstitucional, mas sim porque tais matérias, pelo desenvolvimento
sócio econômico e natureza mesma das coisas, deixaram de ser
tratadas com racionalidade e objetividade a nível local, somente
encontrando sua racionalidade em nível regional. Na verdade não
são mais de interesse puramente local, embora devam e precisam
merecer atenção das comunidades locais, visto que estas integram a
comunidade regional.116

Ora, é exatamente esse o entendimento do Tribunal de Justiça de São Paulo, que

se posicionou no sentido de que o interesse metropolitano, isto é, as funções

públicas de interesse comum se sobrepõem aos interesses meramente locais das

municipalidades e que a competência para administrar e executar os serviços nas

regiões metropolitanas é do Estado de São Paulo, “gestor” da entidade e de seus

interesses e não dos municípios.

Nesse sentido uma decisão em sede de Ação Direta de Inconstitucionalidade da

Lei Municipal N° 1.861, de 22 de fevereiro 2006, do Município Arujá que criava

empresa municipal de saneamento ambiental “SANEAR”. O Tribunal de Justiça do

Estado de São Paulo entendeu que determinados artigos da legislação afrontavam o

texto constitucional estadual, especialmente os artigos 154 e 155, que tratam

exatamente da instituição de região metropolitana.

Vejamos a ementa:

INCONSTITUCIONALIDADE - ADIN - ARTIGOS Io, 2o, 3o E §§, 5o


E §§, E 7", INCISOS I, II, IV, VI, VII, VIII, X, XI, XII E PARÁGRAFO
ÚNICO; 15, I E II; 17, 18 E 19 DA LEI N° 1.861, DE 22 DE
FEVEREIRO DE 2006 DO MUNICÍPIO DE ARUJÁ - CRIAÇÃO
PELO MUNICÍPIO DO "SANEAR" SANEAMENTO AMBIENTAL DE
ARUJÁ - CRIAÇÃO INDEVIDA PELO MUNICÍPIO - INVASÃO DE
COMPETÊNCIA ESTADUAL - MUNICÍPIO QUE POR LEI, FAZ
PARTE DA REGIÃO METROPOLITANA DE SÃO PAULO
INTERESSE REGIONAL QUE SE SOBREPÕE AO INTERESSE
LOCAL, AVOCANDO PARA O ESTADO, A COMPETÊNCIA EM
QUEJSTÃO - AFRONTA A DISPOSITIVOS CONSTITUCIONAIS
ESTADUAIS (154 E 155) – AÇÃO PROCEDENTE. (ADIN 139.229-
116
Alves, Alaôr Caffé. Op. Cit. p. 31-32.
64

0/4-00, RELATOR: DES. OSCARLINO MOELLER, ÓRGÃO


ESPECIAL, JULGADO EM 19/09/2007).

Outro exemplo de decisão no mesmo sentido uma decisão do Supremo Tribunal

Federal que declarou absolutamente constitucional o uso de logradouros municipais,

bens públicos municipais, para o transporte de passageiros intermunicipal em região

metropolitana.

EMENTA: DIVERGÊNCIA. ACÓRDÃOS DA MESMA TURMA.


SÚMULA Nº 353. DISSENSO DEMONSTRADO. TRANSPORTE
INTERMUNICIPAL DE PASSAGEIROS. NÃO INCIDE, NO CASO, O
ÓBICE DO VERBETE MENCIONADO, PORQUE A COMPOSIÇÃO
DA TURMA, AO TEMPO DOS PARADIGMAS, ERA
MAJORITARIAMENTE DIVERSA DA QUE TINHA QUANDO DO
JULGAMENTO DO ACÓRDÃO EMBARGADO. DEMONSTRADO O
DISSENSO, APRECIAM-SE OS EMBARGOS. A CARTA DE 1988
ESTABELECE AS ESFERAS DE COMPETÊNCIA DOS ENTES
FEDERADOS PARA A DEFINIÇÃO DAS LINHAS DE
TRANSPORTE COLETIVO DE PASSAGEIROS, CABENDO AOS
ESTADOS AS INTERMUNICIPAIS E AOS MUNICÍPIOS AS
INTRAMUNICIPAIS, NADA IMPEDINDO, OBVIAMENTE, QUE O
SERVIÇO DE TRANSPORTE INTERMUNICIPAL SE EXERÇA NO
TERRITÓRIO MUNICIPAL, UTILIZANDO-SE, MESMO, DE
LOGRADOUROS QUE TAMBÉM SERVEM DE ITINERÁRIO PARA
O TRANSPORTE LOCAL. ACÓRDÃO QUE SE ACHA EM
CONFORMIDADE COM ESSA ORIENTAÇÃO. EMBARGOS
REJEITADOS. (RE 107337 EDV, RELATOR(A): MIN. FRANCISCO
REZEK, RELATOR(A) P/ ACÓRDÃO: MIN. ILMAR GALVÃO,
TRIBUNAL PLENO, JULGADO EM 20/02/1992, DJ 08-06-2001 PP-
00023 EMENT VOL-02033-08 PP-01797 REPUBLICAÇÃO: DJ 08-
06-2001 PP-00023 – GRIFO NOSSO).

Note-se que a decisão versa sobre transporte público de passageiros, cuja

competência para organizar e prestar tal serviço é exclusiva do município como

previsto no art. 30, V da Constituição117.

117
Art. 30. Compete aos Municípios: (...); V - organizar e prestar, diretamente ou sob
regime de concessão ou permissão, os serviços públicos de interesse local, incluído o de
transporte coletivo, que tem caráter essencial;
65

No entanto, a titularidade dos serviços comuns metropolitanos, o chamado

interesse metropolitano, “não pode ser imputado exclusivamente a um único ente

político-administrativo”.118

Como forma de exemplificar seu posicionamento, Caffé Alves cita os diversos

planos diretores municipais daqueles municípios autônomos que formam as regiões

metropolitanas. Cada um desses planos é elaborado e discutido internamente em

cada localidade formando um mosaico de planos diretores heterogêneos para

uma mesma região, sem articulação entre si, podendo gerar situações de conflito

dentro da Região.

Mesmo caso do licenciamento ambiental nas regiões metropolitanas.

Por exemplo, no caso de licenciamento ambiental de empreendimento

potencialmente poluidor em território de município que faça parte de uma região

metropolitana, devidamente constituída e que tenha norma de caráter regional sobre

uso e ocupação do solo da região metropolitana.

Essa possibilidade pode gerar no órgão ambiental licenciador dúvidas sobre qual

destas regras aplicar, se aquela emanada do município ou aquela de caráter

regional.

Parece-nos que no caso de existir um planejamento integrado de uso e ocupação

do solo urbano, essa norma deve prevalecer sobre as municipais.

No entanto, na medida em que a instituição de região metropolitana


deve apresentar um planejamento integrado de uso do solo urbano,
com base nas leis orgânicas dos municípios que a integram, passa a
prevalecer nesse contexto o interesse regional. Nesses casos, a
certidão do município deve considerar, como legislação aplicável ao

118
O autor cita a página 145 da edição de 1995 da obra Direito Urbanístico Brasileiro de
José Afonso da Silva.
66

uso e ocupação do solo, a instituída no âmbito da região


metropolitana.119

Outro exemplo tomado por Caffé Alves é o da captação, tratamento, adução a

grosso e distribuição de água ou o de coleta, transporte, tratamento e disposição

final de efluentes e resíduos sólidos, que segundo ele, nas regiões metropolitanas

“algumas dessas funções podem ser exercidas pelo poder local, outras devem sê-lo

pela administração regional”.120

Acaba por citar o professor José Afonso da Silva 121 que ao afirmar em sua obra

que “a titularidade não pode ser imputada a nenhuma das entidades em si, mas ao

Estado e aos Municípios envolvidos”, defendendo a cooperação mútua entre os

níveis de governo horizontais (Municípios da mesma região) e vertical (entre Estado

e Municípios), usa o argumento do próprio professor, dizendo que “bem se pode

aceitar o entendimento que Alaôr Caffé Alves dava para a titularidade dos serviços

comuns”.

Porém, embora José Afonso da Silva122 defenda que a titularidade não pode ser

imputada a qualquer das entidades em si, mas ao Estado e aos Municípios

envolvidos, não defende a cooperação mútua entre os diferente níveis de governo

como defendia aquele autor.

Segundo ele a cooperação é para os casos onde a Constituição Estadual prevê a

facultatividade de que o Município participe da Região Metropolitana conforme a sua

vontade, como no caso do Rio Grande do Sul (art. 16, § 1º), onde a participação do

119
Moreira, Danielle de Andrade e Guimarães, Virgínia Totti. As Regiões Metropolitanas e
o Licenciamento Ambiental. In Coutinho, Ronaldo e Rocco, Rogério (org). O Direito
Ambiental das Cidades. DP&A Editora: Rio de Janeiro, 2004, p. 99.
120
Alves, Alaôr Caffé. Op. Cit. p. 33-34.
121
Alves, Alaôr Caffé. Op. Cit. p. 32-33
122
Silva, José Afonso. Direito urbanístico brasileiro. São Paulo: Malheiros, 2008, p. 164.
67

Município na Região Metropolitana acontece mediante a aprovação pela Câmara

Municipal.

Esse entendimento, de que não se opera a coordenação entre os diferentes

níveis, se dá pelo fato de que a lei complementar estadual deve definir quais são as

funções públicas de interesse comum aos Municípios que formam a Região

Metropolitana e ao Estado, e não somente aos Municípios, sendo que a lei não

poderá definir como de interesse comum aqueles de intrínseco interesse local, nem

aquelas que são de interesse do Estado sem ser de interesse da Região

Metropolitana.

Cita, por exemplo, o caso da Constituição do Estado de Minas Gerais, que no art.

43, enumerou aquelas consideradas como sendo dessa natureza específica: I –

transporte intermunicipal e sistema viário de âmbito metropolitano; II – saneamento

básico, notadamente abastecimento de água, destinação de esgoto e coleta de lixo

urbano, drenagem pluvial e controle de vetores; III – uso do solo metropolitano; IV –

transportes e sistema viário; V – produção e distribuição de gás combustível

canalizado; VI – aproveitamento dos recursos hídricos controle da poluição

ambiental, na forma que dispuser a lei federal; VII – outros serviços incluídos na

área de competência do Conselho deliberativo por lei federal.

Em sua recente obra, Pedro Estevam Alves Pinto Serrano, porém, faz ressalvas

ao posicionamento de Alaôr Caffé Alves. Concorda o autor com a administração da

Região Metropolitana deverá ser efetuada em conjunto, com todos contribuindo e

participando das decisões, auferindo caso a caso a “real dimensão do interesse

local”, de acordo com a divisão de competências já estipulado pelo legislador

constitucional. Segundo ele,


68

De forma alguma cabe ao mesmo (legislador estadual) formular


dispositivos ou diplomas relativos à Região Metropolitana que
impliquem usurpação das competências municipais, de molde a
restringir a autonomia Municipal.123

Diz ele, que o município integrante de Região Metropolitana, legalmente

constituída, não é e não pode ser menos autônomo que o município que não faça

parte de nenhuma unidade regional, alegando que o único diploma normativo capaz

de estabelecer e limitar as competências e a autonomia dos entes federados é

exatamente a Constituição, e se o texto constitucional não faz claramente essa

limitação não poderia o legislador estadual fazer124.

E conclui

Ao Estado-membro cabe exercer sua competência no pacto


federativo e não determiná-la. Muito menos lhe cabe determinar o
alcance concreto da competência municipal. Só a Constituição
Federal pode definir e confirmar as competências dos entes
federados (Grifo do Autor).125

De fato, a autonomia municipal está mantida conforme descrita no vigente texto

constitucional, porém, ressalvas devem ser feitas.

Caso o constituinte desejasse que os municípios fossem os únicos responsáveis

por todos os serviços, obras, intervenções, mesmo em regiões envolvendo vários

municípios conurbados não teria instituído a figura das Regiões Metropolitanas,

ainda mais no capítulo que trata da organização do Estado nacional.

Desta ilação concluímos que ao tomar essa decisão pretendeu exatamente dividir

com os estados e demais municípios, por meio das regiões metropolitanas, a

responsabilidade para o planejamento, organização e execução dos serviços

comuns de interesse metropolitano e as funções públicas de interesse comum.

123
Serrano, Pedro Estevam Alves Pinto. Op. Cit. p. 136.
124
Serrano, Pedro Estevam Alves Pinto. Op. Cit. p. 145.
125
Serrano, Pedro Estevam Alves Pinto. Op. Cit. p. 149-150. Grifo do autor.
69

Como bem argumenta Ana Carolina Wanderley Teixeira, é comum a defesa

exacerbada e radical da autonomia municipal plena e exclusiva na defesa dos

interesses locais, dificultando e até mesmo evitando a ação integrada dos entes que

formam a região metropolitana, justificando, assim o conflito que envolve a efetiva

implantação dessas áreas. Segundo ela, essa característica pode ser resquício de

uma Administração pública patrimonialista ou da disputa (por vezes político-

partidária) que envolve os chefes dos poderes executivos municipais, mas o certo é

que

da absorção no Brasil dos efeitos da descentralização desordenada


pela falta de planejamento, exsurgiu o “municipalismo autárquico”,
segundo o qual os problemas municipais devem ser resolvidos
isoladamente pelo governo municipal respectivo, com a equivocada
crença de que são solucionados envolvendo a coordenação das
políticas publicas são solucionados financeiramente, tão somente
pela transferência de recursos.126

Assim, a autonomia municipal plena, absoluta, exagerada e servindo interesses

que não os públicos e republicanos pode se tornar um entrave para a efetiva

implantação da região metropolitana, transformando-se em um verdadeiro obstáculo

para o desenvolvimento regional e a busca da igualdade como previsto no texto

constitucional, devendo estados, municípios e regiões metropolitanas conviver

harmoniosamente e pacificamente, já que a forma que o legislador constituinte

determinou na busca das soluções para as funções de interesse comum foi

exatamente a criação, quando o Estado-membro achar necessário e conveniente,

por meio de lei complementar estadual, das regiões metropolitanas, e não da busca

individualizada, por cada município isoladamente, dessas soluções.

Nesse sentido poderia atuar a região metropolitana, com a função de

coordenação e orientação dos municípios envolvidos, respeitando as autonomias

126
Teixeira, Ana Carolina Wanderley. Op. Cit. p.84.
70

municipais. Porém, na existência de atritos, como os aqui demonstrados127, o

estado-membro detem o interesse comum e daria a palavra final da implementação

ou não de determinada obra..

Por isso mesmo, como bem aborda Pedro Estevam Alves Pinto Serrano

Só se devem considerar como regionais, para fins de determinação


da titularidade do Estado-membro sobre eles, as atividades e
serviços que tenham a participação de mais de um Município ou do
Estado-membro como conditio sine qua non para a sua realização
material.128

3.3.1 Funções Públicas de Interesse Comum

Como vimos, não é possível negar que o constituinte originário tenha conferido

autonomia aos entes federados e que essa previsão, juntamente com a igualdade

entre os entes federados e a distribuição de competências, forma o tripé que

sustenta o sistema federal adotado em nosso país desde a primeira Constituição

Republicana, elaborada sob a influência de Rui Barbosa, juntamente com a rigidez

do sistema.

E, ao dar aos municípios, no art. 30 da constituição de 1988, competência para

“legislar sobre os assuntos de interesse local”, como poderia conferir a outro ente

administrativo a outorga desse interesse para tratar do assunto de forma regional?

Nas palavras de Ana Carolina Wanderley Teixeira, a resposta já foi dada na

medida em que ao estudarmos o fenômeno do regionalismo e da formação das

Regiões Metropolitanas, a defesa radical e exacerbada da autonomia municipal não

pode ser tratado como dogma, visto que as soluções ultrapassam as fronteiras

127
Saneamento básico, transporte intermunicipal ou até mesmo o transporte dentro de
um determinado território municipal, mas com reflexos na região metropolitana – como
por exemplo o caso do Metro de São Paulo.
128
Serrano, Pedro Estevam Alves Pinto. Op. Cit. p. 138
71

geográficas dos Municípios, sendo que por vezes, os interesses locais e os regionais

não são excludentes, mas, muitas vezes complementares.129

Portanto, o interesse comum metropolitano não será a somatória dos interesses

locais das unidades que formam a Região Metropolitana, visto que o interesse

comum está ligado à unidade metropolitana, sendo que seu reconhecimento jurídico

é, na verdade, “uma resposta institucional para problemas urbanos-regionais de

caráter complexo e de dimensões supralocais”.130

Para tanto, Caffé Alves131, divide o estudo do termo em duas partes:

1) A função pública, que não é somente a execução de serviços públicos e as

respectivas concessões, mas engloba, ainda, a normatização, a adoção de

políticas públicas e controles; diz respeito ao “poder-dever” das autoridades

para com as comunidades.

2) O interesse comum, vínculo que abrange várias pessoas político-

administrativas (municípios), em uma determinada região geográfica,

agrupadas mediante lei complementar, para o exercício de funções públicas

de interesse de todos os envolvidos, existindo, portanto, uma

“interdependência operacional”. Os critérios para essa definição podem variar,

sendo, por exemplo, bacia hidrográfica, controle ambiental, fontes de recursos

naturais, dimensões das infra-estruturas urbanas e etc.

Esse modelo, de “funções públicas de interesse comum”, adotado pela atual

Constituição aumentou o campo de atuação do conceito ao estender sua aplicação

para as demais figuras regionais – aglomerações urbanas e microrregiões 132, além


129
Teixeira, Ana Carolina Wanderley. Op. Cit. p. 86.
130
Alves, Alaôr Caffé. Op. Cit. p. 35.
131
Alves, Alaôr Caffé. Op. Cit. p. 35-36.
132
Deixando de lado o conceito restrito de “interesse metropolitano”.
72

da possibilidade de enquadrar no interesse comum funções que não são,

necessariamente, serviços públicos, como outrora fixado no texto constitucional,

podendo abarcar, por exemplo o planejamento urbano-regional e o controle do solo

metropolitano.

Ana Carolina Wanderley Teixeira, por seu turno, defende em sua obra o modelo

que o Estado de Minas Gerais adotou para o estabelecimento das funções públicas

de interesse comum.

Segunda ela, por ser de competência de cada Estado-membro definir quais são

as funções, o constituinte local delegou à lei complementar estadual a competência

para a fixação dessas funções no momento da criação da Região Metropolitana,

desconstitucionalizando a matéria.

Não nos parece, no entanto, a melhor forma. Explicamos.

Caso determinada função estabelecida na lei complementar como de interesse

comum deixe essa característica, por qualquer motivo (seja diminuição da

importância dela ou da capacidade de um único município metropolitano tratar o

assunto), estará no direito positivo que aquele assunto é de interesse comum,

ferindo, nesse caso, a autonomia municipal. De forma contrária, se o texto legal

deixou de considerar uma determinada função como de interesse comum, por não

existir, naquele momento, interdependência operacional entre os municípios da

região metropolitana, e com o passar dos anos, essa interdependência passe a

existir, uma nova lei complementar terá que ser editada para que essa função passe

a ser reconhecida como de interesse comum. Parece-nos, que esse modelo

engessa o modelo pretendido pelo constituinte de região metropolitana, aumentando


73

sobremaneira sua burocracia e assim dificultando o verdadeiro motivo de sua

existência.

Preferimos, então, o modelo proposto por Caffé Alves133.

Resumidamente, o autor esclarece que, por existir, nas regiões metropolitanas,

uma interdependência dinâmica, com as características variando de acordo com o

tempo, entrono urbano, condições sócio-econômicas, dimensões dos serviços

prestados, o estabelecimento dessas funções não pode haver simplesmente uma

descrição normativa do interesse comum, sendo que algumas atividades que

isoladamente seriam consideradas de interesse comum, ao serem analisadas no

âmbito regional passariam a ser de interesse comum, por razões do ordem

dimensional, dimensional, social, institucional, geográfica, natural, econômica ou

técnica, sem afrontar o princípio constitucional da autonomia municipal.

A configuração de competências tem aspectos formais e materiais, e


estes últimos, como conteúdos empíricos, dependem da realidade
constatada e não apenas da expressão literal de seus respectivos
conceitos. Os conceitos jurídicos, não só os teóricos mas também os
de natureza normativa, devem ser completados com o concurso da
experiência sobre o mundo sócio-economico, realizando-lhes a
concreção interpretativa e aplicativa [...] Portanto, o regime jurídico
de prestação de serviços de interesse local ou de interesse regional
(funções públicas de interesse comum) pode ser alterado em função
do desenvolvimento ou mudança de fatorres contextuais objetivos,
de ordem físico-geográfica, social, econômica, institucional, técnica,
financeira ou administrativa.134

Exatamente por esses motivos é que o conceito deve ser dinâmico e se adaptar

às ocasiões da realidade regional. Arremata o autor:

Ela precisa ter ‘natureza’ regional, identificada por critérios


justificadores dessa natureza, argüíveis juridicamente e que possam,
como já apontamos, ser deduzidos prudencialmente em caso de
contestação judicial. E isso é particularmente importante porque seu

133
Alves, Alaôr Caffé. Op. Cit. p. 37-38
134
Alves, Alaôr Caffé. Op. Cit. p. 37-38
74

tratamento pode resvalar para a questão da autonomia dos entes


políticos envolvidos na região metropolitana.135

Na mesma linha, Ana Carolina Wanderley Teixeira136, afirma que se a

administração municipal conseguir resolver seus problemas e os anseios de sua

população individualmente mesmo dentro de uma “grande região urbana” estará

exercendo sua plena autonomia e competência de forma exclusiva. Em sentido

contrário, caso não consiga enfrentar os desafios da conurbação sem a atuação dos

municípios vizinhos, constata-se que o assunto “deve ser entregue à região, formada

por esses municípios circunvizinhos e cujos interesses são coincidentes”.

A essa mesma conclusão chegaram Danielle Andrade Moreira e Virgínia Totti

Guimarães, quando afirmam que

os limites de sua autonomia devem ser interpretados de modo a


conjugar os interesses regionais e os locais. (...) Pode-se dizer que
esses interesses metropolitanos, também denominados de “funções
publicas de interesse comum” consistem nas atividades
operacionais, de planejamento, normatização, programação,
coordenação, execução, controle e fiscalização, cujo exercício deva
ser integrado para abranger as necessidades de todos os
envolvidos.137

135
Alves, Alaôr Caffé. Op. Cit. p. 38
136
Teixeira, Ana Carolina Wanderley. Op. Cit. p. 89.
137
Moreira, Danielle de Andrade e Guimarães, Virgínia Totti. As Regiões Metropolitanas e
o Licenciamento Ambiental. In Coutinho, Ronaldo e Rocco, Rogério (org). O Direito
Ambiental das Cidades. DP&A Editora: Rio de Janeiro, 2004, p. 91-92.
75

4 A Região Metropolitana da Baixada Santista

4.1 A Divisão Regional na Constituição do Estado de São Paulo de 1989

Na esteira da Constituição Federal de 1988, o legislador constituinte estadual

adotou no Texto de 1989 a organização regional do Estado de São Paulo, sendo

que na seção I ficaram definidos os objetivos, diretrizes e prioridades dessa divisão

regional, quais sejam:

Artigo 152 A organização regional do Estado tem por objetivo


promover:
I – o planejamento regional para o desenvolvimento sócio-econômico
e melhoria da qualidade de vida;
II – a cooperação dos diferentes níveis de governo, mediante a
descentralização, articulação e integração de seus órgãos e
entidades da administração direta e indireta com atuação na região,
visando ao máximo aproveitamento dos recursos públicos a ela
destinados;
III – a utilização racional do território, dos recursos naturais, culturais
e a proteção do meio ambiente, mediante o controle da implantação
dos empreendimentos públicos e privados na região;
IV – a integração do planejamento e da execução de funções
públicas de interesse comum aos entes atuantes na região;
V – a redução das desigualdades sociais e regionais.
Parágrafo único – O Poder Executivo coordenará e compatibilizará
os planos e sistemas de caráter regional.

Percebe-se da leitura do texto que o constituinte estadual deu continuidade ao

princípio previsto no texto federal, notadamente ao art. 3º, que define como objetivo

da República Federativa do Brasil o desenvolvimento nacional (inciso II) e a

erradicação da pobreza e a redução das desigualdades sociais e regionais (inciso

III) e art. 174, § 1º que trata dos planos de desenvolvimento regionais.

Nota-se ainda, que o constituinte estadual previu a cooperação entre os agentes

dos diferentes níveis de poder, bem como a articulação e integração de entidades e


76

órgão destes diferentes níveis e, também, do planejamento e da execução de

funções públicas de interesse comum aos entes atuantes na região.

No artigo seguinte, art. 153138, a Constituição do Estado de São Paulo facultou ao

Estado a divisão do território em unidades territoriais, constituídas por municípios

limítrofes, mediante lei complementar, para integrar a organização, o planejamento e

a execução de funções públicas de interesse comum.

Alguns pontos do referido artigo precisam ser analisados com um pouco mais de

cautela.

O primeiro deles é que nem o texto federal nem o estadual falam em conurbação

como pressuposto para a divisão do território estadual em unidades territoriais.

Ambos, falam somente em municípios limítrofes, sendo que o constituinte

estadual, como veremos a diante, adotou como um dos critérios para a definição de

região metropolitana, espécie do gênero unidade territorial, a conurbação.

Os dois diplomas, ao preverem a possibilidade da criação de unidades regionais,

falam em “municípios limítrofes”, o que não significa, em absoluto, que esses

municípios devem ter suas áreas urbanas “coladas” ou “grudadas” umas nas outras,

mas tão somente façam parte de uma mesma realidade sócio, econômica e

territorial.

Outra observação importante é que ambos os textos, federal e estadual, usam o

termo “integrar a organização, o planejamento e a execução de funções públicas de

interesse comum”.

138
Art. 153 – O território estadual poderá ser dividido, total ou parcialmente, em unidades
regionais constituídas por agrupamentos de municípios limítrofes, mediante lei
complementar, para integrar a organização, o planejamento e a execução de funções
públicas de interesse comum, atendidas as respectivas peculiaridades.
77

Nossa preocupação aqui é com o verbo integrar.

Novamente faremos uso dos dicionários para tentar entender qual o motivo que

levou o constituinte a usar esse mesmo termo no diploma mais importante na divisão

e organização do Estado139 e por qual motivo o constituinte estadual adotou a

mesma terminologia.

Segundo o dicionário Houaiss140, integrar significa incluir(-se) um elemento num

conjunto, formando um todo coerente, sendo que integração é ato ou efeito de

integrar(-se), incorporação de um elemento num conjunto. Já segundo o dicionário

Aurélio141, integrar significa juntar-se, tornando-se parte integrante; reunir-se,

incorporar-se.

Podemos concluir que o intuito dos constituintes, ao usar tal termo, foi o de que as

unidades regionais (regiões metropolitanas, aglomerados urbanos ou microrregiões)

criadas pelas leis complementares estaduais, deveriam fazer parte de um conjunto

responsável pela organização, planejamento e execução de funções públicas de

interesse comum.

Esse conjunto deve ser formado pelo Estado-membro e pelos municípios e

quando couber, também pela União, quando o interesse deixar de ser meramente

regional e passar a ser nacional.

Mais uma vez percebemos que o ideal adotado na organização, planejamento e

execução do interesse comum deve ser o da cooperação entre os entes envolvidos

naquele espaço territorial.

139
Não se confunde, aqui, Estado com Estado-membro.
140
Houaiss, Antonio. Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa. Editora Objetiva.
141
Ferreira, Aurélio Buarque de Holanda. Novo Dicionário da Língua Portuguesa, 2º
Edição. Revista e Ampliada. Editora Nova Fronteira.
78

Ainda mais importante essa cooperação, segundo no que concerne ao controle

ambiental dessas regiões, que deve ser ainda mais eficiente para que se possa

garantir a melhoria da qualidade de vida da população, mediante a adoção e o

estabelecimento de normas urbanísticas comuns, integrando os interesses dos

municípios que fazem parte da Região Metropolitana, do Estado-membro e, por

vezes, da própria União.

Conforme pode ser depreendido do próprio texto constitucional, a


criação das regiões metropolitanas advém da necessidade de serem
conjugados os esforços dos entes federativos para o entendimento
de necessidades urbanas específicas que, como visto, tornam-se
ainda mais latentes nessas áreas.142

Percebe-se, ainda da leitura do texto constitucional, que a entidade região

metropolitana, órgão da administração, não tem competência legislativa, exclusiva

dos entes políticos e nem podem editar normas onde o interesse for

predominantemente local, não havendo, de forma alguma ofensa à autonomia

municipal, pois são elas – regiões metropolitanas, previstas constitucionalmente com

previsão expressa de seu objetivo, qual seja, o detratar de forma cooperada e

coordenada dos esforços onde ocorrerem as grandes concentrações urbanas

envolvendo mais de um município. São leis dos estados correspondente é que

devem tomar medidas integrativas para a efetivação dos serviços comuns dos entes

municipais envolvidos para serem implementados pela correspondente região

metropolitana.

142
Moreira, Danielle de Andrade e Guimarães, Virgínia Totti. As Regiões Metropolitanas e
o licenciamento ambiental. In: Coutinho, Ronaldo e Rocco, Rogério (orgs.). O Direito
Ambiental das Cidades. Rio de Janeiro: DP&A, 2004, p. 87.
79

4.2 As Regiões Metropolitanas na Constituição do Estado de São Paulo.

O legislador constituinte estadual de 1989 resolveu então fazer a diferenciação

das espécies de unidades regionais (gênero), definindo os conceitos de região

metropolitana, aglomeração urbana e microrregião, que não havia sido elaborada

pelo constituinte federal, que somente facultou aos estados suas criações.143

O § 1º do art. 153 assim definiu região metropolitana:

Art. 153, § 1º - Considera-se região metropolitana o agrupamento de


municípios limítrofes que assuma destacada expressão nacional, em
razão de elevada densidade demográfica, significativa conurbação e
de funções urbanas e regionais com alto grau de diversidade,
especialização e integração sócio-econômica, exigindo planejamento
integrado e ação conjunta permanente dos entes públicos nela
atuantes.

Os critérios adotados pelo constituinte estadual paulista para definir, uma vez que

a constituição não os fixou foi o da assumida expressão nacional, em razão de alta

densidade demográfica, uma significativa conurbação e a existência de funções

urbanas e regionais comuns, com alto grau de diversidade, especialização e

integração, o que exige o planejamento integrado e a ação conjunta dos entes

públicos envolvidos nessa determinada região geográfica.

Fica claro que o objetivo do constituinte paulista é o de facilitar o planejamento e a

execução de funções públicas de interesse comum entre os municípios e o Estado

de São Paulo.

Segundo o art. 7° da Lei Complementar Estadual n° 760 de 1994, que estabelece

diretrizes para a ordenação regional do Estado de São Paulo, as funções públicas

de interesse comum, passiveis de planejamento integrado são o planejamento, uso

143
Como o presente trabalho diz respeito somente as Regiões Metropolitanas, focaremos
nessa espécie de unidade regional em detrimento das demais.
80

e ocupação do solo; transporte e sistema viário regionais; habitação; saneamento

básico; meio ambiente; desenvolvimento econômico e atendimento social.

Existem hoje no Estado de São Paulo três regiões metropolitanas constituídas

que abrangem 67 municípios. A saber:

1. A Região Metropolitana de São Paulo, que engloba 39 municípios,

inicialmente constituída pela Lei Complementar Federal 14 de 1973, ainda

sob a égide da Constituição anterior e mais tarde pela institucionalizada

pela Lei Complementar Estadual n° 94 de 1975. Sua estrutura

organizacional não foi atualizada, adaptando-se aos novos modelos

propostos pelas Constituições federal e estadual. Assim, sua organização

administrativa não está operante na sua totalidade144.

2. A Região Metropolitana da Baixada Santista, formada por nove municípios,

primeira região metropolitana a ser criada no país após o advento da

Constituição Federal de 1988 e os novos modelos adotados pelas

constituições estaduais. Foi criada pela Lei Complementar n° 815 de 1996

que autorizou o poder executivo a criar o Conselho de Desenvolvimento da

Região Metropolitana da Baixada Santista – CONDESB e o Fundo de

Desenvolvimento Metropolitano da Baixada Santista – FUNDESB. Em

1998, a Lei Complementar n° 853 criou a AGEM – Agência Metropolitana

da Baixada Santista.

3. A Região Metropolitana de Campinas, com 19 municípios, criada pela Lei

Complementar Estadual n° 870 de 2000, que autorizou o poder executivo a

instituir o Conselho de Desenvolvimento da Região Metropolitana de


144
Ver Regiões Metropolitanas do Estado de São Paulo. Secretaria dos Transportes
Metropolitanos. Governo do Estado de São Paulo, 2008. P. 42.
81

Campinas – CONDESC e o Fundo de Desenvolvimento da Região

Metropolitana de Campinas – FUNDEC. A Agência Metropolitana de

Campinas – AGEMCAMP foi criada em 23 de setembro de 2003, por

intermédio da Lei Complementar n° 846.

4.3 A lei Complementar 760 de 1° de agosto de 1994 e a organização

regional do Estado de São Paulo.

Com a promulgação das Constituição Federal em 1988 e a Estadual em 1989, o

Estado de São Paulo, estabeleceu diretrizes para a organização regional de seu

território, por meio da Lei Complementar Estadual n° 760 de 1° de agosto de 1994,

permitindo a divisão de seu território, total ou parcialmente, em unidades regionais

“com a finalidade de incentivar a organização regional e coordenar e compatibilizar

seus planos e sistemas de caráter regional”.145

Essa organização tinha como objetivo promover146: I - o planejamento regional

para o desenvolvimento sócio-econômico e melhoria da qualidade de vida; II - a

cooperação dos diferentes níveis de governo, mediante a descentralização,

articulação e integração de seus órgãos e entidades da administração direta, indireta

atuantes na região, visando ao máximo aproveitamento dos recursos públicos a ela

destinados; III - a utilização racional do território, dos recursos naturais e culturais e

a proteção do meio ambiente, mediante o controle da implantação dos

empreendimentos públicos e privados na região; IV - a integração do planejamento

e da execução de funções públicas de interesse comum aos entes públicos atuantes

na região; e V - a redução das desigualdades sociais e regionais.

145
Art. 2° da Lei Complementar Estadual n° 760, de 1° de agosto de 1994.
146
Art. 1° da Lei Complementar Estadual n° 760, de 1° de agosto de 1994.
82

Percebemos que além da busca da redução das desigualdades sociais e

regionais, como preceituam as Constituições Federal e do Estado de São Paulo, o

legislador complementar estadual se preocupou com o planejamento regional,

mediante a integração dos diferentes níveis de governos, com a utilização racional

do território e dos recursos naturais, além da proteção do meio ambiente.

No art. 3°, o legislador complementar define região metropolitana como “o

agrupamento de municípios limítrofes, com destacada expressão nacional, a exigir

planejamento integrado e ação conjunta com união permanente de esforços para a

execução das funções públicas de Interesse comum, dos entes públicos nela

atuantes, que apresente, cumulativamente, as seguintes características: I - elevada

densidade demográfica; II - significativa conurbação; III - funções urbanas e

regionais com alto grau de diversidade; e IV - especialização e integração sócio-

econômica”.

No art. 7° a Lei Complementar elenca uma série de funções que podem ser

entendidas como sendo de interesse comum dentro das unidades regionais147. Não

nos parece, no entanto, que esse rol seja taxativo, hermético, sendo somente

exemplificativo, uma vez que novas funções podem passar a ser de interesse

comum com o desenvolvimento urbano e o surgimento de novas necessidades que

envolvam as cidades de determinada unidade regional.

Prevê ainda, a criação de um Conselho de Desenvolvimento, de caráter normativo

e deliberativo, para cada unidade regional, paritário, formado por representantes dos

147
Art. 7 (...): I - planejamento e uso do solo; II - transporte e sistema viário regionais; III -
habitação; IV - saneamento básico; V - meio ambiente; VI - desenvolvimento econômico;
e VII - atendimento social.
83

municípios e do estado, assegurada a participação popular nos termos da previstos

na lei148.

4.4 A Região Metropolitana da Baixada Santista - RMBS

Como objeto específico da presente dissertação, vamos passar a estudar de

forma mais pormenorizada a RMBS, o histórico de sua criação, seu desenvolvimento

econômico, industrial e o atual momento de transformação.

4.4.1 Histórico e Instituição da RMBS

Como visto anteriormente, o Estado de São Paulo foi pioneiro na criação da

primeira região metropolitana após a promulgação da Carta de 88, criando a Região

Metropolitana da Baixada Santista, que, além disso, foi a primeira Região

Metropolitana que não envolvia uma capital de estado entre os municípios

integrantes de arranjo regional.

Embora institucionalizada por meio de Lei Complementar n° 815 de 1996, as

negociações para a criação da RMBS são antigas, sendo que desde os anos 60 já

apresentava os problemas típicos da conurbação, como a divisão funcional do papel

das cidades que integram a aglomeração, a migração pendular entre os municípios

e a forte dependência de ações integradas entre os municípios e o Estado para a

solução de gargalos de infra-estrutura como os de transporte, saneamento básico,

meio ambiente, habitação e etc..149

Ainda na década de 1960/70, a definição da Baixada Santista como unidade

regional de tipo administrativo foi objeto, de dois decretos do Executivo Estadual

148
Art. 14 da Lei Complementar Estadual n° 760, de 1° de agosto de 1994.
149
Os dados apresentados a seguir foram obtidos no sítio da Agem
<http://www.agem.sp.gov.br/rmbs_historia.htm>, acessado em 23 de fevereiro de 2010
84

(48.162 e 48.163, de 03/07/1967), quando a região foi incluída no trecho

correspondente ao conjunto do Litoral Paulista integrante da unidade regional

designada como São Paulo Exterior, que incluía também as regiões de Jundiaí e

Bragança Paulista, áreas essas que, da mesma forma que a Baixada Santista,

apresentavam fortes vínculos funcionais com a Grande São Paulo.

Esse cenário durou até o ano de 1970, quando pelo Decreto 52.576, de 12 de

dezembro a Baixada Santista voltou a integrar a unidade regional do Litoral.

Em 1971 foi realizado o primeiro trabalho na região de forma sistemática sobre as

questões de cunho regional, através da publicação de um Relatório realizado pela

Comissão de Estudos sobre a Metropolização da Baixada Santista - CEMBS,

constituída pelo decreto municipal de 4 de agosto de 1971 pelo então interventor

federal em Santos, General Clóvis Bandeira Brasil. Essa comissão era formada por

um representante indicado pelo Poder Executivo e um pelo Poder Legislativo de

cada um dos municípios integrantes da Baixada Santista, a saber: Santos, São

Vicente, Cubatão, Guarujá e Praia Grande; e um representante dos seguintes

organismos: Associação dos Diplomados da Escola Superior de Guerra - ADESG;

Rotary Club de Santos; Secretaria de Economia e Planejamento do Estado e Serviço

Federal de Habitação e Urbanismo do Ministério do Interior – SERFHAU.

Nota-se que dentre os objetivos da CEMBS já aparecia a necessidade de estudos

sobre um Plano Diretor de Desenvolvimento Integrado da Baixada Santista.

Desde aquele momento as instituições regionais já vislumbravam a necessidade

de um plano que coordenasse as repercussões, em nível metropolitano, das

atividades programadas pelo Estado e União na região como a Rodovia Rio-Santos


85

(Br 101); a Rodovia dos Imigrantes; a melhoria e ampliação do Porto de Santos; os

incentivos fiscais previstos pela EMBRATUR etc.

Em 1973, a União instituiu por meio da Lei Complementar 14, as regiões

metropolitanas de São Paulo, Belo Horizonte, Porto Alegre, Recife, Salvador,

Curitiba, Belém e Fortaleza, sendo que a Região da Baixada Santista, embora

nutrisse uma expectativa nesse sentido não foi instituída pela Lei Complementar.

Sem ter sido instituída em 1973, a região continuou se articulando e em 1976 foi

realizado o estudo “A instituição de um Órgão Intermunicipal para a Baixada Santista

- O princípio da metropolização”, pela Prefeitura Municipal de Santos, com o objetivo

de discutir subsídios para a elaboração de um Plano de Desenvolvimento Integrado

de Santos. Como proposta deste encontro, surgiu a hipótese da criação de um

Consórcio Intermunicipal para a resolução dos problemas comuns, através de um

convênio entre os municípios e o Estado, mas que também não surtiu grandes

resultados.

A partir dos anos 80 teve início um movimento coordenado pelo Centro das

Indústrias do Estado de São Paulo - CIESP e pelo Centro de Integração e

Desenvolvimento Empresarial da Baixada Santista que se intitulou “Campanha de

Integração Regional – Metropolização da Baixada Santista”. Esta foi desenvolvida

em duas frentes:

• Gestões junto aos Prefeitos Municipais, para que fosse constituída a Associação

dos Municípios da Baixada Santista.

• Formação da Associação Promotora da Metropolização da Baixada Santista -

PRÓ-METRO, que seria a entidade representativa da sociedade civil da região para

lutar pela institucionalização da Região Metropolitana.


86

Em 1984, foi elaborado um manifesto das entidades comunitárias onde 16

entidades subscreviam tal documento, quando a imprensa local deu grande

destaque e importância ao movimento, noticiando diariamente as atividades e

publicando entrevistas sempre enfocando a necessidade da metropolização da

região.

Nesse mesmo período o Governo do Estado passou a fazer uma divisão do seu

território em “Regiões de Governo”, quando a Baixada Santista adquiriu a

delimitação territorial que mais se aproxima daquela adotada na institucionalização

da Região Metropolitana.

A primeira iniciativa concreta no sentido da institucionalizar a Região

Metropolitana da Baixada Santista sob os novos preceitos constitucionais relativos à

criação de regiões metropolitanas, aglomerações urbanas e microrregiões,

aconteceu entre o segundo semestre de 1989 e o primeiro de 1990.

Neste momento a Empresa Metropolitana de Planejamento da Grande São Paulo

S.A. – EMPLASA preparou proposta completa, incluindo a minuta de Lei

Complementar para a criação da RMBS, ao lado de propostas similares para a

criação das Regiões Metropolitanas da Grande São Paulo e Campinas, da

Aglomeração Urbana de Jundiaí e da Microrregião Bragantina.

Dessa intenção não houve um resultado concreto, pois existia a necessidade

legal da edição de uma lei-quadro, de caráter complementar à Constituição

Estadual, definindo os critérios, procedimentos e bases conceituais e institucionais

gerais para a criação de unidades regionais.

Em dezembro de 1992, os prefeitos eleitos da região se reúnem com o intuito de

buscar soluções para os problemas comuns da Região e elegem temas prioritários


87

para discussões: transporte coletivo, saúde, educação, destinação final do lixo,

turismo, balneabilidade das praias e saneamento básico e habitação.

Note-se que dos temas propostos, três tem relação direta com o meio ambiente

(Destinação final do lixo, balneabilidade das praias e saneamento básico) e ao

menos dois indiretos (turismo e habitação).

Neste momento foi criada a Coordenadoria Regional de Metropolização -

COREME, órgão intermunicipal composto por representantes técnicos de cada

prefeitura, com o objetivo de assessorar os prefeitos nas questões de âmbito

regional e de formalizar uma pauta de prioridades a ser encaminhada ao Governo

Estadual.

O processo avança e ainda em 1993 os prefeitos da região e firmam de comum

acordo a presença do Estado nas discussões temáticas e ainda a criação de um

Conselho Extraordinário para resolver os problemas comuns, enquanto tramitava na

Assembléia Legislativa o Projeto de lei que iria institucionalizar novas regiões.

É em 1º de agosto de 1994, com a com a promulgação da Lei Complementar nº

760 que o Estado de São Paulo estabeleceu diretrizes para a organização regional

do território, criando um Sistema de Planejamento Regional e Urbano, sob a

coordenação da Secretaria de Planejamento e Gestão, com as finalidades de

incentivar a organização regional e coordenar e compatibilizar seus planos e

sistemas de caráter regional.

O próximo passo foi instituir a Região Metropolitana da Baixada Santista como

unidade regional do Estado de São Paulo, compreendida pelo agrupamento dos

Municípios de Bertioga, Cubatão, Guarujá, Itanhaém, Mongaguá, Peruíbe, Praia


88

Grande, Santos e São Vicente, a partir da Lei Complementar nº 815, de 30 de julho

de 1996.

Para a instalação da governança metropolitana, foi criado o Conselho de

Desenvolvimento da Baixada Santista - CONDESB, através do Decreto Estadual nº

43.361 de 27/11/96 e o Fundo de Desenvolvimento Metropolitano da Baixada

Santista - FUNDO , a ser gerido pelo CONDESB.

O Conselho tem caráter normativo e deliberativo, tratando dos assuntos inerentes

aos campos funcionais de interesse comum da RMBS. A participação de seus

representantes é paritária entre o conjunto das prefeituras e os representantes do

Estado.

As funções públicas de interesse comum da região são especificadas pelo próprio

CONDESB150, dentro dos seguintes campos funcionais: I - planejamento e uso do

solo; II - transporte e sistema viário regional; III - habitação; IV - saneamento básico;

V - meio ambiente; VI - desenvolvimento econômico, e VII - atendimento social

Suas atribuições151 são: I - definir as funções públicas de interesse comum entre

os municípios e o estado; II - especificar os serviços públicos de interesse comum do

estado e dos municípios, compreendidos nos campos funcionais referidos no artigo

7º, da Lei Complementar nº 760, de 1º de Agosto de 1994 e no artigo 5º, da Lei

Complementar nº 815, de 30 de julho de 1996, bem como, quando for o caso, as

correspondentes etapas ou fases e seus respectivos responsáveis; III - aprovar

objetivos, metas e prioridades de interesse regional, compatibilizando-os com os

objetivos do estado e dos municípios que o integram; IV - aprovar os termos de

referência e o subseqüente plano territorial elaborado para a respectiva região; V -


150
Art. 5° da Lei Complementar Estadual nº 815, de 30 de julho de 1996
151
Art. 2° do Regimento Interno do Condesb.
89

apreciar planos, programas e projetos, públicos e privados, relativos à realização de

obras, empreendimentos e atividades que tenham impacto regional; VI - aprovar e

encaminhar, em tempo útil, propostas regionais relativas ao plano plurianual, à lei de

diretrizes orçamentárias e à lei orçamentária anual; VII - propor ao estado e aos

municípios dele integrantes alterações tributárias com finalidades extrafiscais

necessárias ao desenvolvimento regional; VIII- comunicar aos órgãos ou entidades

federais que atuem na unidade regional as deliberações acerca de planos

relacionados com os serviços por eles realizados; IX - elaborar o seu regimento

interno e suas alterações; X - deliberar sobre quaisquer matérias de impacto

regional; XI - propor critérios de compensação financeira aos municípios

metropolitanos que suportem ônus decorrentes da execução de funções ou serviços

públicos metropolitanos; XII - constituir câmaras temáticas para as funções públicas

de interesse comum e câmaras temáticas especiais, voltadas a um programa,

projeto ou atividade específica, como sub-função entre as funções públicas definidas

pelo colegiado, disciplinando o seu funcionamento; XIII- indicar os membros do

conselho que irão integrar o conselho de orientação do Fundo de Desenvolvimento

Metropolitano da Baixada Santista – FUNDO.

A Lei Complementar também autorizou o poder executivo estadual a criar uma

autarquia para o fim de integrar a organização, o planejamento e a execução das

funções públicas de interesse comum na região.

Em 1997 aconteceu a eleição e posse do CONDESB e são constituídas as

primeiras câmaras temáticas.

Complementando o sistema de planejamento regional, em 23 de dezembro de 98,

através da Lei Complementar nº 853, foi criada a Agência Metropolitana da Baixada


90

Santista – AGEM, como entidade autárquica do Estado de São Paulo, com sede e

foro em município da Região Metropolitana da Baixada Santista, com a finalidade de

integrar a organização, o planejamento e a execução das funções públicas de

interesse comum na Região Metropolitana da Baixada Santista, desenvolvendo,

para tanto, as seguintes atribuições152: I - arrecadar as receitas próprias ou as que

lhe sejam delegadas ou transferidas, inclusive multas e tarifas relativas a serviços

prestados; II - fiscalizar a execução das leis que dispõem sobre regiões

metropolitanas e aplicar as respectivas sanções, no exercício do poder de polícia; III

- estabelecer metas, planos, programas e projetos de interesse comum, bem como

fiscalizar e avaliar sua execução; IV - promover a desapropriação de bens

declarados de utilidade pública, quando necessário à realização de atividades de

interesse comum; V - manter atualizadas as informações estatísticas e de qualquer

outra natureza, necessárias para o planejamento metropolitano, especialmente as

de natureza físico-territorial, demográfica, financeira, urbanística, social, cultural,

ambiental, que sejam de relevante interesse público, bem como promover,

anualmente, a sua ampla divulgação; VI - exercer outras atribuições que lhe sejam

legalmente conferidas.

4.4.2 Caracterização Regional

Como vimos, a RMBS foi criada em 1996 com nove municípios, que ocupam uma

área total de 2.373 Km², que representam 1% do território total do Estado, e tem

limites idênticos aos das Regiões Administrativa e de Governo de Santos.

Localizada numa pequena faixa de planície litorânea, limitada pela escarpa da

Serra do Mar153, sua rede hidrográfica é composta por diversos rios, com destaque
152
Art. 3° da Lei Complementar Nº 853, de 23 de dezembro de 1998.
153
A Serra do Mar forma um conjunto de escarpas que se estende do Rio de Janeiro até
Santa Catarina. No Estado de São Paulo é a borda do planalto, encontrando-se em
91

especial para o Itapanhaú, Itatinga, Preto, Branco, Cubatão e Quilombo154. Todos os

municípios fazem parte da Unidade de Gerenciamento de Recursos Hídricos –

UGRH Baixada Santista, sendo que parte das águas trazidas do Alto Tietê

responsável pela produção da usina de Henry Borden é usada no abastecimento

público domiciliar e industrial, por meio da captação no Rio Cubatão.

Atualmente, cerca de 70% de seu território corresponde a áreas de proteção

ambiental, que demandam cuidados e especial atenção e integração dos poderes

públicos na sua conservação e preservação.

A partir dos anos 1950 a região passou por um processo de intenso crescimento

econômico, alavancado pelos investimentos no pólo industrial de Cubatão, que teve

reflexo no crescimento populacional e na conseqüente concentração dessa

população principalmente nas cidades de Santos155, Cubatão e Guarujá, que acabou

provocando um movimento de extravasamento dessa população em direção aos

municípios vizinhos, que adquiriram características de cidade-dormitório, com

movimento pendular da sua população, deslocando-se entre essas cidades.

O processo de conurbação acabou por gerar uma ocupação urbana desordenada,

originando uma cadeia de degradação ambiental impulsionada pela poluição

industrial, portuária e domiciliar que acompanhada do forte adensamento urbano,

principalmente na orla, colaborou para o surgimento de assentamentos subnormais

em áreas de risco ambiental com a possibilidade de deslizamentos de encostas e

inundações que são constantemente observadas nas cidades da região, que está
altitudes entre 800 e 1.200 metros.
154
As informações são do Governo do Estado de São Paulo, Fundação Sistema Estadual
de Análise de Dados – SEADE. Perfil Regional. Região Metropolitana da Baixada Santista.
Atualização em abril de 2009.
155
O município de Santos é um dos mais populoso da região, além de ser um dos mais
densamente povoados do Estado, com 1.537,4 habitantes por Km². Cerca de 80% da
população da RMBS concentra-se em quatro das nove cidades: Santos, São Vicente,
Guarujá e Praia Grande.
92

sujeita a esses fenômenos por conta de seus acidentes geográficos, sobretudo nas

encostas da Serra do Mar e nas áreas estuarinas.

5 A Competência urbanística nas regiões metropolitanas.


93

Como tratar as questões urbanísticas nas regiões metropolitanas e a quem cabe

o planejamento urbanístico nessas regiões? Pode o estado-membro, instituidor da

região metropolitana, por meio de lei complementar estadual, legislar

urbanisticamente? De que forma? Essas são questões que surgem quando

pretendemos aplicar nas regiões metropolitanas os conceitos do direito urbanístico.

5.1 Breves palavras sobre Direito Urbanístico

Para a Sociedade Brasileira de Urbanismo (SBU), pode-se entender urbanismo

como

um campo do conhecimento multi e interdisciplinar voltado ao


ordenamento da cidade, de suas atividades distribuídas no território
a fim de que seja alcançada melhor qualidade de vida para a
população. 156

Para José Afonso da Silva, por ser uma ciência e técnica interdisciplinar, o

urbanismo “correlaciona-se com a cidade industrial, como instrumento de correção

dos desequilíbrios urbanos, nascidos da urbanização e agravados com a chamada

‘explosão urbana’ do nosso tempo”, e tem como objetivo a “organização dos

espaços habitáveis visando à realização da qualidade de vida humana”. 157

Já Hely Lopes Meirelles, o “urbanismo é o conjunto de medidas estatais

destinadas a organizar os espaços habitáveis, de modo a propiciar melhores

condições de vida ao homem na comunidade”.158

Desde a Carta de Atenas159, em 1933, são consideradas quatro as funções

principais da cidade e, conseqüentemente, diretrizes do urbanismo: i) habitar; ii)

156
Conceito disponível em
<http://sburbanismo.vilabol.uol.com.br/o_urbanismo.htm#_ftn1> acessado em
15/03/2010.
157
Silva, José Afonso da Silva. Op. Cit. p. 28 - 31
158
Meirelles, Hely Lopes. Direito Municipal Brasileiro. São Paulo: Malheiros, 2001, p.510.
159
Documento resultante do IV Congresso Internacional de Arquitetura Moderna.
94

trabalhar; iii) recrear-se; e iv) circular, cabendo ao urbanismo a organização da

cidade para o desenvolvimento da qualidade de vida da população. 160

Nesse sentido caminhou a Constituição Federal quando nos artigo 225 buscou a

sadia qualidade de vida e no artigo 182 definiu como objetivo da política de

desenvolvimento urbano a ordenação do pleno desenvolvimento das funções sociais

da cidade e a garantia do bem-estar de seus habitantes.

Portanto, para Celso Antonio Pacheco Fiorillo,

a função social da cidade é cumprida quando esta proporciona a


seus habitantes p direito à vida, à segurança, à igualdade, à
propriedade e à liberdade (CF, art. 5°, caput), bem como quando
garante a todos um piso vital mínimo, compreendido pelos direitos
sociais à educação, à saúde, ao lazer, ao trabalho, à previdência
social, à maternidade, à infância, à assistência aos desamparados,
entre outros encontrado no art. 6°. (...) Em linhas gerais, a função
social da cidade é cumprida quando proporciona aos seus habitantes
uma vida com qualidade, satisfazendo os direitos fundamentais, em
consonância com o que o art. 225 preceitua.161

O Direito Urbanístico surge, então, como produto das transformações sociais

advindas da urbanização e da necessidade da normatização das ferramentas do

urbanismo na busca da sadia qualidade de vida e de cidades sustentáveis e é no

ensinamento de Carlos Ari Sundfeld

o reflexo, no mundo jurídico, dos desafios e problemas derivados da


urbanização moderna (concentração populacional, escassez de
espaço, poluição) e das idéias da cinencia do urbanismo (como a de
plano urbanístico, consagrada a partir da década de 30) (...)
contrapondo-se ao direito civil clássico ao deslocar do âmbito
puramente individual para o estatal as decisões básicas quanto ao
destino das propriedades urbanas (princípio da função social da
propriedade).162
160
Sobre as funções da cidade ver: Silva, José Afonso da. Curso de Direito Urbanístico
Brasileiro, p. 19 e seguintes.; Canepa Carla. Cidades Sustentáveis. São Paulo: RCS
Editora, 2007, p 112 e seguintes ; Marques, José Roberto Marques. Meio Ambiente
Urbano. Rio de Janeiro: Forense Universitária, p. 183 e seguintes; Fiorillo, Celso Antonio
Pacheco. Curso de Direito Ambiental Brasieliro. São Paulo: Saraiva, 2006, p. 258.
161
Fiorillo, Celso Antonio Pacheco. Curso de Direito Ambiental Brasileiro. São Paulo:
Saraiva. 2006, p. 258.
162
Sundfeld, Carlos Ari. O Estatuto da Cidade e suas Diretrizes Gerais. In Estatuto da
Cidade. Comentários à Lei Federal 10.257/2001. São Paulo: Malheiro Editores. 2006, p.
95

Ao inserir na Constituição de 1988 um capítulo sobre a ordem urbanística (artigos

182 e 183), o constituinte acabou por constitucionalizar o direito urbanístico, a fim de

regular os conflitos entre o interesse coletivo e o interesse privado, que é afetado

pelo princípio da função social da propriedade.

Assim, a política urbana tem por objetivo proporcionar ao cidadão o pleno

desenvolvimento das funções sociais da cidade e promover o equilíbrio entre o

desenvolvimento econômico (crescimento) e a preservação ambiental como bem

preceitua Carlos Ari Sundfeld:

O crescimento não é um objetivo; o equilíbrio, sim; por isso, o


crescimento deverá respeitar os limites da sustentabilidade, seja
quanto aos padrões de produção e consumo, seja quanto à
expansão urbana. Toda intervenção individual potencialmente
desequilibradora deve ser previamente comunicada, estudada e, a
seguir, compensada.163

José Afonso da Silva nos ensina que o Direito Urbanístico é aquele que vai

fornecer ao Poder Público os instrumentos normativos para, observando-se o

princípio da legalidade164, fazer valer os direitos da coletividade sobre os interesses

particulares.

Para o autor, manifestam-se dois aspectos fundamentais do direito urbanístico:

(a) O direito urbanístico objetivo, que consiste no conjunto de

normas jurídicas reguladoras da atividade do Poder Público

destinada a ordenar os espaços habitáveis – o que vale dizer:

conjunto de normas jurídicas reguladoras da atividade

urbanística; (b) o direito urbanístico como ciência, que busca o

46.
163
Op. Cit. p.55.
164
Previsto no art. 5°, II da Constituição Federal: “ninguém será obrigado a fazer ou
deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei”.
96

conhecimento sistematizado daquelas normas e princípios

reguladores da atividade urbanística.

Ao final de sua construção para chegar a uma conclusão sobre a definição de

direito urbanístico nesses dois aspectos conclui que:

O direito urbanístico objetivo consiste no conjunto de normas que


têm por objeto organizar os espaços habitáveis, de modo a propiciar
melhores condições de vida ao homem na comunidade.
O Direito urbanístico como ciência é o ramo do direito público que
tem por objeto expor, interpretar e sistematizar as normas e
princípios dos espaços habitáveis.

Segundo o artigo 21, IX da constituição federal, compete à União elaborar e

executar planos nacionais e regionais165 de ordenação do território e de

desenvolvimento econômico e social.

Além dessa previsão, a constituição inovou ao introduzir um capítulo para tratar

especificamente da política urbana. Nesses artigos, o constituinte definiu as

diretrizes e princípios da política urbana e delegou ao Poder Público municipal a

execução da política de desenvolvimento urbano, conforme as diretrizes gerais

fixadas em lei.

Coube a Lei Federal 10.257 de 2001, também denominada Estatuto da Cidade166,

a regulamentação dos artigos 182 e 183 da constituição, contendo as diretrizes de

desenvolvimento urbano, os objetivos da política urbana nacional e a disciplina do

regime da propriedade urbana, os instrumentos urbanísticos.

No artigo 24, I, a constituição fixou a competência concorrente dos estados-

membros para legislarem sobre normas gerais de direito urbanístico. Já o § 2°

165
As regiões a que se refere o inciso não são as regiões metropolitanas, mas as regiões
formadas por vários estados-membros, prevista no art. 43 da CF.
166
Artigo 1°, § único da Lei 10.257 de 2001.
97

assegura que a competência para a União legislar sobre normas gerais não exclui a

competência suplementar167 dos Estados.

O art. 182 da Constituição de 1988 preceitua que a “política de desenvolvimento

urbano, executada pelo Poder Público municipal, conforme diretrizes fixadas em

lei, tem por objetivo ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade

e garantir o bem estar de seus habitantes” (grifo nosso).

O Estatuto da Cidade, que veio regulamentar esse artigo da Carta Política, em

seu art. 2°, inciso II estabelece como diretriz da política urbana “a garantia do direito

a cidades sustentáveis, entendido como o direito à terra urbana, à moradia, ao

saneamento ambiental, à infra-estrutura urbana, ao transporte e aos serviços

públicos, ao trabalho e ao lazer, para as presentes e futuras gerações” (grifo

nosso).

Nas palavras de Édis Milaré

Estados e Municípios, impulsionados por instituições nacionais e


internacionais que se ocupam do urbanismo pleno para o século XXI,
vêm, progressivamente, aderindo a essa onda salutar, consagrando
em instrumentos legais os princípios básicos de uma cidade
saudável e sustentável.168

Na Região Metropolitana da Baixada Santista não poderia ser diferente. Com a

concentração urbana causada como reflexo dos processos de criação do Porto de

Santos, do pólo petroquímico, siderúrgico e industrial de Cubatão e da construção

da infra-estrutura para atendimento desses equipamentos, como as ferrovias e a

167
Nas palavras de José Afonso da Silva, competência suplementar “significa o poder de
formular normas que desdobrem o conteúdo de princípios ou normas gerais ou que
supram a ausência ou omissão destas (art. 24, §§ 1° ou 4°)”. Curso de Direito
Constitucional Positivo, 2009, p. 481.
168
Milaré, Édis, Op. cit. p. 45.
98

Rodovia Anchieta, surgiram os impactos desse adensamento em curto espaço de

tempo.

A ocupação e o uso do solo de forma desordenada, com o surgimento de núcleos

habitacionais sem qualquer infra-estrutura de saneamento básico, em locais

impróprios para esse fim surgiram na região com reflexos de grande impacto e

degradação ambiental.

Para Maria Luiza Granziera

A má ordenação do território ou a falta de ordenação, assim como do


desenvolvimento econômico, são causas de desequilíbrio, na medida
em que a expansão, seja urbana, seja econômica, sem a fixação de
limites pelo Poder Público, gera abusos e, conseqüentemente, sérios
danos à sociedade e ao meio ambiente. O papel das normas
protetoras do meio ambiente, dessa forma, é estabelecer as
diretrizes orientadoras do meio ambiente do espaço urbano como do
desenvolvimento econômico.169

5.2 O Planejamento Regional

Não há que se discutir sobre a competência municipal para legislar sobre o

urbanismo e sobre os planos municipais, principalmente no que se refere ao Plano

Diretor. Tal competência vem da observação do artigo 30, I da Constituição de 1988,

que afirma ser de competência dos municípios legislarem sobre os assuntos de

interesse local, bem como do artigo 182 que reserva ao Poder Público municipal a

execução da política de desenvolvimento urbano.

Porém, os Estados-membros também possuem competência urbanística para

elaborar seus planejamentos de desenvolvimento urbano, com base no art. 24, I e

seus §§, que assegura o direito de legislar concorrentemente com a União sobre

direito urbanístico, além da expressa competência para criar, mediante lei

169
Granziera, Maria Luiza Machado. Direito Ambiental. São Paulo: Editora Atlas, 2009, p.
477.
99

complementar estadual, as Regiões Metropolitanas (art. 25, § 3°), como já vimos no

segundo capítulo, para integrar a organização, o planejamento e a execução de

funções públicas de interesse comum.

Dessa forma, as ações do Estado-membro deverão ser no sentido de estabelecer

diretrizes intermunicipais, conduzindo a uma ordenação de todo o território, não

sendo possível ao Estado a atividade urbanística intra-municipal, exceto nos casos

de Regiões Metropolitanas e aglomerações urbanas, onde o próprio texto

constitucional prevê a integração dos Poderes Públicos na organização,

planejamento e execução das funções públicas de interesse comum, inclusive as

urbanísticas.

O atual sistema constitucional

(...) dá aos Estados possibilidade jurídica de atuar com eficácia na


execução de tal função, com definição da competência estadual na
matéria, que lhes confere um campo supramunicipal de ordenação
territorial, que aos Municípios cabe observar como normas gerais de
atuação e coordenação no nível geral e microrregional (ou regional
intra-estadual).170

O documento “Política Nacional de Desenvolvimento Urbano”171, do Ministério das

Cidades ao tratar das Regiões Metropolitanas, aponta entre outros procedimentos

adotados na construção de uma política metropolitana nacional

A realização de estudos para a elaboração de planos


metropolitanos em parceria do Ministério das Cidades com Estados
e Municípios. Estes planos metropolitanos visarão: A) orientar o uso
e a ocupação do solo na definição, por meio de um
macrozoneamento, de áreas destinadas a distritos industriais
metropolitanos, habitação social e áreas de proteção ambiental; B)
orientar as políticas de drenagem urbana, coleta de lixo,
abastecimento de água e esgotamento sanitário; C) orientar a
gestão, os investimentos e a integração dos transportes coletivos; D)
mapear as áreas socialmente vulneráveis e integrar as ações locais e

170
Silva, José Afonso da. Op. Cit. p, 127. Para maiores detalhes ver os capítulos “Dos
Planos Urbanísticos Estaduais” e “Do Plano Urbanístico Metropolitano”.
171
Ministério das Cidades. Política Nacional de Desenvolvimento Urbano. Brasília,
Ministério das Cidades, 2004
100

estaduais com as ações dos diversos ministérios do governo federal.


É fundamental lembrar que estes planos devem dialogar com os
planos diretores municipais e é desejável que, a médio prazo, eles
orientem os investimentos públicos nas áreas metropolitanas (grifo
nosso).

O próprio Estatuto da Cidade, artigo 4°, incisos I e II, define como instrumentos a

serem utilizados a) os planos estaduais de ordenação de território e de

desenvolvimento econômico e social, e b) o planejamento das regiões

metropolitanas, aglomerações urbanas e microrregiões.

Embora faça essa referência ao planejamento metropolitano o Estatuto da Cidade

não tratou especificadamente do tema, sendo que o capítulo referente às regiões

metropolitanas existente no projeto de lei foi retirado pela Comissão de Constituição

e Justiça e Redação, não existindo uma regulamentação federal para o tema. O

projeto ainda previa como exigência das unidades regionais um Plano Diretor

Metropolitano, que deveria abranger o território de todos os municípios

integrantes.172

Já a Constituição do Estado de São Paulo, no artigo 155, parágrafo único,

determina a compatibilização dos planos municipais aos estaduais e regionais, no

que couber, bem como os planos estaduais ao plano diretor dos municípios e as

prioridades locais:

Artigo 155 - Os Municípios deverão compatibilizar, no que couber,


seus planos, programas, orçamentos, investimentos e ações às
metas, diretrizes e objetivos estabelecidos nos planos e programas
estaduais, regionais e setoriais de desenvolvimento econômico-social
e de ordenação territorial, quando expressamente estabelecidos pelo
conselho a que se refere o artigo 154.
Parágrafo único - O Estado, no que couber, compatibilizará os
planos e programas estaduais, regionais e setoriais de

172
Dentre outros pontos o projeto definia como função pública de interesse comum a
atividade ou serviço que executado isoladamente poderia causar impactos nos outros
municípios ou ser inviável. Carmo, Silvia de Castro Bacellar do, e Falcoski, Luiz Antônio
Nigro. Um olhar sobre o planejamento e gestão metropolitanos. A Região Metropolitana
da baixada Santista in Cadernos Metrópoles, n° 14, 2005, p. 133-134.
101

desenvolvimento, com o plano diretor dos Municípios e as


prioridades da população local.

Tais planos regionais conterão, além das necessidades locais, na visão de José

Afonso da Silva:

I – prescrições globais sobre o desenvolvimento microrregional173


com base em parâmetros temporais e quantitativos estabelecidos em
harmonia com a programação econômica e social da área; II –
critérios gerais de assentamento urbano de relevância regional, de
acordo com as diretrizes definidas pela lei e pela política de
desenvolvimento urbano e regional do Estado; III – critérios e
vínculos para a tutela do patrimônio histórico, paisagístico, artístico,
arqueológico, etnológico e turístico da microrregião, quando cabível;
IV delimitação e regras indicativas de controle do uso do solo de
áreas supramunicipais que se considere necessário submeter a
restrições especiais ou a uma adequada proteção ou melhoramento
visando à tutela do meio ambiente natural, com vista à proteção
florestal, à formação de parques e reservas naturais e ambientais, à
preservação dos mananciais em geral, das várzeas e das margens
de águas públicas de interesse regional, observadas a legislação
federal pertinente e a competência municipal na matéria; V –
indicação e localização de infra-estruturas básicas de caráter
regional e definição da rede viária e dos transportes ao nível da área
considerada; VI – indicação dos instrumentos jurídico-institucionais
necessários à implementação e execução do plano; VII – definição
das diretrizes a serem observadas na execução de obras e serviços
públicos estaduais na área; VIII – medidas para a adequação da
estrutura urbanística existente ao modelo territorial proposto e para a
coordenação dos planos urbanísticos especiais e municipais
compreendidos na microrregião.174

Claro está que tanto a Constituição Federal, como a Estadual (São Paulo) e a

legislação infraconstitucional deu muita importância ao planejamento na busca do

equilíbrio entre o desenvolvimento econômico e a preservação ambiental (natural e

artificial), sendo, assim, um dos mais importantes instrumentos na busca por cidades

sustentáveis, do pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e do bem-

estar de seus habitantes.

O inciso, IV, do artigo 2° do Estatuto da Cidade é um exemplo claro dessa

importância, ao estabelecer como diretriz da política urbana o planejamento do

173
José Afonso da Silva utiliza o termo microrregional levando-se em consideração o
prisma nacional, não se confundindo com a figura da unidade regional da microrregião.
174
Silva, José Afonso da. Op. Cit. p, 130-131.
102

desenvolvimento das cidades, da distribuição espacial da população e das

atividades econômicas do Município e do território sob sua área de influência, de

modo a evitar e corrigir as distorções do crescimento urbano e seus efeitos

negativos sobre o meio ambiente (grifo nosso).

Ora, essas distorções a que se refere o inciso IV do artigo 2° do Estatuto da

Cidade são ainda mais visíveis e perniciosas nas Regiões Metropolitanas, onde a

concentração urbana é ainda maior e seus efeitos não respeitam as fronteiras

municipais, gerando reflexos negativos e impactos ambientais, sociais e urbanísticos

nas cidades conurbadas, motivo pelo qual o legislador incluiu no rol dos municípios

obrigados a elaborar o plano diretor (artigo 41, II) aqueles integrantes de regiões

metropolitanas e aglomerações urbanas.

O plano diretor, previsto no Texto Constitucional e regulamentado no Estatuto da

Cidade é o instrumento básico de planejamento urbano municipal. Neles estarão

fixadas as diretrizes, os objetivos, o que deve ser feito na cidade para se alcançar

esses objetivos e quem deve executar tais atividades.175

Esse planejamento deve projetar o futuro, considerando a situação atual dos

assentamentos e a degradação gerada pela ocupação desenfreada, levando-se em

conta os impactos e cenários de transformação projetados para o futuro.

Não sem sentido, portanto, que no seu artigo 155 a Constituição do Estado de

São Paulo determina que os municípios, no que couber, deverão compatibilizar seus

planos, programas, orçamentos, investimentos e ações às metas, diretrizes e

objetivos estabelecidos nos planos e programas estaduais, regionais e setoriais,

175
Obviamente o plano diretor deverá ser pautado pelos princípios constitucionais e
deverá ser pautado pelo equilíbrio entre o desenvolvimento econômico e a preservação
ambiental – desenvolvimento sustentável.
103

tanto de desenvolvimento econômico como de ordenação territorial, quando

expressamente estabelecidos pelo conselho de que trata o artigo 154176. No seu

parágrafo único, o movimento é contrário, estabelecendo que o Estado, no que

couber, compatibilizará seus planos e programas estaduais, regionais ou setoriais

com os planos diretores dos Municípios, bem como levará em conta as prioridades

locais.

Percebe-se no constituinte estadual uma preocupação de que o planejamento e

as ações dos poderes públicos, principalmente nas unidades regionais –

notadamente nas regiões metropolitanas, sejam de forma coordenada e de acordo

com os princípios federativos.

Dessa forma, o planejamento, e a respectiva elaboração do plano metropolitano,

nessas entidades regionais é certamente uma função pública de interesse comum,

sendo que sua titularidade é da Assembléia Legislativa do estado, que poderá

delegá-la, na constituição estadual ou na lei complementar que instituir a região, de

acordo com sua conveniência.

A lei complementar poderá delegar essa competência ao ente regional, no caso

do Estado de São Paulo, ao Conselho de que trata o art. 154. Na Região

Metropolitana da Baixada Santista, tal plano seria elaborado pela AGEM (órgão

técnico do sistema metropolitano), aprovado pelo CONDESB (conselho normativo e

deliberativo, com participação popular) e depois executado pela AGEM (órgão

executor) em parceria com os municípios e demais órgãos estaduais envolvidos.

No entanto, um plano elaborado pela entidade metropolitana, com a participação

popular, por meio de audiências e consultas públicas estabelecendo diretrizes e

176
Conselho de caráter normativo e deliberativo. No caso da RMBS o CONDESB.
104

servindo como um instrumento básico de política de desenvolvimento e da expansão

urbana, tal qual um verdadeiro plano diretor metropolitano, deveria ser aprovado em

lei pela Assembléia Legislativa.

Essa aprovação pela Assembléia Legislativa revestiria o plano metropolitano com

o princípio da legalidade, e o cobriria de maior legitimidade e poder de ação.

Nesse sentido podemos tomar como exemplo a Lei Específica da Billings, que

define a Área de Proteção e Recuperação dos Mananciais da Represa Billings

(APRM-B).

Vítima da explosão demográfica causada pelo rápido adensamento populacional,

em áreas de proteção ambiental, sem qualquer tipo de planejamento na ocupação

do solo ou de saneamento ambiental, o reservatório passou a apresentar perda

tanto na qualidade como na quantidade de água disponível para o abastecimento da

Região Metropolitana de São Paulo.

Embora não seja exatamente um plano metropolitano, a lei estabelece normas de

preservação, uso e ocupação do solo para os municípios de Diadema, Santo André,

São Bernardo do Campo, Ribeirão Pires e Rio Grande da Serra, além de São Paulo,

todos integrantes da RMSP.

Além disso, a lei prevê que a gestão da área seja compartilhada, entre o Estado e

os municípios envolvidos, num claro movimento de integração e cooperação entre

os Poderes Públicos envolvidos.177

Cabe ressaltar a ampla participação popular na elaboração do projeto de lei e

durante sua tramitação na Assembléia Legislativa de São Paulo, com a realização


177
Fonte Portal do Governo do Estado de São Paulo
<http://www.saopaulo.sp.gov.br/spnoticias/lenoticia.php?id=202831&c=5017>, acessado
em 20/09/2009.
105

de 53 reuniões e várias audiências públicas nos oito meses de tramitação na Casa

Legislativa.

Essa lei tem caráter tanto ambiental como urbanístico, estabelecendo regras tanto

aos particulares como aos municípios notadamente na regularização de lotes por

meio de compensação ambiental, delimitação de áreas de intervenção, com a

realização de um zoneamento ambiental e a adoção de parâmetros para o uso e

ocupação do solo, a limitação da urbanização do entorno do reservatório, evitando

novas ocupações e normatizando a implantação de infra-estruturas sanitárias.178

Outro exemplo de planejamento estadual é o PINO - Planejamento Ambiental

Estratégico das Atividades Portuárias, Industriais, Navais e Offshore, realizado pelas

Secretarias do Meio Ambiente e Desenvolvimento do Estado de São Paulo e tem por

objetivo traçar um plano que irá organizar a atração de investimentos (públicos e

privados)179, minimizando seus efeitos e impactos negativos e promover a

sustentabilidade sócio-ambiental da região litorânea do Estado de São Paulo.180

5.2.1 O Plano Metropolitano de Desenvolvimento Integrado

A responsabilidade pelo planejamento e execução dos planos metropolitanos é,

como já dito, da AGEM. Dentre os vários projetos e planos elaborados pelo órgão, o

que mais se aproxima de um plano diretor metropolitano é o Plano Metropolitano de

Desenvolvimento Integrado da Região Metropolitana da Baixada Santista – PMDI181,

178
Fonte: Secretaria do Meio Ambiente. Governo do Estado de São Paulo. Minuta de lei
específica da Área de Proteção e Recuperação dos Mananciais do Reservatório Billings
APRM-B.
179
Atualmente existem várias perspectivas de investimentos na região, principalmente
relacionadas à cadeia de exploração e distribuição de petróleo e gás natura (estaleiros,
bases de apoio, aeroportos e heliportos), à indústria, e à expansão dos portos de Santos e
São Sebastião.
180
Fonte: Secretaria do Estado do Meio Ambiente,
<http://www.ambiente.sp.gov.br/cpla/pino.php>, acessado em 05/03/2010.
181
Fonte: Agência Metropolitana de Desenvolvimento da Baixada Santista,
<http://www.agem.sp.gov.br/projetos_pmdi.htm>, acessado em 20/10/2010.
106

elaborado pela Empresa Paulista de Planejamento Metropolitano S.A.(EMPLASA)

em parceria com a Agência Metropolitana.

Segundo o próprio documento, trata-se de um conjunto de princípios, objetivos,

políticas e diretrizes consistentes e articulados entre si, que visa orientar o

desenvolvimento da região num prazo de 12 anos (2002 a 2014)182. O Plano não tem

caráter normativo, visto que não foi aprovado em lei pela Assembléia Legislativa,

não podendo obrigar particulares ou Poder Público e nem regular qualquer atividade

por não observar o princípio da legalidade.

O PMDI tem por objetivo: 1) fornecer aos agentes públicos e particulares que

atuam na Região, cenários e perspectivas de desenvolvimento e demandas

regionais; 2) Oferecer insumos aos municípios da Região, para que estabeleçam de

forma compatibilizada suas programações de urbanização e intervenções sobre o

meio ambiente, bem como suas normas de ordenamento espacial e defesa e

promoção ambiental; 3) Disponibilizar referências para ação das entidades públicas

ou privadas prestadoras de serviços de infra-estrutura e sociais no âmbito da

Região; 4) Identificar oportunidades de ação promocional, de recuperação, de

dinamização e de criação junto a segmentos da atividade econômica e de

organização física/ urbanística e ambiental de suporte à economia e ao

assentamento na Região; 5) Disponibilizar informações e referências em geral, de

âmbito regional, para a elaboração de Planos Diretores dos municípios da RMBS; 6)

Oferecer insumos em geral para o desempenho das funções públicas de interesse

comum no âmbito da RMBS.

182
Emplasa. Plano de Desenvolvimento Integrado – PMDI 2002 – Região Metropolitana da
Baixada Santista, p. 4.
107

É, na sua essência, um plano voltado primordialmente para o desenvolvimento

econômico, sendo que a qualidade de vida está direcionada unicamente com o

surgimento de oportunidades de trabalho e não ao equilíbrio com o meio ambiente

urbano e natural, deturpando o conceito de desenvolvimento sustentável.


108

6 Conclusões

A partir da analise do texto constitucional e de uma perspectiva histórica sobre o

federalismo brasileiro, buscamos uma base teórica que servisse de alicerce para o

estudo da autonomia municipal nas regiões metropolitanas.

Esse estudo não é fácil, uma vez que a Constituição de 1988 pouco falou sobre a

institucionalização dessas entidades regionais, que mesmo não sendo uma inovação

da atual Carta, sofreu sérias mudanças na sua estrutura, o que dificulta (ou mesmo

impossibilita) o uso da doutrina sobre o assunto anterior a 1988183.

Da mesma forma, a falta de uma legislação federal que regulamente a matéria

possibilita a cada estado-membro tratar o instituto de forma diferente, não existindo

uma uniformidade de seu uso e atribuições no país.

Porém, o estudo das atribuições das regiões metropolitanas deveria ser cada vez

mais profundo e profícuo, vez que, atualmente, a grande maioria da população vive

nas cidades, fruto do êxodo rural e do processo de industrialização, e grande parte

nas regiões metropolitanas, quando o processo de conurbação derruba as fronteiras

físicas da cidade e, muitas vezes, as fronteiras jurídicas, exigindo do Direito o

dinamismo e adaptação a novas realidades.184

A finalidade do Direito185 é regulação das condutas de pessoas físicas e jurídicas,

de Direito Privado ou Público, na busca dos objetivos fundamentais da República,

notadamente a construção de uma sociedade livre, justa e solidária, o

desenvolvimento nacional, a erradicação da pobreza e a redução das desigualdades


183
Metaforicamente, não é possível ler a Constituição de 1988, com os óculos da
Constituição e 1967 ou da emenda de 1969.
184
Segundo Sol Garson, em 2005, as regiões metropolitanas abrangiam 463 municípios e
42% da população, além de ser responsável por 57,5% do PIB. In Regiões Metropolitanas.
Por que não cooperam? Rio de Janeiro: Letra Capital. 2009, p. 192.
185
Aqui grosso modo entendido como conjunto de normas de condutas.
109

sociais e regionais e a promoção do bem de todos, sem qualquer tipo de

preconceitos ou discriminação.186

Nesse sentido não só o estudo das regiões metropolitanas é de indiscutível

importância, por se tratar de porção territorial onde as desigualdades se exacerbam,

pois, mesmo sendo os centros econômicos mais dinâmicos, suas periferias abrigam

a população mais pobre e marginalizada dos processos formais de geração de

emprego e renda, mas principalmente que o uso dessas regiões pelo Poder Público

chegue ao objetivo que é a qualidade de vida das pessoas.

Esse é o objetivo, também, do Direito Ambiental e do Direito Urbanístico,

promover o desenvolvimento sem comprometer a qualidade de vida das presentes

e futuras gerações.

Esses princípios devem ser levados em consideração quando estudamos, sob o

prisma constitucional, o instituto das regiões metropolitanas.

Evidente que as regiões não são entes federativos ou pessoas políticas. São

instrumentos, previstos constitucionalmente, como forma de enfrentar as

dificuldades da conurbação.

Isto posto, as regiões metropolitanas não são entes dotados de autonomia,

diferente dos estados e dos municípios. Portanto, não existe o falso dilema de que o

legislador complementar estadual, ao criar a região metropolitana, poderia, de

alguma forma, , ferir sua autonomia constitucional, ceifando parte das competências

municipais de atuar quando o assunto for de “interesse local”.

Ao delegar aos estados a possibilidade de criar as regiões metropolitanas, para

integrar a organização, o planejamento e a execução de funções públicas de


186
Constituição Federal, artigo 3° e incisos.
110

interesse comum, o constituinte estava, na verdade, falando que os municípios não

são competentes para, individualmente, atuar quando o interesse for comum, isto é,

exacerbar o limite constitucional do interesse local.

Evidente, no entanto, que o interesse comum não é, de forma alguma, desculpa

para que o estado intervenha inconstitucionalmente nos interesses do município.

O interesse comum sobrepõe-se, constitucionalmente, ao interesse local. Não

hierarquicamente, mas por serem distintos. Um município não poderia agir no

território de outro, em nome do interesse comum, cabendo ao ente territorialmente

responsável a competência regional.

Se por um lado, o interesse comum não pode estender-se sobre as competências

municipais, essas também não podem sobrepor-se ao interesse e a titularidade do

estado-membro de tratar de questões de interesse regional.

Esse é também o entendimento das jurisprudências que trouxemos, tanto do

Supremo Tribunal Federal, como do Tribunal de Justiça de São Paulo, que

entendem constitucional a atuação do estado, por meio da região metropolitana, no

território municipal.

O município que integre uma unidade regional, no caso região metropolitana não

é menos autônomo que o município que não a integre. Porém as necessidades são

diferentes.

Portanto o legislador complementar estadual ao exercer o direito outorgado pela

constituição federal de criar região metropolitana não está excedendo seu limite de

competência estipulado pela Constituição. Pelo contrário, exerce um direito, pois foi

o próprio texto constitucional que previu a criação de regiões metropolitanas quando


111

os municípios não conseguirem, isoladamente, exercer sua autonomia e

competências.

Esse é o espírito adotado pelo constituinte paulista ao prever na Constituição

Estadual de 1989 os municípios devem, no que couber, compatibilizar seus planos

aos planos regionais, bem como o estado, compatibilizar seus planos aos planos

diretores dos municípios integrantes de entidades regionais.187

No Estado de São Paulo, a região metropolitana não é simplesmente um órgão

estadual, mas um órgão formado por estado e municípios, que conjuntamente irão

atuar na organização, planejamento e execução das funções públicas de interesse

comum.

Esse é o espírito da Lei Complementar 760 de 1994, que definiu as diretrizes para

a divisão regional do Estado de São Paulo, bem como, também é a intenção da Lei

Complementar n° 815 de 1996 que criou a Região Metropolitana da Baixada

Santista e o CONDESB com paridade de membros entre estado e municípios

envolvidos.

Esse modelo adotado, de um Conselho de Desenvolvimento, com atribuições

normativas e deliberativas e de uma Agência com funções executivas e de

planejamento, com a participação dos municípios e a previsão da participação

popular parece ser um modelo equilibrado para a gestão metropolitana.

É o caso da legislação urbanística metropolitana, que nas formas de um plano

diretor regional, fixe diretrizes regionais de desenvolvimento e expansão urbana,

organizando o funcionamento e o crescimento da região, levando-se em

consideração, a peculiaridade de cada município, porém, com uma visão global da

187
Constituição do Estado de São Paulo, artigo 155 e parágrafo único.
112

região, evitando uma “colcha de retalhos” formada por vários planos diretores que

por ventura, não se comuniquem.188

Dessa forma, as cidades sustentáveis, previstas como um direito de todo cidadão,

tanto na Constituição Federal como no Estatuto da Cidade, dependem de um

planejamento que leve em consideração todos os aspectos e pormenores,

principalmente nos locais onde os efeitos da urbanização e da conurbação sejam

mais presentes como é o caso das regiões metropolitanas.

A única forma de enfrentar essa questão, nessas regiões, é a participação de

todos os entes envolvidos e da população, no planejamento e na execução das

funções públicas de interesse comum.

7 Bibliografia

188
Os planos diretores são obrigatórios para cidades com mais de 20 mil habitantes ou
integrantes de regiões metropolitanas (Lei 10.257/2001, artigo 41, I e II).
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