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A EMPRESA FAMILIAR ROBERT G. DONNELLEY “O exame de vida e das obras dos grandes lideres demonstra que nada deveram & sorte, mas a oportu- nidade que thes foi oferecida... Sem a oportu- nidade, a capacidade teria sido desperdicada e carente de capacidade a oportunidade teria sido va.” — N. Maguraven. Neste artigo consideraremos familiar a emprésa que tenha estado ligada a uma familia pelo menos durante duas ge- ragdes e com ligacdes familiares que exercam influéncia sObre as diretrizes empresariais, os interésses e objetivos da familia. Tal relac&o pode ser identificada quando um cu mais dos seguintes fatéres estiverem presentes: e@ A relac&o familiar é um fator, dentre outros, na de- terminag&c da sucessao administrativa. @ Espésas ou filhos do atual ou de antigos diretores tive- rem assento no Conselho de Administracéio. @ Os valores institucionais importantes da emprésa es- tao identificados com a familia, seja por meio de publi- cag6es formais da emprésa, seja através das tradicdes da organizacdo. @ As acées de um membro da familia exercem influén- cia, ou pelo menos acredita-se que exercam, sObre a repu- Ropert G. DONNELLEY — Do First National City Bank of Chicago e da R. R. Donnelley and Sons Company. Nota da Redacdo: Traduzido do inglés por Carlos Osmer Bertero e publicado mediante autorizacéo da Harvard Business Review, Vol. 42, n.° 4, julho-agésto de 1964, onde foi originalmente publicado. 162 A EMPRESA FAMILIAR RAE/23 tagao da emprésa, independentemente de sua participa- ¢4o formal nos quadros administrativos da mesma. @ Os parentes sentem-se obrigadcs a possuir acdes da emprésa por razOes que nao sao exclusivamente financei- ras, particularmente quando a emprésa incorra em pre- juizos . @ A posicéo ocupada pelo membro da familia na em- présa influenciaré sua situacdo familiar . @ Um membro da familia devera relacionar-se clara- mente com a emprésa a fim de determinar sua propria vida profissional . Importancia da Emprésa Familiar Aproximadamente 20% das quinhentas maiores empré- sas listadas pela revista Fortune evidenciam importantes ligagdes familiares, seja, com respeito 4 propriedade de acées, seja no que diz respeito a administrago. Em varios setores industriais, inclusive produtcs quimi- cos, farmacéuticos, téxteis, corretagem de cereais, proces- samento de carne, bancos de investimento, vidros, distri- buic&o de bebidas e conexos, graficas, agéncias de propa- ganda e instituicdes varejistas, as emprésas ligadas a gru- pos familiares desempenham um papel que, se nfo chega a ser de dominic, é pelo menos de grande importancia. Encontramos entre elas empreendimentos de grande su- cesso como Du Pont, Seagrams, Cargill, Corning Glass, Upjohn, Firestone Tire and Rubber Company, Winn-Di- xie Department Stores, Joseph Magnin, Cabot Inc., Lykes Brothers Steamship. Um survey conduzido pela revista Fortune em 1955, englobando 175 das maiores emprésas norte-americanas, revelou que cérca de 55% incluiam parentes exercendo cargos administrativos na mesma firma. Um estudo baseado no levantamento da situac&o de apro- ximadamente 8.000 administradores, conduzidc pelos RAE/23 A EMPRESA FAMILIAR 163 profess6res W. LLoyp WARNER e JAMES C. ABEG- GLEN (Big Business Leaders, Nova Iorque, Harper & Brothers, 1955), mostrou que dois dentre cinco adminis- tradores eram filhos de detentores de altas posigdes admi- nistrativas, e trés dentre cinco eram filhos de proprietarics de grandes emprésas e ocupavam cargos nas firmas de seus pais. Cumpre destacar que os pesquisadores em ques- tao descobriram que a proporcéo de filhos de acionistas majoritarios ocupando cargos nestas mesmas emprésas re- fletiam um aumento com relagéo a uma pesquisa do mes- mo género realizada vinte e quatro anos antes. Os pro- fess6res WARNER e ABEGGLEN também observaram um declinio no nimero de filhos ccupando cargos de pre- sidentes ou diretor superintendente nas mesmas empré- sas de seus pais, mas por outro lado verificaram que tal diminuig&o era mais do que ccmpensada pelo aumento de filhos ocupandc cargos de vice-presidentes e outros niveis imediatamente abaixo, do que podia ser encontrado entre os individuos da geracéo passada. @ Seria a administragdo familiar contraria aos principios fundamentais da tradicéo empreszrial americana que de- fende a competicé&o livre e a igualdade de oportunidades e a tese de que o melhor homem deve ocupar o cargo mais elevado? @ O valor atribuido a uma administragao de tipo fami- liar seria ilusério, e o produto de racionalizagdes pata jus- tificar os interésses das familias envolvidas? @ = A influéncia familiar contrariatia os preceitos de uma administragaéo profissionalizada? @ As complexidades e as exigéncias da vida empresa- rial moderna impediriam definitivamente que a familia continuasse a tentar perpetuar a influéncia familiar s6bre a vida da emprésa? 164 A EMPRESA FAMILIAR RAE/23 Davidas como as citadas sébre a eficacia, para nao ques- tionar da moralidade da administragéo familiar, consti- tuem exemplos tipiccs da atitude predominante entre ho- mens de negocio, consultores e professéres de administra- ¢4o. Nalgumas emprésas o interésse familiar é fonte de muitas fraquezas da crganizagéo. Mas se a simples pre- senga de membros de uma familia ccnstitui por si a indi- cacao de ma administracao, é uma proposigéo aberta ao debate. Na verdade seria suficiente que se observasse 0 sucesso de algumas emprésas familiares, para se poder questionar a validade do sistema de punicdo-recompensa que permeia a atividade administrativa das emprésas nado familiares . Neste artigo tentarei analisar desapaixonadamente as em- présas de tipo familiar e tentarei enumerar algumas van- tagens e desvantagens, esperando que possam servir de orientagéo para os membros da comunidade empresarial que desejem entender de maneira mais adequada a na- tureza da emprésa de tipo familiar. Espero que c artigo seja de especial interésse a todos aqué- les que sao empregados de tal tipo de emprésa, ou que estejam em vias de aceitar cargos, ou que simplesmente ja detenham posigées administrativas em emprésas fami- liares . Pelo fato de que as fraquezas de uma emprésa podem ser os motivos da vitalidade de outras, o melhor que um observadcr pode fazer é auxiliar os que de qualquer ma- neira participem das atividades de emprésas familiares a adquirir uma compreensdo da situacao em que estao en- volvidos e que lhes possibilite o entendimento das situa- Ges para que possam elaborar os cursos de aco a serem seguidos. Minhas observagées sAo baseadas num estudo de 15 em- présas familiares bem sucedidas, apoiadas em entrevistas individuais com membros das familias em posigdes admi- nistrativas e curtos homens de negécics e professéres que se tém interessado pelo problema. RAE/23 A EMPRESA FAMILIAR 165 FRAQUEZAS A EVITAR Consideremos primeiramente o lado negativo da questo, tomando como exemplo casos reais e posteriormente exa- minaremos as situacdes nas quais houve sucesso. Entre as fraquezas da administracgao familiar acreditamos serem as mais importantes: © Conflitos entre os interésses da familia e os da emprésa. e@ Falta de disciplina com relacéo 4 destinacdo dos lu- cros e ao desempenho nos varios setores da organizac&o. @ Morosidade nas reagdes ds novas condigées de com- peticdo impostas pelo mercado. @ Desenvolvimento de nepotismo que nao é contraba- langado por padrées cbjetivos de desempenho ou por sis- temas adequados para avaliagéco de mérito de adminis- tradores. Conflitos de Interésse Na emprésa familiar, a familia quase sempre detém 0 con- tréle acionario e as posicdes administrativas de relevancia para poder estabelecer os objetivos da organizagdo e ten- tar a satisfacéo de suas aspiragdes, mesmo que éstes nao ccincidam obrigatoriamente com cs interésses da emprésa. Por outro lado os interésses e valores opostos dos mem- bros de uma emprésa “aberta” exercem contréle ou con- dicionam os interésses e valores do individuo bem como de seus familiares. Desta forma tende a desenvolver-se a lideranca administrativa e perpetua-se a énfase de valé- res institucionais que se sobrepde aos valéres puramente individuais através de sistemas formais de contréle e in- centivos . E evidente que tal situagc na emprésa de tipo “aberto” nem sempre conduz ao equilibrio. Algumas vézes, a or- 166 A EMPRESA FAMILIAR {23 ganizacéo acabara por subjugar o individuo bem como sua familia. O conceito popular de “homem de organiza- ¢40” (organization man) com sua espésa e filhos “organi- zacionais”, constitui um bom exemplo désse perigo. Tal dominio poderé afetar diretamente o interésse piblico, como ficou patenteado no caso de “fixacao de precos” que envolveu a General Electric e a Westinghouse, e outros predutores de equipamento eletrénico. Enquanto a em- présa “aberta” pode ter seus problemas, pelo menos existe a possibilidade de que 0 mecanismo organizacional impo- nha aos seus membros um senso de responsabilidade com relacao aos dirigentes da organizacac. Numa emprésa familiar, a énfase sdbre os aspectos tipica- mente organizacionais nao é inerente a estrutura da em- présa, pelo menos no que diz respeito as relagdes entre os membros do grupo familiar. O equilibrio entre os in- terésses da familia e da emprésa é habitualmente de na- tureza psicolégica, originando-se no sentido de responsa- bilidade pessoal da familia como um todo para com a companhia. O fato de que as emprésas familiares mais bem sucedidas desenvolveram refinados sistemas de res- trigdes As prerrogativas familiares, em muitos casos apoia- do em rigidas tradigdes da prépria familia, nao elide o fato de que para cada caso, as restrigdes tem de ser ini- cialmente opostas pelos préprios membros da familia. E. I. DU PONT de Nemours & Company, Inc., conside- tada quase universalmente como um paradigma de orga- nizagao bem administrada podera servir de exemplo: Apesar dos membros da familia Du Pont possuirem parte substancial das acées da companhia, e, além disso, serem membros ativos da administracgéo da emprésa elaborando suas principais diretrizes, as relagdes familiares nao tém sido a Unica razéo para obtencao de promogées dentro da organizacao. A restricao 4 prerrogativa familiar teve ori- gem quando PIERRE DU PONT rejeitou deliberada- mente em 1910 a “cristalizada e tradicional atitude de que a emprésa era administrada pela familia e que era um dever familiar administrar a emprésa... PIERRE’ RAE/23 A EMPRESA FAMILIAR 167 TT nomeou membros da familia para posicgées importantes, mas apenas depois de terem dado provas de suas capaci- dades administrativas” . * Porém, em organizagdes nao tao bem suceditdlas como a Du Pont, a imunidade contra as restrigdes de natureza organizacional faz com que importantes necessidades em- presariais sejam obstaculizadas e mesmo frustradas por interésses da familia. Esta situacgéo pode conduzir a um dos mais amplamente divulgados problemas das empré- sas familiares, inclusive a falta de capital, falta de dis- - crigféo na administracéo financeira, diretrizes erréneas, falta de disciplina na aplicag&o dos lucros, no utilizagéo de pessoas dotadas de talento administrativo pelo simples fato de nao pertencerem ao circulo familiar, nepotismo e o que é mais grave, conflitos familiares. Esses abusos séo de certa forma esperados numa emprésa familiar, particularmente quando a familia nao logrou de- senvolver uma atitude de responsabilidade com relagao A companhia que possui. Diversamente do sistema de va- lores predcminante numa companhia de tipo “aberto”, que estabelece de maneira “formal” a autoridade de de- terminada pessoa, bem como a sua responsabilidade, status e a correspondente recompensa financeira com base na competéncia demonstrada na consecucao dos objetivos da emprésa, as normas familiares comumente enfatizarao a necessidade de prover as exigéncias da comunidade fami- liar. Na confusao de valores que resultaré em tais situa- des, as necessidades da companhia poderao ceder lugar As necessidades da familia. Tal situagdo teve lugar na Cole Hardware Company* (co nome dessa emprésa bem como das subseqiientes designadas por um asterisco sao disfarces, mas tanto as emprésas como os individuos sao reais). Levando em considerac&o suas obrigagdes para com ou- tros membros da familia, Peter Cole, presidente e diretor 1) ALFRED D. CHANDLER, JR, Strategy and Structure, Cambridge, Massa- chusetts: Massachusetts Institute of Technology Press, 1962, pag. 64. 168 A EMPRESA FAMILIAR RAE/23 comercial da companhia, sentiu-se obrigado a nomear seus irmaos e cunhadcs para ccupar varios cargos na com- panhia, apesar de nao serem administradores competen- tes. “O corretc seria nac nomed-los, mas nao posso agir desta maneira com os meus proprics irmaos. Além do mais se meu cunhado nao se empregar nesta emprésa, te- rei que arrumar uma outra forma de sustenta-lo.”? A obrigagao expressa por Cole com relacéio acs seus pa- rentes era frontalmente oposta a atitude comum de em- pregador, cujo senso de responsabilidade o obriga a re- compensar c bom, e punir o mau desempenho. No caso da Companhia Cole, o presidente ignorou as necessidades da emprésa, que se faziam sentir através de um compe- tente grupo de administradores, para resolver um proble- ma familiar. Esta confuséo dos interésses da familia e da emprésa constitui também fonte de outros problemas em emprésas familiares . Em tais situagdes a companhia é vista como o tesouro da familia, e como resultado os problemas de natureza fi- nanceira podem revestir-se de um carater tao reservado como os problemas referentes as rendas e bens de fami- lia, asfixiando o desenvolvimento de mecanismos de con- tréle financeiro e de técnicas de planejamento necessa-' rios e adequados o que abre caminho para que se perpe- tuem os métodos ineficientes e as diretrizes se tornem obs- curas. Citemos um exemplo: Numa grande indistria da costa Atlantica, propriedade de uma familia, acabou-se por excluir de todos aquéles que nao féssem membros da familia, qualquer informagao re- ferente A posicdo financeira da emprésa, isto porque os in- terésses financeiros da companhia estavam profundamente relacionados com os interésses da familia prcprietaria. Esta medida era t4o inflexivel que o préprio tescureiro ignorava a posicéo financeira da emprésa, pois nfo era 2) C.ROLAND CHRISTENSEN, Management Sucession in Small and Growing Enterprises, Boston, Division of Research, Harvard Business School, 1953, pag. 175. RAE/23 A EMPRESA FAMILIAR 169 membro da familia. Tal situacéo nao permitia que o te- scureiro desempenhasse as funcées fundamentais e basicas inerentes ao seu cargo. Falta de Disciplina com Relacgao 4 Destinagaéo dos Lucros Outro problema encontrado em emprésas familiares, mas também comum a outras emprésas que sao controladas por pequencs grupos, é a auséncia de disciplina com rela- ¢&o a destinacao dos lucros. Da mesma forma que a em- présa formada por pequenos grupos, a familiar tende a concentrar-se em minticias como na qualidade do produto, exageros no que diz respeitc a melhorias na fabrica e na renovacaéo de equipamento, em afazeres civicos em ven- das e na consolidacao do prestigio adquirido, e no cultivo de relagdes pessoais que excedem os limites das contribui- ¢des que ésses varios fatéres podem cferecer para que se atinja a lucratividade a longo prazo como condigfo indis- pensavel para a sobrevivéncia da organizacao. Tal énfase pode levar a sistemas frouxos de contréle de custos e ou- tras praticas contabeis igualmente inadequadas, ou 4 ma vontade dos administradores para que adotem as medidas ccrretivas necessarias para que a contabilidade possa in- dicar que “certas extravagancias” sao despropositadas . Contudo, o impacto désse problema é dificil de ser ex- presso estatisticamente, e dois administradores de bancos de Chicagc afirmaram ser “os bons sistemas contabeis” e “a presteza em agir com vistas a corrigir um curso de agéo quando os custos se apresentam excessivamente altos” as principais diferencas entre as emprésas familiares bem @ mal sucedidas. E nao é impertinente observar que uma comparacdo recente entre um grupo de pequenas empré- sas, das quais 80% eram bastante “fechadas”, com outras do mesmo tamanho, todavia “abertas”, revelaram para as dc primeiro grupo margens de lucro menores, cérca de metade da margem apresentada pelas do segundo grupo. Sendo as emprésas familiares, de maneira geral, mais con- servadcras do que as emprésas “abertas” nos seus relaté- 170 A EMPRESA FAMILIAR /23 trios financeiros, e por motivos competitivos e fiscais ten- tam sonegar lucros nos seus relatorics financeiros das mais diversas maneiras, conclui-se pela suspeic&éo com relag&o as conclusées apresentadas por tal tipo de pesquisa. Mas existe algo a considerar sébre os administradores de em- présas familiares que poderao questionar da consisténcia de sua disciplina com relag&o 4 destinacao dos lucros. Morosidade na Reformulacao de Diretrizes Mercadoldgicas Excessivo envolvimento com os interésses familiares po- dem ser empecilhos para que uma emprésa utilize todas as vantagens que as mudancas de mercado possam lhe of2- recer, ou simplesmente para que maximize as oportuni- dades de crescimento. Tal atitude pode ser ilustrada pelo caso da Howard Wine Company*: A fim de poder atender a um mercado nacional em cres- cimento para a sua linha de produtos, a companhia neces- sitava de um aumento de capital. Apesar do crescimento da companhia ter sido capaz de vir cobrir mais do que o aumento de capital projetado, a familia Howard opés-se A medida, simplesmente porque “sentiam” nao ser conve- niente que pessoas de fora (os novos subscritores de agdes), viessem a participar dos negécios familiares. Quando uma familia se identifica intimamente com um de- terminado produto cu com uma fungdo tradicionalmente desempenhada pela sua emprésa, outro problema podera criar-se, ou seja, a companhia tornar-se-4 vulneravel aos efeitos das modificagées de mercado. Foi o que ocorreu com a Hollowell Glove Company * . Durante anos o pai havia treinado seu filho para produ- zir num alto padrao de qualidade um determinado tipo de luva. A despeito das mudancas impostas pela moda, e que levaram o tipo de luva a se tornar absolutamente ina- ceitavel do ponto de vista mercadoldgico, o filho foi inca- paz de dirigir a firma e adapté-la as novas condig6es da moda e do mercado. Neste caso, felizmente, o filho man- teve as esperancas de que os consumidores retornassem RAE/23 A EMPRESA FAMILIAR ibal TTF ao velho estilo e acreditou que “qualquer modificagao in- troduzida no produto acabaria por lesar a reputacgado de alta qualidade da companhia que o pai consolidara com grandes sacrificios” . Mas ésse problema nao é comum a tédas as emprésas fa- miliares, pois alguns dcs administradores e professéres de administracao entrevistados mencionaram companhias familiares bem sucedidas por “suas firmes diretrizes para definig&o de sua linha de produtos e nos esforcos deser volvidos para implementacdo das referidas diretrizes’ Isto nao eclipsou o fato de que muitos puderam constatar grande debilidade nos esforcos mercadolégicos das empré- sas familiares. Segundo o presidente de um importante banco de Chicago: “Tenho a impresséo de que as companhias de menor su- cesso, sdo razoavelmente eficientes na esfera de produ- cao. Normalmente, seus problemas surgem na area de mercadizagaéo e no desenvolvimento de novos produtos, bem como no aperfeigoamento de sua linha atual de pro- duc&o. Conseqiientemente tais companhias tendem a fi- car para tras dos demais competidores e a perder mer- cado. A recuperacgdo de uma posigéo competitiva que se deteriorou é na verdade um processo lento e dificil, que habitualmente nao pode ser realizado pela mesma admi nistracgdo que permitiu que a determinag&o se concreti- zasse.” Nepotismo Excessivo Problema mais notério da emprésa familiar é o nepotis- mo, que de acérdo com o verbéte correspondente tirado de um dicionario da lingua inglésa é “a promocgao de pa- rentes, mais por causa das relagdes de parentesco do que por mérito”. Tanto ja foi escrito sbre o assunto que é perigoso sequer abordar o problema nas discussdes que tém lugar no 4mbito de emprésas familiares. Como bem comentou a revista Fortune: “O fato que por si s6 se impée a consideracdo é que as exigéncias do mercado em breve 172 A EMPRESA FAMILIAR RAE/23 eliminarao as firmas que entregam sua administracao a parentes incompetentes.”* Todavia, toda emprésa identi- ficada com uma familia tera de preocupar-se com o favo- ritismo que tende a desenvolver-se nas suas diretrizes de pessoal, vez que a opiniao piblica suspeita quase auto- maticamente ser o nepotismo a regra na maioria dessas emprésas. Onde o nepotismo é praticado, acabam por impor-se os va- lores da familia, e os critérios para participacdo na ativi- dade empresarial deixam de levar em considerac&o a com- peténcia profissional. Quando isto ocorrer, as cportuni- dades que poderao ser eventualmente oferecidas a pes- soas que nao fazem parte do circulo familiar correréo o tisco da recusa, 0 que colocaré a emprésa numa posicdo desvantajosa com relag&o aos seus competidores que dis- porao de uma faixa mais ampla para recrutar o seu pessoal. Ao mesmo tempo o nepotismo enfraquece as posigdes dos atuais administradores, forcando-os a carregar o fardo da incompeténcia dos protegidos e a realizar as tarefas que nao séo por éstes desempenhadas. De maior gravidade é o fato do nepotismo conceder maicr importancia as “questdes de familia” do que a “realidade” no tratamento dos assuntos empresariais. Quando isto acontecer, a ori. entacao da emprésa, para a realizac&o de tarefas especifi cas por parte de seus administradores, sera abolida, e as perspectivas de sobrevivéncia da companhia a longo prazo estarac inevitavelmente ameacadas. O tipo de pensamento que gera o nepotismo também con- duz a formag&o de grupos em oposicao no interior da or- ganizacao, a nosso ver o problema mais sério das empré- sas familiares. Discussdes e grandes diferencas de opi- niao nao so peculiares 4s emprésas familiares, mas o me- canismo da heranca podera gerar poderosos interésses mi- noritarios e divergéncias que uma vez concretizados, pro- vocarao explosGes emocionais em todos os membros da organizacao de conseqiiéncias imprevisiveis . 3) PERRIN STRYKER, “Would You Hire Your Son?”, marco de 1957, pag. 228. RAE/23 A EMPRESA FAMILIAR 173 A identificagao da emprésa, da tradicao familiar e do inte- résse peculiar de proprietaric faz com que cada membro da familia se considere o porta-voz da emprésa, com di- reito a decidir sébre diretrizes. Acontece que muitos dos parentes sentir-se-Ac na mesma posicéo e pcssuindo 0 mesmo direito, sendo o dever de decidir. Conseqiiente- mente assistimos ao paradoxc de que as manifestagdes de autoridade provenientes dos ccupantes de cargos sfo cbs- taculizadas por outros membros em posicao hierarquica inferior, ou simplesmente sem nenhuma fungao na orga- nizacdo formal da emprésa. E c caso em que as diretri- zes ditadas pelo presidente s&o questionadas pelo diretor superintendente . Quando temos outros abusos além do nepotismo, os con- flitos potenciais de uma emprésa de tipo familiar podem desencadear-se. Quando o nepotismo impera numa orga- nizagao o sistema de avaliacéc e recompensa baseia-se preferencialmente nas relagdes familiares e apenas secun- dariamente na capacidade o que diminui a resisténcia or- ganizacional para enfrentar as pressdes internas. Cada deciséo passa a assumir um carater subjetivo e carrega-se de teor emocional sempre vinculado ao “problema fami- liar”, ao invés de ser uma solugéo fundamentada em pa- drées objetivos de contribuicdéo aos fins colimados pela emprésa. Na Everett Hardware Manufacturing Compa- ny * temos a seguinte situacdo: Os dois principais diretores Peter e Paul Everett concordaram em tratar seus filhos da mesma for- ma, apesar da maior capacidade demonstrada por um dos rapazes, Quando os pais faleceram, as ope- ragdes da emprésa foram paralisadas pois nenhu- ma das partes da familia, sucessores dos ex-direto- res, permitiu-se que a cutra exercesse qualquer for- ma de contréle sdbre as atividades da firma. Sen- do a emprésa tratada como heranca e nao como responsabilidade familiar, os pais nao se ocuparam. com a elaboragéo de um critério para julgar as queixas de seus respectivos filhos. Tal situacdo che- 174 A EMPRESA FAMILIAR / 23 gou ao impasse quando se desfez a harmonia até aquéle momento reinante na familia. VANTAGENS A USUFRUIR Embora problemas peculiares existam nas emprésas fa- miliares, nao se deve mencsprezar as importantes vanta- gens que poderdo ser obtidas a partir da utilizacao ade- quada da vitalidade existente no relacionamento familiar. Afinal de contas o interésse familiar é idéntico a qualquer outro fator de competicao humana que poderé interferir com cs objetivos empresarias. A Lei de Parkinson, para tomar um exemplo, descreve uma situac&o burocratica co- mum, na qual um administrador satisfara suas préprias necessidades de prestigio adicionando ao seu corpo de fun- cicnarios empregados supérfluos. A situagdéo em que os operarios deliberadamente diminuem a produg&o apesar da existéncia, dentro da companhia, de um sistema formal de incentivos e de avaliacéo de mérito é um exemplo bas- tante convincente da vitalidade das férgas puramente hu- manas num escalao inferior da atividade empresarial. Contudo quando o interésse é controlado no interior da emprésa familiar e a familia é capaz de equacionar os seus interésses a longo prazo com cs interésses da emprésa no mesmo pericdo de tempo, consegue-se obter uma rara e preciosa harmonia entre os diversos valores normalmente em oposic&o nas relagdes entre individuos e organizacdes. Esta unidade de propésitos é reforgada, implementada, e perpetuada pela tradic&o, pelo orgulho e pela identifica- g&o da familia com a companhia, e transforma-se num fa- tor intangivel no sucesso de muitas emprésas familiares. Constitui também a base de tédas as demais vantagens que possam ser encontradas na emprésa de tipo familiar. Citariamos as seguintes, como sendo as principais: @ Disponibilidade de recursos administrativos e finan- ceiros obtidcs gragas ao sacrificio familiar. RAE/23 A EMPRESA FAMILIAR 175 Oe @ Relacionamento favoravel da emprésa com a comu- nidade empresarial e com a sociedade como um todo de- vido ao respeito inspirado pela familia proprietaria . @ Uma estrutura interna caracterizada pela lealdade e pela dedicagao. @ Identificagdo de proprietdrios e administradores num tnico grupo, realmente interessado nos destinos da com- panhia. @ Sensibilidade as responsabilidades sociais pela neces- sidade de manter o prestigio da familia. © Coeréncia e continuidade das diretrizes administra- tivas e dos objetivos da firma. O Sacrificio Pessoal E paradoxal que o interésse familiar, fonte de debilidade financeira em muitas emprésas, possa em outras circuns- tancias transformar-se no principal fator de vitalidade fi- nanceira. Diversas emprésas familiares tém sido conso- lidades a base de sacrificics pessoais e dividendos exi- guos, e o orgulho e a lealdade dos membros da familia foram os responsaveis pela manutengaio da emprésa du- rante periodos de grandes dificuldades quando as consi deracgdes sébre lucros e prejuizos poderiam ter conduzi- do simplesmente ao encerramento das atividades. Se- gundo um famoso historiador da atividade empresarial americana, foram os fatéres anteriormente listados que permitiram as primeiras familias proprietarias, anteriores a Weyerhaeuser, sustentar cérca de quarenta anos de per- das, para que a emprésa pudesse tornar-se um gigante in- dustrial . A extens&o dessa lealdade é evidente nas reminiscéncias de uma espésa sébre as lutas iniciais que se encontram no principio da vida de outro grantde lider industrial: “Nossa situagéo sempre melhoraria nos préximos cinco anos. Sempre que quis trocar nossa mobilia meu marido 176 A EMPRESA FAMILIAR RAE/23 dizia: Nao agora. Estamcs precisando comprar uma nova maquina.” Em outras situagdes o orgulho e a identificagaéo da familia com a companhia obrigaram a que a firma honrasse com- promissos que excediam a obrigacdo estritamente legal. Isto é ¢ que tem levado muitas emprésas falidas a saldaz os débitos de suas emprésas ja inexistentes. Numa im- portante companhia, a familia proprietaria pagou com os seus préprios recurscs as obrigagdes para com seus em- pregados durante um periodo de grandes prejuizos. Por vézes, uma familia abastada nao sé empresta seu apoio financeiro 4 emprésa, como também transfere admi- nistradores capacitados de outras emprésas do mesmo gru- pce para auxiliar a que se encontra em dificuldades para solucionar seus problemas. Em varios dos casos estuda- dos, especialmente nas emprésas bastante “fechadas”, a transferéncia de recursos de outras emprésas para a que se encontra em dificuldades chega a ser uma pratica ha- bitual. Tomemos o exemplo da Roger Distributing Com- pany *: Por muitos ancs esta companhia expandiu-se pelo ofere- cimento de servicos contdbeis e de assessoria sGbre mer- cadizagéo. Porém a maior parte de seu faturamento es- tava ligado a uma Gnica conta. Nas transformacées do pds-guerra, com a passagem para um névo sistema de contabilizagéo, a companhia passou a ter sérios proble- mas para poder continuar servindo o seu principal cliente. Se tais problemas persistissem levariam a emprésa a uma queda substancial de sua receita, além do reflexo nega- tivo que projetaria sGbre a tradicional imagem da com- panhia. A soluc&o seria encontrada pela contratagao de servicos especializados, que no caso, seriam vendidos por outra emprésa, propriedade da familia Roger. Em tal si- tuacdo a familia proprietaria da emprésa de consultoria em questao encarregou-se de tomar tédas as medidas a fim de evitar que a solug&o viesse a ser propiciada por um competidor, no caso, a emprésa da familia Roger. RAE,/23 A EMPRE&SA FAMILIAR 177 Muito se tem criticado que administradores de emprésas familiares, ac invés de obterem, simplesmente herdam seus cargos. Pouco crédito, porém, tem-se dado ao admi- nistrador familiar que introduz ordem numa emprésa con- fusa e desorganizada, ou que nao tem grandes probabi- lidades de sobrevivéncia, a fim de atrair para a orga- nizacgao ordenada e restabelecida nas suas perspectivas de sucesso, o administrador profissional competente que possa oferecer sua valiosa contribuicéo. Basta deixar que 0 caso da Horwitz Machine Company * fale por si mesmo. A emprésa esta localizada no meio-oeste e dedica-se a fabri- cacéo de equipamento de calefacao. Nessa emprésa, o presidente, que nao era membro da fa- milia, tudo féz para dilapidé-la a fim de poder obter o contréle do que seria ent&o a “massa falida” e “reergué- la” em seu proprio beneficio. Isto ocorreu apesar do pre- sidente ter como parte de sua remunerac&o o recebimentc de agGes ordinarias e sem nenhuma consideragdo para com os empregados que perderiam seus empreges, além dcs prejuizcs que eram causados a comunidade. Apdés subs- tancial investimento, os membros da familia ccnseguiram: enfraquecer o presidente, e como n&o era possivel atrair nenhum profissional realmente competente para gerir uma emprésa em situac&o t&o precdria, um dos mem- bros da familia decidiu assumir o espinhoso cargo, pois considerava um sacrificio a ser feito como parte de suas “responsabilidades familiares” . Reputacao Valiosa Na conclusao de seu artigo sébre a familia Rothschild co Time afirmava: “ para enfrentar o futuro dispunham de uma vantagem oriunda do passado, 0 mito dos Roths- childs, que era 0 seu mais valioso ativo.”* A reputac&o de uma familia pede nao apenas exercer uma influéncia favoravel as relacdes entre a emprésa e a co- 4) 20 de dezembro de 1963, pag. 74 178 A EMPRESA FAMILIAR RAE/23 munidade, mas ainda exercer um impacto direto e claro nas préprias operagées da companhia. Em varios casos de luta entre emprésas de uma mesma indistria, a repu- tac&o da familia proprietaéria é um fator importante para obtencZo de empréstimos de bancos locais. Apesar da incerteza envolvida em tais tipcs de transag&o, os bancos acreditam que seus riscos séo diminuidos por causa do passado respeitavel da familia. As ligacées familiares também podem ser de importancia para que se crie o clima de confianca necessario 4 prépria existéncia de uma emprésa, particularmente nas situagdes em que os pontos em disputa sao controversos e as de- mais companhias envolvidas no estaéo protegidas por uma administragéo competente, ou por pareceres de firmas de consultoria importantes ou ainda por sangées legais con- tra a perda de confianga. Um campo dindmico e incerto, com uma infinidade de riscos, como é 0 ramo des bancos de investimento, constitue um exemplo dos mais ade- quados do que acabamos de afirmar. Os diversos bancos de investimento de Nova Iorque est&o ligados a familias, o que lhes permite uma grande flexibilidade no estabele- cimento de associagées para investimento em Areas onde o retérno sébre o investimento costuma ser elevado e a competic&o ainda nao se estruturou claramente. Nalguns casos o beneficio oriundo de uma relag&o familiar pode assumir aspecto muito sutil. Nas areas de atividade onde as relagdes informais séo decisivas para a realiza- cdo de transacgées, a identificagao da emprésa com uma familia respeitada pede influenciar de maneira direta as préprias atividades de mercadizagdéo. Uma emprésa de corretagem do tipo “fechado”, por exemplo, pode conser- var clientes antigos ou atrair novos devido 4 sua identifi- cagéo com uma familia ilustre no mundo dos negécios. Tal relagéo podera desempenhar grande importancia em instancias em que todos os demais fatéres so semelhan- tes ou em que os resultados dos servicos ofertados so intangiveis . RAE/23 A EMPRESA FAMILIAR 179 Lealdade dos Empregados O valor de uma relac&o familiar nao se limita ao papel desempenhado pela familia nas atividades da companhia e nas suas relagdes com o piblico. O envolvimento da fa- milia com a atividade empresarial podera exercer influén- cia na prépria organizacdo interna da firma. A adminis- tracao familiar pode evitar excessiva mudanca nos qua- dros administrativos, o que tem efeito particularmente de- sastroso para as pequenas emprésas, e ainda assegurar-se de que a capacidade competitiva da firma continuara inal- terada. A atividade empresarial ncs ‘iltimos anos tem assistido a um agravamento de problema de rotac&éo de m&o-de-obra altamente qualificada (executive turn-over). Uma em- présa de consultoria da cidade de Nova Iorque estima en- tre 75.000 e 100.000 o niimero de administradores de nivel médio e alto, que mudam de emprégo anualmente. As proporgées désse turn-over levou um autor ao se- guinte comentario: “Embora nao se possa demonstrar em délares e em centavos ou numa declaracdo de lucros e perdas, o turn-over de administradores é... um dos custos ocultos mais elevados a onerar a moderna em- présa.”* Aquilo que simplesmente custa caro para a grande ou média emprésa podera ser ruinoso para a pequena, onde © turn-over de administradores abala a prépria estru- tura administrativa da organizag&o e pde em risco sua ca- pacidade competitiva. Um administrador que nao seja ligado a familia proprietaria permaneceré numa pequena emprésa familiar apenas enquanto isto the convier. Se encontrar uma oportunidade que atenda melhor aos seus 5) JupiTH Dotems, “A Good Man is Hard to Keep”, Dun’s Review and Modern Industry, maio de 1963, segundo citagdo de The Executive, agésto de 1963, pag. 21. 180 A EMPRESA FAMILIAR RAE/23 interésses, abandonaré seu cargo imediatamente. Se se associar a uma companhia Iccalizada noutra Area, repre- sentara uma grande perda devido ao tempo e as despesas incorridas para o seu treinamento, recursos que sao, ge- ralmente, escassos na pequena emprésa. Muito prova- velmente o administrador em questdo ira para uma em- présa concorrente ou iniciara o seu préprio negécio, o que sempre redundara em grande ameaga para o seu antigo empregador. Diversamente da grande emprésa, a pequena n4o desfruta da seguranca proporcionada pelo tamanho ou pelas van- tagens trazidas por um grande programa de pesquisa e de- senvolvimento de novos prcdutcs. Normalmente, a es- tratégia competitiva da pequena emprésa baseia-se na sua capacidade para oferecer certos servigos de maneira mais adequada ou mais rapidamente do que as grandes empré- sas. Habitualmente os recursos de uma emprésa pequena sao constituidos de uma técnica especial cu de caracteris- ticas de produto que nao pcdem ser patenteadcs. Quan- do um de seus administradores se transfere para um con- corrente, a emprésa pequena podera assistir 4 utilizagao de suas técnicas ou de seus produtos para o comprome- timento de sua situac&o, e sua posicao na industria séria- mente ameacada. O administrador que é membro da familia, ou que man- tém ccm esta qualquer tipo de vinculo ja procedera de ou- tra maneira, pois estara imune a tentac&o de buscar “me: Thores” cportunidades. Uma vez tomada a deciséo de trabalhar na emprésa da familia, suas expectativas, treina- mento e a prépria pressao familiar o incorporarao 4 em- présa. Se um parente fér procurar emprégo noutras fir- mas no mesmo ramo de atividade, suas ligacées familia- res levarac os concorrentes a olha-lo com suspeita, o que se torna cutro fator a restringir as suas possibilidades de empregar-se fora da emprésa da familia. Ao longo da vida da organizac&o a sucesséo de adminis- tradcres que séo membros da familia e que se revelem ccmpetentes acaba por criar um sentimento de grande A EMPRESA FAMILIAR 181 lealdade para com a firma. A despeito da tendéncia en- contradica entre varios observadores de escarnecer o pa- ternalismo, muitas emprésas familiares aparentemente acreditam que os parentes sdo de grande auxilio para tra- tar com os empregados na funcéo de relag6es industriais, a julgar pelo namero de casos em que os parentes sao colocados como “homens” de Relacées Industriais. Tal afirmac4o encontra apoio num artigo da revista Fortune que versa sobre os prés e contras da emissao de parentes. Ao observar que algumas companhias consideram a pre- senca de membros da familia uma vantagem, o artigo cita Charles Heinz, ent&o vice-presidente de relagdes indus- triais da H. J. Heinz Company ao dizer que “ser da fa- milia Heinz o ajudava na criagéo de um clima mais favo- ravel nas negociagédes com os empregados”. ° Nalgumas emprésas familiares a lealdade dos empregados e dcs administradores que n&o sao parentes da familia proprietaria é considerada como altamente significativa. Ao contrario do que acontece com os administradores pro- fissionais, que tendem a deixar de ser objeto da lealdade dos empregadcs da organizag&o por ccasiao de sua aposen- tadoria, quando se trata de uma administragéo exercida por membros da familia, o que assistimos é uma trans- feréncia de lealdade de pai ao filho que o sucede. Por vézes, essa lealdade é tao grande que cs empregados se empenhardo para manter o contréle familiar. No caso de uma pequena industria, do ramo metalurgico, os préprios empregados insistiram para que o filho do proprietario e presidente fésse treinado para assumir a presidéncia por- que n4o desejavam que “intrusos” dirigissem e possuis- sem a emprésa. Administradores e Proprietérios: um sé Grupo Quando uma familia identifica estreitamente os seus me- lhores interésses com o que é mais conveniente para a emprésa, esta usufruira dos grandes beneficios de proprie- 6) PERRIN STRYKER, op. cit, pég. 228. 182 A EMPRESA FAMILIAR RAE/23 tarios e administradcres terem seus interésses e cbjeti- vos unificados. Esta reciprocidade tem sido considerad3 © ponto mais defensavel para os planos de remunerar administradores com acées da propria emprésa que ad: nistram. A convicg&o de que os administradores devem ser tam- bém proprietdrios esta t&o arraigada entre os 2dministra- dores “familiares” que devido a sua lealdade As tradicdes familiares, acabam por eliminar os interésses imediatistas de vender suas ages num momento oportuno para consi- derar apenas cs interésses da companhia a longo prazo. Por isso tornam-se extremamente relutantes em vender suas partes na emprésa da familia. Dada a influéncia que exercem como proprietarios os administradores “familiares” poderao ser menos sensiveis as criticas fundamentadas em desempenho desfavcravel a curto prazo, para terem a liberdade de focalizar os obje- tivos a prazo mais longo, Varios administradores “fami- liares” debatem largamente problemas de suas emprésas, quando consideragées a curto prazo os levariam & manu- teng&o do statu quo e a atitudes e diretrizes mais conser- vadoras. Muitos administradores atribuem os esforcos iniciais realizados por suas emprésas no setor de “Pesqui- sa e Desenvolvimento” 4 capacidade demonstrada para buscar objetivos a longo prazc, abandcnando o comodis- mo de posigGes mais imediatistas. 7 Nalguns casos, como nos dois exemplos dados a seguir, 0 apoio de um grupo leal de acionistas capacitou as com- panhias em questo a tomar atitudes decisivas para sua vitalidade e dinamismo a longo prazo. Segundo o presidente da Hopwell Fabricated Material Company *, foi a lealdade o principal fator para que se tomasse a deciséo de adotar uma cempenha nacional de mercadizacao que possibilitou 4 emprésa o dominio do mercado. “No inicio, 0 projeto exigiu gastos anuais que 7) Vide ARNOLD C. Cooper, “R & D Is More Efficient in Small Compa- nies”, in Harvard Business Review, maic-junho de 1964, pag. 75. RAE/23 A EMPR&SA FAMILIAR 183 igualmente a térca parte das vendas no mesmo pericdo de tempo. Sem o apoio substancial dos acionistas os direto- res seriam forgados a adc¢do de diretrizes muito menos ousadas .” O presidente da Wray New England Printing Company * pensava que o contréle acionario por parte da familia era peca essencial para que sua companhia fésse cepaz de entrar agressivamente no campo da “renovac&o tecnolé- gica”, sem que se consultassem préviamente os sindicatos envolvides na medificagéo. Tal direito foi reconhecido pelos sindicatcs apenas depois de uma grande greve que fei téo onerosa a curto pr2zo que o proprietario-adminis- trader estava convencidc de que a companhia teria cedi- dc, nao fésse o apoio dos acionistas, na sua maior parte constituida por membros da familia. “Sabiamos que a familia ecreditava como nés, e estava disposta a correr ¢ risco”, dizia um administrador nao ligado a familia re- latendo cs acontecimentos. “Se os acionistas nao féssem da famiila proprietaria, teriamos sido forgados a agir de outra maneira, poi: néo poderiamos correr o risco de per- des tao grandes.” ' A presenca de um interésse familiar respeitavel podera exercer relevante influéncia noutros setores. Nas empré- sas onde a ligac&o familiar se faz sentir principalmente pela pcsse de acées, 0 conhecimento de que existem acio- nistas realmente interessados, que detém parte suficiente das acdes para assegurar o contréle, podera levar os res- ponsaveis pela administracao da emprésa a refletirem mais demcradamente sébre as suas responsabilidades para com cs acionistas. Isto assume grande importancia em nossos dias quando a administrag&o “profissionalizada” é cada vez mais imune ao contréle dos acionistas, pelo fato das acées se dispersarem entre um sem-nimero de possuido- res. Uma concentracéo de agdes na mao de uma sé pes- soa ou de um grupo relativamente pequeno assegura uma aco mais cuidadosa por parte dos administradores. Quando tal contréle esta em maos de uma familia a pro- tecaic oferecida acs interésses da companhia é ainda maior 184 A EMPRESA FAMILIAR RAE/23 porque o acionista sera menos propenso a vender suas agdes quando surgirem dificuldades. Além dessas vantagens singuleres, muitos administradores acreditam que as companhias de tipo familiar beneficiam: se, como outras emprésas em que o capital nao é muito dispersc, de uma flexibilidade maior do que as encontra- digas nas emprésas “abertas”. Embora esta vantagem pa- reca mais facilmente atribuivel ao tipo de organizagao centralizada que surge quase inevitavelmente nas empré- sas familiares, diversos administradores “familiares” dao exemplos especificos, em que a capacidade para tomar de- cisdes mais rapidas a respeito de quest6es importantes re- sultou em grandes lucros a longo prazo. Por causa dessa flexibilidade uma companhia de processamento de carne foi capaz de comprar uma fabrica maior e mais mo- derna para as suas operagées, decorrendo apenas seis ho- tas entre a tomada da decisdo e a realizagéo da compra, o que Ihe permitiu entrar no mercado de processamento de carne no momentc oportuno. Mas essa flexibilidade nem sempre é uma vantagem, parti- cularmente quando interfere com os bons principios de administracao. Um administrador de uma emprésa do ra- mo téxtil observou que “quando uma familia domina uma firma, podera levar ao aparecimento de um grupo de admi- nistradores subservientes, e um Conselho de Administra- ¢&o igualmente cativo, o que impede se proceda a uma revisao critica das decisdes”. Concorde com a mesma opi- niao o administrador de uma emprésa, que fabrica papel, de propriedade familiar, manifestou-se nos seguintes tér- mos: “A influéncia de nossa familia pode permitir que os administradores ajam mais rapidamente, mas sempre que isto tem acontecido, os resultados se mostraram de- sastrosos.” Da mesma forma que outras organizacdes “fechadas” a emprésa familiar poder4 usufruir das vantagens da dis- crigéo. Reconhecendo que uma discric&o excessiva, che- gando aoc segrédo puro e simples, pode impedir as agdes de uma administracao eficiente, muitos administradores RAE/23 A EMPRESA FAMILIAR 185 ee acham que a restrig&o de informacdes sébre as operacées de uma companhia pode constituir-se numa grande van- tagem para a competicao. Uma emprésa, outrora pro- Priedade familiar, fundamentava suas decisdes no sentido de continuar sendo “fechada” em parte devido “a diminuta capacidade de um grande numero de acionistas para po- derem avaliar os efeitos das acées da companhia, parti- cularmente no que dizia respeito a sua capacidade com- petitiva”, que era indiscutivelmente uma realidade palpa- vel quando tais avaliacgées eram feitas por um grupo mais restrito. Nalgumas emprésas familiares, como os exemplos a seguir c demonstram, a capacidade para restringir o fluxo de in- formagées é considerada de vital importancia. Durante dez anos a Lambrecht Machinery Company * au- mentou seu tamanho de um quarto para dois tergos com telagéo 4 sua principal concorrente. “Se nossa concor- rente tivesse percebido o quao rapidamente cresciamos”, dizia o presidente, “teria sido capaz de impedir uma taxa de crescimento tao elevada. Sabiam que estavamos cons- truindo novas fabricas, mas nao dispondo de nossos rela- torios financeiros, néo poderiam avaliar quao grande era c progresso que estavamos obtendo.” Sensibilidade 4s Responsabilidades Sociais O orgulho e a identificagéo familiar com os interésses de uma firma podem fazer com que a administragdo seja mais sensivel as responsabilidades sociais e desta forma con- tribuir para o fortalecimento da emprésa a longo prazo. As rigidas consideragdes sdbre lucratividade inerentes as organizagées empresariais é indiscutivelmente um fator de importancia. Mas quando deixa de ser limitado por ou- tras consideragées, de natureza diversa, podera conduzir a acdes que nem sempre s&o do melhor interésse da co- munidade. 186 A EMPRESA FAMILIAR RAE/23 Quando um empregado é solicitado a participar de agées que possam ferir o interésse publico, pedera encontrar- se em posicéo insustentavel para seguir o seu proprio jul- gamento, porque simplesmente teria de sacrificar o seu emprégo e a seguranca de sua familia. Mas devido ao nome da familia, a administracgéo de uma emprésa fami- liar, pelo menos esta foi a opiniao de varios administra- dores entrevistados, sera menos capaz de justificar atos contrarics aos melhores interésses da comunidade. Atitu- des come'a que segue nao sao de todo incomuns: “Como pederia explicar a meu filho o escandalo implicito no conluio para fixacgado de pregos?”, in- dagava um fabricante de papel. “Tal situacdo se- tia altamente prejudicial 4 reputacao de minha fa- milia e ao prestigio da companhia.” Como para outras vantagens relacionadas, a importancia de se possuir um nome de familia associado a uma em- présa é de dificil aferigac em térmos quantitativos. En- quanto varios executives entrevistados concordaram de maneira geral sébre a vantagem potencial de associar fa- milia com emprésa, quase todos observaram que a atu lizag&o destas vantagens dependera exclusivamente da pr6- pria familia. “Eu tratei com muitas familias”, dizia um tesoureiro de uma grande emprésa téxtil, “que pautavam suas acdes pelo. cédigo de ética des ladrées, 0 que era meridianamente refletido pelas atividades de suas em- présas.” Varios administradcres prontificaram-se a declarar que a vantagem de pcssuir um nome de familia associada a uma emprésa perde importéncia em nossos dias. “Ha vinte anos”, comentava o presidente de uma grande em- présa de equipamentos industriais, “eu concordaria intei- ramente com a tese de que a sensibilidade para com as responsabilidades scciais era um dos fortes da emprésa familiar, mas hoje quase tédas as firmas reconhecem @ importancia de desfrutar de boa reputacéo na comuni- dade.” RAE/23 A EMPRESA FAMILIAR 187 ee Apesar destas qualificagées permanece a evidéncia de que as emprésas familiares, devido ao envolvimentc familiar, tendem de maneira geral a ponderar os aspectos sociais de suas decisées mais demoradamente do que as compa- nhias “abertas” . Cceré.cia e Continuidade das Diretrizes Administrativas Uma vantagem extraordinaria que uma sucesso de admi- nistradores familiares capazes pode fornecer a uma em: présa é a coeréncia e um sentido profundo dos objetives da companhia. Ambcs os fatéres parecem ter importan- cia crescente numa sociedade onde a mudanga e a ruptura com as instituicdes tradicionais constituem o comporta- mento habitual. Téda companhia tende a ter um certo nimero de “mitos” cu tradigdes que tem a func&o de preservar objetivcs e capacidades que Ihe sao peculiares. Quando uma admi- nistracao composta de familiares assume a responsabili- dade pelos destinos da organizacdo os “mitos” importantes sao ccnsideravelmente fortalecidos pela acéo da familia porque cada diretriz transforma-se num vinculo que re- monta as préprias origens da companhia. Neste caso, 0 administrador familiar exerce o papel catalizador de unir 0 presente e o passado da organizacdo. Enquanto a contribuicéo mais importante do administra- dor familiar nestas situacgées possa ser intangivel, a pre- senca da familia pode ser o elemento decisivo para capa- citar a emprésa a aumentar as prcporgdes de suas opera- ¢6es, inclusive entrando em novos setores de atividade sem que as modificagdes decorrentes venham romper os valores organizacionais jé consclidados, ou seja, a unidade essencial da emprésa. Exemplificando: O principal ditigente de uma grande emprésa industrial acredita que a existéncia de uma administra¢do familiar tradicional auxiliou em muito sua crganizacio a preser- var sua tradicional insisténcia na qualidade dos produtos fabricados, a despeito da crescente mecanizacao dos pro- 188 A EMPRESA FAMILIAR RAE/23 SS cessos industriais. O fundadcr da emprésa criou a reputa- cao de qualidade “artesanal” para a organizagao e a su- cesséo administrativa tendo sempre sido feita por tredi- ¢éio familiar, permitiu se perpetuasse a mesma dedicagéo & qualidade que era caracteristica do fundador . O efeito da identificagao entre uma familia e a capacidade de uma emprésa mcdificar-se sem perder a sua unidade essencial também foi observada por um tesoureiro, que todavia nao pertencia A familia proprietaria. Desde o fim da Segunda Guerra Mundial a emprésa crescia rapida- mente através da compra de outras no mesmo ramo in- dustrial. Apesar do crescimento vertiginoso o tesoureiro. continua a acreditar que o senso de unidade fornecido pela familia proprietéria e que também ocupa os principais cargos administrativos no grupo, que se dedica ao ramo téxtil ha j4 trés geracées, tem impedido que se estabeleca uma confusao organizacional das mais drasticas, pela di- versidade das varias emprésas que tém sido incorpora- das ao longo dos ultimos vinte anos. “Apesar de ncsso crescimento e da absorcao de muitas firmas com carac- teristicas bastante diversas, os postulados administrativos tradicionais continuam inabalados gracas ao respeito que todos devotam aos membros da familia.” que se encontram a frente do grupo.” A associac&o de uma familia a uma emprésa pode influen- ciar ndo apenas a organizacdo interna mas ultrapassar cs umbrais da companhia e atingir o mercado, conferindo a organizacao caracteristicas peculiares que the sAo de gran. de valia no processo competitivo. © presidente de uma companhia siderargica observava que a administrac&o familiar pode revestir-se de grande importancia para consolidar o valor do “servigo pessoal” . Quando uma emprésa é criada com base no valor do “ser- vico pesscal” (que freqiientemente esta ligado as ativida- des pessoais do proprietério fundador), suas possibilida- des para expansdo sao limitadas. Porém a utilizagao de cutros membros da familia pode possibilitar a expansao pois no primeiro caso ela estaria fatalmente limitada as RAE./23 A EMPRESA FAMILIAR 189 a capacidades de um unico homem, e na emprésa familiar, através da sucessdo administrativa efetuada dentro do cir- culo familiar, as habilidades peculiares ao proprietario fundador e que respondem pela privilegiada posic¢ao da firma em face aos seus competidores, acaba também por transferir-se. A importancia que uma emprésa da Nova Inglaterra, que opera no ramo de restaurantes, confere & administracaéo familiar em todos os apelos de suas campa- nhas de propaganda e promogéo, esta indiscutivelmente baseada no pensamento acima exposto. Em varios casos que pudemos observar a administragéo familiar parece ter constituido o elemento decisivo para a criacgéo de uma “imagem” favordvel da emprésa. A Fin- daly Art Gallery orgulha-se de poder exibir uma experi- €ncia de “trés geracdes no ramo da arte”; a Oscar Mayer Company, que em 1963 vendeu 279 milhédes de dolares, mostra sua preocupagéo com a qualidade de seus produ- tos, fazendo referéncia 4 administracao familiar no seu slogan: “Uma tradicg&o de qualidade da nossa para a sua familia.” Uso semelhante da tradic¢&o acabou por desen- volver-se num série de anuncios da H. J. Heinz Company. Nos textos o proprio Henry Heinz, presidente do Conse- lho de Administracao, apela para que a emprésa mante- nha as orientagdes de seu avd referente & utilizagéo de ingredientes da melhor qualidade. A tradig&o da adminis- tracéo familiar e a habilidade do apélo de Henry Heinz ao mencionar esta tradicéio tiveram como resultado o re- i6rco da reputacao de qualidade dos produtos da emprésa aos olhos do piblico. O administrador familiar pode também levar outras van- tagens sObre o administrador profissional. Entre elas po- demos observar a dedicacao, a experiéncia, acesso a todos cs setores da companhia e a imunidade contra as pressées intra-organizacionais. Uma resposta comum a todos os que foram entrevistados foi que muitos filhos e outros membros da familia tendem a trabalhar com mais afinco, a serem mais entusiastas € mais leais A companhia do que os administradores profis- 190 A EMPRESA FAMILIAR RAE/23 eee sionais. Pelo fato de terem sido criados no ambiente da emprésa poderéo também adquirir extensos conhecimen- tos ‘a-respeito da emprésa antes que assumam os cargos que Ihe estéo destinados. Uma vez empossados contarao com maior boa-vontade por parte dos administradores mais antigos e que ocupsam os cargcs mais altos, para con- vicio e transmissdo de experiéncias. Finalmente as pesscas: da familia poderao desenvolver suas capacidades admi- nistrativas sem temer estejam ameacando posigées de ou- trem. Um supervisor da familia proprietaria dizia: “Pelo fato de ser da familia, posso estabelecer o ritmo de tra- balho que achar conveniente, sem que pensem que esteja tentando adular o chefe.” Pcr tédas estas razdes, um ele- mento da familia, desde que interessado na companhia, podera encontrar grandes possibilidades na sua emprésa para desenvolver ao maximo suas habilidades como admi- nistrador. PRECAUCOES A TOMAR Acredito ter conseguidc: demonstrar que a participagdo de familias na vida empresarial nao ccnstitui obrigatoriamen- te uma fonte de fraquezes. Aquilo que eventualmente é a fraqueza de uma firma, quando tratada por uma adminis- tragéo ccmpetente, pode transformar-se num ponto de grande vitalidade. Mas a experiéncia das organizacdes onde a participagao familiar se constituiu em fonte de sucessos indica que isto sé ccorre quando: © A familia enterder que os seus objetivos pessoais podem ser atingidos apenas se também for assegurado 0 sucesso da emprésa a longo térmo. ®. Os administradores familiares estiveram dispostos a es- tabelecer diretrizes e restrigdes formais a fim de assegurar a participagéc familiar apenas na medida em que esta contribua para o fortalecimento da emprésa a longo prazo. “A histéria de varias das firmas mais importantes demons- tra que suas atuais posigdes sfo em grande parte atribui- veis ao reconhecimento da importancia das duas condicdes A EMPR&SA FAMILIAR 191 enumeradas. Porém o sucessc muitas vézes é turvado por uma crise da familia ou da emprésa. Em muitos casos, a harmonia se restabelece apenas com a demisséo de um membro da familia. Noutros, resultam do crescimento da companhia que obriga a familia a enfrentar as necessida- des da firma. Paradoxalmente, renunciando a parte do contréle que exercia sébre a organizacao, a familia acabe- va por fortalecer a sua prépria posicaéo de lideranga e ao mesmo tempo, aumentava as possibilidades empresariais de operagées lucrativas. Contréle do Favoritismo Para assegurar um equilibrio sadio entre os interésses da emprésa e os da familia os administradcres da maioria das emprésas familiares bem sucedidas delimitam clara- mente o alcance das tradicionais prerrogativas da familia e as necessidades de liberdade de agéo dos administrado- res. Embora reconhecam que a participacéo familiar possa conferir a alguns parentes o direito de solicitar cargos, muitas destas firmas acabaram por assegurar, através de estabelecimento de restricées formais, bem como devido a tradicdes informais, uma limitagao ao favoritismo, de for- ma que tais solicitagées nao venham a predominar. Temos aqui um caso tipico: A Thompson Manufacturing Company* 6 uma grande em- présa no ramo da mecanica pesada. Seus administradores que séio da familia que detém o contréle acionério, defen- dem a posigac de que alguma participagéo da familia na administracéio da emprésa é de importancia para o for- talecimento da unidade interna da organizacgéo. Esta van- tagem intangivel é apoiada, além do mais, por tédas as consideracées de ordem pratica. Através do contréle acio- nario os varios ramos da familia detém a maior parte do capital e os Thompsons acreditam que alguma participa- cao familiar na administrag&o faz com que os votos resul- tantes da propriedade das ages sejam utilizados em favor dos melhores interésses da companhia. Por estas razées, as ligacdes de tipo familiar devem ser objeto de cuidadoso 192 A EMPRESA FAMILIAR AE/23 exame para a admissdo de administradores e para sua pos- terior promc¢do no quadro da emprésa. Mas esta consideragéo néo tem predominado porque os administradores vinculados a familia acreditam que o di- reito de administrar devera ser obtido pelos membros da familia pelos mesmos caminhos que normalmente seguem os administradores profissionais. “O nome da familia po- dera trazé-lo as portas da companhia”, nctava um presi- dente, “mas o restante dependerA exclusivamente déle”. Para assegurar que ésses procedimentos se tornem habi- tuais, a companhia estabelecera diretrizes explicitas em situagdes em que filhos de acionistas estejam envolvidos, e téda a superviséo, bem como os processos de avaliacac de mérito estarao sob o contréle de pessoas n&o ligadas & familia, nao se permitindo ao pai nem solicitar informa- g6es sdbre o desempenho de seu filho. Em conformidade com esta diretriz de Pessoal, a compa- nhia ainda exercera contréle sébre os interésses familiares. A maioria dos diretores nao pertence a familia Thompson, embora a administracao encoraje todos os ramos da fami- lia, inclusive os que nao detém cargos na emprésa, a fazer com que sua parcela de acées esteja representada no Conselho de Administragéo. Quando ha um problema em- presarial que também envolva interésses da familia, como remuneracao de administradores ou provimento de novos cargos administrativos, os diretores que nao pertencem a familia desempenham papel relevante a fim de garantir que as necessidades da emprésa sejam atendidas a despeito de eventuais conflitos com os interésses da familia. Embora se concedam alguns privilégios 4 familia, os pro- prietarios que também detém posicdes na gestfo da Thompson Manufacturing Company, reconhecem a neces- sidade de aceitar limitacées as Prerrogativas familiares para poder obter uma administracdo mais forte e eficaz. Devido a sua disposicao em agir de tal maneira, a firma ascendeu a uma posicéo de dominio no seu setor indus- trial, onde os desmandos familiares tém constituido a regra. RAE/23 A EMPRESA FAMILIAR 193 eee Barreiras ao “Empreguismo” Na Companhia Thompson néo existem restrigdes especiais ao emprégo de pessoas da familia além dos critérios gerais estabelecidos para a admisséo de qualquer outra pessca que preencha um pedido de emprégo. O essencial é que os requisitos fundamentais para o preenchimento do cargo sejam plenamente satisfeitos. Dentre as companhias estu- dadas a Thompson foi na verdade uma excegao. Varias das emprésas familiares que reconhecem a importancia da li- mitacaéo das prerrogativas familiares tendem a ser mais restritivas nas suas diretrizes para admissdo de pessoal. Algumas emprésas familiares chegaram a adotar a diretriz de simplesmente nao empregar familiares. O valor de uma diretriz tao rigida é sempre incerto. Em geral, a tendéncia para que se abram excecées a regras contra a admissao de parentes é mais notéria onde, para- doxalmente, as regres sio as mais estritas. Em tais casos, onde a familia detém © contrdle acionério, as regras sao infringidas na medida em que a familia decide considerar os interésses familiares em detrimento dos interésses em- Ppresariais. Nas situagées tipicas, as familias tentam limi- tar, mas n&o eliminar o emprégo de parentes. Nalgumas companhias, as restrigdes ao emprégo reduzem- se a alguns casos de parentesco e a idade. Muitas fami- lias excluem tacitamente genros, noras, cunhados e cunha- das, bem como sogros e sogras, apesar de muitas destas. emprésas terem tido experiéncias extremamente favora- veis com parentes. Noutras companhias estudatas a firma é administrada pelo filho mais velho do ultimo presidente. Isto sugere que a primogenitura existe em algumas com- panhias. O fato dos filhos terem o mesmo nome que seu: pais, pode encontrar explicacado nas expectativas da fami- lia para que os filhos de ex-presidentes assumam os cargos outrora exercidos por seus pais. Certas companhias exigem que os membros da familia que desejem assumir cargos administrativos tenham condicées 194 A EMPRESA FAMILIAR RAE/?? Se superiores aquelas exigidas de administradores profissio. nais aspirantes ao mesmo cargo. Uma tradicional emprésa familiar da Nova Inglaterra, estabelece que um parente s6 podera ocupar cargo na referida emprésa apds “receber convite” dos atuais administradores. Outras exigem que cs parentes obtenham sucesso administrativo em emprésas que ndo fazem parte do grupo como credencial para sua admiss&o. Exemplo de tal diretriz é a Pillsbury Company, onde o presidente do Conselho de Administragéo, PHILIP Ww. PrtisBuryY, afirma: “Tenho como principic nao admitir meus filhos em minha emprésa, a menos que tenham de- senvolvido suas capacidades fora desta emprésa, por um periodo de varios anos de carreira bem sucedids”. Defen- dendo posicao idéntica o administrador de um banco “fa- miliar” diz que tal tipo de exigéncia faz com que o parente que aspira a um cargo na emprésa de sua familia, adquira uma grande experiéncia empresarial e o auxilia no desen- volvimento de um sentimento de seguranga. A Companhia Thompson é tipica no usc de uma segunda abordagem ao problema da limitag&o das prerrogativas familiares. Os administradores esperam que a administra- cao de tipo familiar seja mantida, sem, todavia, chegar a restringir a participagao de parentes nos quatdros adminis- trativos da emprésa, ou sem pressiond-los a que integram 0 referido quadro. A administragéo é particularmente cuidadcsa em ndo pressionar familiares a que entrem na emprésa. A familia auxilia seus membros que se interes- sam por iniciar carreiras fora da emprésa, e pelo fato das acdes da companhia serem vendidas em Bélsas de Valores, nao teréo o angustiante problema de ver a sua seguranca financeira, bem como a de seus familiares, passar ao con- tréle de outrem. Nao havendc restrigdes ao emprégo de parentes na Com- panhia Thompson, os administradores que sao da familia dao grande importancia aos problemas de treinamento de administradores e de desenvolvimento de critérics objeti- vos para a avaliacdo de mérito dos parentes que entram RAE/23 A EMPRESA FAMILIAR 195 na emprésa. Se bem que algumas emprésas familiares es- tabelegam um programa especial para o treinamento de parentes, os Thompsons sao tratados da mesma forma que os administradores profissionais que pertencem ao quadro da companhia, Participam das reunides promovidas dentro do programa de treinamento de administradores e ¢40 so- licitados a percorrer tcdos os escalées administrativos, ini- ciande pelos inferiores, ccmo tcdos os demais administra- dores. Incentivos ao Bcm Desempenho O estabelecimento de critérios imparciais para medigéo do desempenho de parentes nao constitui caracteristicas ex- clusiva das grandes emprésas familiares, comc a Compa- nhia Thompson. Uma emprésa familiar que opera como atacadista, submete os seus parentes a contratos, fazendo desta forma que sua remuneracdo dependa exclusivamente de suas capacidades enquanto vendedores. Abordagem semelhante pode ser observada numa empré- sa que se dedica 4 fabricacdo de artigcs esportivos, cnde.o tilho do presidente tornou-se respcnsavel pelo desenvol- vimento de uma nova linha de produtos. O projeto pro- Piciou ao filho adquirisse uma grande experiéncia e ao mesmo tempo serviu para verificar a sua ccmpeténcia nas varias fases da cperacdo. Noutra emprésa familiar, tendo falecido o proprietdrio, os curadores dos bens do herdeiro foram encarregado: de emitir parecer s6bre a sua capaci- dade ccmo administrador, tao logo fésse atingida a maio- tidade. No casc da avaliac&o do herdeiro ser desfavoravel, os curadores deveriam vender os bens, ou seja, a propria emprésa. Avaliagao de Administradores Apesar da variacao nos métcdos empregadcs a maioria das emprésas bem sucedidas entendem que os melhores inte- résses, tanto das firmas como das familias exigem grande 196 A EMPRESA FAMILIAR RAE/23 16 OO eee objetividade nc treinamento de administradores que sejam membros da familia. Esta objetividade torna-se particular- mente importante para a companhia porque os emprega- dos tendem a transmitir ao pablico em geral, aos consumi- dores e a todos cs demais setores que mantém relagdes com a emprésa cs v@cios e virtudes do chefe da organizacao. Do ponto de vista do parente que esta sendo avaliado, a objetividade podera inclusive evitar que outros membros da familia, por questées nao ligadas ao interésse da empré- sa, venham a desmerecé-lo em seus julgamentos. HENRY Forp concedia a seu filho Edsel poucas oportunidades de exercer influéncia nos afazeres da companhia porque jul- gava-o desprovido de “dureza” necessaria para ser um bom administrador. A historia demonstrou que a Ford Motor Company havia superado a fase da “dureza” administrati- va do velho Ford e, naquela altura, o estilo administrativo do filho Aadsel era exatamente o que a companhia neces- sitava. Conseqiientemente, a avaliacdo objetiva pode permitir que 0 parente a ser avaliado seja mais auténtico, ao invés de ser apenas a “segunda edic&o” de seu predecessor, o que ao final beneficiara tanto os administradores envolvidos come a emprésa, Finalmente, quando o parente é obrigado a “conquistar” 0 seu cargo, suas proprias duvidas e insegu- rangas a respeito de suas capacidades diminuem, o desafio representado pcr uma carreira dentro da emprésa se apre- senta de maneira estimulante e sadia, e os seus problemas em conseguir aceitagao e confianga por parte dos demais participantes da organizacao séo reduzidos a um minimo. Ao mesmo tempo que adotam diretrizes limitando as prer- rogativas familiares, emprésas mais licidas, como a Thompson, ha pouco analisada, ddo grande importancia a medidas que visem a atrair e treinar administradores que no pertengam ao circulo familiar. Na Thompson tal dire- triz foi implementada quando as press6es inerentes ao cres- cimento da emprésa acabaram por convencer a familia da impcssibilidade de preencher todos os cargos que se cria- RAE/23 A EMPRESA FAMILIAR 197 Eee vam com pessoas da familia. Normalmente, os administra- dores nao pertencentes ao circulo familiar excedem os membros da familia Thompson na administragéo de alto nivel da companhia, além de estarem representados no Co- mité Diretor. Os administradores profissionais encontram participacéo através de um sistema de recebimento de agdes como parte de sua remuneragcio, a tal ponto que muitos administradores enriqueceram trabalhando para a companhia. No passado pessoas estranhas a familia che- garam a presidéncia da emprésa. Tais disposigdes por parte: da familia proprietaria asseguram uma boa administracaéo para a companhia, independentemente da capacidade administrativa das pessoas da familia. Também se explica parcialmente por que a reputagéo da companhia na in- dastria em que opera, é a de que constitui “um bom local de trabalho”. A disposicéo da familia proprietaria em “abrir” as posicdes administrativas de alto nivel da emprésa a administrado- res prcfissionais parece constituir um atributo da maioria das emprésas familiares que se tem mostrado longevas. Trés dos ultimos cinco presidentes de uma emprésa indus- trial que ja existe ha cinco gerac6es e que conta com um capital de 300 milhdes de ddlares, nao eram da familia proprietaria. Situag&o semelhante pode ser encontrada num banco familiar que foi estudado, bem como em muitas emprésas tradicionais que constituiram objeto de nosso le- vantamento. Quando as oportunidades s&o oferecidas a todos cs empregados da companhia, independentemente de relacdes familiares, a emprésa familiar nao tera maiores problemas para atrair administradores realmente capazes. CONCLUSAO O consenso geral é de que, quando familia e emprésa estaéo mesclados, o resultado é sempre uma atividade empresa- tial de menor eficiéncia. Mas um exame mais detido do assunto sugere que esta crenca pode ndo encontrar funda- mentos. Ignora-se o fato de que a pratica administrativa 198 A EMPRESA FAMILIAR RAE/23 eficiente se baseia no entendimento do relacionamento entre pessoas na medida em que afetam a vida de qual- quer organizac&o. Onde tal entendimento estiver presente, a emprésa familiar tendera a desenvolver procedimentos e tradigGes organizacionais, que se tornaram proverbiais e se beneficiarao dos valéres da interag&o entre a vida fami- liar e a atividade empresarial e que se constituem numa grande vantagem a longo prazo tanto aos interésses da companhia como da familia proprietaria. O sucesso de muitas emprésas familiares indica que a igno- rancia das relagdes envolvidas e nao a participagdo pura e simples da familia é 0 fator decisivo a ditar o sucesso ou o fracasso de tais firmas. Entender a contribuicgéo que uma familia pode oferecer para o fortalecimento da com- panhia a longo prazo, analisar os pontos fracos existentes e implementar os mecanismos de contréle empresarial a fim de restringir éstes problemas, sAo alguns aspectos do problema enfrentado pelo administrador que trabalha numa emprésa de tipo familiar.

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