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ARTIGO ORIGINAL

OCORRÊNCIA DE ENTORSE E LESÕES DO JOELHO EM


JOGADORES DE FUTEBOL DA CID
DA ADE DE MANA
CIDADE US, AMAZONAS
MANAUS,
KNEE LESIONS AND SPRAINS IN SOCCER PLAYERS OF MANAUS CITY, AMAZONAS - BRAZIL
EDUARDO TELLES DE MENEZES STEWIEN1, OSMAR PEDRO ARBIX DE CAMARGO2
RESUMO SUMMARY
Foram estudados 50 jogadores de dois times profissionais e 47 Fifty male and 47 female soccer players from Amazonas state
jogadoras de três times amadores de futebol do Estado do teams in Manaus City were studied. The occurrence of knee sprain
Amazonas, todos da primeira divisão e sediados em Manaus. and resultant lesions was determined by interviewing the athle-
Foi determinada a ocorrência de entorse do joelho e lesões de- tes about their history of knee sprain, as well as by subjective
correntes, mediante uma entrevista sobre a história de entorse evaluation and physical examination using the method recom-
do joelho, além de avaliação subjetiva e exame físico, segundo mended by the International Knee Documentation Committee
o International Knee Documentation Committee (IKDC 2000). (IKDC 2000). Among male soccer players, 16 (32%) have menti-
Entre os jogadores, 16 (32%) haviam referido entorse do joelho, oned knee sprain, being 14 (28%) unilateral and 2 (4%) bilateral.
sendo 14 (28%) unilateral e 2 (4%) bilateral. Entre as jogadoras, Among females, 11 (23%) have mentioned knee sprain, being 9
11 (23%) haviam referido entorse do joelho, sendo 9 (19%) uni- (19%) unilateral and 2 (4%) bilateral). Ten (63%) male athletes
lateral e 2 (4%) bilateral. Dez (63%) dos jogadores com entorse with knee sprain presented ligament or meniscus lesions, seven
sofreram lesões ligamentares ou meniscais, dos quais 7 atletas of which have been submitted to surgery (6 meniscectomies and
submeteram-se à cirurgia, sendo 6 meniscectomias e 2 recons- 2 anterior cruciate ligament reconstructions). We did not find knee
truções do ligamento cruzado anterior. Não encontramos lesões lesions among female soccer players examined. Male and fema-
do joelho entre as jogadoras de futebol examinadas. O tempo le athletes returned to their activities after treatment in an average
médio de afastamento dos atletas foi em torno de 3,5 meses time of about 3.5 months. Among the male athletes, the average
em ambos os sexos, sendo que entre os jogadores o tempo time of recovery was nearly 3 times longer in those who suffered
médio de retorno foi quase 3 vezes maior naqueles que sofre- ligament or meniscus lesions. The medium score of the IKDC
ram lesões ligamentares ou meniscais. A média da pontuação 2000 subjective form was 95 points for male and 96 points for
do IKDC subjetivo foi no sexo masculino de 95 pontos e de 96 female athletes.
pontos no sexo feminino.
Keywords: Soccer/injuries, Knee injuries, Athletic injuries.
Descritores: Futebol/lesões;Traumatismos do joelho; Trauma-
tismos em atletas.

INTRODUÇÃO que sirvam de referência para estabelecer a sua freqüência.


O aumento da prática de esportes competitivos ocorreu duran- O presente trabalho se propõe a investigar a ocorrência de en-
te o século XX, iniciando-se com os Jogos Olímpicos Modernos torse do joelho e lesões decorrentes em jogadores de equipes
em Atenas, Grécia, no ano de 1896. As populações de diversos de futebol da 1ª divisão do Estado do Amazonas de ambos os
países foram estimuladas a mostrarem suas performances es- sexos da cidade de Manaus, mediante exame físico e aplicação
portivas e, com isto, buscarem a superioridade. Muitos espor- de entrevista, com os seguintes objetivos específicos:
tes foram criados e desenvolvidos, e alguns alcançaram fantás- 1) Determinar a freqüência de entorse e lesões do joelho que
tica popularidade, destacando-se entre eles o futebol, que se ocorreram nos atletas;
encontra entre os mais praticados por ambos os sexos em dife- 2) Avaliar os joelhos dos atletas, mediante exame físico e o pro-
rentes faixas etárias. A Fédération Internacionale de Football tocolo subjetivo baseado no International Knee Documentation
Association – FIFA congrega 203 países membros e cerca de Committee – IKDC 2000;
200 milhões de praticantes, sendo 40 milhões de mulheres(1). 3) Verificar a existência de diferenças entre os atletas de ambos
O crescimento da atividade futebolística produziu um aumento os sexos.
no número das lesões traumáticas graves. O joelho, por sua
condição de articulação altamente solicitada e exposta a trau- CASUÍSTICA E MÉTODOS
mas, é freqüentemente lesado, sendo a rotura do ligamento cru- A população de estudo foi formada por jogadores de futebol da
zado anterior uma das lesões mais comuns. A evolução natural 1ª divisão dos sexos masculino e feminino da cidade de Ma-
das lesões ligamentares pode afetar a prática do esporte com- naus no Estado do Amazonas, todos filiados à Federação Ama-
petitivo e o correto diagnóstico e tratamento destas lesões po- zonense de Futebol (FAF). Segundo a FAF, existiam em Manaus
dem proporcionar um retorno do atleta ao seu nível prévio de no ano de 2001, quatro equipes profissionais de futebol de cam-
atividade. Sabemos que homens e mulheres apresentam inci- po do sexo masculino e oito equipes amadoras de futebol de
dências diferentes de lesão do ligamento cruzado anterior (LCA) areia do sexo feminino, não havendo equipes de futebol profis-
nos mesmos esportes, mas ainda não existe uma explicação sional do sexo feminino. Aceitaram participar do estudo duas
convincente para isto(2). do sexo masculino, ou seja, 50% das equipes existentes, e três
Manaus é a maior cidade da região Norte do Brasil com 1,4 do sexo feminino, ou seja, 37,5% das equipes existentes na ci-
milhão de habitantes, segundo dados do Instituto Brasileiro de dade. Todos os atletas foram entrevistados e examinados pelo
Geografia e Estatística. Não encontramos na literatura dados autor durante o período de 01 a 30 de novembro de 2001.
epidemiológicos de lesões do joelho nesta população, assim Inicialmente foi realizada uma entrevista com perguntas abertas
como não existem registros organizados em hospitais e clubes e fechadas sobre os dados gerais de identificação, como nome,

Trabalho realizado no Grupo de Joelho do Departamento de Ortopedia e Traumatologia da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo. Departamento de
Ortopedia e Traumatologia da Universidade Federal do Amazonas.
Endereço para correspondência: Av. Rio Negro 194 apto 802 – Veiralves, Manaus, AM – CEP: 6903-040 – E-mail: estewien@uol.com.br
1 - Mestre em Ortopedia e Traumatologia da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo e Professor da Universidade Federal do Amazonas.
2 - Professor Adjunto e Chefe do Departamento de Ortopedia e Traumatologia da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo “Pavilhão Fernandinho
Simonsen”.
Trabalho recebido em: 07/04/04 aprovado em 05/05/05

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data de nascimento, sexo, idade atual, peso, altura e endereço, ocorreu em um momento diferente, mesmo nos pacientes com
seguido de informações esportivas como lado dominante, tem- história de lesão bilateral. Por isto, consideramos o número total
po de prática do esporte, posição no campo e perguntas sobre de 18 joelhos estudados para os homens e 13 joelhos estuda-
se já sofreram entorse do joelho e os desdobramentos desta dos para as mulheres nas tabelas que analisaram os dados re-
entorse quanto ao lado afetado, se durante jogo ou treino, qual lativos àquele joelho com entorse (Tabelas 5, 7, 8, 9, 10, 11, 12
mecanismo de lesão, tempo de afastamento, se necessitou tra- e Gráficos 1, 2). Nas Tabelas 1, 2, 6, 14, 16, que analisaram
tamento médico e qual o tipo de tratamento. Os entrevistados dados referentes ao atleta com entorse, utilizamos o total de 16
que haviam sofrido entorse responderam 10 perguntas traduzi- para os jogadores e de 11 para as jogadoras. A idade média
das do inglês sobre a avaliação subjetiva do joelho, segundo o dos jogadores na época da referida entorse foi de 24 anos, en-
protocolo do IKDC 2000 (International Knee Documentation Com- quanto a idade média das jogadoras foi de 23 anos.
mittee, 2000), com pontuação de 0 a 100(3). Os atletas do sexo masculino apresentavam boas condições
Foi realizado o exame físico dos joelhos pelo método IKDC 2000, de infra-estrutura para os treinos e tratamento médico, como
com a retirada dos quesitos de avaliação pós-operatória: avali- campos de treinamento, sala de musculação e departamento
ação dos compartimentos, avaliação do local de retirada do médico. As equipes do sexo feminino não apresentavam sede
enxerto, avaliação dos achados radiográficos e o teste funcio- própria e nem departamento médico, tendo que treinar em cam-
nal. Foram analisadas as variáveis frouxidão, alinhamento, posi- po público e procurar assistência médica por meios próprios.
ção e deslocamento da patela, arco de movimento, derrame ar- 16 (32%) dos atletas do sexo masculino e 11 (23,4%) dos atle-
ticular, déficit de movimento passivo e exame ligamentar(3). tas do sexo feminino apresentaram história de entorse no joelho
O autor obteve, junto à direção de cada clube, autorização ver- (Tabela 3).
bal para realizar o exame físico dos joelhos dos atletas de fute- A maioria dos atletas apresentou história de entorse unilateral,
bol que participaram da pesquisa. O autor obteve, também, junto sendo 14 (88%) do sexo masculino e 9 (82%) do sexo feminino
a cada atleta, autorização verbal para o exame físico. (Tabela 4).
Observamos que a maioria dos joelhos afetados entre os ho-
RESULTADOS mens é o esquerdo (56%), enquanto entre as mulheres é o direi-
Foi entrevistado e examinado o total de 97 atletas, dos quais 50 to (69%)(Tabela 5).
eram do sexo masculino e 47, do sexo feminino. Os 50 jogado- A maioria dos atletas com história de entorse jogavam no meio
res pertenciam ao Nacional Futebol Clube e ao São Raimundo campo (29,5%), na defesa (29,5%) e no ataque (22%)(Tabela 6).
Futebol Clube. As jogadoras eram do Estrela do Vale Futebol Observamos que 50% dos atletas do sexo masculino apresen-
Clube, Compensa Futebol Clube e Vascão Futebol Clube. To- taram entorse entre 23 e 27 anos, enquanto que para as mulhe-
das as entrevistas e os exames foram realizados durante o mês res houve uma distribuição bimodal de 38% no período de 13 a
de novembro de 2001, abrangendo 100% dos jogadores e 88% 17 anos, e 28 a 31 anos (Tabela 7).
das jogadoras das equipes de futebol abordados. Foram exclu- 45% dos homens com tempo de prática de futebol entre 5 e 8
ídas as jogadoras que se recusaram a realizar a entrevista. anos, enquanto que 47% das mulheres não chegavam a 4 anos
A idade dos jogadores variou entre 19 e 36 anos, com média de de prática (Tabela 8).
26,7 anos, e das jogadoras, entre 13 e 39 anos, sendo a média Observamos que a maioria (68%) das lesões ocorre durante os
de 23,5 anos. As médias de peso foram de 69,8 kg no sexo jogos (Tabela 9).
masculino e de 59,3 kg no sexo Observamos que entre os ho-
feminino. As médias de altura fo- mens não existe predominância
ram de 169,0 e 166,5 cm, respec- para o mecanismo de trauma di-
tivamente para o sexo masculino reto ou indireto, enquanto para as
e o sexo feminino. O tempo de mulheres houve predominância
prática do esporte variou entre 36 (62%) das torções pelo mecanis-
e 300 meses no sexo masculino, mo indireto, embora estatistica-
com média de 154 meses, e en- mente não significante (Tabela 10).
tre 24 e 252 meses no sexo femi- A maioria dos homens (72%) e
nino, com média de 113 meses. das mulheres (62%) ficou afasta-
Foram encontrados entre os jo- do dos treinos e jogos por um pe-
gadores 42 (84%) com dominân- ríodo superior a um mês após a
cia na perna direita e 8 (16%) com entorse do joelho (Tabela 11).
dominância na perna esquerda, Observamos que entre os ho-
e entre as jogadoras 39 (83%) mens o tratamento conservador
com dominância na perna direi- foi realizado em 10 (56%) joelhos,
ta e 8 (17%) com dominância na enquanto o cirúrgico foi realiza-
perna esquerda. do em 8 (44%) joelhos. Entre as
Os dados principais colhidos na mulheres, o tratamento conserva-
entrevista, avaliação subjetiva e dor foi realizado em 11 (85%) jo-
exame físico dos atletas com his- elhos e nenhum tratamento foi
tória de entorse do joelho (Tabe- realizado em 2 (15%) joelhos
las 1 e 2.) (Tabela 12).
Entre os 50 jogadores de futebol, Observamos que dos 16 atletas
16 (32%) haviam referido entor- do sexo masculino com história
se no joelho, sendo 14 (28%) uni- de entorse, sete (44%) atletas fo-
lateral e 2 (4%) bilateral. Entre as ram operados, sendo seis unila-
jogadoras de futebol, 11 (23%) teral e um bilateralmente, e que
haviam referido entorse no joe- dos oito joelhos submetidos à
lho, sendo 9 (19%) unilateral e 2 cirurgia, houve seis (75%) menis-
(4%) bilateral.(Tabelas 3, 4). É cectomias e duas (25%) recons-
importante destacar que cada Tabela 1- Distribuição dos principais dados dos atletas do sexo truções do ligamento cruzado
episódio de entorse estudado masculino com entorse segundo quesitos dos formulários 1, 2 e 3. anterior com tendão patelar. O

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exame físico ligamentar dos atle- (37%) considerados normais,
tas operados não apresentou al- enquanto que as atletas dividem-
terações. se entre 11 (91%) consideradas
Dos atletas que haviam sofrido normais e 1 (9%) obviamente vara
entorse no joelho, três do sexo (Tabela 16).
masculino apresentaram altera- Encontramos todos os atletas
ção ligamentar. Dois deles apre- com a patela em posição normal
sentaram o teste de abertura e centrada. Só 1 atleta apresen-
medial de 3 a 5mm, o que é con- tou déficit do arco de movimento
siderado próximo do normal, se- do joelho entre -5 e 130 graus,
gundo o IKDC 2000, o terceiro bilateralmente. Nenhum atleta
apresentou o teste da gaveta masculino ou feminino apresen-
posterior de 6 a 10mm, conside- tou derrame articular. Entre os
rada anormal, conforme o IKDC atletas que não haviam sofrido
2000. Um dos atletas com alte- entorse do joelho, nenhum apre-
ração no teste de abertura medi- sentou frouxidão ligamentar ao
al apresentou lesão no menisco exame manual, conforme a seqü-
medial, conforme exame de res- ência de exame físico ligamentar
sonância nuclear magnética rea- Tabela 2 - Distribuição dos principais dados dos atletas do sexo
do IKDC.
lizado posteriormente. feminino com entorse segundo quesitos dos formulários 1, 2 e 3.
Encontramos o número total de DISCUSSÃO
dez (63%) atletas do sexo mas- Diversos autores descrevem os
culino com história de entorse membros inferiores como a re-
que apresentaram lesões liga- gião mais lesionada durante a
mentares ou meniscais. prática do futebol, estando o jo-
O tempo de retorno ao jogo va- elho entre as articulações mais
riou entre 1 e 9 meses no sexo afetadas (4-9). Segundo Ekstrand e
masculino, com média de 3,5 Gillquist(7), a entorse do joelho é
meses, e entre 1 mês e 9 meses Tabela 3 - Distribuição dos atletas com e sem história de um dos traumatismos mais fre-
no sexo feminino, com média de entorse, segundo o sexo. qüentes. A entorse, seja por me-
3,7 meses. (Gráfico 1). A média canismo direto ou indireto, pode
do tempo de retorno ao jogo dos originar lesões meniscais, con-
atletas com lesões ligamentares drais e ligamentares, entre elas
ou meniscais foi de 4,5 meses, a lesão do LCA. As lesões liga-
enquanto os jogadores sem le- mentares do joelho modificam o
são retornaram em 1,8 mês. desempenho esportivo dos indi-
A pontuação do IKDC subjetivo víduos, conforme observaram
variou entre 75 e 100 pontos no Rezende et al.(10).
sexo masculino, com média de No presente estudo comparamos
95 pontos, e entre 82 e 100 pon- jogadores de futebol de ambos
tos no sexo feminino, com mé- os sexos, da cidade de Manaus,
Tabela 4 - Distribuição dos atletas com história de entorse
dia de 96 pontos. (Gráfico 2) Amazonas. Verificamos nesta
unilateral e bilateral, segundo o sexo.
45 (90%)s homens são conside- oportunidade que as diferenças
rados normais para frouxidão ar- de infra-estrutura entre os dois
ticular generalizada, enquanto grupos estudados eram notórias.
que as mulheres dividem-se en- Os atletas do sexo masculino trei-
tre 24 (51%) consideradas nor- navam em sede própria, contan-
mais e 23 (49%) consideradas do com departamento médico.
frouxas (Tabela 13). As equipes do sexo feminino trei-
Entre os atletas do sexo masculi- navam em campo público e não
no com história de entorse 14 tinham departamento médico
(88%) são considerados normais próprio, tendo que dispor de
para frouxidão articular generali- meios próprios para diagnóstico
Tabela 5. Distribuição dos joelhos dos atletas com entorse
zada, enquanto 7 (63%) mulhe- e tratamento.
pelo lado afetado do joelho, segundo o sexo.
res com história de entorse são Quanto às características físicas
consideradas frouxas (Tabela 14). de peso e altura, os dois grupos
Observamos que os homens di- mostraram valores esperados,
videm-se entre 38 (76%) obvia- sendo o sexo masculino, em
mente varos e 12 (24%) com ali- média, 2,5cm mais alto e 10kg
nhamento considerado normal, mais pesado. Concordamos com
enquanto as mulheres dividem- Ejnisman e Cohen(1) de que o fu-
se entre 29 (62%) atletas com ali- tebol se apresenta como um
nhamento considerado normal e esporte de extremo contato físi-
18 (38%) obviamente varas co e que quanto maior os valo-
(Tabela 15). res de peso e altura, maior é o
Observamos que os atletas do contato entre os jogadores. Po-
sexo masculino com história de demos, então, supor que existe
entorse dividem-se entre 10 Tabela 6. Distribuição dos atletas com história de entorse um contato físico maior entre os
(63%) obviamente varos e 6 pelo posicionamento dos jogadores, segundo o sexo*. jogadores do sexo masculino.

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Entre os jogadores, 16 (32%) ha- ras foram as mais afetadas
viam referido entorse do joelho, (36,5%, cada) (Tabela 6). Engs-
sendo que em 14 (28%) a entor- trom et al.(6) não acharam diferen-
se foi unilateral e em dois (4%) ça entre a posição de jogo e a
atletas, foi bilateral; considera- taxa de lesão esportiva entre
mos 18 entre 100 joelhos de atle- mulheres. Pedrinelli(9) não encon-
tas do sexo masculino, ou seja, trou diferença significativa entre
18% dos joelhos de atletas do a posição de jogo e o número de
sexo masculino sofreram entorse lesões esportivas entre homens.
(Tabelas 3, 4). Entre as jogado- Bjordal et al.(12) encontraram um
ras, 11 (23%) haviam referido Tabela 7. Distribuição dos joelhos dos atletas com entorse risco de lesão do LCA significati-
entorse do joelho, sendo que em pela idade na época da lesão, segundo o sexo. vamente maior entre jogadores
nove (19%) a entorse foi unilate- de ataque do sexo masculino e
ral e em dois (4%) atletas foi bila- feminino. Cohen et al.(5) concluí-
teral; consideramos 13 entre 94 ram que a maior incidência de
joelhos, ou seja, 14 % dos joe- lesões no futebol masculino ocor-
lhos de atletas do sexo feminino ria em jogadores do meio de
haviam sofrido entorse (Tabelas campo e do ataque. Percebemos
3, 4). Podemos afirmar que a en- que não houve concordância
torse do joelho foi bastante co- quanto a posição de jogo e a
mum na população estudada, quantidade de lesões na revisão
uma vez que cerca de um terço da literatura. Concordamos com
dos jogadores e quase um quar- Ejnisman e Cohen(1) que o fute-
to das jogadoras haviam referi- bol passa por uma transformação
do uma entorse. Engstrom et al.(6) Tabela 8. Distribuição dos joelhos dos atletas com entorse tática do jogo, baseados em for-
encontraram 7(17%) jogadoras pelo tempo de prática de futebol, segundo o sexo. te preparo físico e marcação
com lesões ligamentares e me- agressiva, ocasionando maior
niscais em duas equipes de fu- contato entre os jogadores das
tebol feminino na Suécia, no pe- diferentes posições. Acreditamos
ríodo de um ano. Em nosso meio, que o risco de lesão não depen-
Carazzato et al.(4) encontraram de da posição de jogo.
uma taxa de 13% de lesões liga- Aproximadamente a metade das
mentares e meniscais no futebol entorses ocorreu nos homens
masculino em 20 anos de ativi- com 5 anos a 8 anos de prática
dade em um clube poliesportivo. de futebol, e nas mulheres com
Hoy et al.(11) concluíram que as até 4 anos de prática (Tabela 8).
lesões no esporte competitivo Hoy et al.(11) encontraram as mé-
são de maior gravidade, tanto em Tabela 9. Distribuição dos joelhos dos atletas com entorse dias para lesões esportivas rela-
atletas do sexo masculino, como pelo local de ocorrência, segundo o sexo. cionadas ao futebol em homens
em atletas do sexo feminino. e mulheres, respectivamente, de
Entre os jogadores de futebol 22 e 19 anos. A entorse é um
com entorse do joelho, sete mecanismo potencialmente gera-
(44%) foram submetidos à cirur- dor destas lesões, e verificamos
gia, dos quais seis unilateral e um uma tendência ainda não expli-
bilateralmente. As cirurgias reali- cada de precocidade da entorse
zadas foram seis meniscectomi- e da lesão do LCA em atletas do
as e duas reconstruções do LCA sexo feminino. A distribuição das
com tendão patelar. Todos os entorses segundo a idade, mos-
atletas submetidos à cirurgia es- trou que, a faixa etária mais afe-
tavam em plena forma em suas tada foi de 18 a 27 anos para os
equipes por ocasião da pesqui- homens, com 89% dos casos.
sa. Nenhum deles apresentou Tabela 10. Distribuição dos joelhos dos atletas com história Para as mulheres houve uma dis-
déficit de movimento, derrame de entorse pelo mecanismo de trauma, segundo o sexo. tribuição bimodal de 38% nas fai-
articular ou frouxidão ligamentar xas etárias de 13 a 17 anos e 28
ao exame clínico. a 31 anos (Tabela 7). Pedrinelli(9)
Jogadores com dominância na encontrou em uma equipe profis-
perna direita foram encontrados sional de futebol masculino que
em ambos os sexos com fre- a maior ocorrência de lesões es-
qüência de 83%. Contudo, a portivas estava na faixa etária
mesma freqüência não foi obser- entre 25 e 28 anos.
vada nos atletas que sofreram Nosso trabalho mostra que as
entorse, caindo a valores de 69% entorses do joelho ocorreram
no sexo feminino e de apenas Tabela 11. Distribuição dos joelhos dos atletas com história
mais freqüentemente durante jo-
44% no sexo masculino (Tabela de entorse pelo tempo de afastamento, segundo o sexo. gos do que durante os treinos, ou
5). Ainda não foram encontradas seja, na proporção de 2:1 para
explicações para este fenômeno ambos os sexos (Tabela 9). En-
e nem dados para comparação. gstrom et al.(6) determinaram uma
No sexo masculino os atacantes foram os mais afetados (31% incidência de lesão esportiva durante os jogos na ordem de
das entorses), enquanto no sexo feminino, volantes e defenso- 24/1000 horas, enquanto nos treinos de 7/1000 horas.

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Quanto ao mecanismo de trau- do joelho. Esta experiência bem
ma, encontramos uma distribui- sucedida nos levou a utilizá-lo no
ção igual de 50% para o meca- presente estudo. Acreditamos
nismo direto e indireto entre os que a utilização de um protocolo
homens, e para as mulheres de, internacional de avaliação subje-
respectivamente, 62% e 38%. tiva do joelho poderia ser aper-
Sendo esta diferença estatistica- feiçoado. Em nosso meio, ativi-
mente não significante (Tabela dades como esquiar, realizar tra-
10). Os estudos até agora reali- Tabela 12. Distribuição dos joelhos dos atletas com entorse balhos de jardinagem e, mesmo,
zados diferem entre si quanto ao pelo tipo de tratamento, segundo o sexo. jogar tênis são incomuns. Em
mecanismo das lesões. Ekstrand substituição, atividades similares
e Gillquist (7) encontraram 61% deveriam ser introduzidas no
das lesões traumáticas no joelho IKDC 2000 para facilitar sua difu-
pelo mecanismo direto em atle- são internacional.
tas do sexo feminino e Pedrine- A frouxidão articular generaliza-
lli(9) concluiu que as lesões espor- da foi mais pronunciada em atle-
tivas por mecanismo indireto são tas do sexo feminino (49%), en-
mais freqüentes; Arendt e Dick(2) quanto que 90% dos homens
observaram que as mulheres mantiveram um padrão de nor-
apresentavam probabilidade 2 malidade (Tabela 13). Este fato é
vezes maior de ter uma lesão do explicado pela condição femini-
LCA, resultante de trauma dire- na de maior flexibilidade articu-
to, e 3 vezes maior probabilida- Gráfico 1. Distribuição dos joelhos dos atletas com entorse lar(14,15). Ao analisarmos os atle-
de, resultante de trauma indire- pela pontuação do IKDC subjetivo. tas com história de entorse do
to, do que os homens, já Cohen joelho, notamos que a maioria
et al.(5) concluíram que as lesões dos homens (88%) apresentou o
por mecanismo indireto foram padrão de normalidade, enquan-
mais freqüentes em jogadores de to a maioria das mulheres (63%)
futebol do sexo masculino. apresentou frouxidão (Tabela 14).
Em relação ao tempo de afasta- Concordamos com Rozzi et al.(15)
mento da atividade física após a na afirmação de que as mulhe-
entorse, a maioria dos jogadores res aparentemente adaptaram
e das jogadoras permaneceu mecanismos compensatórios de
afastado por mais de 1 mês, aumento da atividade muscular
(72% e 62%) (Tabela 11 e Gráfi- flexora do joelho para alcançar
co 1). Os homens apresentaram maior estabilidade.
tempo médio de retorno aos jo- Quando estudamos o grupo com
gos de 3,5 meses, enquanto as história de entorse notamos que
mulheres de 3,7 meses. Luthje et Gráfico 2. Distribuição dos joelhos dos atletas com história a maioria dos homens (63%)
al.(13) observaram em jogadores de entorse pelo tempo de recuperação. apresenta joelho em varo e a
de futebol que as lesões de joe- maioria das mulheres (91%) apre-
lho eram a maior causa de ne- senta alinhamento normal. Se-
cessidade de cirurgia, com um gundo Fu e Stone(14) as mulheres
tempo médio de retorno ao es- apresentaram uma maior antever-
porte de 3 meses. A importância são femoral, um maior ângulo Q,
das lesões de joelho no afasta- uma maior flexibilidade, uma
mento dos atletas ficou demons- menor massa muscular, um inter-
trado em nosso estudo e dos côndilo femoral mais estreito,
autores citados e revela o impac- uma tendência ao genuvalgo fi-
to sobre a vida destes atletas. siológico, e a uma maior rotação
O IKDC 2000 subjetivo revelou externa da tíbia; enquanto os ho-
médias elevadas para a maioria mens apresentaram uma antever-
dos atletas (Tabelas 1, 2; Gráfico são femoral menor, um menor
2), o que reflete a boa condição Tabela 13. Distribuição dos atletas pela frouxidão articular ângulo Q, uma musculatura mais
dos joelhos examinados. Houve generalizada, segundo o sexo. desenvolvida, uma menor flexibi-
apenas 1 atleta do sexo masculi- lidade, um intercôndilo femoral
no com Ikdc subjetivo de 75 pon- mais largo, uma tendência ao
tos; este apresentou ao exame genuvaro, e uma rotação interna
clínico uma lesão de menisco ou neutra da tíbia.
medial, confirmada por um exa- Entre as jogadoras encontramos
me de ressonância nuclear mag- somente aquelas que haviam
nética. Recentemente, Irrgang JJ sido submetidas a tratamento
et al.(3) concluíram que o IKDC conservador (Tabela 12). Acredi-
2000 subjetivo é um instrumento tamos que, se houvesse um de-
fiel e válido para a medição de partamento médico nas equipes,
sintomas, função e atividade es- encontraríamos jogadoras que
portiva em indivíduos de ambos teriam sido submetidas à cirurgia
os sexos nas diferentes faixas Tabela 14. Distribuição dos atletas com história de entorse, e retornado ao esporte. Seria,
etárias, com diferentes alterações pela frouxidão articular generalizada, segundo o sexo. então, razoável supor que teríamos

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um numero maior de pacientes se encontrar seqüelas potencial-
com história de entorse no joelho mente incapacitantes nestes atle-
no sexo feminino, se estivessem tas. Desta forma, deve-se estimu-
em equipes profissionais. lar a pesquisa sobre a epidemio-
Além dos pacientes submetidos logia e o mecanismo da entorse do
à cirurgia, houve três jogadores joelho, para tentarmos minimizar ou
do sexo masculino que apresen- evitar as suas desastrosas conseqü-
taram alteração ligamentar por ências.
ocasião do exame físico. No pri-
meiro paciente foi encontrado um CONCLUSÃO
exame físico compatível com le- Os resultados apresentados e
são do menisco medial, que foi discutidos no presente trabalho
confirmada posteriormente por Tabela 15. Distribuição dos atletas, quanto ao alinhamento permitem tirar as seguintes con-
ressonância nuclear magnética. dos membros inferiores, segundo o sexo. clusões:
Dois deles apresentaram o teste 1) Entorses do joelho ocorreram na
da abertura medial de 3 a 5 mm, proporção de cerca de um terço
o que é considerado próximo do (32%) entre os jogadores e de
normal, segundo o IKDC 2000. aproximadamente um quarto
O terceiro atleta apresentou o (23%) entre as jogadoras das equi-
teste da gaveta posterior de 6 a pes de futebol investigados na ci-
10 mm, considerada anormal, dade de Manaus; em 4% dos atle-
conforme o IKDC 2000. Todos os tas de ambos os sexos houve en-
três jogadores eram titulares de torse nos dois joelhos.
suas equipes na ocasião do exa- 2) A maioria dos atletas do sexo
me e apresentavam uma pontu- masculino com historia de entorse
ação do IKDC 2000 subjetivo de (63%) apresentou lesões ligamen-
75, 93 e 100, respectivamente. tares ou meniscais; apenas 44%
Nenhuma das jogadoras de fu- Tabela 16. Distribuição dos atletas com história de entorse, foram submetidos à intervenção
tebol apresentou alteração no quanto ao alinhamento dos membros inferiores, segundo o sexo. cirúrgico, havendo 3 vezes mais
exame físico ligamentar. Elas meniscectomias do que reconstru-
eram em média 3,2 anos mais jo- ções do ligamento cruzado anterior.
vens do que os jogadores e apresentavam 3,4 anos a menos 3) Após tratamento da entorse, o tempo médio de retorno ao
de prática de futebol, mostrando, portanto, menor tempo de esporte foi em torno de 3,5 meses em ambos os sexos, sendo
permanência no esporte. Estes dados sugerem que muitas jo- que entre os jogadores o tempo médio de retorno foi quase 3
gadoras abandonaram o futebol mais cedo do que os jogado- vezes maior naqueles que sofreram lesões ligamentares ou me-
res, provavelmente, em parte, devido a lesões sofridas. Os dois niscais.
atletas do sexo masculino que haviam sido submetidos à cirur- 4) Aproximadamente a metade das entorses ocorreu em joga-
gia de reconstrução do ligamento cruzado anterior, não apre- doras mais jovens e com menor tempo de prática do futebol; já
sentaram alteração no exame físico ligamentar, e apresentaram nos jogadores profissionais, a maioria das entorses (84%) ocor-
no IKDC 2000 subjetivo as pontuações de 100 e 99. reu com pelo menos 5 anos de prática.
A associação das lesões ligamentares, condrais e meniscais 5) A presença de frouxidão articular generalizada foi significati-
durante a fase aguda da entorse do joelho é freqüente e deve vamente maior entre as jogadoras do que entre os jogadores
ser considerada na indicação do tratamento. Quando o pacien- de futebol, alcançando 63% nas atletas com entorse.
te evolui com instabilidade do joelho, sabemos que freqüente-
mente existe a associação de lesões degenerativas meniscais e AGRADECIMENTO
condrais. O fato de que estas lesões degenerativas piorarem com Agradecemos ao Núcleo de Apoio à Publicação da Faculdade
o tempo já está bem determinado. Por isto, é preocupante saber- de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo - NAP-SC o
mos que quanto mais cedo elas ocorrem, maior é o potencial de suporte técnico-científico à publicação deste manuscrito.

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146 ACTA ORTOP BRAS 13(3) - 2005

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