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Religião

Como a fé resiste à descrença

André Petry

Desde que se espalhou a notícia extraída do censo


VEJA TAMBÉM
demográfico do IBGE de 2000, Nova Ibiá, vilarejo de 7
Nesta reportagem
000 habitantes no interior da Bahia, ganhou um estigma e
• Quadro: Os sem-fé
uma obsessão. Como os números do censo mostravam
crescem, mas são poucos...
que 59,85% dos seus habitantes diziam não ter religião
alguma, Nova Ibiá passou a conviver com o estigma de
Nesta edição
ser a cidade mais atéia do Brasil. Em nenhuma outra, em
• O conflito entre fé e
ponto algum do país, tanta gente dizia não ter filiação
ciência
religiosa. A segunda cidade com a maior tropa de sem-
• A religião faz mal ao
religião era Pitimbu, no interior da Paraíba, mas com
mundo
números mais modestos – 42,44%. Desde então, a
obsessão de Nova Ibiá é livrar-se do estigma do ateísmo. "Conheço dois ou três ateus, e
só. Isso não é verdade", diz Raimundo Santana, bispo da Igreja Batista, atualmente
ocupado em preparar os festejos do ano que vem, quando sua igreja completará 100
anos na região. "Não acredito nisso, nunca ninguém aqui me disse que não tem
religião", reforça Albervan da Silva Cruz, o primeiro padre a residir em Nova Ibiá. "A
cidade mais atéia? Não é verdade", sentencia o prefeito José Murilo Nunes de Souza, de
41 anos, com a autoridade de quem confessa, meio a contragosto, que se criou católico,
mas não tem religião.

Os porta-vozes de Nova Ibiá, um povoado que fica nos confins da falida zona cacaueira
da Bahia, estão em harmoniosa sintonia com a maioria dos brasileiros. No maior país
católico do planeta, no país do sincretismo religioso, no país onde católicos têm
benzedeira e evangélicos vão a sessões espíritas, no país que alega, num misto de
gracejo e esperança, ser a terra natal de Deus, o Todo-Poderoso, quase nada é pior do
que ser ateu. Uma pesquisa encomendada por VEJA, realizada pela CNT/Sensus,
mostra que 84% dos brasileiros votariam em um negro para presidente da República,
57% dariam o voto a uma mulher, 32% aceitariam votar em um homossexual, mas –
perdendo de capote – apenas 13% votariam em um candidato ateu (veja quadro). Pior
que isso só o capeta. O levantamento mostra que, entre os grupos populacionais que se
convencionou chamar de minorias – racial, sexual ou de gênero –, a minoria mais
rejeitada é a religiosa, ou a anti-religiosa. No Brasil de São Frei Galvão, portanto, ser
temente a Deus é mais do que uma marca nacional – chega a ser, informa a pesquisa,
um imperativo social.

Às vésperas do Natal, quando 2,1 bilhões de cristãos vão comemorar os 2 007 anos do
nascimento de Jesus Cristo, os católicos brasileiros seguem diminuindo ano após ano,
como vem acontecendo desde 1940, mas ainda formam uma estupenda multidão: são
quase 74% da população brasileira – o que equivale a mais de 130 milhões de fiéis.
Com alguns disciplinados e praticantes e muitos displicentes e relapsos, os católicos do
Brasil, com seu número espetacular, mostram o vigor da crença divina, a pujança da fé,
a robustez de Deus – uma potência curiosamente dotada de todas as qualidades inversas
às da humanidade, que é criada (e Deus é incriado), que é limitada (e Deus é ilimitado)
e que é mortal (e Deus é imortal). Os números da fé no Brasil talvez sirvam como
explicação para dois fenômenos. Explicam a resistência da religiosidade em um mundo
marcado pela descrença e, ao mesmo tempo, o notável preconceito da maioria dos
brasileiros em relação aos ateus. Faz sentido rejeitar alguém apenas porque não acredita
em Deus?

"Faz todo o sentido", afirma a historiadora Eliane Moura Silva, professora da


Universidade Estadual de Campinas e especialista em religião, ela própria uma atéia. "O
brasileiro ainda entende o ateu como alguém sem caráter, sem ética, sem moral." É um
entendimento que parece espalhar-se de modo mais ou menos homogêneo por todas as
classes sociais. Recentemente, a historiadora deu duas aulas sobre ateísmo na Casa do
Saber, instituição criada para eliminar lacunas intelectuais dos endinheirados de São
Paulo, e a platéia teve uma reação adversa, quase hostil, às idéias ateístas. Antes, a
neurocientista Silvia Helena Cardoso, doutora em psicobiologia pela Universidade da
Califórnia, em Los Angeles, publicou um artigo num jornal de Campinas discutindo se
os santos seriam esquizofrênicos, dada a freqüência com que tinham visões – ou
alucinações. Recebeu tantas ameaças que resolveu abandonar o assunto. O professor
Antônio Flávio Pierucci, da Universidade de São Paulo, especialista em sociologia da
religião, explica o fenômeno: "Os brasileiros não estão habituados a se confrontar com a
realidade do ateu". É o que leva os políticos – antes, durante e depois da eleição – a
sempre dizer que ninguém é mais temente a Deus do que eles.

Fotos Gregorio Borgia, Ali Jarekji / Reuters,


Steve Cole / Getty Images / Royalty Free
DO SANGUE E DA FÉ
Católicos se reúnem na Praça de São Pedro,
em Roma (acima), e muçulmanos se
encontram em Meca, na Arábia Saudita: os
ateus nasceram junto com a primeira religião
e, hoje, denunciam que, por trás da crença em
Deus, há um rastro de violência e barbárie
Reuters

Em maio passado, o instituto Datafolha fez uma pesquisa sobre religiosidade por
ocasião da visita ao país do papa Bento XVI. A pesquisa relevou a dimensão
impressionante da fé brasileira: 97% disseram acreditar na existência de Deus, 93%
informaram crer que Jesus Cristo ressuscitou depois de morrer crucificado e 86%
concordaram que Maria deu à luz sendo virgem. Com números tão possantes, não há
dúvida de que o Brasil figura entre os países mais crédulos do mundo – e isso abre um
paradoxo. São cada vez mais abundantes as descobertas científicas sobre a origem do
universo e das espécies. Se a credulidade não se abala diante disso, é lícito questionar
que talvez nenhuma prova científica, por mais sólida e contundente, seja capaz de
reduzir a pó o teísmo, a crença no divino (veja reportagem) "O último deus
desaparecerá com o último dos homens", diz o filósofo francês Michel Onfray, em seu
Tratado de Ateologia, sucesso retumbante com mais de 200.000 exemplares vendidos
na França. E, ateu convicto, ele alfineta: "E com o último dos homens desaparecerão o
temor, o medo, a angústia, essas máquinas de criar divindades".

Antes que o último homem se vá, percebem-se aqui e ali sinais de que a religião, em
que pese seu vigor, começa a perder público – no Brasil, inclusive. De 1940 a 1970, a
turma dos brasileiros sem religião ficou praticamente do mesmo tamanho, atolada em
menos de 1% da população. Nas últimas três décadas, saltou de 1,6% para 7,3% (veja
gráficos e mapa). Os sem-religião já são o terceiro maior grupo, atrás de católicos e de
evangélicos. Pelos dados do último censo, os sem-religião eram 12,5 milhões, mais que
um Portugal inteiro. Não são todos ateus, é claro. Entre eles, há agnósticos, secularistas,
céticos e até quem acredita em Deus, mas não pratica nenhuma religião. O IBGE não
pergunta aos entrevistados se são ateus ou não. Calcula-se, no entanto, que os ateus
sejam uns 2%. Nos Estados Unidos, eles oscilam nessa faixa, mas os sem-religião de lá
chegam aos 15%. No mundo, os ateus são uns 4%. São poucos, sobretudo se
comparados aos bilhões de cristãos, muçulmanos e judeus, para ficar apenas nas três
grandes religiões monoteístas, mas é uma massa crescente, principalmente nos países
desenvolvidos. Na Espanha, Alemanha e Inglaterra, menos da metade da população
acredita em Deus. Na França, os crentes não chegam a 30%.

Entre os brasileiros sem religião, a maior curiosidade está na Bahia de Todos os Santos,
terra onde frei Henrique de Coimbra rezou a mítica primeira missa, em 26 de abril de
1500. A Bahia, que abriga Nova Ibiá e seu esquadrão de sem-religião, é o terceiro
estado com o maior contingente de brasileiros sem filiação religiosa. E Salvador, entre
as capitais, é a campeã nacional: 18% dos soteropolitanos não têm religião.
Considerando-se o país todo, os sem-religião são mais numerosos entre os homens e
entre os brasileiros com menos de 55 anos. Não se sabe de onde eles vêm. É provável
que venham do rebanho de católicos desgarrados. O Rio de Janeiro, por exemplo, é o
estado menos católico do país e, simultaneamente, tem o maior pelotão de sem-religião.
Também é certo que boa parte dos católicos está virando neopentecostal. Nas duas
últimas décadas, à queda acentuada de católicos correspondeu uma alta igualmente
acentuada de evangélicos – em especial da Igreja Universal do Reino de Deus, que,
sendo uma voraz sugadora de fiéis e dízimos, se transformou em potência divina e
comercial.

A raiz do fenômeno que irriga o crescimento de evangélicos e de sem-religião faz parte


da mesma genealogia: os laços étnicos e culturais de boa parte dos brasileiros estão se
desfazendo como resultado da modernidade – do que a modernidade traz de positivo,
como o aumento da escolarização e a crescente profissionalização de certas camadas
sociais, e do que traz de negativo, como a desestruturação das famílias e a favelização
das metrópoles. "É a religião atuando como solvente", diz o professor Flávio Pierucci,
da USP. Seus números apóiam sua percepção. Um laço étnico que se desfaz: entre os
adeptos do candomblé, credo de origem africana, 40% são brancos. Outro: nos cultos
afro-brasileiros há cerca de 100.000 negros, e nos cultos evangélicos os negros já são
1,7 milhão. Mais um: os brasileiros que trocam o catolicismo pelo neopentecostalismo
estão dissolvendo um laço cultural e histórico, substituindo a religião fundadora do
Brasil, herança que vem do fundo do passado colonial, por uma novidade na cena
religiosa do país. É aí, nesse processo de dissolução, que crescem os ateus e os sem-
religião.

Por razões distintas, o ateísmo também é crescente lá fora. Nos Estados Unidos, o
embate entre religiosos e sem-fé ficou mais intenso depois dos atentados de 11 de
setembro de 2001, praticados por dezenove muçulmanos, e da eleição do presidente
George W. Bush, o astro da direita cristã que se julga interlocutor de Deus. Com os
cristãos conservadores exercendo notável influência em tribunais e escolas, os Estados
Unidos são um caso único entre os países ricos e democráticos. Nenhum outro tem grau
tão elevado de religiosidade – e de radicalismo. Em 2001, os mais fanáticos líderes
religiosos americanos, em vez de condenar os atentados, disseram que eram uma
punição contra um país que aceitava o aborto e o homossexualismo... Nesse ambiente, a
literatura sobre o ateísmo tem feito barulho e sucesso, como é o caso do biólogo inglês
Richard Dawkins, autor de Deus, um Delírio, do jornalista inglês Christopher Hitchens,
que mora em Washington e escreveu Deus Não É Grande, e do filósofo americano Sam
Harris, autor de Carta a uma Nação Cristã, um manifesto cortante em defesa do
ateísmo (veja entrevista).

Ainda que sua história seja pouco conhecida, o ateísmo nasceu junto com a primeira
religião, mas só entrou no cardápio das idéias abertamente debatidas com o advento do
iluminismo, no século XVIII. Assim como os crentes, que se dividem em uma miríade
de correntes e denominações, os ateus de hoje divergem em muitos pontos, mas há
alguns consensos. Um deles é que a moralidade não depende das religiões, e, portanto,
um ateu pode ser ético e bom. A favor da tese está a neurociência, cujas descobertas já
provaram que até os chimpanzés têm noções morais, sentimentos de empatia e
solidariedade – e não rezam nem crêem em Deus. Outro ponto em que todos os autores
sobre ateísmo concordam é que as religiões produziram (e ainda produzem) notável
rastro de sangue. Além dos exemplos clássicos das Cruzadas dos cristãos ou da
expansão islâmica à base da espada, há exemplos contemporâneos. Na Irlanda do Norte,
protestantes lutam contra católicos. Na Caxemira, são muçulmanos contra hindus. No
Sudão, cristãos contra muçulmanos, que também se confrontam na Etiópia, na Costa do
Marfim, nas Filipinas... Crentes de diferentes religiões ou denominações guerreiam no
Irã, no Iraque, no Cáucaso, no Sri Lanka, no Líbano, na Índia, no Afeganistão...

É evidente que a moralidade não é mesmo resultado da religião, mas também não é
resultado de sua ausência. Adolf Hitler (1889-1945), que planejou dizimar um povo
inteiro, se dizia religioso. Josef Stalin (1879-1953), cujas vítimas fatais podem chegar a
20 milhões de soviéticos, se dizia ateu. Os religiosos também concordam que a fé já
provocou guerras e violência. Em outubro passado, o papa Bento XVI, num encontro
em Nápoles com lideranças multiconfessionais, conclamou a todos para "reiterar que a
religião nunca poderia ser um veículo do ódio". Mas também se sabe que as religiões já
contribuíram para a paz e desempenham um valoroso trabalho missionário nas áreas
mais miseráveis do planeta. Ninguém pode afirmar que os deuses, os livros sagrados e
as preces são uma criação do homem, sem nenhuma intervenção divina. Também
ninguém pode garantir o contrário. Sendo assim, enquanto a idéia de Deus, a imagem do
menino Jesus na manjedoura ou o espírito do Natal servirem para confortar e congregar
milhares, milhões, bilhões de seres humanos, é bom que a fé possa seguir contribuindo
para levar paz a homens e mulheres. Incluindo os moradores da pequena Nova Ibiá.
ONDE FORAM PARAR OS
ATEUS DE NOVA IBIÁ?

Fotos Xando Pereira, Steve Cole/Getty


Images/Royalty Free

SEM PADRE
Sem a presença do padre, católicos fazem a
leitura da Bíblia: convite para recrutar mais
fiéis

No caminho para Nova Ibiá, a cidade baiana onde 60% da população diz não ter
nenhuma religião, há uma igreja abandonada. Cercada por um mato alto e paredes
descascando, a Igreja Nossa Senhora de Lourdes, onde se celebrava uma missa mensal,
não abre mais as portas. Lília Lisboa, que cuidava do prédio, mudou-se para Salvador e
ninguém se interessou em tomar conta do templo. Quinze quilômetros à frente, já no
centro de Nova Ibiá, diante da praça central, fica a modesta Igreja de São José, o
principal templo católico do vilarejo. Ali, numa noite de segunda-feira, dezoito pessoas
escutavam a leitura da Bíblia sob a luz tênue de uma vela grande e oito velas pequenas.
Não havia padre no altar. A leitura da Bíblia era feita por uma beata, sentada no
primeiro banco de madeira. À entrada da igreja, um cartaz conclamava: "Toda a igreja
está feliz com sua vinda. Quando voltar, traga um convidado".

Apresentada assim, com igreja abandonada e campanha de recrutamento de fiéis, Nova


Ibiá parece fazer jus à fama de a cidade mais atéia do Brasil. Mas há algo que não se
encaixa. Tudo em Nova Ibiá recende a religião. O município não tem agência bancária,
médico, hospital nem juiz, mas tem três lan houses – e nada menos que doze igrejas.
São três católicas e nove templos evangélicos, além de um terreiro de candomblé.
"Também", diz o prefeito, José Murilo de Souza, "é mais fácil abrir uma igreja do que
um comércio." Na Igreja de São José, cujo santo é o padroeiro do povoado, as missas de
domingo reúnem 150 fiéis. Dobrando a esquina, a Igreja Batista de Nova Ibiá, fundada
em 1908, recebe 400 pessoas nos dias mais concorridos – uma enormidade para um
vilarejo de 7 000 habitantes. O altar é um móvel de compensado, custou 180 reais logo
ali, na Paloma Móveis, mas o sistema de som, para não perder um único aleluia, é coisa
de 25 000 reais. "Aqui, ou é crente ou é católico", diz o bispo Raimundo Santana, negro
corpulento de 51 anos, casado, quatro filhos, todos batistas e um já missionário, que há
28 anos comanda a Igreja Batista de Nova Ibiá.

COM O BISPO
O bispo Raimundo, em seu templo: o
altar é de compensado, custou 180
reais, mas o som é de primeira

Onde estão os ateus, os agnósticos, os sem-religião de Nova Ibiá? Há algo que não se
encaixa. Em 1991, o censo do IBGE descobriu que havia 6,35% de pessoas sem religião
na cidadezinha e que 83,35% da população dizia ser católica. Em 2000, no novo censo,
a realidade havia virado de ponta-cabeça: 59,85% afirmavam não ter religião e apenas
16,02% diziam-se católicos. Tamanha mudança só se justificaria com uma rebelião de
católicos, mas ninguém tem notícia de um movimento dessa
natureza. Ao contrário. Até fevereiro do ano passado, o padre
não morava em Nova Ibiá. Ia à cidade de vez em quando, para
celebrar a missa, e partia. Agora, o padre Albervan da Silva
Cruz mora na cidade e reza muita missa. Na Igreja Matriz, há
missa no domingo, na terça, na primeira sexta de cada mês e,
de quinze em quinze dias, no sábado. Na Igreja de São Roque,
a missa é na quinta. Na Igreja de São Francisco, na zona rural,
a missa é rezada duas vezes por mês, sempre aos domingos.
Aos 30 anos, o padre Albervan é o primeiro pároco de Nova
Ibiá, e Nova Ibiá é a primeira paróquia do padre Albervan.
Ali, ele já fez dez casamentos e dá aula de filosofia para
quinze turmas da 5ª à 8ª série da escola pública local.

O cenário religioso de Nova Ibiá é um retrato em miniatura da


realidade brasileira: os evangélicos crescem, enquanto os
católicos lutam para que seu rebanho não se disperse – ainda
assim, a queda vertiginosa de 83,35% para 16,02% de
católicos em nove anos é inexplicável. O padre, rival dos
evangélicos, tem uma explicação conspiratória. Diz que ouviu falar que os
pesquisadores do IBGE eram protestantes e, quando um católico dizia ser católico, mas
não praticante, eles cravavam "sem religião" por conta própria. "Não sei se é verdade",
afirma. É improbabilíssimo que seja, mas é certo que os evangélicos estão ganhando
terreno. De 1991 para 2000, saltaram de 9,69% para 23,65%. O pulo, conforme o bispo
Raimundo Santana, deu-se em 1998, quando a Igreja Batista resolveu "renovar-se", ou
seja, passou a acreditar em dons espirituais e curas divinas. "Eu mesmo não acreditava,
mas hoje acredito", diz ele. "Depois da renovação, a igreja cresceu muito." De dízimo,
ela recolhe entre 3 000 e 4 000 reais mensais.

O comerciante Idevaldo Prazeres da Silva, de 50 anos, é um dos convertidos. Era


católico, há nove anos virou evangélico, tem um irmão pastor e está lendo a Bíblia pela
quarta vez. Veste uma camiseta na qual se lê: "Em Deus tenho posto minha confiança".
Da loja de material de construção de Idevaldo da Silva, sobe-se uma ladeira para chegar
à casa do único ateu identificado de Nova Ibiá. Ateu? Não, ele diz que não, que é
católico há anos e perdeu a conta do tempo que freqüenta a igreja. Com a barba por
fazer, mãos levemente trêmulas, o ateu enrustido – ou o católico caluniado – diz que só
conhece gente de fé em Nova Ibiá. O bispo Raimundo Santana, com sua experiência de
quase três décadas pregando, garante que há outros dois ateus no vilarejo, mas não os
identifica. Porque um está indo a um centro espírita e abandonando o ateísmo. O outro
está dando os primeiros passos para aderir à igreja do bispo. Ele não quer estragar essa
peregrinação rumo à fé revelando quem são. Acredita que em breve Nova Ibiá não terá
nem ateus nem materialistas – e explica, com sua metafísica peculiar, a diferença entre
um e outro: "Ateu não acredita em nada, materialista só acredita no que pega e vê".
Religião
O conflito entre fé e ciência

O sonho do geólogo americano Kurt Wise era ser professor de biologia em alguma
universidade de ponta nos Estados Unidos. Sua carreira acadêmica vinha numa rota
brilhante. Ele foi aluno do célebre paleontólogo Stephen Jay Gould, um dos gigantes da
biologia do século XX, e carregava debaixo do braço diplomas das universidades de
Chicago e Harvard. Até que um dia, pressionado pela irresistível tensão entre a ciência e
os ensinamentos da Bíblia, Kurt Wise tomou uma atitude radical: pegou uma tesoura e
saiu cortando todos os trechos da Bíblia que contrariam as descobertas da ciência.
Cortou, cortou e cortou, até que não sobrou quase nada do livro sagrado. "Tive de tomar
uma decisão entre a evolução e as Escrituras", relembra Wise. Era uma coisa ou outra.
Ele acabou renunciando ao sonho de ser professor de biologia e aceitando integralmente
a palavra de Deus. "Assim, com grande tristeza, lancei ao fogo todos os meus sonhos e
as minhas esperanças na ciência." O caso dramático de Kurt Wise é relatado no livro
Deus, um Delírio, do biólogo inglês Richard Dawkins, e coloca uma questão central: é
possível conciliar religião e ciência?

Como a ciência é movida pela dúvida e pela razão,


VEJA TAMBÉM
enquanto o motor da fé são a crença e o espírito, os
Nesta edição
cientistas costumam ser os mais descrentes. Pesquisas
• Como a fé resiste à
indicam que 93% dos membros da Academia Nacional de
descrença
Ciências dos Estados Unidos não aceitam a idéia de um
• A religião faz mal ao
Deus. Há dez anos, a revista Nature informou que 60%
mundo
dos cientistas não acreditavam em Deus, a mesma
porcentagem encontrada em levantamento similar feito em 1916. Entre os mais
incrédulos, estão os biólogos. Os matemáticos são os mais crentes. Mesmo vinda de
longe, a questão até hoje divide os cientistas. Dawkins, por exemplo, afirma que é
inaceitável um cientista ter idéias religiosas, pois o conflito é incontornável. Um
geólogo como Kurt Wise sabia, cientificamente, que o planeta tem bilhões e bilhões de
anos, mas a Bíblia garante que foi criado por Deus apenas 10.000 anos atrás. O que
fazer? Há quem aceite a idéia de que a Bíblia contém imprecisões ou passagens
metafóricas, que não devem ser interpretadas literalmente. Mas, nesse caso, cada crente
é o hermeneuta de sua própria crença?

São raros, mas existem cientistas devotos. O mais famoso é o biólogo americano
Francis Collins, autor de um dos feitos mais notáveis da ciência recente: o mapea-mento
do DNA humano. Collins, temente a Deus desde os 27 anos, escreveu A Linguagem de
Deus para mostrar que ciência e fé não são incompatíveis, mas complementares. A
ciência investiga o natural, a religião investiga o espírito – e uma não responde às
dúvidas da outra. Entre os cientistas, muitos rejeitam essa divisão compartimental do
saber humano, mas Collins alega que a ciência tem respostas empobrecedoras para
indagações primordiais. Por exemplo: por que estamos aqui? Qual é o sentido da vida?
Os cientistas ateus não sabem dizer e, em defesa de sua visão atéia, alegam que a
ausência de uma explicação natural não exige necessariamente uma explicação
sobrenatural. Eles acusam os religiosos de aproveitar a lacuna do conhecimento humano
para preenchê-la com o pensamento mágico.

Ciência e fé não foram inimigas escancaradas desde sempre, porque a fé, por séculos,
foi mais forte, mais influente e mais poderosa que a ciência. Mas o choque entre ambas
tem fundas raízes na história – a começar por Demócrito, que, cinco séculos antes da era
cristã, intuiu a existência do átomo em um exercício mental de um vigor espantoso.
Diante da afirmação de que tudo era matéria, tudo era átomo, a fé sentiu-se contrariada
porque, se tudo é assim, Deus não pode ser imaterial. E, pior, sendo material, é
corruptível. Séculos mais tarde, a Igreja Católica, autoridade no Ocidente, entraria em
rota de colisão aberta com as mais fantásticas descobertas científicas. Foi contra o
heliocentrismo. O Sol não poderia ser o centro do universo, pois esse lugar perfeito, o
centro, era da Terra, obra de Deus. Foi contra a datação do mundo, o estudo da anatomia
em cadáveres e até se insurgiu contra o número zero, noção central para a evolução da
matemática. Desagradou-lhe também o pára-raio, cuja invenção nos dispensou de temer
um Deus que nos enviava descargas elétricas punitivas de vez em quando.

É possível que nada tenha sido tão devastador para a crença divina quanto a descoberta
de Charles Darwin (1809-1882), que chegou às livrarias inglesas no dia 22 de novembro
de 1859, sob o título A Origem das Espécies, com modestos 1 250 exemplares –
esgotados rapidamente. Darwin dizia que não havia nada como um criatório divino em
algum canto do planeta, de onde Deus sacava de vez em quando uma espécie nova. As
espécies evoluíam segundo o princípio da seleção natural. Ruía a idéia de que Deus fez
do barro Adão e de sua costela Eva. A hecatombe reverbera até hoje, 150 anos depois,
quando criacionistas, em especial nos Estados Unidos, insistem no "desenho
inteligente", roupagem nova para o velho criacionismo. A descoberta de Darwin é
genial porque, como é próprio das obras-primas, contraria o padrão mental vigente. O
homem está habituado a acreditar que, para criar algo, é preciso algo maior. Que só o
complexo gera o simples. Ou seja: um homem pode fazer um livro, mas um livro não
faz um homem. Darwin mostrou que a simplicidade dá origem à complexidade. Da
ameba original veio tudo, o besouro, o coelho, o macaco, o homem. Para ressaltar o
repúdio da fé ao darwinismo, o filósofo Michel Onfray, em seu Tratado de Ateologia,
indaga, ironicamente: "O papa, primo de um babuíno?".

O avanço da ciência também subverte a idéia religiosa de que a natureza e as espécies


carregam o germe da perfeição – como se tivessem sido projetadas para funcionar como
uma máquina maravilhosa. É engano. As espécies são imperfeitas, redundantes. Os
embriões humanos produzem caudas e guelras nos primórdios, que acabam perdendo na
fase fetal tardia. Os biólogos enxergam nesse processo a prova cabal da evolução
darwinista e da impropriedade do conceito de criação e seu corolário, a perfeição do
desenho divino. A evolução não tende à perfeição. Entre os bichos, a evolução produziu
aves que não voam, cobras com pélvis e peixes cegos. Esse processo, em vez de perfeito
e retilíneo, é tateante e reincidente em seu incessante trabalho de produção de mutações.
O que se atribui à perfeição do desenho é somente o resultado da adaptação às vezes
apenas temporária da espécie ao ambiente em que vive. Um exemplo? A ave batizada
pelos navegadores portugueses de dodo, corruptela de doido. Por milênios, o dodo viveu
nas Ilhas Maurício em relativa segurança, sem predadores e com comida rasteira
abundante. Com o passar das eras nesse ambiente, as asas tornaram-se um acessório
dispensável e a evolução permitiu que os dodos incapazes de voar sobrevivessem tão
bem ou melhor do que os voadores. Logo sobraram apenas dodos incapacitados para o
vôo. Resultado: os dodos foram extintos logo depois da chegada dos homens às Ilhas
Maurício, em meados do século XVII. Sem asas, essas aves tornaram-se presa fácil para
os predadores bípedes humanos.
Mas, apesar do dodo, do átomo, das galáxias, da nanotecnologia e da prova da
conjectura de Poincaré, a religião resiste. Por quê? Para uns, a religião surge com a
descoberta da finitude, e o peso esmagador de saber-se mortal só pode ser suportado
com a muleta do pensamento mágico. Para outros, a religião é um instrumento que o
homem criou para adaptar-se ao meio ambiente, que lhe parecia misterioso – como, de
outro modo, entender a noite, a chuva, o trovão, a neve? Existe, ainda, a tese de que
estamos biologicamente programados para acreditar em coisas que não podemos provar
porque, para sobreviver, acreditamos nos perigos e alertas que recebemos de pai e mãe
.– ainda que, como crianças, não possamos entender o perigo real de ficar no parapeito
da janela do 10º andar. Por fim, a própria teleologia, que nos leva a julgar que tudo
existe com alguma finalidade – a nuvem para chover, o sol para aquecer, o mar para
nadar –, acaba por predispor a espécie humana à religião. O biólogo americano David
Sloan Wilson, da Universidade Binghamton, outro especialista em Darwin, acredita que
a religião pode acabar um dia, mas sempre haverá espaço para a fé. Wilson é ateu.

Sua tese tem respaldo em uma pesquisa da década de 70 que estudou 53 pares de
gêmeos idênticos e 31 pares de gêmeos não idênticos. A conclusão dos pesquisadores é
que a espiritualidade tem raiz genética, mas a opção por determinada liturgia, por um
culto específico, pelo hábito de rezar, por freqüentar o templo ou a igreja, por ler a
Bíblia ou o Corão é algo culturalmente adquirido. Um dia, o homem saberá ler com
precisão os 3 bilhões de letras do DNA humano, nossa carteira de identidade.
Certamente, esse conhecimento científico fará com que seja possível evitar um câncer,
uma disfunção renal, a tendência à depressão ou a fragilidade dos ossos do tórax. Mas,
ainda assim, com toda essa pujança, esse conhecimento imenso, não saberemos como
fazer um homem bom ou mau, triste ou feliz. Talvez, da estupenda trajetória percorrida
da simplória ameba primeva à potência do cérebro de Albert Einstein (1879-1955), o
fundamental seja apenas isso: ser bom, ser feliz.
Religião
A religião faz mal ao mundo

O filósofo Sam Harris, um dos ateus mais


barulhentos dos EUA, diz que só com o fim
da fé se poderá erguer uma civilização global

André Petry

Fotos Jobathan Alcorn/Zuma Press, Steve


Cole/Getty Images/Royalty Free

LEGIÃO DE LEITORES
Com seus livros sobre ateísmo, Sam Harris
tem freqüentado a lista dos mais vendidos do
New York Times

Dependendo do ângulo em que é observado, o filósofo


VEJA TAMBÉM
americano Sam Harris, de 40 anos, exibe uma des-
Nesta edição
concertante semelhança fí-sica com o ator Ben Stiller,
• Como a fé resiste à
mas seu trabalho nunca está para comédias. Junto com o
descrença
biólogo inglês Richard Dawkins, autor de Deus, um
• O conflito entre fé e
Delírio, Sam Harris é um dos mais ativos militantes
ciência
contra as religiões. Em 2005, nos Estados Unidos, ele
lançou O Fim da Fé e ficou mais de trinta semanas na lista dos mais vendidos do jornal
The New York Times. Neste ano, produziu um novo best-seller com críticas à religião.
Com 91 páginas, Carta a uma Nação Cristã, já lançado no Brasil pela Companhia das
Letras, é um compêndio em defesa do ateísmo. É redigido com uma linguagem tão
cortante e argumentos tão implacáveis que, por vezes, roça o panfletário, mas dá seu
recado com clareza absoluta. O filósofo bate em cada um dos pilares da fé e conclui: "A
religião agrava e exacerba os conflitos humanos muito mais do que o tribalismo, o
racismo ou a política". Ele deu a seguinte entrevista:

O movimento dos ateus é forte nos Estados Unidos e na Inglaterra, principalmente.


É uma decorrência dos atentados de 11 de setembro de 2001?
Vejo dois motivos simultâneos para essa confluência geográfica: os atentados de 11 de
setembro e a escancarada religiosidade do governo de George W. Bush. A conjunção
desses dois fatores levou muitas pessoas a se preocupar com o fato de que a fé está
agora dos dois lados do balcão. Esse é um jogo altamente perigoso.
Por quê?
A fé é, intrinsecamente, um elemento que, em vez de unir, divide. A única coisa que
leva os seres humanos a cooperar uns com os outros de modo desprendido é nossa
prontidão para termos nossas crenças e comportamentos modificados pela via do
diálogo. A fé interdita o diálogo, faz com que as crenças de uma pessoa se tornem
impermeáveis a novos argumentos, novas evidências. A fé até pode ser benigna no nível
pessoal. Mas, no plano coletivo, quando se trata de governos capazes de fazer guerras
ou desenvolver políticas públicas, a fé é um desastre absoluto.

O senhor acha que o mundo seria melhor sem religião, sem fé, sem crença em
Deus?
Seria melhor se não houvesse mentiras. A religião é construída, e num grau notável,
sobre mentiras. Não me refiro aos espetáculos de hipocrisia, como quando um pastor
evangélico é flagrado com um garoto de programa ou metanfetamina, ou ambos. Refiro-
me à falência sistemática da maioria dos crentes em admitir que as alegações básicas
para sua fé são profundamente suspeitas. É mamãe dizendo que vovó morreu e foi para
o céu, mas mamãe não sabe. A verdade é que mamãe está mentindo, para si própria e
para seus filhos, e a maioria de nós encara tal comportamento como se fosse
perfeitamente normal. Em vez de ensinarmos as crianças a lidar com o sofrimento e ser
felizes apesar da realidade da morte, optamos por alimentar seu poder de se iludir e se
enganar.

É possível conciliar ciência e religião?


A diferença entre ciência e religião é a diferença entre ter bons ou maus motivos para
acreditar nas hipóteses sobre o mundo. Se houvesse boas razões para crer que Jesus
nasceu de uma virgem ou que voltará à Terra, tais proposições fariam parte de nossa
visão racional e científica do mundo. Mas, como não há boas razões para acreditar
nisso, quem o faz está em franco conflito com a ciência. É claro que as pessoas sempre
acham um modo de mentir para elas mesmas e para os outros. A estratégia, nesse caso,
é dizer que tal crença decorre da fé. Com freqüência, ouvimos dizer que não há conflito
entre razão e fé. É o mesmo que dizer que não há conflito entre fingir saber e realmente
saber. Ou que não há conflito entre auto-engano e honestidade intelectual.

Haverá o dia em que a humanidade deixará de ter fé ou a fé faz parte da natureza


humana?
O desejo de compreender o que se passa no mundo é inato, assim como o desejo de ser
feliz, de estar cercado por pessoas que amamos ou o desejo de ser mais feliz, mais
carinhoso, mais ético no futuro. Mas nada disso nos obriga a mentir para nós mesmos,
ou para nossos filhos, a respeito da natureza do universo. É claro que nossa
compreensão do universo é incompleta e desconhecemos a extensão exata de nossa
ignorância. Não temos como antecipar as maravilhosas descobertas que serão feitas. O
que sabemos com absoluta certeza, aqui e agora, é que nem a Bíblia nem o Corão
trazem nossa melhor compreensão do universo.

Mas nem a Bíblia nem o Corão se pretendem um manual científico para entender
o mundo?
Esses livros não são sequer um guia sobre moralidade que possamos considerar
minimamente adequado, e falo de moralidade porque é um campo em que ambos se
consideram exemplares. A Bíblia e o Corão, por exemplo, aceitam a escravidão.
Qualquer um que os considere guias morais deve ser a favor da escravidão. Não há uma
única linha no Novo Testamento que denuncie a iniqüidade da escravidão. São Paulo até
aconselha aos escravos que sirvam bem aos seus senhores e sirvam especialmente bem
aos seus senhores cristãos. É desnecessário dizer que a Bíblia e o Corão, além de não
servir como guias em termos de moralidade, também não são autoridade em física,
astronomia ou economia.

Que tipo de impacto seu livro pode ter sobre os leitores religiosos?
Eu ficaria feliz se o livro levasse os leitores a se perguntar por que, em pleno século
XXI, ainda aplaudimos pessoas que fingem saber o que elas manifestamente não sabem
nem podem saber. Não há uma única pessoa viva que saiba se Jesus era filho de Deus
ou se nasceu de uma virgem. Na verdade, não há uma pessoa viva que saiba se o Jesus
histórico tinha barba. No entanto, em muitos países é uma necessidade política simular
que sabemos coisas sobre Deus, sobre Jesus, sobre a origem divina da Bíblia. Imagino
que qualquer pessoa religiosa que leia Carta a uma Nação Cristã com a cabeça aberta
descobrirá que os argumentos usados contra a fé religiosa são absolutamente
irrespondíveis. Isso deve ter algum efeito sobre o modo de ver o mundo dos leitores.
Eles certamente vão perceber que ser um cristão devotado faz tanto sentido quanto ser
um muçulmano devotado, que, por sua vez, é tão lógico quanto ser um adorador de
Poseidon, o deus do mar na Grécia antiga. É hora de falarmos sobre a felicidade humana
e nossa disponibilidade para experiências espirituais na linguagem da ciência do século
XXI, deixando a mitologia para trás.

O Brasil é um país aparentemente tolerante com as diferentes religiões e conhecido


pelo sincretismo religioso. Num país assim, é mais fácil ou mais difícil para o
ateísmo crescer?
Em certo sentido, deve ser mais fácil. O convívio intenso de crenças inconciliáveis deve
levar as pessoas a compreender que tais crenças são produtos de acidentes históricos,
são contingenciais, são criadas pelo homem e, portanto, não são o que pregam ser.
Judeus e cristãos não podem estar ambos certos porque o núcleo de suas crenças é
contraditório. Na verdade, eles estão equivocados sobre muitas coisas, exatamente como
estavam antes os adoradores dos deuses egípcios ou gregos. Ou os adoradores de
milhares de deuses que morreram durante a longa e escura noite da superstição e da
ignorância humana. Em qualquer lugar que os seres humanos façam um esforço honesto
para chegar à verdade, nosso discurso transcende o sectarismo religioso. Não há física
cristã, álgebra muçulmana. No futuro, não haverá nada como espiritualidade
muçulmana ou ética cristã. Se há verdades espirituais ou éticas a ser descobertas, e
tenho certeza de que há, elas vão transcender os acidentes culturais e as localizações
geográficas. Falando honestamente, esse é o único fundamento sobre o qual podemos
erguer uma civilização verdadeiramente global.

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