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GLOBALIZAÇÃO,

NEOLIBERALISMO E O
DIREITO NO BRASIL

Arnaldo Sampaio de Moraes Godoy

Doutor e Mestre em Direito pela PUC/São Paulo


Hubert Humphrey Fellow na Universidade de Boston
Procurador da Fazenda Nacional
2

NOTA INTRODUTÓRIA DE AGRADECIMENTO

O presente trabalho foi apresentado no II Taller de Interculturalidad em Santiago, na


Universidade do Chile. Agradecimentos a Milka Castro ( Universidade do Chile ) e a
Raquel Yrigoyen Fajardo (Universidade Católica do Peru). O capítulo sobre a
mundialização do capital foi concebido na Universidade de Chiang Mae, na Tailândia,
por ocasião do XIII International Congress on Legal Pluralism. Agradecimentos a
Melanie Wiber ( Universidade de Nova Brunswuick), a Gordon R. Goodman
(Universidade de Birminghan) e a Rajendra Pradhan ( Universidade do Nepal). O
capítulo sobre direito constitucional foi apresentado em evento da Universidade Estadual
de Londrina. Agradecimentos a Aylton Barbieri Durão ( UEL- Londrina ) e a Eduardo
Henrique Figueiredo (PUC-PR-Londrina). O capítulo inicial, ligando globalização e
neoliberalismo, foi apresentado em evento da UNOPAR, Londrina. Agradecimentos a
Anna Luisa Walter de Santana e a Ursula Lima, minhas orientandas. As impressões
gerais, que formam as conclusões, foram apresentadas em evento da UNISUL,
Universidade do Sul de Santa Catarina. Agradecimentos a Sandra Lewis (UNISUL). As
pesquisas sobre os fundamentos teóricos da globalização foram implementadas em ano
acadêmico na Universidade de Boston. Agradecimentos a Catherine Tinker ( Pace
University, Nova Iorque ) e a David Tarr ( Universidade de Boston ) , o mentor do
projeto. Problemas de saúde prejudicaram o andamento da pesquisa, que havia sido
agraciada com uma estada no Instituto Internacional de Sociologia Jurídica, em Onati, na
Espanha. Agradecimentos àqueles que me trataram, Milton Bocato e Antonio Carlos
Morita. À Leila Moraes Godoy, minha mãe, pelo conforto de sempre. À Larissa, que tudo
presenciou, tudo sabe e tudo motivou.
3

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO
1) GLOBALIZAÇÃO E NEOLIBERALISMO
2) MUNDIALIZAÇÃO DO CAPITAL E DIREITO BRASILEIRO
2.1) DIREITO CONSTITUCIONAL
2.2) DIREITO ADMINISTRATIVO
2.3) DIREITO DO TRABALHO
2.4) DIREITO TRIBUTÁRIO
2.5) DIREITO PROCESSUAL
2.6) DIREITO CIVIL
2.7) DIREITO DO CONSUMIDOR
3) CONCLUSÕES
BIBLIOGRAFIA
4

Globalization has become a euphemism for Americanization.


Roberto Mangabeira Unger, False Necessity, p. xxxviii
5

INTRODUÇÃO

Globalização é metáfora de nossos dias que exprime

condição econômica e cultural. Promove a hegemonia do capitalismo e de percepções


neoliberais, anunciando uma escatologia que consagra novos moldes de soberania, de
relações humanas e de idiossincrasias. Impulsiona um neoconservadorismo radical.
Provoca reações afinadas com projetos de terceira via, a exemplo do neotrabalhismo
inglês e do neodemocratismo norte-americano. Insulta os defensores de uma democracia
radical, projeto que denuncia as necessidades falsas que a globalização promove. A
globalização formata modelos epistêmicos, saberes, plasmando também um inusitado
conjunto normativo. A globalização dita um direito diferente, especialmente para países
periféricos, como o nosso. O direito brasileiro vem sendo redesenhado como resultado de
nossa inserção no mundo globalizado. A interface entre globalização, neoliberalismo e
direito no Brasil é o tema do presente estudo.
Faz-se primeiramente um levantamento de diversas opções
conceituais explicativas dos movimentos de globalização. Enuncia-se brevemente o
pensamento de intelectuais brasileiros que se preocuparam com o tema, a exemplo de
Octavio Ianni e de Milton Santos. Faz-se uma arqueologia do uso do adjetivo global, a
partir da apropriação do mesmo por parte das escolas de business administration nos
Estados Unidos da América, na década de 1980. Desenha-se o imaginário atinente a
globalização, com estações em François Chesnais, Lênin, Perry Anderson, Karl Popper,
Alvin Tofler, Ulrich Beck, Fredric Jameson, David Held, Giovanni Righi, Danilo Zolo,
Roberto Mangabeira Unger, entre outros.
Menciona-se a globalização enquanto prática discursiva,
especialmente quanto aos aspectos retóricos de sua percepção como etapa de
desenvolvimento do capitalismo. Com base em Walter Benjamin denuncia-se que o
presente se apropria do passado, que a história é presa das circunstâncias presentes. Com
6

base em Zygmunt Baumann, Anthony Giddens e Celso Furtado faz-se uma leitura sócio-
econômica do processo de globalização. Ainda em âmbito de cogitações históricas,
anuncia-se a perspectiva de Francis Fukuyama, para quem o triunfo do neoliberalismo
anuncia a concepção hegeliana de fim da história, temperada pelo vaticínio
nietzschiniano do último homem.
Enunciam-se as bases conceituais da globalização, que o
estudo reputa como frágeis. Opõe-se modernidade e pós-modernidade, vinculando-se esta
última ao processo de globalização. Nesse sentido, questiona-se a crítica radical da razão,
a deslegitimização do conhecimento e a aporia gerada pela crise das grandes narrativas.
Mas não seria a globalização mero capítulo de uma grande narrativa, como concebida
por Jean-François Lyotard, em estudo apresentado ao governo canadense1 ?
Avalia-se o conceito marxista de determinismo econômico, a
presumir o avanço das relações entre capital e trabalho, em desfavor deste último.
Sucintamente o trabalho compara as etapas do capitalismo, com ênfase nas fases
comercial, industrial, financeira e globalizada.
O livro finca âncoras epistemológicas em Antonio Negri e
em Michael Hardt, fiando-se nas concepções de poder no livro Império para mapear o
modelo de submissão imposto ao Brasil, com análise dos posteriores reflexos em nosso
direito. O trabalho faz ligeira referência a Louis Althusser, a Gilles Delleuze, a Felix
Guattari e a Joseph Stiglitz, com o objetivo de demonstrar ações contrárias à
globalização, centrando-se mais tarde nos modelos de contra-hegemonia propostos por
Boaventura de Sousa Santos.
Estudam-se os chamados atores globais, com especial
atenção no FMI. Com base em texto de Perry Anderson o trabalho traça os contornos do
neoliberalismo, com indicações dos pensamentos de Hayek e de Miltom Friedman.
Indica-se o programa neoliberal. Faz-se apertada imagem dos modelos de Reagan e de
Thatcher. Descreve-se o Consenso de Washington e as medidas neoliberais de maior
alcance, a exemplo de movimentos de privatização. Faz-se referência mais demorada à
direita norte-americana, aficionada que é do ideário neoliberal. Estudam-se os reflexos da
inexistência do Estado de bem-estar social no que toca ao desenvolvimento de práticas

1
LYOTARD, Jean-François. The Postmodern Condition: a Report on Knowledge, p. 37 e ss.
7

neoliberais dentro dos Estados Unidos. Evidencia-se o surgimento de práticas globalistas


no mundo todo. Uma ligeira e apertada resenha histórica é então apresentada;
propositadamente usam-se verbos no presente histórico, denunciando-se um passado que
ainda opera em nós mesmos, evidenciando-se uma acronia superlativa.
Faz-se um pormenorizado levantamento de excertos de
Roberto Campos, de modo a se qualificar o pensamento neoliberal no Brasil, com
especial alusão aos vínculos ideológicos do diplomata e senador que representava os
pecuaristas do Mato Grosso2.
Com base no canadense Michel Chossudovsky estudam-se os
efeitos das práticas do FMI, quando o trabalho ganha mais proximidade com a realidade
brasileira. São identificados temas como combate a inflação, privatizações,
regulamentação da sociedade pelo mercado, miniaturização do Estado. Faz-se rápida
referência a propósito dos efeitos dessas práticas em campo de direito previdenciário,
penal, internacional e ambiental, este último subsumido ao problema do desenvolvimento
sustentável3.
Faz-se um balanço dos efeitos da globalização e do
neoliberalismo em relação ao modelo constitucional brasileiro, que corre o risco de
contar com constituição meramente simbólica. Indicam-se as críticas de Roberto Campos
ao modelo constitucional de 1988. Evidencia-se a antinomia entre realidade econômica e
espaço normativo, formatando-se a questão da oposição entre juristas e economistas, com
base em José Eduardo Faria. Identificam-se as emendas constitucionais que comprovam
perda de direitos, ou de direitos ficticiamente conquistados. É quando o trabalho explicita
preocupação maior com a emenda constitucional de número 40.
Comenta-se a crise do Estado, que vive uma
ingovernabilidade sistêmica. Faz-se uma abordagem referente ao processo de
desconstitucionalização, caminho inverso da diretiva tomada pelo direito civil, que por
sua vez está cada vez mais constitucionalizado, tema de estudos de Pietro Perlingieri, de
Ana Prata e de Renan Lotufo. Menciona-se a percepção de realinhamento constitucional,

2
ANDERSON, Perry. Afinidades Seletivas, p. 175.
3
LEFF, Enrique. Ecologia, Capital e Cultura, p. 259 e ss.
8

como cogitada por Oscar Vilhena Vieira, metáfora identificadora de reforma


constitucional.
Problematiza-se o direito administrativo de feição consensual
que ora se forma como reflexo do neoliberalismo que impera. Faz-se menção ao
açodamento dos processos de privatização. Faz-se uma síntese informativa a propósito
das agências regulamentadoras. Cogita-se do novo modelo de Estado brasileiro.
Relaciona-se o triunfo do neoliberalismo com a nova sistemática que se apresenta ao
servidor público brasileiro.
Desenham-se os paradoxos e as aporias do direito do
trabalho. Faz-se uma relação entre flexibilização e globalização, entre faxina na CLT e
neoliberalismo, entre história do direito do trabalho e as novas emendas constitucionais
supressoras de direitos, assim como também a projetos para reforma de pontos essenciais
da CLT.
Vincula-se a reforma tributária às exigências do FMI.
Denuncia-se a diminuição dos investimentos em setores básicos e absolutamente
carentes, também como resultado das intenções que pactuamos como aquele organismo
internacional. Faz-se referência da relação entre advocacia tributária e política normativa
fiscal mal elaborada. Talvez até propositadamente. Critica-se a regressividade do ICMS e
o abuso da União na instituição de exações tipificadas como contribuições, dada a
desnecessidade da repartição destas últimas com os demais entes políticos da federação.
Analisa-se o Brasil no conjunto dos acordos econômicos internacionais, especialmente no
que toca às repercussões de acordos com o FMI sobre os ajustes da economia brasileira,
assim como nos reflexos dos referidos acordos no sistema tributário nacional.
Inventaria-se o momento crítico vivido pelo direito
processual, do qual se exige um modelo orientado para outorgar tutela satisfativa para
sociedade de massa. Admite-se que o direito processual brasileiro flerta com institutos do
direito processual da common law, especialmente no que toca na figura do amigo da
corte, conhecida como o amicus curiae. Questiona-se a propósito de um novo conceito de
tempo, a atormentar a prática forense, como a recorrente questão da morosidade da
justiça nos dá conta. Faz-se ligeiro contraponto entre súmula vinculante e writ of
certiorari. Denuncia-se a ditadura da informática da dominação.
9

Vincula-se a globalização a questões pontuais do direito civil,


a exemplo de temas de bioética e de migrações conceituais de assuntos originariamente
afetos à topografia civilística, como a matrimônio. Discute-se o papel das ongs-
organizações não governamentais, nessa nova ordem ditada pelo neoliberalismo.
São sumariadas as tendências do direito do consumidor, em
relação ao movimento de globalização. Uma sociedade que se percebe como de risco
tende a legitimar as relações de consumo com epítetos de cidadania consumerista e com
apanágios de integralidade de informações, como se percebe na questão axial dos
transgênicos.
Com certa desconfiança nos ditames da razão denunciada
pela pós-modernidade, desde que ela não pode tudo, embora seja o único bem que
temos4, e dado que ser iluminista é rir do próprio iluminismo5 , o trabalho que segue
problematiza as verdades que informam o direito brasileiro. A globalização pode
promover o bem estar e o progresso, porém suscita todas as críticas, quando centralizada
em governos ou em grupos empresariais6.
A condição política pós-moderna que nos envolve, parasita
da modernidade, de cujos dilemas e conquistas se alimenta7, sugere uma permanente
crítica que exige uma desconfiada análise das condições democratizantes8, porque a
globalização e o neoliberalismo podem ensejar um neocolonialismo jurisdicista9. Em
resumo, o presente trabalho pretende insistir que o direito brasileiro contemporâneo só
pode ser analisado com seriedade dentro dos mais amplos problemas que acompanham a
globalização e o neoliberalismo.

4
ROUANET, Sérgio Paulo. Mal-Estar na Modernidade, p. 118.
5
ROUANET, Sérgio Paulo. As Razões do Iluminismo, p. 195.
6
CROOK, Clive. Globalisation and its Critics, in The Economist, 27 de setembro de 2001.
7
HELLER, Agnes e FEHÉR, Frenc. A Condição Política Pós-Moderna, p. 23.
8
TOURAINE, Alain. Crítica da Modernidade, p. 361.
9
ARRUDA JR., Edmundo L. de. Introdução à Sociologia Jurídica Alternativa, p. 95 e ss.
10

1. GLOBALIZAÇÃO E NEOLIBERALISMO

A globalização surpreende, encanta, assusta10, realizando


várias formas de alienação, percebidas como naturais no processo civilizatório11.
Surpreende-nos com a velocidade com a qual rearticula nossas vidas, encanta-nos com as
promessas que faz, assusta-nos ao evidenciar nossa falibilidade. Percebe-se uma
globalização fábula, cuja crença nos é imposta; uma globalização perversa, que matiza a
realidade vivente; uma globalização utópica, que anuncia um mundo panglossianamente
melhor12. Ângulo pessimista (e realista) indica-nos que a globalização mata a noção de
solidariedade, devolve o homem à condição primitiva do cada um por si e , como se
voltássemos a ser animais da selva, reduz as noções de moralidade pública e particular a
um quase nada13. Segundo Anthony Giddens, a propósito da expressão globalização,
trata-se de (...) palavra que não estava em parte alguma [mas que] passou a estar em
toda parte14.
Global tornou-se adjetivo de uso freqüente nas escolas norte-
americanas de administração de empresas no início da década de 1980, quando
consultores de estratégia e marketing, a exemplo de K. Ohmae e M. E. Porter,
conduziram seminários em Harvard, Columbia e Stanford, orientados para projetos
internacionais15. Falava-se naquele tempo de um mundo sem fronteiras, a mercê de um

10
IANNI, Octavio. Teorias da Globalização, p. 14.
11
IANNI, Octavio. op.cit., p. 197.
12
SANTOS, Mílton. Para uma outra Globalização – do Pensamento Único à Consciência Universal, p.
18 e ss.
13
SANTOS, Milton. op.cit., p. 65.
14
GIDDENS, Anthony. A Terceira Via, p.38.
15
CHESNAIS, François. A Mundialização do Capital, p. 23.
11

poder triádico16, representado pelos Estados Unidos da América, pelas nações européias
que então processavam um movimento unificador de economias e pelo Japão. Modelos
políticos foram definitivamente cooptados por interesses financeiros. Trata-se da história
do capitalismo em permanente expansão imperialista17, centrado oportunisticamente em
plano supra-nacional18, em momento de expansão e de reorientação19.
O imaginário ligado à globalização remete-nos a várias
nuances também metafóricas20. Tem-se o globo enquanto figura astronômica, e de difícil
aceitação por parte do catolicismo dominante no medievo, período de formação de uma
tradição jurídica ocidental instruída pela vertente romanística21 e oxigenada pelo
desenvolvimento do capitalismo22. Pensa-se um mundo protagonista de uma história que
avança23 na realização de projeto de civilização libertadora24 . Trata-se de uma nova onda
que redimensiona o espaço25, explicitando o geomorfismo de uma aldeia global. Na base
de todo esse movimento está o desenvolvimento extensivo e intensivo do capitalismo no
mundo26. Alavanca-se a politização das relações, dado que aos empresários é facultado o
pleno domínio do poder de negociação; as empresas detém papel central na configuração
da economia e da própria sociedade27.
Percebe-se uma globalização em termos tecnológicos, na
medida em que a cibernética delineia fluxo de informações28 que altera regimes de
produção e de consumo. Do ponto de vista político a globalização recontextualiza a
soberania, acenando com modelos democráticos que prenunciam novo equilíbrio de
forças e que é marcadamente muito sutil29. Culturalmente, intercâmbios modelam o
paradoxo de uma destruição criativa30, prenhe de sonhos, pesadelos e ceticismo31,

16
CHESNAIS, François. op.cit., loc. cit.
17
LÊNIN, V.I.U. O Imperialismo, Fase Superior do Capitalismo, p. 366 e ss.
18
MELLO, Alex Fiuza de. Marx e a Globalização, p. 197 e ss.
19
IANNI, Octavio. A Sociedade Global, p. 55.
20
IANNI, Octavio. Teorias da Globalização, p. 11 e ss.
21
BERMAN, Harold J. Law and Revolution, The Formation of the Western Legal Tradition, p. 85 e ss.
22
TIGAR, Michael E. Law and the Rise of Capitalism, p. 61 e ss.
23
ANDERSON, Perry. O Fim da História- de Hegel a Fukoyama, p. 81 e ss.
24
POPPER, Karl. The Open Society and Its Enemies, v. 2, p. 27 e ss.
25
TOFLER, Alvin. The Third Wave, p. 125 e ss.
26
IANNI, Octavio. A era do globalismo, p. 35.
27
BECK, Ulrich. O que é globalização? , p. 14.
28
JAMESON, Fredric. A Cultura do Dinheiro, p. 17.
29
HELD, David Democracy and Global Order, p. 80 e ss.
30
COWEN, Tyler. Creative Destruction, p. 17.
12

identificando um imperialismo de instrução que é característico do nicho cultural


capitalista32.
Economicamente, opõe-se à miséria do hemisfério sul o
desconforto da riqueza do hemisfério norte, circunstância administrada sob forte pressão
ideológica e que nos promove a desconfiança, uma vez que a globalização é um mito
conveniente a um mundo sem ilusões, mas é também um mito que rouba a esperança33. O
reflexo social disso tudo redunda na cesura entre possuidores (haves) e despossuídos
(have-nots), esses últimos, os protagonistas das horrendas imagens apresentadas na mídia
com a destruição do trabalho e dos postos de trabalho34.
É o triunfo do mercado, suposta explicitação pragmática de
um sutil racionalismo, enquanto veículo do progresso35. De tal modo, (...) nesses espaços
de racionalidade, o mercado torna-se tirânico e o Estado tende a ser impotente. Tudo é
disposto para que os fluxos hegemônicos corram livremente, destruindo e subordinando
os demais fluxos36 .
Assim como não há autoridade sem democracia, também não
há direitos sem responsabilidades37, pelo que o custo da periferização decorrente do
imperialismo38 volta-se um dia contra os próprios agentes do capitalismo global. Não se
percebe aumento de parcela da população com acesso a novos padrões de consumo39.
A globalização é prática discursiva e nesse sentido os seus
defensores apropriam-se da história, usando a disciplina de Clio para justificarem suas
suspeitas verdades. Trata-se de presenteísmo, de visão historiográfica radicalmente
subjetivista40. A globalização seria o resultado de uma evolução, que remontaria às

31
TOMLINSON, John. Globalization and Culture, p. 71 e ss.
32
TOMLINSON, John. Cultural Imperialism, p. 134 e ss.
33
HIRST, Paul e THOMPSON, Grahame. Globalização em Questão, p. 20.
34
BAUMAN, Zygmunt. Globalização- As Consequências Humanas, p. 82.
35
PORTER, Roy. Enlightenment, Britain and the Creation of the Modern World, p. 397 e ss.
36
SANTOS, Milton. A Aceleração Contemporânea : Tempo, Mundo e Espaço, in SANTOS, Milton et
allii, Fim de Século e Globalização, p. 18.
37
GIDDENS, Anthony. A Terceira Via, p. 75.
38
BENAYON, Adriano. Globalização versus Desenvolvimento, p. 127.
39
FURTADO, Celso. O Capitalismo Global, p. 26.
40
SCHAFF, Adam. História e Verdade, p. 111.
13

primeiras movimentações do homem na terra41, na percepção de seus maiores entusiastas,


que o presente estudo vai mais a frente reproduzir, jocosamente.
Isso é particularmente complexo em âmbito de historiografia
jurídica, uma vez que se tem amplo repertório para justificativas da normatividade
globalizada; é que o presente olha para o passado e encontra lá sua imagem, como quem
se vê ao espelho42. O historiador simpático à globalização vale-se do pretérito em relação
ao qual dá um salto de tigre, apropriando-se do que lhe interessa, na deliciosa imagem de
Walter Benjamin, em sua XIV tese da filosofia da história43. Uma poética histórica de
sabor hegeliano44 plasma um historicismo do progresso45 que suscita críticas marcadas
por questões epistemológicas que duvidam da objetividade das narrativas46.
É nesse ambiente historiográfico que parece triunfar a tese de
Francis Fukuyama, para quem vivemos o fim da história e o tempo do último homem47.
Com a vitória da democracia e do neoliberalismo, especialmente após a queda do muro
de Berlim, estariam sepultadas todas as utopias. A história estaria realizada
definitivamente na vituperação e na derrota do socialismo. Não haveria mais espaço para
soluções exógenas à liberal-democracia48 e por isso escusadas e supérfluas todas as lutas
políticas. Fukuyama torna-se o alvissareiro da vitória do liberalismo. Com base na
tradição hegeliana que preconizava o fim da história, de uma certa maneira apropriada
pelo pensamento marxista, para quem a história agonizaria com a ditatura do
proletariado, Fukuyama tomou um conceito de Marx para sepultar o marxismo.
Formaliza-se o avanço da direita norte-americana49, agora
justificada na luta contra o terrorismo internacional50, epicentro da doutrina Bush51, que

41
STEGER, Manfred B. Globalization- a very short introduction, p. 20.
42
HESPANHA, António M. Panorama Histórico da Cultura Jurídica Européia, p. 46.
43
BENJAMIN, Walter. Illuminations, p. 261.
44
WHITE, Hayden. Metahistory- The Historical Imagination in Nineteenth-Century Europe, p. 81 e ss.
45
BREISACH, Ernst. Historiography- Ancient, Medieval & Modern, p. 205 e ss.
46
IGGERS, Georg G. Historiography in the Twentieth Century- from Scientific Objectivity to the
Postmodern Challenge, p. 139.
47
FUKUYAMA, Francis. The End of History and the Last Man.
48
FUKUYAMA, Francis.. op.cit., p. 39 e ss.
49
COULTER, Ann. Treason, Liberal Treachery from the Cold War to the War on Terrorism, p. 145 e
ss.
50
ROMSFELD, Donald H. Transforming the Military, in Foreign Affairs, May/June/2000, p. 20 e ss.
51
HIRSH, Michael. Bush and the World, in Foreign Affairs, October/2002, p. 18 e ss.
14

se presta a realizar todo o ideário conservador norte-americano52. Uma suposta


prosperidade global pressagiaria um mundo diferente, moldado por novas orientações
hegemônicas, desconhecendo os valores firmados na forma jurídica internacional da paz
de Westphalia, com cartografia invisível, sem fronteiras53: além da história, morre
também a geografia...
O crescimento do neoconservadorismo norte-americano faz-
se simultaneamente a uma nova concepção emergente nas hostes democratas. O partido
republicano de George W. Bush, herdeiro dos programas de minimalismo estatal de
Ronald Reagan e de intervencionismo de Richard Nixon, apoia-se na luta contra o
terrorismo internacional, em favor da otimização da chamada segurança doméstica (home
security). Nos Estados Unidos o partido republicano nascera radical, com tom reformista,
forte nas causas democráticas sulistas, a exemplo da fixação de Lincoln com a questão
escravocrata. O partido republicano norte-americano transformou-se com o tempo.
Albergou as políticas não intervencionistas de Herbert Hoover, a conduta de Eisenhower
durante a bipolaridade do mundo da guerra fria, a era Nixon, Ford, promovendo a
revolução econômica liberal de Reagan, orientado por Greenspan, atingindo seu cume
com o militarismo absoluto dos Bush, pai e filho, no Iraque e no Afeganistão. Trata-se,
no entanto, de uma anarquia internacional que os Estados Unidos já não conseguem
controlar54. E a par disso, há ainda a oposição internacional ao concerto econômico
orquestrado pelos Estados Unidos, a exemplo dos protestos dos grupos de Seattle,
contrários à globalização55.
Já os democratas carregam tradição de intervencionismo e de
regulamentação, heranças do programa New Deal de Franklyn Delano Roosevelt. Mais
tendente a causas populares, a base democrata é recorrente nos programas de Kennedy e
de Lyndon Johnson, nas grandes questões da igualdade e dos direitos civis, no planisfério
de direitos humanos de Jimmy Carter e na relativa estabilidade econômica dos dois
mandatos de Bill Clinton. A ascenção de John Kerry escora-se nesse ideário, dado que o

52
MOORE, Michael. Stupid White Men, p. 163 e ss.
53
HELD, David e MCGREW, Anthony. Prós e Contras da Globalização, p. 70 e ss.
54
WALLERSTEIN, Immanuel. Geopolítica, política de classe e a atutal desordem mundial, in DOS
SANTOS, Theotonio (coord.), Os Impasses da Globalização, p. 20.
55
CASTILLO, Adolfo. Participación Ciudadana y estrategias frente a la globalización, in ARELLANO,
Fernando (ed.), Globalización, Seattle y estrategias ciudadanas, p. 69.
15

democrata de Massachussets apresenta-se favorável à ações afirmativas, ao aborto,


contrário à pena de morte, à privatização do sistema previdenciário, a uma Alca que
despreze aspectos ambientalistas e juslaborialistas. O otimismo com a globalização,
todavia, contamina republicanos e democratas.
Porém, este otimismo para com a globalização fundamenta-
se em bases conceituais muito frágeis56. A globalização seria uma conseqüência da
modernidade57, atribulada com as relações com a construção do eu58, ambiguamente
marcado pela própria destruição59. Molda-se uma identidade que não se reconhece,
acelerando-se um processo de estranhamento com o mundo. Na medida em que se
diminuem distâncias e trajetos, aumentam-se preconceitos e ambivalências.
O pós-moderno60 seria o equivalente filosófico que se presta
a teorizar o núcleo do entorno da globalização. Enquanto a modernidade estaria assentada
na admiração por uma cultura elevada61, na arte sofisticada62, na originalidade63, no
apego a forma, ao clássico64, no hermetismo, na oposição ao público, a pós-modernidade
seria determinada pela aceitação de uma cultura banal, pela aporia da anti-arte, pelo
pastiche65, pelo conteúdo, pela simplificação, pelo minimalismo66, pela fácil
compreensão, pela participação do público. Uma vigorosa denúncia da razão abstrata67
choca-se com a idéia da ordem como uma tarefa a cumprir68 e a crítica radical da razão
paga um alto preço pela despedida da modernidade69.
A deslegitimização do conhecimento70 confunde-se com a
crise de legitimação do modelo avançado de capitalismo71, que peleja em sufragar

56
HOFFMANN, Stanley. Clash of Globalizations, in Foreign Affairs, July/August/2002, p. 108.
57
GIDDENS, Anthony. As Consequências da Modernidade, p. 61 e ss.
58
GIDDENS, Anthony. Modernidade e Identidade, p. 70 e ss.
59
TOURAINE, Alain. Crítica da Modernidade, p. 113 e ss.
60
SILVA, Jair Ferreira da. O que é Pós-Moderno, p. 24.
61
CASSIRER, Ernst. The Philosophy of Enlightenment, p. 93 e ss.
62
CASSIRER, Ernst. op.cit., p. 275 e ss.
63
KRAMNICK (ED.), Isaac. The Portable Enlightenment Reader, p. 314 e ss.
64
RICHARD, Carl J. The Founders and the Classics, p. 53 e ss.
65
ECO, Umberto. The Name of the Rose.
66
CALVINO, Italo. Seis Propostas para o Próximo Milênio, p. 13 e ss.
67
HARVEY, David. Condição Pós-Moderna, p. 46.
68
SMART, Barry. A Pós-Modernidade, p. 49.
69
HABERMAS, Jurgen. O Discurso Filosófico da Modernidade, p. 467.
70
LYOTARD, Jean-François. The Postmodern Condition : A Report on Knowledge, p. 37.
71
HABERMAS, Jurgen. Legitimation Crisis, p. 33 e ss.
16

ambiente político de conotação mais pública72, enfrentando a dicotomia entre verdade e


moral73. Opera-se situação epistêmica de desconstrução das fronteiras disciplinares74,
amalgamada maliciosamente por circunstância discursiva de horror ao consenso, como
remanescente de odioso totalitarismo75.
Aceitando-se premissa marxista que nos dá conta de que
certo determinismo tecnológico acompanha o avanço do capitalismo76, tem-se que
práticas contemporâneas que afeiçoam a globalização decorrem da direção tomada pela
pragmática imperialista, bem entendido, com as ressalvas historiográficas já anotadas.
Radicaria a globalização num vetusto sistema colonial77 que
se desenvolveu do século XV ao século XVIII no contexto do capitalismo comercial, e
que oxigenou uma forma de domínio político78 pela qual os europeus subjugaram a
América79, na busca de metais preciosos e de gêneros tropicais exóticos80.
No século XIX, no entrecho do capitalismo industrial81,
financeiro, monopolista, concorrencial e belicoso, desdobrou-se modelo de domínio
político e econômico, formal e informal, que genufletiu povos africanos82, asiáticos83 e
americanos84, na busca de mercados consumidores, matérias-primas de fácil acesso e de
campos para investimento seguro.

A partir do ocaso da guerra fria percebe-se capitalismo de


molde global, que desconhece fronteiras, que percebe a pobreza como privação das
capacidades85 e que persegue mão-de-obra barata, reservas ambientais, pólos de
investimento e de exportação de problemas.

72
HABERMAS, Jurgen. The Structural Transformation of the Public Sphere, p. 27 e ss.
73
McCARTHY, Thomas. The Critical Theory of Jurgen Habermas, p. 291 e ss.
74
CONNOR, Steven. Cultura Pós-Moderna, Introdução às Teorias do Conhecimento, p. 23.
75
JAMESON, Fredric. Postmodernism or, the Cultural Logic of Late Capitalism, p. 347.
76
RENTON, David. Marx on Globalization, p. 103.
77
HUNT, E.K. History of Economic Thought, A Critical Perspective, p. 24.
78
DONGHI, Halperin. História da América Latina, p. 11.
79
FAUSTO, Boris. História do Brasil, p. 43 e ss.
80
PRADO JÚNIOR, Caio. História Econômica do Brasil, p. 56 e ss.
81
HOBSBAWN, Eric. The Age of Capital- 1848-1875, p. 270 e ss.
82
HOBSBAWN, Eric. The Age of Empire- 1875-1914, p. 56 e ss.
83
SAID, Edward W. Orientalismo, o Oriente como invenção do Ocidente, p. 60 e ss.
84
GALEANO, Eduardo. As Veias Abertas da América Latina, p. 189 e ss.
85
SEN, Amartya. Desenvolvimento como Liberdade, p. 109 e ss.
17

Intrigante estudo de Antonio Negri e de Michael Hardt86


aponta para um Império como forma de poder do mundo globalizado. Império seria
diferente de imperialismo na medida em que nesse último há guerra entre as potências; no
Império uma estrutura hierárquica que alcança os Estados Unidos, os países ricos da
União Européia, o Japão, os grandes bancos e corporações internacionais exercem o
poder por meio de atores globais, a exemplo do Fundo Monetário Internacional e da
Organização Mundial do Comércio.
Segundo Negri e Hardt, Império é o poder soberano que
governa o mundo87. Os Estados Unidos ocupariam uma posição de destaque88, o poder de
polícia, e disso as guerras contemporâneas são inequívoca prova, na medida em que
tomam o sentido de guerras justas89 . Recentes conflitos havidos no Afeganistão e no
Iraque confirmam a plausibilidade da assertiva. Ideologicamente, desenha-se o Império
como permanente, eterno e necessário90. Negri e Hardt evidenciam a falência do projeto
de Hans Kelsen, realizado na formação da Organização das Nações Unidas, como poder
que transcende ao Estado-Nação91.
A uma suposta hegemonia dos Estados Unidos, marcada por
um enorme vazio de representação para posturas pacifistas92, pelo controle de
mecanismos de manipulação à moda das invectivas de Althusser93, restam não muitas
alternativas de resistência, a exemplo dos rizomas propostos por Deleuze e Guattari94.
Realizando o sentido de rizoma, como resistência, cabe que
se discuta permanentemente a questão desse capitalismo global. É que a globalização
funda-se em falsos mitos, como a idéia de que o mercado exige, totalmente fora de
sentido, dado que o mercado é ser inanimado, formado por pessoas específicas
organizadas em classes, como a dos executivos95.

86
NEGRI, Antonio e HARDT, Michael. Empire.
87
NEGRI, Antonio e HARDT, Michael. op.cit., p. XI. Tradução e versão livre do autor. (...) Empire is (...)
the sovereign power that governs the world.
88
NEGRI, Antonio e HARDT, Michael. op.cit., p. XII.
89
NEGRI, Antonio e HARDT, Michael. op.cit., p. 10.
90
NEGRI, Antonio e HARDT, Michael. op.cit., p. 11.
91
NEGRI, Antonio e HARDT, Michael. op.cit., p. 6.
92
PETRAS, James e VELTMEYER, Henry. Hegemonia dos Estados Unidos no Novo Milênio, p. 17.
93
ALTHUSSER, Louis. Aparelhos Ideológicos de Estado, p. 66 e ss.
94
DELEUZE, Gilles e GUATTARI, Félix. A Thousand Plateaus: Capitalism and Schizophrenia, p. 25.
95
PETRAS, James e VELTMEYER, Henry. op.cit., p. 68.
18

Porém o foco mais expressivo de resistência conceitual ao


processo de globalização fundamenta-se no projeto de Roberto Mangabeira Unger,
brasileiro radicado nos Estados Unidos, onde leciona em Harvard. Intelecutal brasileiro
certamente mais admirado e comentado no exterior, Mangabeira, (...) tal como Edward
Said e Salman Rushdie (...) é parte da constelação de intelectuais do Terceiro Mundo
ativa e respeitada no Primeiro, sem ter sido assimilada por ele, cujo número e influência
estão destinados a crescer96. Ainda segundo Perry Anderson, Mangabeira é um crítico
agudo de nossa constituição de 1988, por oferecer direitos fictícios e por ampliar,
simultaneamente, a legalização de partes da legislação militar97 .
Mangabeira fez nome como figura de proa no movimento
critical legal studies, associado à contra cultura e à política da nova esquerda norte-
americana, desenhado a partir da década de 1960 nos Estados Unidos98. Redigiu o texto
que é reputado como manifesto do movimento, anotando que o mesmo solapou as idéias
centrais do moderno pensamento jurídico, promovendo uma outra concepção de direito
(...) que implica numa visão de sociedade e que informa uma prática política99. Crítico
do liberalismo, Mangabeira escrevera que o aludido liberalismo é o guarda que nos vigia
numa prisão100. Protestou por um aparato conceitual que nos permita diferenciar o direito
enquanto fenômeno universal das formas enquanto se manifesta em distintos tipos de
sociedade101.
Na introdução de seu trabalho False Necessity, Unger
alinhava um projeto alternativo e radical ao marxismo, à social democracia e ao
neoliberalismo. Para Unger, não se trata de uma terceira via nos moldes de Giddens-
Blair; trata-se de uma segunda via, dado que apenas um caminho, abrandado ou não, é

96
ANDERSON, Perry. Afinidades Seletivas, p. 175/176.
97
ANDERSON, Perry, op.cit., p. 175.
98
MINDA, Gary. Postmodern Legal Movements, p. 110 e ss.
99
UNGER, Roberto Mangabeira. The Critical Legal Studies Movement, p. 1. Tradução e versão livre do
autor. The critical legal studies movement has undermined the central ideas of modern legal thought and
put another conception of law in their place. This conception implies a view of society and informs a
practice of politics.
100
UNGER, Roberto Mangabeira. Knowledge and Politics, p. 3. Tradução e versão livre do autor. Thys
system of ideas is indeed the guard that watches us over the prison-house.
101
UNGER, Roberto Mangabeira. Law in Modern Society, p. 49.
19

agora oferecido no mundo102. Defende uma postura criativa, o fortalecimento da


democracia, a radicalização de uma concreta e construtiva participação, combatendo
todos os modelos deterministas, que nos acorrentam e que nos fazem prisioneiros das
supostas regras que articulam a abstrata idéia de mercado, e de forças determinantes dos
vários modelos sociais que há.
A globalização centra-se teoricamente no neoliberalismo,
arauto do domínio irrestrito do mercado103, aqui denunciado. Críticas há de setores
medularmente vinculados ao processo de globalização. Por exemplo, Joseph Stiglitz,
vencedor do Prêmio Nobel de Economia em 2001, que exercera posições de destaque no
Banco Mundial, dardejou que o neoliberalismo quebrou promessas e que
fundamentalmente não garante liberdade de escolha104.
A globalização suscita um ambiente pragmático que fomenta
um movimento de internacionalização das reformas econômicas105, em prol dos
interesses do Império, a adotar-se a imagem de Negri e Hardt. O Império vale-se dos
global players, dos atores globais, como o Fundo Monetário Nacional e o Banco
Mundial, para garantir condições propícias para o desenvolvimento do capitalismo que
defende, centrado em premissas de liberdade106 , de críticas ao totalitarismo107, de
dicotomias entre capitalismo e socialismo108, momentos que plasmam um sociedade
humana supostamente fruto de uma associação de pessoas que buscam a cooperação109.
Vive então o mundo um ambiente perene de instabilidade
financeira. A competitividade internacional pressiona as relações entre capital e trabalho
no desiderato de garantir-se mão-de-obra barata. Pressionados pelo FMI os Estados
vinculados a empréstimos internacionais aumentam suas bases de imposição tributária
sem a consequente elevação dos serviços que podem prestar e das funções que podem
desenvolver : é a maldição da crise fiscal.

102
UNGER, Roberto Mangabeira, False Necessity, p. xviii. Tradução e versão livre do autor. It is a second
way, given that only one way, softened or not, is now on offer in the world.
103
BOXBERGER, Gerald e KLIMENTA, Harald. As Dez Mentiras da Globalização, p. 9.
104
STIGLITZ, Joseph E. Globalization and Its Discontents, p. 23 e ss.
105
CHOSSUDOVSKY, Michel. A Globalização da Pobreza, Impactos das Reformas do FMI e do Banco
Mundial, p. 11.
106
FRIEDMAN, Milton. Capitalism and Freedom, p. 22 e ss.
107
HAYEK, F.A. The Road to Serfdom, p. 199 e ss.
108
SCHUMPETER, Joseph A. Capitalism, Socialism and Democracy, p. 232 e ss.
109
VON MISES, Ludwig. Liberalismo- Segundo a Tradição Clássica, p. 21.
20

Verifica-se uma crise do Estado, que é estrutural. Decorre


disso uma crise de governabilidade, marcada por uma ingovernabilidade sistêmica.
Promessas de campanha não se realizam e particularmente no Brasil é nítida a fragilidade
ideológica e programática dos partidos políticos. Tem-se a impressão que a oposição ao
assumir o poder troca de programas com a situação, que passa a criticar o que ontem
defendia, enquanto a oposição no poder passa a praticar o que ontem criticava. E a
situação não configura mero jogo de palavras.
Temas de atualidade vociferante, como reforma fiscal,
transgênicos e exercício do direito de greve bem ilustram essas reflexões, fomentadas
pela análise das atuações dos presidentes Fernando Henrique Cardoso e Luís Inácio Lula
da Silva, aquele acadêmico e de pose intelectual, este último sindicalista e de postura
mais realista. Impressionante inflação legislativa, marcada pela proliferação de emendas
constitucionais, de medidas provisórias e de leis ordinárias marca o momento,
promovendo o desencanto do administrado para com o administrador.
A agenda política neoliberal realiza uma ruptura entre Estado
e cidadão. Uma indiferença recíproca matiza as relações entre indivíduo e poder,
circunstância de fácil percepção e constatada com os baixíssimos níveis de interesse
popular no voto e na participação no debate político. Tem-se a impressão de que o Estado
deixou de preocupar-se com as pessoas e de que os indivíduos evitam qualquer contato
não obrigatório com as fontes de poder.
Opera-se uma inversão das premissas weberianas em torno
da burocracia. Se esta fora criada para racionalizar a dominação110, exemplo mais típico
de domínio legal111, manifestação da sociedade moderna112, verifica-se o não
cumprimento de outra promessa, na medida em que o ambiente burocrático parece
acolitar os efeitos perversos da globalização, impessoalizando os moldes de dominação.
O neoliberalismo é o substrato conceitual que caracteriza o
modelo econômico da globalização. De acordo com Perry Anderson,
O neoliberalismo nasceu logo depois da II Guerra Mundial,
na região da Europa e da América do Norte onde imperava o

110
WEBER, Max. Ensaios de Sociologia, p. 229 e ss.
111
FREUND, Julien. Sociologia de Max Weber, p. 170.
112
SOUZA, Jessé de. Patologias da Modernidade, p. 51.
21

capitalismo. Foi uma reação teórica e política veemente


contra o Estado intervencionista e de bem estar113.

Com o término do conflito mundial em 1945 o modelo


capitalista vitorioso suscita a presença de um Estado ainda intervencionista, marcado por
uma ampla extensão de atividades na vida econômica114. No entanto, a guerra
demonstrara o perigo dos regimes totalitários, que haviam exagerado na intervenção
econômica e no dirigismo estatal.
O núcleo do pensamento neoliberal radicava então na
sistemática denúncia dos males causados pelos países de altíssimo nível de intervenção.
Consequentemente, a par dos elogios feitos ao capitalismo e ao regime de livre
concorrência, a vertente teórica do neoliberalismo criticou e hostilizou qualquer ordem de
pensamento comprometida com as aventuras ditatoriais.
É nesse ambiente que Karl Popper denunciou os chamados
inimigos da democracia, que lista, enumerando Platão, Hegel e Marx. Popper vincula os
três pensadores ao que reputa como plano conceitual historicista, no sentido que esses
filósofos teriam concebido sociedades que marchavam para um fim. O rei filósofo de
Platão115 seria o protótipo de déspotas que se dissimulavam esclarecidos. O historicismo
de Hegel116, fundado na concepção de que a história desdobra-se no espírito, que a
realiza, justificaria percepção de que há significado na própria história, que carece do
líder que a conduza. O preceito marxista, de que a história marcha rumo à vitória do
proletariado, síntese da sociologia determinista117 do autor do Capital, recebe de Popper
as mais violentas críticas, por fomentar toda a movimentação concreta do proletariado
internacional.
A virulência do pensamento neoliberal dirige-se
especificamente a todo modelo de superplanificação econômica e nesse sentido Friedrich
Hayek é o mais importante teórico e articulador do movimento118. Brilhante representante

113
ANDERSON, Perry. Balanço do Neoliberalismo, in Emir Sader (org.), Pós-Neoliberalismo, As
Políticas Sociais e o Estado Democrático, p. 9.
114
DOBB, Maurice. A Evolução do Capitalismo, p. 386.
115
POPPER, Karl. The Open Society and its Enemies, vol. 1, p. 138 e ss.
116
POPPER, Karl. The Open Socety and its Enemies, vol. 2, p. 27.
117
POPPER, Karl. op.cit., p. 81.
118
HEILBRONER, Robert L. The Wordly Philosophers, p. 278.
22

da segunda geração da Escola Austríaca119, Hayek criticou implacavelmente o Estado de


bem-estar social e o modelo de Keynes, economista inglês nascido em 1883 que
concebera alternativas para o Estado de laissez-faire120, durante os anos de depressão
econômica, mais dramaticamente sofrida pelos Estados Unidos da América.
O texto seminal de Hayek, vertido em português para O
Caminho da Servidão, ainda de acordo com Perry Anderson,
Trata-se de um ataque apaixonado contra qualquer limitação
dos mecanismos de mercado por parte do Estado,
denunciadas como uma ameaça letal à liberdade, não
somente econômica, mas também política. O alvo imediato
de Hayek, naquele momento, era o Partido Trabalhista
inglês, às vésperas da eleição geral de 1945 na Inglaterra,
que este partido efetivamente venceria121.

Hayek afirmou que o fato de que grande parte de pensadores


progressistas terem aderido ao ideário socialista, não significava que tivessem esquecido
o que os pensadores liberais disseram a respeito das conseqüências do coletivismo122.
Com base no significado mais profundo e representativo da idéia de liberdade123, Hayek
obtemperou que a adesão dos progressistas ao socialismo decorria tão somente de uma
falsa idéia e expectativa de liberdade124 , de uma grande utopia (the great utopia).
A ânsia pelo planejamento estatal suscitaria um inusitado
desejo por um ditador, o que de fato ocorrera na Alemanha125. A presença do Estado no
modelo econômico promove a criação de regimes de monopólio, determinante de
privilégios126, que devem ser combatidos, uma vez que determinam disfunções que
resultam no empobrecimento e na ruína econômica dos Estados que admitem a
proliferação desses odiosos esquemas.
A liberdade negocial é ponto principal no pensamento de
Hayek, que defendia um Estado-mínimo como condição para o desenvolvimento. Ao

119
HUNT, E.K. History of Economic Thought, A Critical Perspective, p. 464.
120
KEYNES, John Maynard O Fim do Laissez-Faire, in Tamás Szmrecsányi (org.), Economia,, p. 106 e
ss.
121
ANDERSON, Perry. op.cit., loc.cit
122
HAYEK, F. The Road to Serfdom, p. 28.
123
HAYEK, F. op.cit., p. 29.
124
HAYEK, F. op.cit., p 31.
125
HAYEK, F. op.cit, p.75.
126
HAYEK, F. op.cit., p. 218.
23

homem, ao ser humano, deve ser garantido o direito de escolha, de optar pela profissão,
pela atividade econômica, elegendo dentre as várias formas de vida, a que melhor lhe
parece127.
Esta liberdade, fomentada por um Estado garantidor do
exercício de atividades econômicas, formata os exatos contornos de uma organização
política desejável. Ao Estado exige-se apenas que não interrompa, não incomode e não
limite. O Estado, na perspectiva de Hayek, apenas assiste ao livre jogo do mercado,
olimpicamente, promovendo a livre concorrência e garantindo aos mais aptos a vitória no
jogo do capitalismo.

Logo no fim da segunda guerra mundial, F. Hayek convocou


e realizou uma reunião em Mont Pèlerin, na Suíça, da qual participaram Miltom
Friedman e Karl Popper, entre outros, fundando uma espécie de franco-maçonaria
neoliberal, altamente dedicada e organizada, com reuniões internacionais a cada dois
anos128. Segundo Perry Anderson, ao referir-se sobre a sociedade de Mont Pèlerin,
Seu propósito era combater o keynesianismo e o solidarismo
reinantes e preparar as bases de um outro tipo de
capitalismo, duro e livre de regras para o futuro. As
condições para esse trabalho não eram de todo favoráveis,
uma vez que o capitalismo avançado estava entrando numa
longa fase de auge sem precedentes- sua idade de ouro-
apresentando o crescimento mais rápido da história (...)129.

Segundo um autor de direito, comentando a obra de Hayek e


o papel do grupo intelectual da sociedade de Mont Pèlerin,
(...) Friedrich August von Hayek (...) tinha como objetivo o
combate ao totalitarismo ínsito ao socialismo, ao nazismo e
ao fascismo(...) Sob o fundamento de que a igualdade
proporcionada pelo Estado de bem-estar social minava a
liberdade e a concorrência, os integrantes da sociedade [ de
Mont Pèlerin ] passaram a destacar a desigualdade como
valor positivo ao Ocidente130.

127
HAYEK, F. op.cit., p. 18.
128
ANDERSON, Perry. op.cit., p. 10.
129
ANDERSON, Perry. op.cit.,loc.cit.
130
HOFFMANN, Fernando. Estado, Neoliberalismo, Globalização e Economia, in Revista da Faculdade
de Direito Universidade Universidade Federal do Paraná, 2001, p. 175.
24

Miltom Friedman também representa significativamente o


núcleo do pensamento neoliberal do pós-guerra. Um dos mais importantes expoentes da
Escola de Chicago131 , seu texto mais conhecido é Capitalism and Freedom. Friedman
defende insistentemente as relações entre liberdade econômica e política132. Segundo ele,
a liberdade econômica é um fim em si, assim como meio indispensável para a obtenção e
a realização da liberdade política133. Sua profissão de fé concentra-se na clássica
passagem

O homem livre não perguntará o que seu país pode fazer por
ele nem o que ele pode fazer por seu país. Ele perguntará ‘ o
que eu e meus compatriotas podemos fazer por meio de
nosso governo’ para nos ajudar diminuir nossas
responsabilidades pessoais, para conquistarmos nossos
objetivos e propósitos, e acima de tudo, para proteger nossa
liberdade ?134

Liberdade é expressão que mais caracteriza o movimento


neoliberal em seu início, em detrimento da própria igualdade, pelo que a desigualdade
passa a ser um valor positivo. Combatem-se as idéias intervencionistas de Keynes, o
Estado do bem-estar social, acusado de destruir a liberdade dos cidadãos e a força viva da
concorrência, colocando em perigo a prosperidade geral135. Posteriormente, o
neoliberalismo pôde renunciar a liberdade política em prol da liberdade econômica, que
passou a ser valor máximo, de modo mesmo a justificar a aproximação do neoliberalismo
com modelos ditatoriais.
Durante duas décadas o pensamento neoliberal hibernou
enquanto as condições de desenvolvimento do capitalismo durante a guerra fria se
otimizaram. Foram vinte anos de progresso espetacular para os Estados Unidos e para os
países capitalistas da Europa Ocidental.

131
HUNT, E.K. History of Economic Thought, p. 464.
132
FRIEDMAN, Miltom. Capitalism and Freedom, p. 7 e ss.
133
FRIEDMAN, Miltom. op.cit., p. 8.
134
FRIEDMAN, Miltom. op.cit., p. 2. Versão livre do autor. Thre free man will ask neither what his
country can do for him nor what he can do for his country. He will ask rather “ What can I and my
compatriots do through government” to achieve our several goals and purposes, and above all, to
protect our freedom ?
135
ANDERSON, Perry. op.cit, loc.cit.
25

Eventuais avanços do modelo soviético (a exemplo do que


ocorria nas corridas nuclear e espacial) eram menoscabados pelas denúncias do que
ocorria no lado oriental da cortina de ferro, e os acontecimentos de Praga, em 1968, são
muito sugestivos, nesse aspecto.
A crise do petróleo, em 1973, abalou o que se acreditava
como o sólido alicerce do modelo capitalista. A recessão advinda, o desemprego e o
desaquecimento das atividades negociais acenaram para uma presunção que vislumbrava
a incompetência do Estado do bem-estar social. O aumento dos gastos sociais por parte
do Estado passou a ser uma quimera. O engessamento desses mesmos gastos,
subordinados a orçamentos comprometidos com estratégias de combate à crise
energética, abriram espaço para uma retomada do ideário neoliberal, que parecia
apresentar opções concretas para que se fizesse frente à violenta crise.
Reformas fiscais subordinadas a disciplinas orçamentárias136
passaram a ser cogitadas nos termos das propostas de Hayek e de Friedman, defensores
de um processo de enxugamento do Estado. O proselitismo em torno da onda neoliberal
da época ganhou o republicanismo conservador norte-americano, cristalizado na
revolução de Reagan137 e epitomizado numa nova direita que exigia menos impostos para
os mais ricos138. O direito de ser quadrado (hip to be square) passou a configurar um
novo modo de ação, que qualificava um conservadorismo que traduzia um certo
desconforto com os avanços de setores mais progressistas da sociedade norte-americana.
E o avanço do conservadorismo consolidou-se,
(...) em 1979, surgiu a oportunidade. Na Inglaterra, foi eleito
o governo Thatcher, o primeiro regime de um país de
capitalismo avançado publicamente empenhado em pôr em
prática o programa neoliberal. Um ano depois, em 1980,
Reagan chegou à presidência dos Estados Unidos. Em 1982,
Khol derrotou o regime social liberal de Helmut Schimidt, na
Alemanha. Em 1983, a Dinamarca, Estado modelo do bem-
estar escandinavo, caiu sob o controle de uma coalizão clara
de direita(...)139.

136
ANDERSON, Perry. op.cit., p. 11.
137
RUTLAND, Robert Allen. The Republicans, from Lincoln to Bush, p. 239 e ss.
138
SCHULMAN, Bruce J. The Seventies, p. 193 e ss.
139
ANDERSON, Perry. op.cit., p. 11.
26

A busca da estabilidade monetária passou a ser o objetivo


mais perseguido por essas forças conservadoras, agora no poder. Simultaneamente,
desmontava-se o modelo de proteção trabalhista de alguns Estados, propiciando-se a
restauração de uma saudável taxa de desemprego (sic), vista como natural, fomentadora
de um exército laboral de reserva, responsável pela diminuição de salários e conseqüente
ampliação de margens de lucro. Procedimentos de assepsia fiscal fulminavam germes
patogênicos limitadores do avanço dos agentes econômicos, sufocados pelo Estado de
bem-estar social.

Evidentemente, as condições internas nos Estados Unidos da


América eram diferentes do ambiente que a Europa Ocidental vivia. A tradição socialista
norte-americana era anêmica e inofensiva. O espectro da guerra fria ainda rondava o país,
que elegeu o conflito com o mundo socialista como uma cruzada que deveria ser vencida
a qualquer preço. Circunstancialmente dois republicanos, Nixon e Reagan,
protagonizaram duas e importantes cartadas naquele jogo. O primeiro aproximando-se da
China e este último liquidando as esperanças soviéticas, que se abalavam desde a invasão
do Afeganistão, em 1978.
Preparava-se o cenário que presenciaria o ocaso da guerra
fria, potencializando-se inevitáveis tensões a serem desdobradas no Báltico, na Sérvia, na
Croácia, na reunificação da Alemanha, no papel do Japão e dos tigres asiáticos, na
primeira guerra do golfo, no Líbano, na perene tribalização da África, entregue à sorte da
manipulação norte-americana na gestão de conflitos milenares. A América Latina perdeu
a importância geopolítica e agora implora para o americano não deixá-la, remodelando o
mote, que passa a ser o bizarro Yankee, don’t go home...140
Em 2000 a realidade já era muito diferente e os Estados
Unidos não haviam consolidado o papel que imaginavam ter a história lhes reservado. A
extrema direita representada pelos falcões (hawks) pulveriza-se entre neoconservadores, a
direita cristã e os militaristas clássicos de Dick Cheney e Don Rumsfeld141, festejados por

140
BRENER, Jayme. O Mundo Pós-Guerra Fria, p. 97 e ss.
141
WALLERSTEIN, Immanuel. Geopolítica, Política de Classe e a Atual Desordem Mundial, in
Theotonio dos Santos (coord.), Os Impasses da Globalização, p. 20.
27

Ann Coulter142 e ridicularizados por Michael Moore143. Os ataques terroristas que os


norte-americanos sofreram em setembro de 2001 os instrumentalizaram ideologicamente,
fortalecendo-os para a cruzada que seguiu, no Afeganistão e no Iraque, com cooptação de
certos espaços políticos na Europa ( especificamente na Inglaterra e na Espanha ),
confirmando a incorporação da Europa Ocidental nas redes de poder do Estado norte-
americano após a segunda guerra mundial144.
A direita republicana norte-americana consagra o
neoliberalismo, realizando internamente programas que M. Thatcher levara adiante na
Inglaterra, a exemplo do controle de fluxos financeiros, de uma legislação anti-socialista,
de uma drástica diminuição de gastos com programas sociais, da diminuição de impostos
sobre os altos rendimentos. A justificativa para o implemento de tais programas passa por
uma política externa agressiva, de tom insuspeitadamente intolerante, centrado na lógica
apocalíptica de que há perigo a ser enfrentado a qualquer custo. O terrorismo é refém da
propaganda norte-americana.
De qualquer forma, e agora a década de 70 oferece panorama
para análise, o projeto neoliberal mostrara-se vitorioso naquela época, logrando êxito,
reanimando o capitalismo mundial avançado, restaurando taxas altas de crescimento
estáveis, como existiam antes da crise dos anos 70145. E ainda em termos midiáticos e
ideológicos, a derrota do socialismo real alimentou a crença nos valores neoliberais.
Como se a queda do muro de Berlim, a glasnost e a perestroika confirmassem os
supremos ideais da liberdade de mercado, aquele efeito de demonstração apontado por
Perry Anderson, como segue
O dinamismo continuado do neoliberalismo como força
ideológica em escala mundial está sustentado em grande
parte, hoje, por esse efeito de demonstração do mundo pós-
soviético. Os neoliberais podem gabar-se de estar à frente de
uma transformação sócio-econômica gigantesca, que vai
perdurar por décadas146.

142
COULTER, Ann. Treason, p. 285 e ss.
143
MOORE, Michael. Stupid White Men, p. 16 e 17.
144
ARRIGHI, Giovanni. O Longo Século XX, p. 318.
145
ANDERSON, Perry. op.cit, p. 15.
146
ANDERSON, Perry. op.cit. p. 19.
28

Com um pouco mais de acidez, Óscar Correas percebe que o


único êxito do neoliberalismo no fim do século passado não estaria em seus sucessos
econômicos, que não se vêem aliás em lugar nenhum. Mas sim na estupidização do
mundo, que acredita nos insultos que o neoliberalismo promove, extratos de uma
sociedade educada na falta de solidariedade, na mentira e na morte147.
Tem-se a impressão de que o neoliberalismo sobrevive
hegemônico, sacralizado nos Estados Unidos, na Europa Ocidental, permitindo
episódicos surtos mais animados ainda, a exemplo do triunfo de Berlusconi, o Reagan
italiano. O neoliberalismo assentou-se no Chile de Pinochet, no México de Salinas, na
Argentina de Menen, na Venezuela de Perez, no Peru de Fujimori. O surgimento destas
figuras insere-se num amplo quadro histórico e geopolítico que se desenvolveu ao longo
do século XX148, especialmente a partir do término da 2ª Guerra Mundial em 1945, mas
que remonta a 1776, data em que Adam Smith publicou seu The Wealth of Nations,
mesmo ano em que os norte-americanos separaram-se dos ingleses, num amplo quadro de
revoluções atlânticas, também sentido em 1789, quando do início da saga revolucionária
francesa.
A publicação do Capital de Marx, em 1867, assinalou uma
leitura problematizante do modelo capitalista. O modelo de previdência estatal que
Bismarck instituiu na Alemanha em 1882 certamente é referência de sistema de
intervencionismo absoluto. Guerrou-se também contra uma suposta selvageria capitalista,
e disso é prova o Sherman Anti-Trust Act, de 1890, consolidado nos Estados Unidos com
a presidência de Theodore Roosevelt, também lembrado pelo exotismo, pelas
extravagâncias e por seu espírito aventureiro, qualidades que conduziram o presidente
norte-americano à Amazônia. O século XX conhece reformas liberais na Inglaterra em
1906, que configuravam um Estado-ambulância ( ambulance state). Em 1911 a China
conheceu uma revolução que já anuncia prematuramente a marcha de Mao, na década de
1930.

147
CORREAS, Óscar. El Êxito del Neoliberalismo, in Direito e Neoliberalismo, Elementos para uma
Leitura Interdisciplinar, p. 3.
148
Quadro cronológico organizado a partir de YERGIN, Daniel e STANISLAW, Joseph, The
Commanding Heights, the Battle for the World Economy, p. 419 e ss.
29

A guerra que começou em 1914 deu fim à era de ouro do


comércio internacional. Três anos depois, em 1917, a revolução russa dá início à
realização de um projeto marxista. No ano seguinte, em 1918, dá-se início ao processo de
apaziguamento da primeira guerra, consubstanciado no tratado de Versalhes, pacto que
alimentou o revanchismo alemão e que oxigenará a pregação nacional socialista na
Alemanha. Também em 1919 o partido trabalhista inglês prega intensivamente a
nacionalização dos setores fundamentais da economia britânica. O nacionalismo também
insufla aos chineses, que se rebelam na praça da paz celestial, que receberá grande
atenção mundial em 1989 com a revolta dos jovens estudantes.
Lênin, a partir de 1921, retifica práticas comunistas mais
ortodoxas, na perspectiva de dar-se um passo para trás com o objetivo de dar-se dois
passos à frente, permitindo alguma atividade privada, mediante a regulamentação
decorrente da chamada NEP- Nova Política Econômica. Na mesma época, Ludwig von
Mises publicava sua obra de crítica ao socialismo, divulgando o modelo liberal que nasce
em Viena com a chamada escola austríaca, que será posteriormente cooptado e
desenvolvido pela escola de Chicago. Em 1927 o planejamento estatal atinge seu ponto
máximo com o modelo de Stálin, que naquele ano consolidou seu comando pessoal na
União Soviética.
Em 1929, primeiro ano de um plano quinquenal soviético, a
bolsa de valores de Nova Iorque vive sua grande debacle, anunciando os anos de
depressão, que serão contornados por modelos de dirigismo estatal, posteriormente
consolidados na obra de John Maynard Keynes. Em 1933 os democratas ganham as
eleições nos Estados Unidos e Franklyn Delano Roosevelt dá início ao seu programa de
reconstrução nacional, que atentou contra o liberalismo ortodoxo. Cria-se a U.S.
Securities and Exchange Commission e a Tenesse Valley Authority, algumas medidas
interventivas, que sofrem com a oposição da Suprema Corte daquele país. Enquanto isto,
do outro lado do mundo, a partir de 1934, Mao dá início à grande marcha que culminará
com a revolução comunista chinesa. Em 1936 John Maynard Keynes publicou seu The
General Theory of Employment, Interest and Money, livro base para a formatação do
intervencionismo.
30

China e Japão entraram em guerra a partir de 1937. No ano


seguinte, em 1938, o México nacionalizou a reserva e a prospeção de petróleo,
movimento que seria impensável nos dias de hoje. Ainda em 1938, os Estados Unidos
passam a exercer intensa fiscalização e regulamentação da aviação comercial, por meio
da CBA-Civil Aeronautics Board, organismo que será desfeito quatro décadas depois, em
meio à onda de neoliberalismo. Em 1939 os alemães invadiram a Polônia; começa a 2ª
guerra mundial. Dois anos depois, após o ataque japonês em Pearl Harbor, os norte-
americanos entraram na guerra, episódio que alavancou a economia daquele país, que
desde o conflito de 1914, já exercia hegemonia mundial. Também em 1941, Altiero
Spinelli, preso pelos fascistas na ilha de Ventonene, escreveu seu famoso manifesto que
urgia a necessidade de uma união européia.
Em 1944 Friedrich von Hayek publicou sua obra seminal, O
Caminho da Servidão, denúncia implacável do dirigismo estatal, cujos contornos foram
já assinalados no presente trabalho. Naquele mesmo ano criou-se o Banco Mundial, em
meio à Conferência de Bretton Woods. Os aliados proclamaram-se vencedores da guerra
em 1945. Clement Atlee venceu as eleições na Inglaterra, para indignação de Winston
Churchill. Com Atlee o partido trabalhista toma o poder, formatando e lançando o mais
acabado Estado de bem estar social que se tem notícia, e que perdurará até o retorno dos
conservadores com Margaret Thatcher.
Jeann Monnet, antigo negociante de conhaques, articula um
plano de restauração para a França, sonhando abertamente com uma Europa unida. Na
Índia, Nehru publicava seu A Descoberta da Índia, que importância intelectual exerceria
no processo de descolonização afro-asiático. Em 1946 Keynes faleceu, logo depois de ter
negociado junto aos Estados Unidos um empréstimo para a Inglaterra. Miltom Friedman,
avatar do minimalismo estatal, fora indicado professor na universidade de Chicago. A
Europa vive uma crise intensa, e os Estados Unidos administram o processo por
intermédio do Plano Marshall, desenhado para a reconstrução do velho continente. A
Índia libertou-se da Inglaterra e Nehru será o primeiro-ministro. O modelo
intervencionista inglês intensificou-se em 1947, por conta da nacionalização da indústria
do carvão.
31

Em 1948 os soviéticos instituem um bloqueio em Berlim,


fato que culmina na divisão da Europa. A Alemanha Ocidental, sob a liderança
econômica de Ludwig Erhard, deu fim ao controle de preços, alavancando uma economia
de mercado social, que deu os contornos ao milagre econômico alemão. Em 1949 as
forças comunistas de Mao triunfaram na China, estabelecendo-se uma república popular,
enquanto Chiang-Kai-Tchek fugiu para Taiwan. Em 1950 tem-se início a guerra da
Coréia, importante passo no contexto da guerra fria, que enseja a teoria dos dominós,
percepção norte-americana que denunciava que a vitória do comunismo em qualquer
lugar ensejaria uma reação imediata e em cadeia, em desfavor da democracia, do
liberalismo e do capitalismo.
Em 1952 morreu Evita Perón. Seu marido, Juan Domingo,
parte para o exílio, após nacionalizar drasticamente a economia argentina. Três anos
depois, em 1955, por ocasião da Conferência de Bandung, sob influência da Indonésia,
ensaia-se uma base política internacional não alinhada. Em 1956 as tropas soviéticas
reprimiram violentamente manifestações na Hungria. Naquele mesmo ano, a crise do
canal de Suez semeou a discórdia entre os aliados ocidentais. No ano seguinte criou-se o
Banco Alemão, pensado para combater o processo inflacionário que então se desenhava.
E também em 1957 o Tratado de Roma deu continuidade a um processo de aproximação
entre os países europeus, que remontava a Spinelli e a Monnet. De 1958 a 1960 os
comunistas chineses tentaram desenvolver um processo de desenvolvimento forçado,
chamado de o grande passo a frente.
Em 1961 tem-se início ao processo de industrialização da
Coréia do Sul, sob liderança do general Park Chung Hee. Em 1962 Miltom Friedman
publica um clássico do pensamento neoliberal, Capitalismo e Liberdade. No ano
seguinte, 1963, Kennedy foi assassinado no Texas. Seu sucessor, Lyndon Jonhson,
lançou um plano de combate à pobreza. Na China, divulga-se o livro vermelho de Mao,
premonindo a revolução cultural que será lançada em 1966. Em 1968 Richard Nixon foi
eleito presidente dos Estados Unidos. Naquele mesmo ano os tanques soviéticos sitiaram
Praga, centro de um movimento a favor de um socialismo com face humana. Em 1970 o
socialista Salvador Allende chega ao poder no Chile, lançando um programa de
nacionalização intensiva da economia.
32

Em 1971 Nixon se declara keynesiano, promove o controle


de preços e salários, dá fim ao padrão ouro vinculado ao dólar norte-americano,
encerrando o modelo de Bretton Woods. Trata-se de um dos maiores calotes da história.
Em 1973 a Inglaterra aderiu à comunidade econômica européia. O mundo vive o primeiro
grande choque do petróleo. No Chile, o general Pinochet lidera um golpe de estado que
dá início a um rápido processo de reformas de cunho neoliberal, sob um pano de fundo
matizado por rígida ditadura. Em 1974 a Índia anuncia que domina a energia nuclear. Os
ingleses conhecem uma greve dos mineiros de carvão. Friederich von Hayek divide o
prêmio Nobel com Gunnar Myrdal, reconhecido e assumido keynesiano. Em 1975
Margaret Thatcher vence Edward Heath e torna-se líder do partido conservador britânico.
Naquele mesmo ano, companhias de petróleo são nacionalizadas na Arábia Saudita,
Kwait e Venezuela. Em 1976 morreu Mao. Ainda neste mesmo ano, Miltom Friedman foi
laureado com o premio Nobel de economia. Em 1977, sob a liderança de Alfred Kahn
desata-se o processo de desregulamentação da aviação civil norte-americana.
Em 1978 o cardeal polonês Karol Wojtyla tornou-se o Papa
João Paulo II. Deng Xiaoping torna-se o principal líder chinês, promovendo um processo
de reformas estruturais orientadas para o livre mercado e para a livre iniciativa. Em 1979
Margaret Thatcher torna-se chanceler na Inglaterra. A revolução fundamentalista iraniana
desata uma segunda crise do petróleo. Em 1980 o ultraconservador Ronald Reagan é
eleito presidente nos Estados Unidos. No mesmo ano, o sindicato solidariedade levanta-
se em Gdansky e mesmeriza a Polônia. Em 1981 François Mitterrand torna-se o primeiro
presidente socialista da república francesa. Em 1982 Margaret Thatcher recebe forte
apoio popular após bater os argentinos nas Malvinas. Entre aquele ano e 1985 faleceram
três líderes soviéticos da velha guarda: Brezhnev, Adropov e Chernenko.
Em 1984 Indira Gandhi foi assassinada. Na Inglaterra
privatizou-se a telefonia. Em 1985 Gorbachev dá início à perestroika e a glasnost,
levando adiante reformas na Rússia. Margaret Thatcher sufoca a greve dos mineiros e
consolida seu projeto neoliberal. Em 1989 os jovens reformistas chineses protestaram na
praça da paz celestial. Naquele mesmo ano derrubou-se o muro de Berlim, dando-se fim à
odiosa divisão da Europa. Ainda, Carlos Menem venceu as eleições na Argentina e dá
início a um intenso programa de reformas neoliberais. As eleições de 1990 conduziram
33

Lech Walesa ao poder na Polônia; no Chile, os vitoriosos mantiveram o passo das


reformas neoliberais, encetadas intransigentemente por Pinochet. Ainda em 1990 o Iraque
invadiu o Kwait. No ano seguinte, o mundo presenciou a guerra do golfo, transmitida
pela CNN, que levou ao ar cobertura inusitada.
Em 1991 a União Soviética se desintegra. Boris Yeltsin
tornou-se o presidente de uma federação russa independente. O Tratado de Maastricht foi
assinado, prevendo a união monetária na Europa. Naquele mesmo ano, Alberto Fujimori
derrotou o escritor Mario Vargas Llosa nas eleições do Peru. Em 1992 a Rússia dá início
a intensos programas de privatização. Estados Unidos, Canadá e México formam o Nafta,
North American Free Trade Agreement. Em 1993 o democrata Bill Clinton alcançou a
presidência do Estados Unidos, encetando um programa que tomou emprestado idéias de
seus adversários republicanos, a exemplo da pregação em torno do fim do grande
governo. No ano seguinte, Fernando Henrique Cardoso lançou o plano real no Brasil, o
que fortaleceu e garantiu sua trajetória rumo à presidência do país. Também em 1994
formula-se a Organização Internacional do Comércio.
Em 1997 Hong Kong retornou ao controle chinês. Tony Blair
vence as eleições na Inglaterra, liderando um partido trabalhista com feição muito
modificada, acicatando aspectos do programa do partido conservador, a exemplo das
privatizações e do modelo de livre mercado. Uma violenta crise no sudeste da Ásia abala
a admiração internacional pelos tigres asiáticos. Em 1999 o euro passa a ser a moeda de
transição na Europa continental. Em 2000 Vicent Fox vence as eleições no México,
formulando uma política de neoliberalismo intensivo. George W. Bush, com apoio da
Suprema Corte norte-americana, vence as eleições presidenciais nos Estados Unidos. Em
2001 os norte-americanos sofrem os ataques terroristas, em Nova Iorque e em
Washington. O euro passa a ser a moeda corrente no mundo europeu. Três divisas
consagram a vitória do neoliberalismo: o euro, o dólar e o iene.
A versão acima intencionalmente desenhada aponta para a
apoteose do pensamento neoliberal. Tais idéias foram dissemidas entre nós,
primeiramente com certa resistência do dirigismo militar e da esquerda, posteriormente
assimiladas no mandato Fernando Henrique Cardoso e mais tarde na presidência Lula.
Sob uma leitura de recomposição, no Brasil o neoliberalismo contou com Roberto
34

Campos como um de seus mais animados e bem educados defensores. De sólida


formação humanística, educado em seminário, latinista e helenista, Roberto Campos
definiu-se quando chegou ao Rio de Janeiro como um analfabeto erudito149 . Por
concurso entrou no Itamaraty e viveu em Washington nos últimos dias da guerra mundial.
Como terceiro secretário da embaixada brasileira participou da Conferência de Bretton
Woods, de 1º a 22 de julho de 1944, conhecendo então o representante inglês, o Lord
Keynes150 . Roberto Campos estudou economia na Universidade George Washington,
dedicando-se a intermináveis serões na biblioteca do Congresso. Segundo ele,
Washington durante a guerra era excitante, pois se havia
tornado capital do mundo, dada a extraordinária
proeminência dos Estados Unidos na condução das
operações militares, na pujança de sua produção bélica e na
capacidade de abastecimento dois aliados151.

Roberto Campos participou da criação da ONU152, retornou


ao Brasil, acompanhou a instalação da Comissão Mista Brasil-Estados Unidos153,
participou da criação do BNDE- Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico154,
conviveu intelectualmente com Eugênio Gudin155, colaborou no governo Castello
Branco156, foi senador constituinte157.
Roberto Campos criticou o ambiente da Assembléia Nacional
Constituinte de 1986, que qualificou como a vitória do nacional-obscurantismo158 .
Adiantou-se nas críticas ao novo modelo tributário da Constituição de 1988, reputando-o
como hiperfiscalista159, premonindo perda de receitas da União, que mais tarde seriam
recuperadas com ampliação de bases tributárias160, especialmente mediante a proliferação
das contribuições.

149
CAMPOS, Roberto. A Lanterna na Popa, p. 25.
150
CAMPOS, Roberto. op.cit., p. 62.
151
CAMPOS, Roberto. op.cit., p. 77.
152
CAMPOS, Roberto. op.cit., p. 91.
153
CAMPOS, Roberto. op.cit., p. 159.
154
CAMPOS, Roberto. op.cit., p. 191.
155
CAMPOS, Roberto. op.cit., p. 237.
156
CAMPOS, Roberto. op.cit., p. 555.
157
CAMPOS, Roberto. op.cit., p. 1063.
158
CAMPOS, Roberto. op.cit., p. 1191.
159
CAMPOS, Roberto. op.cit., p. 1198.
160
CAMPOS, Roberto. op.cit., p. 1199.
35

O interessante é que boa parte das profecias de Roberto


Campos teria se confirmado. Criticando a carta de 1988, ele afirmou que a cultura
antiempresarial de que se impregnou a Constituição em breve fará o Brasil o país ideal
onde não investir161. Durante a preparação daquele documento, Roberto Campos já
vociferava e vaticinava
Tenho lido e relido o texto constituinte, um dicionário de
utopias de 321 artigos. Pouco ou nada se parece com as
constituições civilizadas que conheço. Seu teor socializante
cheira muito à infecta Constituição portuguesa de 1976, da
qual Portugal procura agora desembaraçar-se a fim de
embarcar na economia de mercado da Comunidade
Econômica Européia. O voto aos dezesseis anos dizem
copiado da Constituição da Nicarágua. A definição de
empresa nacional parece só existir na Constituição de
Guiné-Bissau. Em ambos os casos, nem o mais remoto odor
de civilização...162

Roberto Campos admitia subordinar a liberdade política ao


desenvolvimento econômico e nesse sentido ao comparar a Argentina como o Chile
observou que
A realidade não é tão simples. Alfonsín é um presidente
inquestionavelmente legítimo e a Argentina experimenta
inflação e estagnação. Pinochet é ilegítimo e conseguiu
desinflação e desenvolvimento. Donde se conclui que a
legitimidade presidencial pelo voto direto, altamente
desejável para a consolidação democrática, não é fórmula
mágica para garantir êxito na luta antiinflacionária, nem na
restauração do desenvolvimento. Tudo depende do senso de
prioridade e da coragem cívica do governante163.

Roberto Campos divulgou constantemente os pensadores


neoliberais, no espaço que ocupou na imprensa. O diplomata brasileiro pranteava Hayek,
que segundo ele
Foi o homem de idéias que mais bravamente lutou, ao longo
de duas gerações atormentadas, pela liberdade do indivíduo
contra todas as modas totalitárias, do socialismo soviético
ao nazismo. E contra outras formas de opressão resultantes
da sobreposição do Estado burocrático à pessoa humana, a

161
CAMPOS, Roberto. O Século Esquisito, p. 190.
162
CAMPOS, Roberto. op.cit., p.192.
163
CAMPOS, Roberto. op.cit., p. 192/193.
36

pretexto de interesses sociais que ele próprio, Estado,


reserve para si o poder de determinar164.

Com língua ferina, condenou toda forma indevida de


interferência do Estado (o mais frio dos monstros, segundo Nietzsche, por Roberto
Campos citado165). A propósito de decisão do Supremo Tribunal Federal que afastou o
antigo IPMF, hoje CPMF, escreveu
Recente decisão do Supremo Tribunal, rejeitando o IPMF,
na preliminar de inconstitucionalidade, foi economicamente
sensata. O imposto fora concebido como uma heróica
simplificação- substituir o atual manicômio fiscal por um
imposto único sobre a moeda eletrônica. Eliminar-se-iam a
burocracia da declaração, a corrupção do fiscal e a
engenhosidade do sonegador. A idéia foi distorcida pelo
governo, piorada no Congresso e tornou-se 59º tributo. Uma
espécie de O bebê de Rosemary, do filme de Roman
Polansky, oriundo de uma transa inconsciente de Mia
Farrow com Belzebu. Aliás, durante as discussões da
Constituição de 1988, profetizei que estávamos criando um
bebê de Rosemary: o diabo íncubo era o nacional populismo,
que o Brasil somente começou a exorciar depois da queda do
Muro de Berlim166.

A participação de Roberto Campos na preparação da


Constituição de 1988 ilustra efusivamente essa interface entre o neoliberalismo e o direito
brasileiro na medida em que boa parte das críticas do diplomata realizou-se no futuro. As
emendas constitucionais que vêm alterando o texto original de 1988 comprovam que a
utopia e o romantismo daquele documento político não resistiram ao sopro efetivo do
pensamento neoliberal, marcado pela globalização. Deve-se reconhecer nossa condição
periférica, em relação ao capitalismo internacional.

Os espaços periféricos do sistema são açoitados com o que


Michel Chossudovsky nomina de o cardápio do FMI167. Impõe-se austeridade
orçamentária, imperturbável agravante da crise fiscal. As moedas nacionais são

164
CAMPOS, Roberto. Antologia do Bom Senso, p. 71.
165
CAMPOS, Roberto. op.cit., loc.cit.
166
CAMPOS, Roberto. Antologia do Bom Senso, p. 327.
167
CHOSSUDOVSKY, Michel. op.cit. p. 28 e ss.
37

desvalorizadas, em favor do dólar e do euro. Obriga-se a uma inusitada liberalização do


comércio.

Degradam-se as funções tradicionais sócioeconômicas dos


168
Estados , alterando-se também identidades nacionais169. Formulam-se programas
relâmpago de privatizações. Reorganizam-se ministérios das fazendas e bancos centrais,
esses últimos muitas vezes sob a batuta de empregados das forças componentes do
Império, conceito de Antonio Negri e Michael Hardt, que ensaiam em explicar a
hegemonia norte-americana no mundo.

As instituições financeiras internacionais exercem governos


paralelos aos poderes oficialmente constituídos. Os países que não aceitam esses planos
de ajustes estruturais são elencados em lista negra. Empréstimos são condicionados a
programas e desempenhos políticos e econômicos. Documentos de prioridades políticas
vinculam dominantes e dominados. Atônitos, passamos a questionar projetos ilibados de
organizações internacionais não governamentais, como o de grupos como Médicos sem
Fronteiras, Greenpeace, Anistia Internacional, Sierra Club e Human Rights Watch, entre
tantos outros. Por outro lado, pensamento mais utópico e mais comprometido com a real
emancipação do ser humano, o que deveria ser a tônica de qualquer processo
globalizante, imagina alternativas de tributação do capital financeiro internacional, como
instrumento gerador de recursos para combate à pobreza170.
Uma sociedade neoliberal baseada em organizações
complexas, em atores múltiplos, como empresas, bancos e entidades de classe dominante
protagonizam um sistema de domínio ditado pelo mercado. Ainda segundo Michel
Chossudovsky171 os projetos de estabilização econômica passam por duas fases. Primeiro
momento verifica um programa anti-inflacionário, marcado pela retração da demanda,
pela maxidesvalorização e destruição da moeda nacional, pela dolarização dos preços
domésticos, pela desindexação dos salários. Segundo momento percebe o implemento de
reformas estruturais.

168
CADERMATORI, José. Chile, el Modelo Neoliberal, p. 117 e ss.
169
LARRAÍN, Jorge, Identidad Chilena, p. 162 e ss.
170
CHESNAIS, François. Tobin or not Tobin ?, p. 39 e ss.
171
CHOSSUDOVSKY, Michel. op.cit., p. 47 e ss.
38

Realiza-se o projeto autoritário e neoliberal do Consenso de


Washington. As medidas propostas e impostas por essa nova ordem são : 1) Acabar com
a inflação, 2) privatizar e 3) deixar o mercado regular a sociedade, através da redução
do papel do Estado, sendo os seus principais protagonistas as grandes corporações
internacionais, sobretudo as norte-americanas172.
Força-se a liberação unilateral do comércio. Privatizam-se as
estatais. Levam-se a termo reformas fiscais, previdenciárias e trabalhistas.
Desregulamenta-se o sistema bancário. Criam-se fundos sociais de emergência para a
administração da pobreza mais ostensiva. A falência na reestruturação de sistemas de
saúde implica na indesejável volta de doenças como o cólera, a febre-amarela e a malária.
A globalização das manufaturas faz-se a custa de
mecanismos garantidores de mão-de-obra barata. Modelos de submissão ideológica
realizam o colonialismo cultural. A generalização de problemas em locais como Somália,
Ruanda, Moçambique, México, Peru, Bolívia, Argentina e Brasil confirmam os
desajustes que decorrem de políticas de globalização.
O avanço do capitalismo, enquanto suposto progresso
econômico e acúmulo de capital eficiente173 é causa e consequência da globalização, de
apreensão imediata. Consubstancia-se o reino dos maiores bancos do mundo174 que
controlam os atores globais em questões como dívida externa de países periféricos175. As
mercadorias colonizam as formas de vida, implementando-se a fetichização prevista pelo
ideário marxista176.
Promove-se uma mercadização do estético, o que já fora
denúncia dos frankfurtianos no exílio177, especialmente por parte de Theodor Adorno178,
concepções que ensejam um neomarxismo crítico179. Nosso tempo globalizado confirma

172
LIMA, Abili Lázaro Castro de. Globalização Econômica, Política e Direito, p. 159.
173
PERROUX, François. O Capitalismo, p. 12.
174
SAMPSON, Anthony. Os Credores do Mundo, p. 160.
175
SABBI, Alcides Pedro. O que é a questão da dívida externa, p. 66 e ss.
176
BOTTOMORE (ED.), Tom. Dicionário do Pensamento Marxista, p. 160.
177
HORKHEIMER, Max e ADORNO, Theodor. Dialectic of Enlightenment, p. 120 e ss.
178
WIGGERSHAUS, Rolf. The Frankkfurt School- its History, Theories and Political Significance, p.
66 e ss.
179
ASSOUN, Paul-Laurent. A Escola de Frankfurt, p. 56 e ss.
39

que a sociedade administrada produz uma massa acrítica e manipulável (...) nela ocorre
a extinção do sujeito cognoscente, do sujeito responsável180.

Duvida-se da razão iluminista, instrumental, que passa a


181
perfilar um sentido cínico e manipulador182. A razão propiciara a violência, suscitando
poder, força, autoridade183, aproximando ideologia e terror184. Vivemos num mundo
prioritariamente composto de deserdados, marcado pela angústia e pela insegurança, tudo
potencializado pela massificação do desemprego.
Boaventura de Souza Santos percebe movimentos
185
hegemônicos e contra-hegemônicos no processo de globalização . Um localismo
globalizado identifica a hegemonia de fragmentos culturais particularizados; é a língua
inglesa que de meio de comunicação de uma ilha torna-se língua franca do mundo. Um
globalismo localizado assinala o impacto do global sobre o local.
É quando a apropriação turística de valores históricos e de
recursos naturais promove a crise ambiental ou quando a conversão da lavoura de
subsistência para agricultura de exportação reformata o uso dos solos. Contra-
hegemonicamente, um certo cosmopolitismo desenha-se mediante o processo de
formação de grupos internacionais interessados na discussão dos problemas decorrentes
da globalização, a propósito da preocupação com temas como patrimônio comum da
humanidade, Amazônia, Antártida, biodiversidade, fundos marinhos, embora nichos
abstratamente possíveis de apropriação hegemônica e indicativos de uma bambificação
da natureza, no alerta de Alexander Gillispie186.
Todos os mencionados elementos referentes ao processo de
globalização, identificados com o neoliberalismo e divinizados no Consenso de
Washington, forçam alterações profundas nos modelos normativos dos países periféricos.
O projeto neoliberal realiza-se localmente e por isso as legislações são alteradas, como

180
MATOS, Olgária C. F. Os Arcanos do Inteiramente Outro- a Escola de Frankfurt- a Melancolia e a
Revolução, p. 15.
181
SLOTERDIJK, Peter. Critique of Cynical Reason, p. 76 e ss.
182
HORKHEIMER, Max. Eclipse of Reason, p. 3.
183
ARENDT, Hannah. On Violence, p. 44.
184
ARENDT, Hannah. The Origins of Totalitarism, p. 460 e ss.
185
SANTOS, Boaventura de Souza. A Globalização e as Ciências Sociais, p. 72 e ss.
186
GILLISPIE, Alexander. International Environmental Law Policy and Ethics.
40

condição de realização das ordens que possibilitam a hegemonia do Império, aquela


figura política apontada por Antonio Negri e Michael Hardt, plasmada no domínio norte-
americano e do capitalismo internacional financeiro. Todavia, no ar a pergunta atinente às
possibilidades do capitalismo sobreviver ao sucesso, proporcionando taxas de
crescimento econômico global anteriores a 1928187, questão que enseja toda sorte de
engenharia social, plasmada em novos modelos normativos.
O Estado periférico perde a condição de soberania que inveja
do estado europeu clássico de governo direto188. Ainda segundo Boaventura de Sousa
Santos,
Nos termos do Consenso de Washington, a responsabilidade
central do Estado consiste em criar o quadro legal e dar
condições de efetivo funcionamento às instituições jurídicas e
judiciais que tornarão possível o fluir rotineiro das infinitas
interações entre os cidadãos, os agentes econômicos e o
próprio Estado189 .

As recentes transformações verificadas no direito brasileiro


identificam essa realidade. A globalização projeta-se em todos os campos da
normatividade, assim como da apreensão da arena jurídica, ensaiando novos cânones
hermenêuticos. Nota-se um conflito entre economistas e juristas, um antagonismo
declarado, uma polaridade entre eficiência econômica e certeza jurídica, entre
programas anti-inflacionários e ordem constitucional190.
Os economistas perseguem uma ética weberiana da
convicção, preocupados que estão com os fins. Os juristas encalçam uma ética também
weberiana da responsabilidade, desassossegados com os meios. Legisladores e
magistrados perambulam por esse tiroteio, que atinge mais duramente o cidadão.

No direito previdenciário, por exemplo, percebe-se uma


releitura do princípio da solidariedade e um redimensionamento do sistema, decorrente de
um movimento de substituição do direito de feição estatal191, formatado pela hegemonia

187
ARRIGHI, Giovanni. O Longo Século XX, p. 337 e ss.
188
TILLY, Charles. Coerção, Capital e Estados Europeus, p. 166 e ss.
189
SANTOS, Boaventura de Souza. op. cit., p. 43.
190
FARIA, José Eduardo. Direito e Economia na Democratização Brasileira, p. 15.
191
ARNAUD, André-Jean. O Direito entre Modernidade e Globalização, p. 157.
41

dos conceitos neoliberais em matéria de relações econômicas192. Certo malthusianismo


apocalíptico prende-se numa gerontofobia preventiva, prevendo a dilação de prazos de
aposentadorias, proclamando a adequação de planos privados de pensão e menoscabando
percepções analíticas de direitos adquiridos.

O direito penal, por sua vez, plasma a internacionalização dos


delitos e percebe nos dizeres de Luiz Flávio Gomes e de Alice Bianchini193 uma
progressiva deterioração marcada pelas seguintes características : deliberada política de
criminalização, freqüentes e parciais alterações na legislação, aumento dos marcos penais
dos delitos clássicos, hipertrofia da proteção penal mediante a proteção institucional ou
funcional dos bens jurídicos, ampla utilização da técnica dos delitos de perigo abstrato,
menosprezo patente ao princípio da lesividade ou da ofensividade, erosão do conteúdo da
norma de conduta, uso do direito penal como instrumento de política de segurança, pouca
preocupação com os princípios de igualdade e de proporcionalidade para se atender a
uma exacerbada preocupação prevencionista, transformação funcionalista de clássicas
diferenciações dogmáticas ( como autoria, participação, consumação, entre outras ), um
crescente movimento de responsabilização da pessoa jurídica, a par da privatização ou
terceirização da justiça e, por fim,
Para alcançar a meta da efetividade, profundas alterações
estão ocorrendo na área do processo penal, quase sempre
orientadas à aceleração do procedimento, agilização da
instrução e rapidez da Justiça, com o corte de direitos e
garantias fundamentais para facilitar a operatividade da
intervenção penal194.

Já o direito internacional procura disciplinar uma nova ordem


mundial que presencia o ocaso do modelo supranacional de Kelsen195 perspectiva de
possível comprovação mediante a avaliação do presente papel protagonizado pela
Organização das Nações Unidas. Emergem novos atores internacionais196 e o Estado-
Nação convencional parece perder espaço. Também, e trata-se de idéia de Paul Kennedy,

192
ARNAUD, André-Jean. e DULCE, María José Farinas. Introdução à Análise dos Sistemas Jurídicos,
p. 352.
193
GOMES, Luiz Flávio e BIANCHINI, Alice. O Direito Penal na Era da Globalização, p. 25 e ss.
194
GOMES, Luiz Flávio e BIANCHINI, Alice. op.cit., p. 32.
195
NEGRI, Antonio e HARDT, Michael. op. cit., p. 5.
196
OLSSON, Giovanni. Relações Internacionais e seus Atores na Era da Globalização, p. 150 e ss.
42

percebe-se uma intensa movimentação entre as potências hegemônicas. Para o teórico


inglês, na medida em que os paises ganham consistência econômica e presença na
política internacional, aumentam os gastos com o militarismo, o que a longo prazo
determina a debilidade destas nações197. Os fatos vividos pela recente história econômica
da União Soviética parecem comprovar a imagem.
Emerge triunfante a tese de Danilo Zolo. Segundo o autor
italiano, a paz da Westphalia foi substituída pelo arranjo da Santa Aliança, que foi
alterado pelo modelo da Liga das Nações, que posteriormente ressurge na Organização
das Nações Unidas, e que hoje mostra-se inoperante, entre outros, em face do surgimento
de novas forças, a exemplo da China. Um pacifismo cosmopolita imaginado por Norberto
Bobbio conflitaria com um constitucionalismo global percebido por R. Falk, modelos
conceituais anulados pela realidade da legitimação norte-americana por parte do
Conselho de Segurança da ONU198. Como pano de fundo haveria ainda um conflito entre
leste e oeste, entre civilização muçulmana e civilização cristã, que por enquanto pende
por um suposto modelo triunfante de ocidentalização compulsória199.
A velocidade dos meios de comunicação revela problemas
do mundo todo, discutem-se direitos humanos num novo plano200, embora, bem
entendido, no ar a pergunta a propósito de que valores referenciam os aludidos direitos,
dada a comunicabilidade dos mesmos com o planisfério conceitual dos direitos naturais.
O direito ambiental, também exemplificativamente,
equaciona o impacto do modelo capitalista com a preservação da natureza, comprovando
que economia e ecologia se completam, suscitando reflexões em torno de
desenvolvimento sustentável. Vive-se hoje no mundo da astronave em oposição ao
mundo pretérito do cowboy; naquele nada se perde, tudo se reaproveita, nada se dissipa,
nesse não havia limites para a presença do homem.
O fechamento dos sistemas exige que se compreenda que as
preocupações com a ecologia não são meramente estéticas ou de cunho ético-

197
KENNEDY, Paul. The Rise and Fall of the Great Powers, p. 347 e ss.
198
ZOLO, Danilo. Cosmopolis, p. 43.
199
HUNTINGTON, Samuel P. The Clash of Civilizations and the Remaking of World Order, p. 183 e ss.
200
PIOVESAN, Flavia. Direitos Humanos e Globalização, artigo in Carlos Ari Sundfeld e Oscar Vilhena
Vieira (coord.), op.cit., p. 195 e ss.
43

filosófico201. Realisticamente, a questão ecológica é uma questão social, e a questão


social só pode ser adequadamente trabalhada hoje como questão ecológica202.
Modelos tributários poderiam intervir positivamente203 , via
implemento de incentivos e de sanções positivas, mediante exações socio-ambientais204.
Problemas de soberania também emergem, por conta da internacionalização da Amazônia
e de ensaio em se transformar partes de nosso território em reserva ambiental
internacional.
Uma estratégia epistemológica para a construção de uma
racionalidade ambiental exige abordagem marcadamente interdisciplinar205, fundada no
respeito à vida206. Agarra-se em norma constitucional que imputa como direito
fundamental o direito a um meio ambiente ecologicamente equilibrado207.
Percebe-se que a globalização e o neoliberalismo projetam
grande impacto no direito brasileiro contemporâneo. De tal modo,
O novo paradigma que se afirma no atual horizonte das
ciências sociais, inclusive a jurisprudência, é portanto uma
dialética desses três vetores, a cibernética, referida ao
controle das condutas, a globalização, referida à
comunicação e o binômio capitalismo/neoliberalismo
referido aos espaços político, econômico e ético da
sociedade. Esses fatores repercutem na época atual e
interferem na compreensão do direito, como aliás o faz em
relação a todos os setores da vida humana208.

De modo a se comprovar a assertiva, o trabalho avança


identificando os reflexos da globalização e do neoliberalismo no direito brasileiro, com
estações nos direitos constitucional, administrativo, do trabalho, tributário, processual,
civil e do consumo. O processo de miniaturização do Estado, em andamento, restringe
direitos historicamente conquistados, limita avanços normativos de sabor mais

201
NUSDEO, Fábio. Curso de Economia, Introdução ao Direito Econômico, p. 365.
202
DERANI, Cristiane. Direito Ambiental Econômico, p. 141.
203
BROWN, Lester R. Eco-Economy, p. 233 e ss.
204
MODÉ, Fernando Magalhães. Tributação Ambiental- a Função do Tributo na Proteção ao Meio
Ambiente, p. 95 e ss.
205
LEFF, Enrique. Epistemologia Ambiental, p. 59 e ss.
206
GILLESPIE, Alexander. International Environmental Law Policy and Ethics, p. 150 e ss.
207
LEITE, José Rubens Morato. Dano Ambiental : do Individual ao Coletivo Extrapatrimonial, p. 85 e
ss.
208
COELHO, Luiz Fernando. Saudades do Futuro, p. 33.
44

democrático, moldando uma sociedade individualista, centrada na competição e na


agressividade do agir, consolidando a ética capitalista.

2. Mundialização do Capital e Direito Brasileiro

2.1 Direito Constitucional

O direito constitucional é o maior foco de ataques

orquestrados pelas forças da globalização, no que toca à alteração de nosso modelo


normativo. O texto constitucional de 1988, por ter representado um reencontro com a
ordem democrática209, uma quebra em relação à ordem jurídica autoritária210 , uma certa
alegria (...) devida à sensação do bom trabalho realizado211, recebeu tratamento
canônico e fomentou certa idolatria constitucional que se arrasta desde os debates da
Assembléia Nacional Constituinte.
Porém a remodelação do Estado, como reflexo de novos
paradigmas de soberania e de ordem econômica, tem promovido modificações

209
COUTO, Ronaldo Costa. História Indiscreta da Ditadura e da Abertura, p. 343 e ss.
210
Não obstante a posição de Manoel Gonçalves Ferreira Filho, para quem não teria havido uma ruptura
revolucionária e consequentemente o texto de 1988 decorreria de um poder constituinte derivado.
FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves. Curso de Direito Constitucional, p. 27.
211
BASTOS, Celso Ribeiro. Curso de Direito Constitucional, p. 95.
45

substanciais, como a provar a admoestação de Marx, o filósofo de Trier, para quem tudo
que é sólido desmancha no ar, tudo que é sagrado será profanado212. A globalização
poderia ter promovido a realização concreta de um Estado cosmopolita, num sentido
habermasiano213; mas não o fez.
Percebem-se também efeitos da globalização em âmbito da
construção da problemática cidadania brasileira. É que, (...) a redução do papel do
Estado como fonte de direitos e como arena de participação, e o deslocamento da nação
como principal fonte de identidade coletiva214 promovem um descentramento dos pólos
de referência. Migrações conceituais entre esferas públicas e privadas bem ilustram a
assertiva, de modo que temas historicamente vinculados ao Estado, como segurança
pública, suscitam soluções que apontam para um pluralismo jurídico promovido dentro
das regras do jogo.
A justiça fica deslocada para os justiceiros que apresentam
programas noticiosos de televisão, nos quais apelam para o drama, banalizando a
violência, pintando as infrações com as tintas da tara, da inconsequência, de uma
criminologia lombrosiana muito fora de moda. São estes os verdadeiros mal feitores,
exploradores de modelos irracionais de representação social215. E ainda fazem votos,
povoando o legislativo algumas vezes com certa escória, que faz da malignidade
mefistofélica perene um modo de vida.
O Estado periférico atende às determinações do Império, a
entendermos este último como um conjunto de forças que orquestra o desenvolvimento
do capitalismo, a partir dos Estados Unidos, de alguns países da União Européia e do
Japão, de acordo com o pensamento de Michael Hardt e de Antonio Negri216. O fim das
soberanias e o nascimento de um modelo político único217, sacudindo as estadolatrias e as
teorias estadocêntricas218, promovendo uma americanização que marca a globalização

212
A famosa frase de Karl Marx é título do livro de Marshall Berman, All That is Solid Melts into Air,
obra que se propõe, entre outros, a problematizar o modernismo e a modernização.
213
FARIAS, Flávio Bezerra de. A Globalização e o Estado Cosmopolita- as Antinomias de Jurgen
Habermas, p. 89 e ss.
214
CARVALHO, José Murilo de. Cidadania no Brasil, o Longo Caminho, p. 225.
215
SANTOS, Boaventura de Sousa. A Crítica da Razão Indolente contra o Desperdício da Experiência, p.
197 e ss.
216
HARDT, Michael e NEGRI, Antonio. Empire, p. 183 e ss.
217
RICUPERO, Rubens. O Brasil e o Dilema da Globalização, p. 27 e ss.
218
BORON, Atílio A. Estado, Capitalismo e Democracia na América Latina, p. 243 e ss.
46

cultural219, sugere um estilo político que por falta de identificação mais apurada, carrega
o epíteto de pós-moderna.
E a imaginarmos um Estado pós-moderno220, presumimos
também um direito constitucional com feição pós-moderna. No sentir de Canotilho, um
direito constitucional pós-moderno seria um direito pós-intervencionista, caracterizado
por ser processualizado, dessubstantivado, neo-corporativo e ecológico221. Uma
constituição afinada com a pós-modernidade teria cariz reflexivo, garantindo mudanças a
partir da construção de rupturas222.
E dada uma carência de efeitos normativos e jurídicos,
processa-se uma concepção de constituição simbólica, plurívoca e autopoiética223. A
globalização exige intervenções rápidas, efetivas, pelo que se podem questionar
concepções que fracionavam as normas constitucionais quanto à aplicabilidade224,
recurso retórico que justificava a não efetividade de normas relegadas à condição de
programáticas ou de efeito contido.
Ameaçada por condição que a relega a mero documento
simbólico, intimidada por um reducionismo que a equipolaria ao hino nacional ou a
bandeira, a constituição vive uma crise, aprofundada pela proliferação de emendas
constitucionais e pela dúvida quanto à convocação de uma nova constituinte. O
constitucionalismo e os constitucionalistas poderiam aproveitar essas aporias e
ambivalências, assimilando a mudança de paradigmas, mediante a implementação de
soluções normativas criativas, repensando-se a função do Direito nas sociedades
modernas225.

Roberto Campos, o mais ferrenho defensor do neoliberalismo


no Brasil, e que foi constituinte na assembléia de 1986, alertara veementemente para
incompatibilidades entre a Constituição que então se escrevia e se promulgava e o mundo

219
BRUNNER, José Joaquim. Globalización Cultural y Posmodernidad, p. 151 e ss.
220
FARIAS, Flávio Bezerra de. O Estado Capitalista Contemporâneo- para a Crítica das Visões
Regulacionistas, p. 45 e ss.
221
CANOTILHO, J.J. Gomes. Direito Constitucional, p. 13.
222
CANOTILHO, J.J. Gomes. op.cit., p. 14.
223
NEVES, Marcelo. A Constitucionalização Simbólica, p. 53 e ss.
224
SILVA, José Afonso da. Aplicabilidade das Normas Constitucionais, p. 35 e ss.
225
UNGER, Roberto Mangabeira. Law in Modern Society, p. 134 e ss.
47

globalizado, que em meados da década de 1980 tomava as feições que hoje o marcam.
Assim,
Os estudiosos de Direito Constitucional aqui e alhures não
buscarão no novo texto lições sobre arquitetura institucional,
sistema de governo ou balanço de poderes. Em
compensação, encontrarão abundante material anedótico.
Que constituição no mundo tabela juros, oficializa o calote,
garante a imortalidade dos idosos, nacionaliza a doença e dá
ao jovem de dezesseis anos, ao mesmo tempo, o direito de
votar e de ficar impune nos crimes eleitorais ? Nosso título
de originalidade será criarmos uma nova teoria
constitucional : a do ‘progressismo arcaico”226.

Roberto Campos profetizava que a Constituição que então


fazíamos nos colocava na contra-mão do processo de globalização inspirado pelo
neoliberalismo que o mundo então vivia. O excesso de regulamentação, o velho apego ao
Estado de bem-estar social denunciado por F. Hayek, Miltom Friedman e Karl Popper
nos alijaria da distribuição das benesses que esse ambiente de globalização estaria prestes
a nos proporcionar. E escrevia o diplomata,
Que contibuição trará a nova Constituição para inserir o
Brasil nessa onda modernizante ? Rigorosamente, nenhuma.
O Brasil está desembarcando do mundo. Em vez da ‘
desregulamentação ‘ , o Estado fará planos globais e
normatizará a atividade econômica. Em vez de encorajar o
Poder Executivo a intensificar a privatização, amplia-se o
monopólio da Petrobrás, nacionaliza-se a mineração, a
União passa a ser proprietária e não apenas admnistradora
do subsolo, os governos estaduais falidos terão o monopólio
do gás canalizado. Enquanto a Inglaterra, o Japão e a
Espanha, entre outros, privatizam suas grandes empresas
telefônicas, o Brasil transforma em monopólio estatal todas
as telecomunicações, inclusive a transmissão de dados. Na
sociedade de informação isso representa enorme
concentração de poder nas mãos da ‘nomenklatura’ estatal,
sujeita a frequentes perversões ideológicas227.

Roberto Campos indignava-se com uma Constituição que


reputava de promiscuísta228, que reconhecia um salário-mínimo nacionalmente unificado,

226
CAMPOS, Roberto. O Século Esquisito, p. 198.
227
CAMPOS, Roberto. op.cit., p. 197.
228
CAMPOS, Roberto. op.cit., p. 192.
48

garantindo ao peão de Piancó salário igual ao do trabalhador do ABC paulista229.


Lamentava que a Constituição promete-nos uma segurança social sueca com recursos
moçambicanos230. Motejou do texto de 1988 em post scriptum que redigiu em artigo de
jornal, um pouco antes da promulgação daquela carta :
P.S. Logo após a promulgação pedirei, como idoso, um
‘mandado de injunção‘ para que o Bom Deus seja notificado
de que tenho garantia de vida, mesmo na ocorrência de
doenças fatais (art. 233), sendo portanto inconstitucional
afastar-me de meus compromissos terrestres231.

Para Roberto Campos a Constituição de 1988 era


saudavelmente libertária no político, cruelmente liberticida no econômico,
232
comoventemente utópica no social . Para o criador do BNDE os constituintes haviam
extrapolado o mandado que o povo lhes conferira, avançado em todos os temas da vida
nacional, de forma irresponsável e anacrônica, promovendo uma antinomia entre o
processo de globalização e nossa estrutura constitucional. Escrevera ele,
Durante a gravidez e parto da nova Constituição, os
constituintes brincaram de Deus. Concederam imortalidade
aos idosos. Aboliram a pobreza por decreto. Legislaram
custos, acreditando que legislavam benefícios. Tabelaram
juros, esquecendo-se de que o governo é o principal
demandante de crédito. Dificultaram despedidas, sem se dar
conta de que assim desencorajariam novas contratações. O
resultado dessas frivolidades será mais inflação e menos
emprego. Nem chegaram a aprender que, num país sem
inimigos externos que lhe ameacem a sobrevivência o
verdadeiro nacionalismo é criar empregos233.

Roberto Campos divulgava que uma nova Constituição seria


insuficiente para promover melhora nas condições de vida dos brasileiros. Alertava que o
excesso de apego à forma, que denominava de constitucionalite, em nada resolveria
problemas estruturais. Por isso,
O povo percebe que a ‘constitucionalite’ não lhe melhorou
as condições de vida. Aliás, se isso acontecesse, os ingleses
estariam perdidos, pois não têm constituição escrita. E os
229
CAMPOS, Roberto. op.cit., p. 194.
230
CAMPOS, Roberto. op.cit., p. 195.
231
CAMPOS, Roberto. op.cit., loc.cit.
232
CAMPOS, Roberto. op.cit., p. 199.
233
Robeto Campos, op.cit., p. 205.
49

japoneses ainda pior, pois sua constituição foi escrita pelos


americanos vitoriosos na guerra. Ante a prosperidade
japonesa, chegar-se-ia à bizarra conclusão que a melhor
constituição é a escrita pelos inimigos234...

A distância entre a realidade e o universo constitucional


intrigava o senador Roberto Campos, que denunciava a utopia que envolvia e emulava o
modelo constitucional que então que se produzia. A Constituição de 1988 promovia uma
catarse nacional, após o longo jejum que a Era Militar impusera ao país. Como a
comprovar o pacifismo de nosso povo, fazia-se uma nova carta política sem ter havido
ruptura jurídica235.
Tinha-se que a assembléia constituinte operava o resgate de
nossa dignidade236, à luz de um postulado liberal que plasmava uma sociedade civil
acima do Estado237. Roberto Campos percebia certo açodamento na trajetória da
Assembléia Constituinte e provocava,
Segundo o primeiro-ministro do trabalhismo inglês, James
Calaghan, nada mais perigoso do que a feitura dos textos
constitucionais. Isso desperta o instinto utópico adormecido
em cada um de nós. E todos somos tentados a inscrever na
Constituição nossa utopia particular. Foi o que aconteceu. É
utopia, por exemplo, decretar que prevaleça no Nordeste um
salário mínimo igual ao de São de Paulo. É utopia dar
garantia de vida, ou seja, a imortalidade, aos idosos. É
utopia imaginar que num país que precisa exportar
competitivamente se possa ao mesmo tempo encurtar o
horário de trabalho e expandir os benefícios sociais238.

O Brasil aproximava-se de um modelo que os portugueses


estavam prestes a abandonar, como condição para entrada na comunidade européia,
configurando-se um desses paradoxos e dramas do direito contemporâneo239. Traslada-se
um modelo normativo de pós-guerra, prenhe de preocupações sociais240, oposto ao
período de influência iluminista, síntese da evolução do ciclo evolutivo do direito

234
CAMPOS, Roberto. op.cit, p. 209.
235
TEMER, Michel. Constituição e Política, p. 115.
236
ANDRADE, A. Couto de. Constituinte- Assembléia Permanente do Povo, p. 19.
237
WOLKMER, Antonio Carlos. Ideologia, Estado e Direito, p. 62.
238
CAMPOS, Roberto. op.cit., loc.cit.
239
CUNHA, Paula Ferreira da. Para uma História Constitucional do Direito Português, p. 427.
240
COSTA, Mário Júlio de Almeida. História do Direito Português, p. 483.
50

canônico na península ibérica241, e pelo coletivismo português esquecido. Escarnecendo


da circunstância, escreveu Roberto Campos:
Para infelicidade dos brasileiros, a nova Constituição entrou
para o anedotário mundial. A piada dos lusitanos é que os
brasileiros botaram na nova Constituição tudo o que os
portugueses querem tirar da deles. Como não considerar
anedótico um texto que, na era dos ‘mercados comuns’,
declara o mercado interno um ‘patrimônio nacional’? Na
era dos mísseis balísticos, declara fundamental para a defesa
nacional uma área de até 150 quilômetros ao longo das
fronteiras ? Como singularizar os advogados como
‘insubstituíveis na administração da justiça’, quando todos
nos queremos livrar deles nos juizados de pequenas causas e
nos desquites amigáveis ?242

Ainda criticando a aproximação conceitual de nossa


constituição com a de Portugal, escreveu Roberto Campos:
A desastrosa Constituição de 1988- inspirada pela
portuguesa, da qual os lusitanos se arrependeram quando se
deram conta de que haviam sido cravados pela ‘ revolução
dos cravos’ – representou, para usar feliz expressão do
professor Paulo Mercadante, um ‘avanço do retrocesso´243.

E em outro texto, Roberto Campos com extremo rigor


persistia na crítica ao romantismo do texto de 1988:
A Constituição brasileira de 1988, triste imitação da
Constituição portuguesa de 1976, oriunda da Revolução dos
Cravos, levou ao paroxismo a mania das Constituições
‘dirigentes’ ou ‘intervencionistas’. Esse tipo de constituição,
que se popularizou na Europa após a Carta Alemã de
Weimar, de 1919, tem pouca durabilidade. Ao contrário da
mãe das Cartas Magnas democráticas- a Constituição de
Filadélfia- que é , como diz o professor James Buchanan, a
‘política sem romance’, as constituições recentes fizeram o
‘romance da política’. Baseiam-se em dois erros. Primeiro, a
‘arrogância fatal’, de que nos fala Hayek, de pensar que o
processo político é mais eficaz que o mercado na promoção
do desenvolvimento. Segundo, a ideia romântica de que o
Estado (...) é uma entidade benevolente e capaz. Esse idiotice

241
SILVA, Nuno J. Espinosa Gomes da. História do Direito Português, p. 363.
242
CAMPOS, Roberto. op.cit., p. 210.
243
CAMPOS, Roberto. Antologia do Bom Senso, p. 301.
51

foi mundialmente demolida com o colapso do socialismo na


inesperada Revolução de 1989/91, no Leste Europeu244.

Deve-se concordar com os vaticínios de Roberto Campos ou


então deve-se admitir que o panorama constitucional brasileiro contemporâneo acena
com retrocessos e com perda de direitos, como reflexos do processo de globalização. As
emendas constitucionais até o presente aprovadas (e outras virão) identificam esse
movimento. A cotejarmos alterações e reformas com o texto originário, descortinam-se
insuspeitas inconstitucionalidades nos enxertos constitucionais, a admitir-se a validade do
pensamento de Otto Bachof, que nos dava conta de inconstitucionalidade de leis de
alteração da Constituição245.
Percebe-se concretamente que o nacionalismo que engendrou
o texto de 1988 passa por descarado desmonte. Dele não restam mais do que escombros.
Seguem alguns exemplos.
A emenda constitucional de número 5 suprimiu o monopólio
estatal na distribuição do gás. A redação original indicava que cabe aos Estados explorar
diretamente, ou mediante concessão a empresa estatal, com exclusividade de
distribuição, os serviços locais de gás canalizado. Por força da emenda, lê-se agora que
cabe aos Estados explorar diretamente, ou mediante concessão, os serviços locais de gás
canalizado, na forma da lei, vedada a edição de medida provisória para sua
regulamentação. Elimina-se a concessão a empresa estatal, permitindo-se regime de
concessão.
A emenda constitucional de número 6 suprimiu benefícios
para as empresas de capital nacional e a reserva de mercado no subsolo.
Substancialmente, trocou-se empresa brasileira de capital nacional da redação originária
do parágrafo 1º do artigo 176 para empresa constituída sob as leis brasileiras e que tenha
sua sede e administração no país.
A emenda constitucional de número 7 suprimiu reserva de
mercado na navegação interna. A nova redação do artigo 178 da Constituição eliminou

244
CAMPOS, Roberto. op.cit. , p. 322.
245
BACHOF, Otto. Normas Constitucionais Inconstitucionais?, p. 52 e ss.
52

sumariamente a predominância dos armadores nacionais e navios de bandeira e registro


brasileiros e do país exportador e importador.
A emenda constitucional de número 8 suprimiu o monopólio
estatal nas telecomunicações. A redação originária do artigo 21, XI declinava que é
competência da União explorar, diretamente ou mediante concessão a empresas sob
controle acionário estatal, os serviços telefônicos, telegráficos, de transmissão de dados
e demais serviços públicos de telecomunicações, assegurada a prestação de serviços de
informações por entidades de direito privado através da rede pública de
telecomunicações explorada pela União. De acordo com o texto emendado tem-se que é
competência da União explorar, diretamente ou mediante autorização, concessão ou
permissão, os serviços de telecomunicações, nos termos da lei, que disporá sobre a
organização dos serviços, a criação de um órgão regulador e outros aspectos
institucionais. Alterou-se também o inciso XII, alínea a, do aludido artigo da
constituição. A redação pretérita mencionava que compete à União explorar, diretamente
ou mediante autorização, concessão ou permissão os serviços de radiodifusão sonora, de
sons e imagens e demais serviços de telecomunicações. O texto remendado consubstancia
que compete à União explorar, diretamente ou mediante autorização, concessão ou
permissão os serviços de radiodifusão sonora e de sons e imagens. Com a exclusão dos
demais serviços de comunicações, promoveu-se laconismo ensejador de Estado mínimo.
A emenda constitucional de número 9 suprimiu o monopólio
estatal na produção de petróleo. Alterou-se o conteúdo do artigo 177 da redação
primitiva, que indicava como monopólio da União a pesquisa e a lavra das jazidas de
petróleo e gás natural e outros hidrocarbonetos fluídos; a refinação do petróleo nacional
ou estrangeiro; o transporte marítimo do petróleo bruto de origem nacional ou de
derivados básicos de petróleo produzidos no País, bem como assim o transporte, por
meio de conduto, de petróleo bruto, seus derivados e gás natural de qualquer origem.
Nos termos da emenda em apreço a União ficou autorizada a contratar com empresas
estatais ou privadas a realização das atividades previstas na redação originária do artigo
177, acima reproduzidas.
A emenda constitucional de número 16, de 4 de junho de
1997, permitiu a reeleição do presidente da república, propiciando a continuidade,
53

naquele instante, das reformas neoliberais. A emenda constitucional de número 19 deu


forma à nova administração pública brasileira, permitindo demissão de servidores por
mau desempenho ou se a folha de pagamentos superar 60 % da receita. Modificou-se
realisticamente o artigo 37 do texto originário. Por exemplo, o direito de greve estava
originariamente limitado por aspectos definidos por lei complementar. Com a emenda em
vigor, exige-se apenas lei específica. Proibiu-se a vinculação ou equiparação de
quaisquer espécies remuneratórias para o efeito de remuneração de pessoal do serviço
público, em substituição a provisão anterior que excepcionava a regra aos servidores da
administração direta, para quem previa-se isonomia de vencimentos para cargos de
atribuições iguais ou assemelhadas do mesmo Poder ou entre servidores dos Poderes
Executivo, Legislativo e Judiciário.
A emenda constitucional de número 20 deu início à reforma
da previdência social, em âmbito de serviço público. Aposentadoria voluntária passa a
exigir tempo mínimo de dez anos de efetivo exercício no serviço público e cinco anos no
cargo efetivo em que se dará a aposentadoria, conquanto que aos 60 anos de idade e 35
anos de contribuição se homem, e 55 anos de idade e 30 contribuição, se mulher, para
efeitos de percepção de proventos integrais e 65 anos de idade, se homem, e 60 anos de
idade, se mulher, com proventos proporcionais ao tempo de contribuição. Anteriormente
não havia restrições de idade e aposentava-se voluntariamente aos trinta e cinco anos de
serviço se homem e aos trinta, se mulher.
A emenda constitucional de número 27 possibilitou a
desvinculação das receitas da União, incluindo-se o artigo 76 no Ato das Disposições
Constitucionais Transitórias. Possibilita-se que a União gerencie mais vinte por cento da
arrecadação de impostos e contribuições sociais já instituídos ou que vierem a ser criados
no período de 2000 a 2003.
A emenda constitucional de número 28 alterou os prazos
prescricionais para as ações trabalhistas rurais. De tal modo, o artigo 7º , inciso XXIX do
texto constitucional passou a disciplinar que o direito a ação, quanto aos créditos
resultantes das relações de trabalho, conta com prazo prescricional de cinco anos para
os trabalhadores urbanos e rurais, até o limite de dois anos após a extinção do contrato
de trabalho.
54

A emenda constitucional de número 30 permitiu o


parcelamento de precatórios judiciários, alterando-se a redação original do artigo 100 do
texto primitivo, assim como também do artigo 78 do Ato das Disposições Constitucionais
Transitórias. A reformulação permite dilação nos modelos de pagamento da União
Federal, de quantias devidas em juízo, flexibilizando a utilização das verbas previstas em
orçamento.
A emenda constitucional de número 39 permitiu a criação
das taxas de iluminação municipais, instituindo contribuição para custeio de serviço de
iluminação pública nos municípios e distrito federal. Autoriza-se a cobrança da aludida
exação na fatura de consumo de energia elétrica. Possibilitou-se nova frente de cobrança
por parte dos municípios, que vêm sendo prejudicados em seus quinhões de fundo de
participação, devido ao fato de que a União vem ampliando sua base de cobrança por
meio de contribuições, que de acordo com a Constituição não precisam ser pulverizadas
entre os outros entes da federação.
A emenda constitucional de número 40 revogou a limitação
das taxas de juros reais a 12 % ao ano246. Esta emenda representa um tiro de misericórdia
na expectativa de que uma normatividade essencialmente política seria capaz de dominar
a contingência da realidade capitalista. A economia fez o direito a ela se curvar, e
reiteradas posições do judiciário, que não sufragava a ineficiente regulamentação dos
juros, já reconheciam essa realidade.
O mercado percebia o capricho do legislador constituinte
como uma estultice e apostava no desdobramento da questão, que penderia para os
aspectos fáticos que regem o tema. O constituinte tentara engessar Shylock, o arrogante
Mercador de Veneza, no parágrafo 3º do artigo 192 do texto original, limitando os juros
reais aos 12% ao ano. Venceram as forças do mercado, que desacorrentaram o sedento
usurário. Triunfou uma lógica afinada com uma suposta eficiência. Afinal,
As palavras de ordem são eficiência e lucro. As empresas e
os indivíduos que não se adaptam à economia de mercado
globalizada, não merecem sobreviver. A concorrência se
torna brutal, num estado de barbárie carreado pela seleção
‘natural’ do mercado. Natural, como se houvesse igualdade
de oportunidades para assegurar uma competição justa, que
246
Folha de São Paulo, 5 de outubro de 2003.
55

permitisse indistintamente o acesso a condições dignas para


empresas e indivíduos verdadeiramente mais competentes, e
que não subsistissem simplesmente pela detenção de maior
poder econômico, habilmente travestido e apresentado como
maior ‘eficiência’247.

Perspectiva que reflete pensamento a partir do direito


denuncia que vivemos, nesta quadra da vida nacional, uma fase aguda de crise do Estado
e do direito, como o demonstram as Emendas Constitucionais em curso, propugnadas
pelo Governo Federal248. É que essa crise configura um direito reflexivo, cujas fronteiras
internas se perdem em consequência de demandas exageradas por intervenção249, feitas
em nome do neoliberalismo que advoga a não intervenção.
Efetivamente, a própria ordem democrática pode estar em
jogo, uma vez que
o delicado equilíbrio entre a liberdade econômica e a
atuação do Estado na ordem econômica, em suas diversas
modalidades, assinala, sem dúvida, um ponto decisivo para o
sucesso ou não do sistema político democrático nos diversos
Estados da atualidade devotados aos valores da liberdade e
da igualdade250.

O problema da liberdade e do Estado como resistência ao


251
absolutismo ganha nova dimensão. Novas formas de absolutismo desenham-se no
horizonte, disfarçadas em devastadoras de um Estado que condenam. Desnacionalizar,
desestatizar, desconstitucionalizar, desregionalizar, são os novos verbos conjugados pela
voz neoliberal252, e o próprio relativismo da soberania denuncia uma qualidade e não um
poder em si253, especialmente porque enlaça um novo conceito, que tradicionalmente

247
SILVEIRA, Eduardo Teixeira. Globalização e Neoliberalismo: o direito de concorrência entre
empresas nacionais e transnacionais, in Revista de Direito Constitucional e Internacional, n. 40,
julho/setembro de 2002, p. 69.
248
ARAÚJO, Aloízio Gonzaga de Andrade. O Brasil e o Mundo Globalizado, in Revista da OAB, n. 65,
julho/dezembro de 1997, p. 13.
249
REICH, Norbert. Intervenção do Estado na Economia ( Reflexões sobre a Pós-Modernidade na Teoria
Jurídica ), artigo in Revista de Direito Público, n. 94, abril/junho de 1990, p. 266.
250
RAMOS, Elival da Silva. O Estado na Ordem Econômica, artigo in Revista de Direito Constitucional e
Internacional, n. 43, abril/junho de 2003, p. 56.
251
BONAVIDES, Paulo. Do Estado Liberal ao Estado Social, p. 39 e ss.
252
BONAVIDES, Paulo. A Globalização e a Soberania, Aspectos Constitucionais, artigo, in Revista TST,
Brasília, vol. 67, n. 1, jan/mar/ 2001, p. 127.
253
PAULA, Vera Cecília Abage de. Aspectos do Relativismo da Soberania : Contribuição ao Estudo,
artigo in Revista da Faculdade de Direito da Universidade Federal do Paraná, n. 33, 2000, p. 121.
56

pugna pela prevalência dos direitos humanos254. Nesse contexto, formata-se o redesenho
de nossa engenharia constitucional. Assim,
O século XXI chegou e a humanidade, além de não ter
conseguido conquistar o espaço cósmico, vem destruindo o
seu único habitat. No Brasil de contrastes, o direito
constitucional alcançou prestígio teórico com grandes
doutrinadores, mas vem dia a dia suportando o retalhamento
da Constituição e o esvaziamento dos direitos fundamentais
de forma tão nítida quanto assustadora255.

O movimento de desconstitucionalização provoca debates


em torno da plausibilidade de textos constitucionais sintéticos ao invés de textos
constitucionais analíticos256, o que invariavelmente conduz a ensaios comparativos com a
hermenêutica constitucional norte-americana. Percebe-se que textos analíticos, como o
nosso, exigem mudanças instrumentais na constituição, enquanto que textos sintéticos,
como o norte-americano, que contém 4000 palavras, possibilitam meras mudanças
exegéticas.
Já observou-se que a constituição norte-americana deveria
ser percebida a partir de seu terreiro econômico, dado que garantiria o liberalismo e o
grande capital257. O antagonismo entre o liberalismo dos democratas258 e o
conservadorismo dos republicanos259 promove um ativismo judicial260 que se opõe a um
textualismo radical, sentido na jurisprudência reacionária de alguns juízes da Suprema
Corte norte-americana, como Antonin Scalia261, Clarence Thomas262 e Sandra Day
O’Connor263.

254
BERARDO, Telma. Soberania, um Novo Conceito, artigo in Revista de Direito Constitucional e
Internacional, n. 40, julho/setembro de 2002, p. 43.
255
FREIRE JÚNIOR, Américo Bedê. 2001 Uma Constituição no Espaço, artigo in Revista Tributária e de
Finanças Públicas, n. 40. setembro/outubro de 2001, p. 250.
256
TEMER, Michel. Revisão Facilitada da Constituição, artigo, Folha de São Paulo, 22 de outubro de
2003.
257
BEARD, Charles A. An Economic Interpretation of the Constitution of the United States, p. 253 e ss.
258
RUTLAND, Robert Allen. The Democrats- From Jefferson to Clinton, especialmente p. 202 e ss.
259
RUTLAND, Robert Allen. The Republicans- From Lincoln to Bush, especialmente p. 239 e ss.
260
POWE JR., Lucas A. The Warren Court and American Politics, p. 217 e ss.
261
SCALIA, Antonin. A Matter of Interpretation, p. 9.
262
GERBER, Scott Douglas. First Principles- the Jurisprudence of Clarence Thomas, p. 191 e ss.
263
O’CONNOR, Sandra Day. The Majesty of the Law- Reflections of a Supreme Court Justice, p. 237 e
ss.
57

Minimalismo judicial toma conta da Suprema Corte dos


264
Estados Unidos , que não faz muita questão de procurar direitos não textualmente
265
enumerados , pelo que objeto de críticas de setores acadêmicos266, que percebem efeitos
da globalização nessa nova ordem constitucional267, que também os afeta, em temas
econômicos e normativos268. Pode-se contemporaneamente ensaiar-se um movimento de
crítica normativa, questionando-se a imparcialidade da constituição269, desmistificada
com a revelação dos conflitos que se dão no interior da Suprema Corte270.
Já no Brasil, por causa de nossa fragilidade institucional,
plasmada no embate que envolve sociedade civil e comunidade271, os efeitos
constitucionais da globalização parecem ser mais relevantes em âmbito de
regulamentação econômica, o que inconteste com a promulgação da emenda
constitucional de número 40. Redimensiona-se o princípio da eficiência272, tão caro a
movimento da jurisprudência norte-americana que vincula o direito à economia273,
perspectiva que revela forte tendência utilitarista274.
A universalidade abstrata do direito do modo de produção
capitalista275 permite que novas ordens sejam engendradas, na proteção da suposta
expansão da capacidade produtiva do ser humano276. Trata-se, efetivamente, de uma
questão de soberania :
Países hoje chamados de “ emergentes “ dependem quase
todos, igualmente, de recursos financeiros emergenciais para
combater a volatibilidade de mercados financeiros expostos
à corrida internacional de capitais. Esses recursos são
concedidos por organizações financeiras internacionais, tais
como o FMI e o Banco Mundial, mediante a imposição de
cartilhas invariáveis, que demonstram como deve ser a
política econômica de cada país socorrido. As políticas de
264
SUNSTEIN, Cass R. One Case at a Time, p. 24 e ss.
265
TRIBE, Lawrence H. e DORF, Michael C. On Reading the Constitution, p. 45.
266
TUSHNET, Mark. Taking the Constitution Away from the Courts, p. 154 e ss.
267
TUSHNET, Mark. The New Constitutional Order, p. 142 e ss.
268
SMITH, Rogers M. Liberalism and American Constitutional Law, p. 138 e ss.
269
SUNSTEIN, Cass R. The Partial Constitution, p. 347.
270
COOPER, Phillip J. Battles on the Bench, p. 152 e ss.
271
REALE, Miguel. Questões de Direito Público, p. 29 e ss.
272
FONSECA, João Bosco Leopoldino da. Direito Econômico, p. 35.
273
POSNER, Richard. Economic Analysis of Law, p. 17.
274
POSNER, Richard. The Economics of Justice, p. 13 e ss.
275
GRAU, Eros Roberto A Ordem Econômica na Constituição de 1988- Interpretação e Crítica, p. 21.
276
VIDIGAL, Geraldo de Camargo. Teoria Geral do Direito Econômico, p. 176.
58

juros praticadas por países economicamente poderosos são


decisivas para a orientação das políticas públicas da
periferia do sistema capitalista277.

Valendo-se de realinhamento constitucional enquanto


metáfora, Oscar Vilhena Vieira admite que os sistemas constitucionais vêm sendo
fortemente pressionados por diversas demandas impostas por um cenário internacional
em rápida reconfiguração278.
Por outro lado, opinando pela luta pela manutenção do
modelo constitucional vigente, Adroaldo Leão adverte que as mudanças e tendências do
constitucionalismo pós-moderno não poderão distanciar-se da proteção internacional
aos direitos do homem, como meio de conter práticas abusivas dos Estados, de grupos
intermediários, do poder econômico paralelo e das descobertas científicas contrárias à
dignidade da pessoa humana279.
A maior parcela de reformas constitucionais indicativas desta
nova ordem globalizante deu-se durante os dois mandatos do presidente Fernando
Henrique Cardoso280, que também ocupou-se de outros temas da agenda modernizante e
neoliberal, a exemplo da questão da privatização das estatais. As relações entre executivo
e legislativo forçaram ao implemento de certas alianças necessárias, responsáveis por
muitas críticas ao modelo de coligações justificadoras de acordos congressuais281.
Percebe-se consequentemente que as modificações que a
globalização e o neoliberalismo imprimem no direito constitucional brasileiro suscitam
três atitudes conceituais. Leitura neoliberal dos acontecimentos recentes permite um
sorriso sardônico, típico daqueles que acham que o tempo confirmou as questões
levantadas no passado, quanto se hostilizou o romantismo e a utopia do texto de 1988.

277
AGUILAR, Fernando Herren. Direito Econômico e Globalização, in Carlos Ari Sundfeld e Oscar
Vilhena Vieira (coord.), Direito Global, p. 271.
278
VIEIRA, Oscar Vilhena. Realinhamento Constitucional, in Carlos Ari Sundfeld e Oscar Vilhena
Vieira, op.cit., pg. 13.
279
LEÃO, Adroaldo. Globalização e o Constitucionalismo Pós-Moderno, in Adroaldo Leão e Rodolfo
Pamplona Filho (coord.), Globalização e Direito, p. 7.
280
GOERTZEL, Ted G. Fernando Henrique Cardoso e a Reconstrução da Democracia no Brasil, p.163
e ss.
281
CHAGAS, Helena, Relações Executivo-Legislativo, in LAMOUNIER, Bolívar (org.), A Era FHC, um
Balanço, p. 335.
59

Um sentir nostálgico pretende que se ocupe o espaço


perdido, mantendo-se a estrutura ideológica do texto, retoricamente encastelado em
divagações analíticas enclausuradas na ambivalência das chamadas cláusulas pétreas. Por
fim, um realismo pragmático reconhece que a marcha das reformas é necessária,
conquanto que não tão açodadas e socialmente irresponsáveis, o que pode parecer
entreguismo, e nem tão demoradas e claudicantes, o que pode indicar um teimoso apego a
um tempo que já não mais existe.

2.2 Direito Administrativo

A globalização e o neoliberalismo têm alterado

substancialmente o sentido de soberania e do próprio conceito de Estado, o que provoca


reflexos nos modelos de políticas públicas. Reformula-se o papel do Estado, que sofre
ataques daqueles que o pretendem mínimo e miniaturizado, de modo que a principiologia
do direito administrativo clássico passa por um tumultuado processo de reestruturação.
Mudanças no perfil do Estado promovem alterações
imediatas nas entidades e órgãos públicos, nos próprios agentes do Estado, na natureza
jurídica e operacional das administrações direta e indireta, no controle dos atos da
administração, na essência dos atos administrativos, nos contratos celebrados pela
administração, no conceito de bens públicos, na intervenção do Estado na propriedade, na
responsabilidade civil do Estado, nos servidores públicos, para referência apenas do que é
convencional e mais comum.
Transforma-se o direito administrativo, que passa a ser mais
consensual, dado que nosso tempo questiona o axioma da supremacia do interesse
público em face do interesse privado, como reflexo do fracionamento dos interesses
60

públicos em primários e secundários, a par do conteúdo da indisponibilidade dos


mesmos282.
A onda crescente de delegação de serviços públicos sugere
uma iniciativa privada complementar à atividade do Estado. Desregulamentação e
desburocratização anunciam esse novo Estado, que pretende promover uma cidadania de
usuários e de clientes. A questão das rodovias pedagiadas e mantidas pela iniciativa
privada ilustra essa convergência, sobremodo por causa do aumento indireto do ônus da
mantença do espaço público, por parte de particulares, que recolhem o pedágio, para que
possam transitar por rodovias de alta lucratividade para seus administradores.
O processo de privatizações ilustra aspectos perversos de
novo direito público que se desenha. Telesp, Vale do Rio Doce, Light, Embratel,
Usiminas, Companhia Siderúrgica Nacional, Cemig, Copesul, Rede Ferroviária Federal-
Sudeste, Açominas, Cosipa, Banerj, Banco Meridional, entre outras estatais, teriam
passado para o controle estrangeiro sem cautelas mínimas de estratégia, com altos custos
para a sociedade, que indiretamente teria financiado tais aquisições283.
O impacto da globalização em face do direito administrativo
é significativo a ponto de autor de muito prestígio ter indagado se o direito administrativo
atual estaria fadado a morrer284. Migrações conceituais emergem quando se analisam as
agências regulamentadoras independentes, a exemplo da ANATEL/ Agência Nacional de
Telecomunicações, da ANEEL/ Agência Nacional de Energia Elétrica, da ANP/ Agência
Nacional de Petróleo285. Leitura maliciosa pode perceber um papel de privatização da
função legislativa, em favor do perfil regulamentador dessas agências.
De imediato constata-se que na medida em que se incrementa
a transnacionalização, ocorre, paralelamente, uma diminuição do papel do Estado, com
o consequente retraimento da esfera pública286, engendrada em nichos nos quais os
fluxos comunicacionais são filtrados e sintetizados, a ponto de se condensarem em

282
DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo, p. 61.
283
BIONDI, Aloysio. O Brasil Privatizado, p. 38 e ss.
284
SUNDFELD, Carlos Ari. A Administração Pública na Era do Direito Global, in Carlos Ari Sundfeld e
Oscar Vilhena Vieira (coord.), op.cit., p. 164.
285
SUNDFELD, Carlos Ari. op.cit., p. 162.
286
LIMA, Abili Lázaro Castro de. Globalização Econômica, Política e Direito, p. 26.
61

opiniões públicas enfeixadas em temas específicos287. O sútil limite entre espaços


públicos e privados decorre do fato de que as políticas neoliberais apregoam que a
miniaturização do Estado implica a limitação do papel do Estado de criar restrições ao
livre mercado e à concorrência288.
O direito administrativo brasileiro foi formatado na tradição
burocrática portuguesa, quando cargos eram dispostos com base em critérios particulares
e não em razão de mérito289, com intensa influência da nobreza e do clero290,
especialmente porque a doutrina do direito não distingue e aparta, nos regimes
absolutos, as atividades do Estado, segundo critério da diversidade dos objetos, matérias
ou finalidades291.
Moldou-se o regime jurídico da administração brasileira na
forma do sistema lusitano, no qual o rei remunerava os nobres com honras, reminiscência
da designação romana das funções públicas292. As instituições da administração colonial
refletiam o entorno absolutista lusitano293, centralização administrativa reproduzida no
império294, na república velha295 e hiperpotencializada na ditadura militar296.
A transição para o regime civil foi consubstanciada na
Constituição de 1988, que romanticamente regulamentou um Estado de bem-estar social,
pelo que foi criticada por um de seus mais ardentes opositores, o arauto do
neoliberalismo no Brasil, Roberto Campos. O diplomata já denunciara que o texto
constitucional fora aprovado sem discussão de texto, mediante emendas de fusão, o que
nos garante exclusividade mundial na feitura de uma constituição de ouvido297.
Em tema de organização administrativa e modelo de Estado,
Roberto Campos escrevia que longe de progressista, a Constituição de 88 é retrógrada,

287
HABERMAS, Jurgen. Direito e Democracia, entre Facticidade e Validade, v. II, p. 92.
288
LIMA, Abili Lázaro Castro de. op.cit., p. 269.
289
SCHWARTZ, Stuart B. Burocracia e Sociedade no Brasil Colonial, p. XV.
290
SALGADO (COORD.), Graça. Fiscais e Meirinhos- A Administração no Brasil Colonial, p. 25.
291
LIMA, Ruy Cirne. Princípios de Direito Administrativo, p. 26.
292
CAETANO, Marcelo. História do Direito Português, p. 226.
293
FAUSTO, Boris. História do Brasil, p. 63 e ss.
294
SODRÉ, Nelson Werneck. Panorama do Segundo Império, p. 272 e ss.
295
SILVA, Hélio. 1889: A República não Esperou o Amanhecer, p. 297 e ss.
296
SODRÉ, Nelson Werneck .Do Estado Novo à Ditadura Militar, p. 246 e ss.
297
CAMPOS, Roberto. O Século Esquisito, p. 189.
62

refletindo doutrinas superadas de hipertrofia estatal298. Roberto Campos criticava a


fixação com a constituição, que ele nominava de constitucionalite, de diarréia
constitucional299 ; querem seus prosélitos acreditar que a caudalosa onda de emendas
constitucionais teria confirmado o vaticínio do politicólogo...
Em planisfério mais concreto, o direito administrativo
brasileiro é afetado pelo movimento da globalização e do neoliberalismo em relação aos
seguintes aspectos, todos relacionados à estrutura de um novo Estado, profundamente
marcado por problemas de legitimação300, potencializados por movimento indicativo de
preocupante apatia política301: agências reguladoras, serviços e servidores públicos.
As agências reguladoras prestam-se ordinariamente a
implementar a regulamentação do mercado, com vistas a impedir o abuso das empresas,
com o objetivo de garantir excelência e padrões de qualidade. De modo a realizar seus
fins, as agências exercem independência de ação, para que possam definir políticas e
estratégias setorizadas.
Concebidas originariamente pelo direito norte-americano, as
agências independentes (independent agencies) regulamentam ostensivamente inúmeros
aspectos do modelo administrativo, a exemplo de transportes, alimentação e remédios302,
agindo formal e informalmente303, sob mais próxima orientação dos princípios que
norteiam o poder executivo304 naquele país, centrado em apanágios de eficiência305, que
tornam o direito conjunto normativo ancilar do desenvolvimento econômico.
A inadequação do Estado de feição tradicional suscitou por
parte do direito administrativo brasileiro uma certa assimilação e adaptação das agências
norte-americanas, com a criação por lei de similares nacionais. Eis as principais:
A Aneel –Agência Nacional de Energia Elétrica, foi fundada
em 1996 com objetivos de definir política de concorrência no setor, licitar a concessão

298
CAMPOS, Roberto. Antologia do Bom Senso, p. 319.
299
CAMPOS, Roberto. Lanterna na Popa, p. 1184.
300
OFFE, Claus. Problemas Estruturais do Estado Capitalista, p. 314.
301
LIMA, Abili Lázaro Castro de. op.cit., p. 236.
302
BURNHAM, William. Introduction to the Law and Legal System of the United States, p. 196.
303
FARNSWORTH, E. Allan An Introduction to the Legal System of the United States, p. 153.
304
JOHNS, Margaret Z. e PERSCHBACHER, Rex R. The United States Legal System, an Introduction,
p. 68.
305
POSNER, Richard A. Economic Analysis of Law, p. 10.
63

das usinas geradoras de energia, fiscalizar a atuação de empresas geradoras e


distribuidoras de energia, com função essencial de criar e fiscalizar política de preços306.
A Anatel- Agência Nacional de Telecomunicações, foi
implementada em 1997, com desideratos de definir políticas, áreas de concessão,
licitação das mesmas, padrões mínimos de qualidade e universalização dos serviços de
telefonia nacional, a par de criação e fiscalização de política de preços307.
A ANP- Agência Nacional de Petróleo, foi criada em 1997,
com missão de definir política de concorrência no setor, abrir o mercado de petróleo e de
gás natural, conduzir licitação das áreas de exploração de petróleo e de gás natural, além
de fiscalizar as atividades relacionadas ao abastecimento nacional de combustíveis308.
A ANA- Agência Nacional de Águas, formada no ano de
2000, é responsável pelo implemento de uma política nacional de recursos hídricos, de
modo a encontrar soluções para o flagelo das secas, para o problema da poluição dos rios,
definindo preços e condições para uso dos rios309.
O CADE- Conselho Administrativo de Defesa Econômica,
moldado ainda em 1962, cuja vida concreta revestiu-se de factibilidade em 1994, com a
Lei 8884. O CADE é o órgão responsável por apurar (fiscalizar) situações de abuso de
poder econômico, decidindo-as (...)310.
A criação dessas agências radica em nova concepção de
Estado, de modo que a autonomia a elas outorgada decorre de tentativas de obtenção de
eficiência na gestão da coisa pública. Por issso,
A crise fiscal do Estado impõe a retomada do equilíbrio
orçamentário pela via da contenção do déficit público,
forçando uma reengenharia. Não se trata de cancelar
investimentos, remunerar mal serviços e servidores e não
honrar a dívida pública. A questão está na qualidade (e não
quantidade) do gasto, mudando o modelo de desempenho
(gestão), de acordo com um planejamento311.

306
Folha de São Paulo, 8 de setembro de 2003, p. B1.
307
Folha de São Paulo, 8 de setembro de 2003, loc.cit.
308
Folha de São Paulo, 8 de setembro de 2003, loc.cit.
309
Folha de São Paulo, 8 de setembro de 2003, loc.cit.
310
TAVARES, André Ramos. Direito Constitucional Econômico, p. 320.
311
SOUTO, Marcos Jurena Villela. Agências Reguladoras, artigo in Revista Tributária e de Finanças
Públicas, n. 33, julho/agosto de 2000, p. 153.
64

Efetivamente, a regulação que enseja a proliferação das


aludidas agências é mecanismo de diminuição do Estado, de desestatização. De tal modo,
Com a transferência de funções de utilidade pública, do setor
público para o privado, pela via de contratos de concessão, o
objetivo da função regulatória é fazer essa transferência
interessante para as três partes envolvidas – concedente,
concessionário e usuário. Para tornar o serviço acessível ao
usuário e remunerar os elevados investimentos, é preciso
diluir a cobrança das tarifas em contratos de longo prazo.
Ocorre que, raramente, os contratantes terão capacidade de,
no momento da negociação ou da estipulação das condições
e obrigações, conhecerem e prevenirem todas as situações
que podem ocorrer no futuro. Isso realça o papel do agente
regulador, que deve buscar interpretar, de forma isenta, os
princípios que orientaram a celebração do contrato, para
propor soluções através da mediação, e em caso de
insucesso, da arbitragem312.

Percebe-se íntima relação entre as agências regulamentadoras


e as emendas constitucionais que flexibilizaram o conteúdo originário que plasmava a
hipertrofia do Estado brasileiro. Alterações no monopólio estatal da distribuição do gás
(emenda 5), nas telecomunicações (emenda 8), na produção do petróleo (emenda 9), entre
outras, decorrentes de pressões para readequação do Estado em face do processo de
globalização, é que justificam concretamente a opção por essas agências. Também, as
mesmas são sintomas de fórmulas de reduções de estatais, e assim,
Embora as denominadas estatais tenham florescido
amplamente em décadas passadas, verificou-se que muitos
dos objetivos para os quais haviam sido engendradas
simplesmente não foram alcançados. Ademais, tornaram-se
muitas delas, máquinas pesadas na estrutura estatal,
reconhecendo-se em muitas um foco novo de corrupção. Foi
assim que na década de 80 iniciou-se, ainda que lentamente,
um movimento inverso, procurando afastar o Estado do setor
privado. Isto ocorreu com a alienação das estatais para a
iniciativa privada, com a quebra ou flexibilização de
monopólios estatais e com a concessão e permissão de
serviços públicos. Daí falar em privatização, desestatização
e desregulamentação313 .

312
SOUTO, Marcos Jurena Villela. op.cit., p. 157.
313
TAVARES, André Ramos. op.cit., p. 323 e 324.
65

O servidor público ganha também um outro sentido


conceitual e fatual. O regime jurídico e estatutário convencional314 sofre com um lugar
comum que a sociedade poderia referenciar, ao estigmatizar servidor e serviço com
supostas demãos de ineficiência. Recente movimento em prol da continuidade das regras
da aposentadoria no serviço público evidenciou essa situação.
É que sociedade que vive à beira do desemprego dificilmente
tomaria o lado daqueles que têm emprego público e que persistiriam na luta por uma
situação que se implementaria após a dissolução pelo tempo do vínculo de emprego, por
conta da aposentadoria.

Indiscutível que o papel midiático fora importante fator nesse


jogo de forças, pelo que se percebeu que a opinião pública demonstrava pouca simpatia
para com o movimento que então se esboçava, em favor da manutenção das regras de
aposentadoria no serviço público.
Um processo de limitação de direitos de servidores encontra-
se em andamento, e os efeitos da emenda constitucional número 19 em relação ao artigo
37 da Constituição parecem confirmar essa assertiva. A garantia de estabilidade no
serviço público, fixada no artigo 41 do texto constitucional, ganha foros de referencial
máximo, em tempos de desemprego. Percebe-se também no cotidiano da administração a
recorrência da utilização de serviços terceirizados (em regime de concorrência),
especialmente em setores de segurança e de limpeza.
O reflexo dá-se na nova caracterização do serviço público.
Originariamente, considerava-se como característico do serviço público ser prestado
pelo Estado (elemento subjetivo), visando à satisfação de necessidades coletivas
(elemento material), exercido sob um regime de direito público (elemento formal)315 .
O Estado liberal convencional percebia um serviço público
orientado para um pequeno volume de ações, a serem protagonizadas em campos de
presença estatal inafastável, a exemplo da segurança pública. Na medida em que o Estado
de bem-estar social foi formatado, com a adoção do ideário de John Maynard Keynes,

314
RIGOLIN, Ivan Barbosa. O Servidor Público na Constituição de 1988, p. 81 e ss.
315
TAVARES, André Ramos. op.cit., p. 291.
66

percebe-se um Estado que implementa atividades que qualificam permanente


intervenção, e que extrapolam para âmbitos industriais e comerciais.
O aparente triunfo do neoliberalismo, significando o reinado
do consumismo e da vida privada316, moldado para alguns moradores da cidade
moderna, seguros em suas casas à prova de ladrões em bairros arborizados317,
menoscaba o desenho tradicional de Estado. Percebe-se que se promove um novo direito
administrativo, cujos princípios e conceitos convergem para agências reguladoras e
servidores públicos detentores de laços tênues com a administração.
Somos todos atores de um novo espaço político, marcado por
um mal definido desencanto, disfarçado de baluarte de uma eficiência cujo passo é
determinado pelos guardiões dos emblemas do capitalismo, hoje eleitos à categoria de
mordomos da globalização.

2.3 Direito do Trabalho

O direito do trabalho parece ser o ambiente jurídico mais

suscetível às transformações decorrentes do processo de globalização. Está em perigo a


dignidade do trabalhador na presente conjuntura318. O direito do trabalho fixou-se no
passado em âmbito de direito privado, dada a ficção que presumia liberdade contratual
absoluta na celebração do pacto de emprego, então enfocado sob o prisma da autonomia

316
KUMAR, Krisham. Da Sociedade Pós-Industrial à Pós-Moderna, p. 146.
317
BAUMAN, Zygmunt. O Mal-Estar da Pós-Modernidade, p. 41.
318
GOMES, Dinaura Godinho Pimentel. A Dignidade do Trabalhador no Cenário da Globalização
Econômica, artigo, in Revista LTr, v. 66, n. 12, dezembro de 2002.
67

da vontade e consubstanciado no leading case norte-americano representado pelo caso


Lochner vs. New York319.
O aludido caso chegou à Suprema Corte dos Estados Unidos
em 1905. Joseph Lochner era o proprietário de uma panificadora e fora condenado por ter
desrespeitado lei do estado de Nova Iorque, que proibia que padeiros trabalhassem mais
de dez horas por dia. Lochner exigia que seus empregados labutassem além do permitido.
Dizia-se correto, que sua conduta era lícita, porque havia aquiescência do empregado,
que também estaria exercendo a liberdade de contratar. A questão foi apreciada pela
Suprema Corte norte-americana, que decidiu que a lei novaiorquina era
inconstitucional320. Promoveu-se indiscriminadamente a liberdade de contrato.
Todavia, o intervencionismo característico de meados do
século XX reenfocou o direito laboral, matizando-o com as premissas que informam o
direito público, coroando tendência conceitual que se desenhava nitidamente já em
Evaristo de Moraes321 e em Lindolfo Collor no plano menos acadêmico e mais político322.
A onda neoliberal contemporânea ensaia uma reprivatização dos cânones de interpretação
do direito do trabalho, processo que emerge como flexibilização das regras,
principalmente percebido no projeto de lei n. 5483/01 que pretende alterar o artigo 618 da
Consolidação das Leis do Trabalho323, fazendo prevalecer a convenção coletiva em
detrimento da legislação324.
O empresário vê-se forçado a competir em condições que
exigem mão-de-obra barata e manipulação de horários. Uma fúria neoliberal estaria
minando conquistas laborais construídas ao longo de penosa jornada histórica325. Suposto
anacronismo do contrato de trabalho326 exige esforço e vigilância redobrados dos juristas

319
GILLMAN, Howard. The Constitution Besieged, The Rise and Demise of Lochner Era Police Powers
Jurisprudence, p. 64 e ss.
320
SCHWARTZ, Bernard. A History of the Supreme Court, p. 193 e ss.
321
MORAES, Evaristo de. Apontamentos de Direito Operário, p. 23 e ss.
322
RUSSOMANO, Mozart Victor. Curso de Direito do Trabalho, p. 11.
323
Benedito Calheiros Bonfim, A Legislação Trabalhista e a Flexibilização, artigo in Revista de Direito
do Trabalho n. 108, p. 31.
324
GOMES, Dinaura Godinho Pimentel. op.cit., p. 66-12/1443.
325
SOUZA, Sérgio Alberto de. Direito, Globalização e Barbárie, p. 66 e ss.
326
DINIZ, José Janguiê Bezerra. O Direito e a Justiça do Trabalho diante da Globalização, p. 96 e ss.
68

para com os efeitos da globalização no direito laboral327. A reversão da concentração


industrial promove uma descompensação da migração setorial da mão-de-obra,
determinando a massificação do desemprego328, provocando o pânico, a adesão a
qualquer aceno de oportunidade de trabalho, a qualquer preço, sob quaisquer condições.
Reflexos da conjuntura internacional, marcada pela prática de
dumping social, pela qual os países abaixam salários e fazem de tudo para que seus
produtos sejam competitivos no mercado internacional, atingem a estrutura do direito
laboral, em proporções alarmantes. O trabalhador paga diretamente esta conta, pois
(...) nos dias que correm, sendo a nossa pátria, infelizmente,
quase sempre uma caixa de ressonância daquilo que
acontece lá fora, estamos no apogeu da onda
neoliberalizante, praticando uma reengenharia do Estado,
solapando as instituições, demolindo conquistas, encolhendo
a máquina administrativa, vendendo tudo (...)329 .

O texto constitucional de 1988 havia acenado com grandes


conquistas para a classe trabalhadora. Efetivamente, uma realidade econômica marcada
pela influência da onda neoliberal pretende anular aquela vitória de Pirro. Assim,
Após 21 anos de arrocho-político em virtude do regime
instalado pelos militares, a idéia de uma nova Constituição
insuflada pelas diversas correntes políticas que trabalharam
pela volta da democracia foi saudada como a panacéia para
todas nossas viscissitudes. Logo promulgada a Constituição,
começaram as críticas, algumas delas veementes, taxando-a
de responsável por uma suposta impossibilidade de se
governar o país. Porque coincidiu a chegada da nova
Constituição, exatamente, com o surgimento de um
liberalismo vestido de nova roupagem, porém, com a mesma
estrutura filosófica, como se fora um sepulcro caiado de que
nos fala o Evangelho330.

A realidade violenta que nos sufoca infelizmente comprovou


a imprestabilidade fática da fala constitucional, opondo mais uma vez a ética da

327
ROMAGNOLI, Umberto. Os Juristas do Trabalho ante a Globalização, artigo, in Diana de Lima e
Silva e Edésio Passos (coord.), Impactos da Globalização- Relações de Trabalho e Sindicalismo na
América Latina, p. 21 e ss.
328
PINTO, José Augusto Rodrigues. A Globalização e as Relações Capital/Trabalho, artigo in Adroaldo
Leão e Rodolfo Pamplona Filho (coord. ), op. cit., p. 104 e ss.
329
SOARES, Ronald. A Inconstitucionalidade do Salário Mínimo ( Salário Mínimo e Neoliberalismo),
artigo in Revista LTR, n. 64, p. 1255.
330
SOARES, Ronald. op.cit., pg. 1257.
69

convicção e a preocupação com os fins que caracterizam os economistas em face da ética


da responsabilidade e da preocupação com os meios que marcam a atuação desses
últimos. É lugar comum no discurso jurídico afirmar que
Os economistas, ostentando teses herméticas e salvadoras,
vociferam contra o custo Brasil, mostrando a necessidade
premente de fazer o produto Made in Brazil competitivo para
o crescimento das divisas331.

O assalto internacional às forças nacionais promove medidas


que caracterizam o mencionado dumping social, o que configura abuso de poder
econômico332 . A competitividade de nossos produtos no mercado internacional depende
de quadro geral de preços internos, que começam com a redução de salários, dado o
desinteresse do Estado em aliviar a carga tributária. É nesse ambiente de fortíssima
pressão que campeia o desemprego, prolifera o subemprego e miniaturiza-se o salário
mínimo. De tal modo,
Filho enjeitado dessa conjuntura ‘liberalizante’ , o salário
mínimo, segundo os entendidos em matéria econômica, um
dos componentes menos significativos do tal ‘custo Brasil’,
foi escolhido como ‘bode expiatório’ para justificar não só o
desequilíbrio da Previdência Social quanto a impossibilidade
de os órgãos públicos arcarem com o salário maior. E a
Constituição ? Ora, a Constituição que vá para ... qualquer
lugar, menos aqui333.

Dissolve-se o direito do trabalho, não obstante sua carga de


historicidade, de representação normativa de luta antiga contra o capital. Por isso,
A pasteurização da economia, isto é, a sua globalização,
passando pelos interesses do capital em face da implosão das
muralhas socialistas que barravam a sua expansão, conduz a
uma pasteurização do direito, principalmente do Direito do
Trabalho, que é entrave aos objetivos da nova ordem
econômica e política mundial334.

Com o objetivo de se neutralizar qualquer oposição à sanha


do capital no desmonte da tradição obreira, acena-se com o desemprego e promove-se um
processo de desradicalização das ideologias. A leveza e o descompromisso de um sentir

331
SOARES, Ronald. op.cit., loc. Cit.
332
TAVARES, André Ramos. Direito Constitucional Econômico, p. 152.
333
SOARES, Ronald. op.cit., loc.cit.
70

conceitual light determina que qualquer forma de radicalização, nesse sentido


originariamente marxista de se tomar as coisas pela raiz, protagonizaria o
desentendimento. Nesse aspecto,
(...) a desradicalização das ideologias serve muito mais aos
propósitos liberais, do que aos sociais, na medida em que o
discurso da ‘liberalização’ dos institutos de direito social
tem sido bem mais pujante e forte do que o da ‘socialização’
dos institutos de direito privado335.

Consequentemente, o movimento sindical agoniza entre


Scylla e Caribbis, imagem da literatura clássica que plasma perigos e indecisão,
oscilando entre interesses imediatos de manutenção mínima de emprego e projetos mais
ambiciosos de avanço nas condições de trabalho. O enfraquecimento do poder sindical é
sintoma que se desenvolve desde o apogeu do Estado de bem-estar, que como uma
esponja procurava absorver a luta de classes. Há proposta para ambiciosa reforma
sindical em andamento336. Tem-se também que em meados da década de 1990 o Brasil
viveu a mais grave crise de emprego de sua história337.
O próprio critério de território338 fragmenta-se com a nova
cartografia do poder, mascarando a resposta natural à injustiça e à exploração dos
empresários339. Com efeito,
(...) no direito sindical, percebe-se um gradual
enfraquecimento das entidades sindicais. A partir da adoção
do pacto proposto pelo Estado do bem-estar, para evitar o
conflito de classes, houve uma efetiva perda de importância
das entidades sindicais, até mesmo para o próprio
operariado340.

Sentir realista parece nortear as reflexões mais recentes em


torno dessa aparente desconstrução do direito do trabalho. Inevitável o processo de
mundialização do capital, o que suscita problemas, que devem ser enfrentados, a

334
SOARES, Ronald. op.cit., p. 1260.
335
CORREIA, Marcus Orione Gonçalves O Contrato Individual do Trabalho no Contexto Neoliberal:
Uma Análise Crítica, artigo in Revista LTR, n. 67, p. 426.
336
PASSOS, Edésio. Reflexões e Propostas sobre a Reforma Trabalhista e Sindical, artigo in Revista
LTR, v. 67, p. 519 e ss.
337
OLIVEIRA, Ribamar. Emprego, in LAMOUNIER, Bolívar (org.), A Era FHC- um Balanço, p. 99.
338
MANGANO, Octávio Bueno. Organização Sindical Brasileira, p. 8.
339
RODRIGUEZ, Américo Plá. Princípios de Direito do Trabalho, p. 24.
340
CORREIA, Marcus Orione Gonçalves. op.cit., p. 424.
71

tomarmos a circunstância como mais uma (entre outras no pretérito havidas) que ameaça
o vendedor da força de trabalho. Nesse sentido,
O processo de globalização, ao mesmo tempo em que
propicia a internacionalização do sistema produtivo de
serviços, começa a evidenciar a necessidade de se buscar, de
forma mais concreta, imediata e progressiva, a solução de
necessidades prementes para garantir a sobrevivência da
humanidade, que deixa de ser uma abstração, para se
converter numa realidade341.

Percebe-se hoje que a historicidade do direito do trabalho


convivia com o desdobramento de práticas que configuram a globalização, que também
detém posição de fragmentação histórica, sobremodo a partir do século XVIII342.
Concomitantemente a algumas conquistas da trajetória do movimento obreiro
descortinava-se a realidade globalizante. Assim,
A globalização, ao contrário do que pode parecer, é um
processo muito antigo, que vem se desenvolvendo há
milhares de anos e que tende à eliminação de fronteiras
nacionais e à fusão das inúmeras culturas locais para a
formação de um núcleo cultural homogêneo comum343.

A partir de 1945 o movimento globalizante teria ganho mais


velocidade, e de tal maneira,
Com a queda dos nacionalismos e o início da decadência do
socialismo real, a partir do final da Segunda Grande Guerra,
o processo de globalização, que havia permanecido suspenso
até então, ingressou em sua derradeira fase de consolidação.
Uma das características dessa fase é a superação dos
paradigmas da modernidade e o advento da pós-
modernidade344.

Em que pese o avanço nos direitos conquistados é axioma


que se faz necessária uma reforma no modelo normativo laboral que estabeleça um
mínimo de proteção a todos os trabalhadores, abaixo do qual não se concebe a

341
GOMES, Dinaura Godinho Pimentel. Os Direitos Sociais no Âmbito do Sistema Internacional de
Normas de Proteção dos Direitos Humanos e seu Impacto no Direito Brasileiro: Problemas e
Perspectivas, artigo in Revista LTR, n. 67, p. 647.
342
FERRER, Aldo. Historia de la Globalización, p. 11.
343
LEITE, Roberto Basilone. Desregulamentação, Flexibilização e Reconstrução do Ordenamento
Trabalhista: o Trabalhador entre o Neoliberalismo e o Garantismo, artigo in Revista LTR, v. 66, p.
1413.
72

dignidade do ser humano345, embora não se perceba a assertiva de forma integral, dado
que,
(...) é urgente uma reforma da legislação, num contexto
reformista de todo o ordenamento legal brasileiro, que lhe
permita ombrear-se com as profundas e rápidas
transformações que marcaram o fenômeno social do século
XX e invadem com o mesmo ritmo vertiginoso o alvor do
século XXI346.

A miniaturização do Estado, aporia de uma monstruosidade


347
ridícula e perigosa , tende a transferir para a iniciativa privada funções ordinariamente
publicísticas, a exemplo da fiscalização do respeito a direitos humanos, que também fica
relegada a segmentos do terceiro setor348. Indiscutível que a desregulamentação e a
flexibilização são expressões sinônimas que conduzem à idéia de redução do nível de
intervenção estatal nas relações de trabalho349. Entre outros, é que
No ambiente econômico globalizado, a assunção de um papel
tutelar dos direitos humanos pelas grandes companhias
indica uma tendência de transferência da responsabilidade
social do Estado para a iniciativa privada350.

Enquanto ao trabalhador procurou se reservar o direito à


liberdade do trabalho, na mesma medida à empresa pretende-se garantir a liberdade de
atividade econômica351. A consecução deste último objetivo contrasta com a formatação
daquele primeiro. Cria-se um dilema de exclusão. A liberdade do trabalho passou a ser
mitigada em nome da garantia da liberdade econômica, como reflexo direto do fato de
que hoje o direito do trabalho é tratado pelos economistas como se fosse matéria de

344
LEITE, Roberto Basilone. op.cit., p. 1414.
345
SUSSEKIND, Arnaldo. Atualização da Legislação Trabalhista, artigo in Revista LTR, v. 67, p. 135.
346
PINTO, José Augusto Rodrigues. As Opções Legislativas para uma Reforma Trabalhista e a
Legislação Setorial, artigo in Revista LTR, v. 67, p. 685.
347
GOYARD-FABRE, Simone. Os Princípios Filosóficos do Direito Político Moderno, p. 427.
348
PIOVESAN, Flavia e FREITAS JR., Antonio Rodrigues de. Direitos Humanos na Era da
Globalização : o Papel do 3º Setor, artigo in Revista de Direito do Trabalho, n. 105, p. 78 e ss.
349
MARINS, Benimar Ramos de Medeiros. As Transformações do Direito do Trabalho e do Princípio da
Irrenunciabilidade, artigo in Revista LTR, v. 66, p. 697.
350
Cardoso, Luciane. Códigos de Conduta, Responsabilidade Empresarial e Direitos Humanos dos
Trabalhadores, artigo in Revista LTR, v. 67, p. 917.
351
NASCIMENTO, Amauri Mascaro. Princípios do Direito do Trabalho e Direitos Fundamentais do
Trabalhador, artigo in Revista LTR, v. 67, p. 908.
73

guarda-livros352 . E são estes ( os economistas ) que acicataram as funções de orientação


de produção normativa. E é por isso que
não resta então ao legislador pátrio outra alternativa para
preservar sua autoridade funcional, que não seja aquela de
menos intervir e menos disciplinar, pois, quanto menos
disciplinar e intervir menor será o risco de ser
desmoralizado pela ineficácia de seu instrumental
regulatório353.

Implementa-se programa desenvolvido pelo capital


internacional, que não vê limites. Tudo se faz em nome da eficiência, da concorrência, da
ampliação das condições de competição no mercado. Eventuais direitos da empresa
chocam-se com efetivos direitos de seus trabalhadores; estes últimos levam a pior.
Invoca-se que sem aquelas estes últimos não existem e que todos os sacrifícios são
necessários, pertinentes, impostergáveis. O problema é recorrente e
Fala-se em destruição ou minimização dos direitos
instituídos em prol dos trabalhadores, para propiciar às
empresas mais produtividade e maior competitividade, ou
seja, o favorecimento do capital em detrimento do
trabalho354.

Estes os efeitos da globalização, da mundialização do capital


e do neoliberalismo em relação ao direito do trabalho. Orquestra-se um movimento que
limita direitos historicamente conquistados, em nome de uma discutível eficiência, sob
uma cortina ideológica que alberga a ameaça, o medo, a ansiedade e a apreensão com o
desconhecido, aspectos que marcam nossos tempos.
Uma voz traiçoeira começa a ser ouvida, sussurrando que não
se pode falar em direito do trabalho onde não há emprego, sutil lamento de um salve-se
quem puder oportunista, entreguista e vendido. Certa razão indolente quer se acomodar,
esquecendo-se de uma trajetória de lutas, protagonizada por aqueles que nunca usaram
black tie.

352
FAUSTO, Francisco. A CLT Sexagenária, Folha de São Paulo, 10 de novembro de 2003, p. A3.
353
GOMES, Dinaura Godinho Pimentel. A Dignidade do Trabalhador no Cenário da Globalização
Econômica, Revista LTR, v. 66, p. 1436.
354
FILHO, José Soares. A Crise do Direito do Trabalho em Face da Globalização, artigo in Revista LTR,
v. 66, p. 1168.
74

2.4 Direito Tributário

A globalização ou processo de mundialização do capital

engendra um cenário que substitui o mundo fracionado da guerra fria, que presenciou um
permanente conflito entre estruturas capitalistas e socialistas, com vitória daquelas
primeiras. Durante o conflito entre Estados Unidos e Rússia perguntava-se de que lado
estavam os demais países do mundo; hoje questiona-se o nível e a extensão de parceiros
comerciais355.
Concomitantemente, a proliferação dos negócios bancários
suscita uma perene especulação, uma inusitada movimentação de capitais, de contratos,
de empréstimos públicos e particulares, garantidos pelos governos dos países periféricos.
Em relação a esses últimos a atividade tributária passa a
desempenhar uma inusitada função. Na perspectiva clássica da ciência das finanças tinha-
se na arrecadação um mecanismo de absorção de valores para que o Estado desempenha-
se suas tarefas. Valores eram (ou deveriam ser) orientados para a segurança, saúde, infra-
estrutura. Variava-se de acordo com o modelo do Estado, que transcendia a função
clássica, quando formatado nos moldes keysenianos de bem-estar social.
É por essa razão que historicamente a atividade tributária
sempre se fez antipática, pela natural tendência dos contribuintes no sentido de
relacionarem custos e benefícios. E muitas vezes o desate dessa aritmética tão simples
fez-se em rebeliões e revoluções. O Egito antigo, o proto-estado de Israel dos tempos
bíblicos, a China das dinastias que se diziam mandatárias do céu, as póleis gregas do rico
Mediterrâneo, a república e o império dos romanos, o Islã que tributava os infiéis, o
modelo de servidão fiscal eslava que os russos conheceram no medievo, a Inglaterra
elisabeteana, as colônias britânicas na América, os inconfidentes das Minas Gerais, enfim
uma interminável lista de embates políticos com fundo e finalidades tributárias ilustram a
assertiva356.

355
FRIEDMAN, Thomas L. The Lexus and the Olive Tree, p. 10.
356
ADAMS, Charles. For Good and Evil, The Impact of Taxes on the Course of Civilizations.
75

No Brasil contemporâneo essa proporção entre o que se paga


e o que se tem em troca torna-se absurdamente dramática. A atual tributação não estimula
os empregos, a exportação e a produção industrial; a carga tributária atual pode atingir
36,4 % do PIB (produto interno bruto). Quando da alteração de alíquotas do PIS (de
0,65% para 1,65%) a arrecadação federal aumentara em cerca de 16%. Tem-se a
impressão que a ônus tributário tende a absorver os recursos que circulam pelo país. O
impacto da tributação no cotidiano das pessoas transcende temas de economia política e
qualifica interferência governamental enervante357.
A advocacia tributária de plantão, que se pretende paladina
da liberdade, e que se diz ativa como Robin Hood da Inglaterra da baixa idade média,
aponta para a sanha maldita do governo, sem questionar os porquês de tal
comportamento, como se existisse por parte do governante um sádico prazer em elevar
tributos sem proporcionar a contrapartida em serviços de qualidade. As próprias
incongruências (loopholes) que a lei tributária enceta, e que tributaristas tanto criticam, é
que promovem a razão de ser e de viver desses robustos escritórios. Não fosse a inaptidão
da lei fiscal, advogados tributaristas e contadores não seriam tão requisitados.
A moda do planejamento tributário, mediante a concepção e
venda de produtos, disfarçados em liminares e decisões que mitigam a carga das
empresas e das pessoas, é fruto direto dessa engenharia social decorrente do mundo
globalizado. O uso de trusts e off-shores , por exemplo, como mecanismos de diminuição
de carga tributária, promovendo inclusive dúvidas conceituais a propósito do fato de que
suscitam práticas elisivas ou evasivas358.
É preciso ir ao fundo do problema. O modelo tributário
brasileiro atual é o resultado da necessidade em que se vê o poder constituído em manejar
a dívida externa e as condições de investimento no país, como decorrência lógica da
economia globalizada. Inserido em modelo de relacionamento com o Fundo Monetário
Internacional, (...) em 1998 o governo federal apresentou para os próximos anos metas
visando à promoção de um crescimento real da renda per capita, entre outros

357
UTZ, Stephen G. Tax Policy, An Introduction and Survey of the Principal Debates, p. 33.
358
CASTRO, Alexandre Barros. Trust e Off-Shore : Elisão ou Evasão Fiscal?, artigo in Revista
Tributária e de Finanças Públicas, v. 30, p. 110 e ss.
76

propósitos. Com isso, propôs um ajuste fiscal de médio prazo e algumas reformas,
visando promover o aumento da poupança nacional359 .
Nesse ambiente viceja também a Lei de Responsabilidade
Fiscal, Lei Complementar 101, de 4.5.2000, que sob pretexto de moralizar os gastos
públicos, engessa os aludidos empenhos. Nesse sentido, referida lei representa um marco
para a mudança da gestão fiscal do país (...) fixa limites para despesas com pessoal,
para dívida pública e também determina que sejam estabelecidas metas fiscais360.
No passado, por exemplo durante a guerra fria, havia espaço
de manobra, dado que suposto combate contra a ameaça comunista, a par de nossa
posição estratégica, possibilitavam uma concepção de geopolítica que nos favorecia.
Porém a situação já não é mais a mesma. A mantença de um serviço de dívida externa é
que dá os contornos ao sistema tributário nacional. De tal modo,
O modelo proposto garante, por uma lado o pagamento
pontual dos compromissos junto aos grandes bancos
internacionais, retirando, por outro, aqueles mesmos
recursos de sua destinação originária. É dizer, que
desmantela os serviços públicos quanto à saúde, educação,
segurança, infra-estrutura, tributa sobremaneira os menos
abastados, olvidando de aperfeiçoar a progressividade na
tributação sobre patrimônio e renda361.

Como pano de fundo, o modelo de neoliberalismo que


imprime um novo ritmo nas relações estruturais internacionais, com conseqüente
redesenho de modelos conjunturais locais. Por isso,
Uma das conseqüências do neoliberalismo é um processo de
globalização, ou o estabelecimento de uma ordem global.
Uma vez determinadas pelas grandes corporações, as
atividades econômicas não sofrem mais o controle dos
Estados envolvidos, tanto mais pelo enfraquecimento das
instituições estatais criadas para esse fim. As principais

359
RIBEIRO, Mária de Fátima. Os Acordos com o FMI e seus Reflexos no Sistema Tributário Nacional,
in SILVA, Roberto Luiz (org.), O Brasil e os Acordos Econômicos Internacionais, p. 179.
360
RIBEIRO, Mária de Fátima, op.cit., p. 183.
361
RONZANI, Guilherme Della Garza. O Estado Liberal Consttucional e seus Reflexos na Tributação-
Neoliberalismo e Reforma Tributária, artigo in Revista dos Procuradores da Fazenda Nacional, v. 5, p.
184.
77

ameaças a este tipo de interesse são as iniciativas locais


(...)362.

Efetivamente é o contribuinte local quem paga a conta dessa


movimentação global, sem poder insurgir-se contra essa circunstância. Assim,
Com a mundialização dos mercados e o comércio sem
fronteiras a exigência da autoridade local se hospeda no
contribuinte assalariado, na incidência e recolhimento na
fonte, e ainda a malsinada contribuição provisória sobre
movimentação financeira363.

Simultaneamente, a busca da estabilidade da moeda e da


baixa inflação faz-se por conta de uma legislação que bem trabalhada promove a evasão e
o ilícito. E nesse sentido,
Infelizmente convivemos com uma política tributária
marginal na contemporaneidade da globalização, agitando
apenas os economicamente desprotegidos e deteriorando o
panorama em grandes cidades, porém no contexto somente
haverá ingrediente favorável se a reforma pretendida
permear a sedimentação racional, de redução de carga,
eliminação de muitos encargos, e a obrigação de empresas,
clubes de futebol, entidades que possuem templos religiosos
somente de conotação lucrativa, enfim, tudo que prioriza
válvula de escape na legislação364.

O tema reforma tributária ganha as atenções.


Romanticamente imaginada como a tábua de salvação para a diminuição da carga fiscal,
presta-se justamente para o contrário, na medida em que realmente parece promover
bases mais amplas para recolhimento. O direito tributário convive então com um
movimento normativo que prevê reforma fiscal que pretende ampliar essa aludida base de
recolhimento, como reflexo da crise pela qual o Estado se vê tomado.

O mais perverso dos impostos, o ICMS, de competência


estadual e marcado por forte regressividade, passa a justificar guerra fiscal que revela
problemas graves de federalismo vertical. Fala-se de uma legislação federal única,

362
RONZANI, Guilherme Della Garza. op.cit., p. 206.
363
ABRÃO, Carlos Henrique. Tributação x Globalização, artigo in Revista Tributária e de Finanças
Públicas, n. 50, p. 282 e 283.
364
ABRÃO, Carlos Henrique. op.cit., p. 284.
78

prevendo cinco alíquotas, substituindo-se as vinte e sete atuais legislações, que oxigenam
guerra fiscal que denuncia problemas de federalismo horizontal.
A CPMF- contribuição sobre as movimentações financeiras,
seria prorrogada até 2007 tornando definitivo o que nascera sob a égide da
provisoriedade. Impostos de importação e de exportação também incidiriam sobre
serviços, além de produtos, que hoje gravam em detrimento de eventual paradigma de
livre comércio.
A recém criada CIDE- contribuição sobre a venda de
combustíveis- persistiria, com partilha posterior entre estados e municípios. Aqueles
ficariam com 18,75 % da arrecadação, esses últimos com 6,25 %. A COFINS,
contribuição para financiamento da seguridade social, deixaria de ser cumulativa,
deixando de incidir em todas as etapas da produção. A tributação internacional passa a
exigir maior fiscalização e empenho, especialmente em âmbito de preços de transferência
e seu controle fiscal365.
Cogita-se também de uma necessária tributação do comércio
eletrônico no plano internacional. Afinal,
O volume deste tipo de negócio ainda pode ser considerado
pequeno comparado com o comércio tradicional, mas é
muito difícil encontrar algum analista econômico que não
vislumbre grande crescimento para o setor nos próximos
anos e que não veja no desenvolvimento do setor uma
relação direta com o crescimento econômico em médio
prazo366 .

Também o direito comunitário passa a integrar o modelo


nacional de tributação, a exemplo do que se passa em âmbito de Mercosul367. Ocorre, no
entanto, que o aludido sistema ainda não foi implementado, a par do fato de que sua
eventual normatização baliza-se em preceitos de harmonização. De tal maneira,
O Tratado de Assunção não cria um sistema tributário para
o Mercosul, nem mesmo trata da matéria de forma específica
ou com profundidade, mas a aponta como meio, ou seja,

365
TÔRRES, Heleno. Direito Tributário Internacional, p. 161 e ss.
366
SILVA, Mário José. Tributação do Comércio Eletrônico no Plano Internacional- Uma Visão Geral,
artigo in Revista Tributária e de Finanças Públicas, n. 38, p.9.
367
DERZI, Misabel Abreu Machado. O Mercosul e a Refoma Tributária, Folha de São Paulo, 7 de
outubro de 2003.
79

como degrau impulsionador a consecução de objetivos


diversos, dentre eles o mercado comum, devido a sua
importância estratégica para a integração. Para isso, coloca
à disposição dos países o instrumento da harmonização,
representando esse não um fim, mas meio de se alcançar a
meta final (mercado comum)368.

A utilização dos blocos e regimes de harmonização pode


representar mecanismos eficazes na luta contra distorções tributárias que engessam o
desenvolvimento do país. De tal modo,
A mundialização dos mercados dita novas regras e
tendências tributárias, levando a criação de blocos
econômicos. Nessa parceria, a harmonização tributária
tendo-se em conta essas novas tendências é imprescindível
para a sobrevivência desses blocos e dos próprios países que
os compõem. Os sistemas tributários devem estar preparados
para integrarem-se. Nesse contexto, tentar seguir passos
diferentes é ficar só, sucumbir369.

A questão ultrapassa a tendência de discutir-se matéria


tributária em campo exclusivamente analítico. A concepção de regra matriz de
incidência, por exemplo, acaba genufletida a relações entre soberania e globalização, que
jamais poderiam ser imaginadas na reforma tributária de 1965, quando se concebeu o
CTN.
Pode-se até cogitar de uma desconstitucionalização de alguns
temas tributários, como mecanismo de celeridade nessa concepção de um modelo
tributário menos ingênuo e mais realista. Com isso,
Podemos, sim, expurgar do texto constitucional inúmeras
disposições de conteúdo mais apropriado para serem
veiculadas em leis complementares ou até pelo legislador
ordinário, na esfera das respectivas competências370.

E se o aumento da carga tributária é o reflexo direto da


globalização em relação a nós brasileiros, percebe-se também uma movimentação

368
CARVALHO, Patrícia. Harmonização do Direito Tributário no Mercosul, artigo in Revista Tributária
e de Finanças Públicas, v. 45, p. 18.
369
SOUZA, Edino Cezar Frânzio de. O Poder de Tributar do Estado no Cenário Econômico Atual, artigo
in Obsevatório Jurídico, Revista Consulex, n. 133, julho/2002, p. 44.
370
REIS, Antonio Carlos Nogueira. Tributação e Desenvolvimento, artigo in Revista Tributária e de
Finanças Públicas, v. 48, p. 149.
80

normativa que acompanha o momento, como acima evidenciado. Exige-se a reforma


tributária, especialmente porque
O aumento da carga tributária, sem que o Estado cumpra
efetivamente as suas funções institucionais, só serve para
tirar o capital produtivo do mercado, com reflexos negativos
à economia, aumento da injustiça fiscal e com a diminuição
da credibilidade do Estado371 .

Em linhas gerais, debate-se a unificação da legislação do


ICMS, e conseqüente fim de alguns incentivos tributários que tal exação prevê, uma
contribuição sobre valor agregado que substituísse metade da contribuição previdenciária
patronal, o fim da cumulatividade do Cofins ( que já é objeto de medida provisória ), a
progressividade do imposto sobre heranças e doações, a transformação da CPMF em
tributo permanente, além da desvinculação de parcela da receita da União372.
O nível de iniqüidades é muito grande. Pode-se pensar que a
tributação sobre a comida de cachorros é inferior ao que se tributa na mesa da pessoa.
Pode-se afirmar que o botox, usado para supressão de rugas nos tratamentos de beleza
tem alíquota zero, enquanto remédios são violentamente taxados.
Tem-se que em relação a ensaios e tentativas de reforma
tributária,
Em primeiro lugar, destaca a tributação sobre o consumo, ao
invés de priorizar a tributação sobre o patrimônio e a renda.
Do modelo decorre a confirmação de uma intenção clara de
combate a desenvolvimento social do país. Isto porque a
tributação sobre o consumo não é progressiva, não
discrimina a capacidade contributiva daquele sobre o qual
recai o ônus da tributação. Um gênero alimentício é
igualmente tributado, independentemente da condição
econômica do adquirente373.

Enfim, o Brasil é um país periférico na ordem global atual.


Monitorado pelos chamados agentes internacionais globais, a exemplo do Fundo
Monetário Internacional e do Banco Mundial. Nessa condição, vive assediado para a

371
ICHIHARA, Yoshiaki. O que é Reforma Tributária?, artigo in Revista Tributária e de Finanças
Públicas, v. 49, p. 178.
372
HARADA, Kiyoshi. Possível Reforma Tributária, artigo in Revista Tributária e de Finanças Públicas,
v. 51, p. 141.
373
RONZANI, Guilherme Della Garza. op.cit., p. 206.
81

consecução de um projeto de estabilização econômica, moldado por um modelo de


reforma estrutural que exige uma atitude fiscal que promova a confiança externa nas
possibilidades internas.
Na miragem de se atrair investimentos externos são
oferecidas amplas generosidades fiscais ao capital estrangeiro, que nos faz presas de uma
interminável chantagem tributária. A carga tributária atual é mero reflexo dessa situação
internacional. Conseqüentemente, qualquer projeto de reforma ou de modelo tributário
que não discuta antes a posição do Brasil nesse concerto internacional, comete o pecado
de pretender subverter os meios pelos fins, a parte pelo todo.

2.5 Direito Processual

A globalização afeta o direito processual civil brasileiro

determinando uma feição procedimental mais ágil, marcada pela instrumentalidade e pela
crítica ao abstracionismo conceitual. A busca da celeridade promove discussões em torno
de eficácia a propósito da adoção de súmulas vinculantes. Perspectivas referentes a uma
nova percepção de tempo robustecem institutos promotores de tutelas cautelares,
justificativas dos novos matizes do agravo374 e da antecipação de tutela375.
A vulgarização do uso da internet torna a rede mundial de
computadores aliada de um ensaio de prestação de tutela jurisdicional mais rápida,
engendrando, por outro lado, problemas procedimentais de insuspeita complexidade. Um
processo civil coletivo reflete anseios de uma sociedade de massa que não pode
equacionar seus problemas judiciais por meio de um processo de cunho individual.

374
Lei 9139/95.
375
Lei 8952/94.
82

Direitos difusos e coletivos demandam soluções que marcam um processo que se


pretende guardião de interesses pulverizados.
Institutos do direito anglo-saxão provocam corações e
mentes de processualistas, a exemplo das class actions, do amicus curiae, do contempt of
court, do writ of certiorari. Anseios por um processo transnacional e instrumental
especulam alterações em modelos arcaicos a exemplos das rogatórias. E nesse turbilhão
de tendências emerge uma tentativa de reforma do judiciário, condimentada por
indisfarçável conflito entre esse poder e o executivo376.
O direito processual persiste na tentativa de amalgamar
segurança jurídica à justiça, problema que já atormentara William Shakespeare quando da
composição do Mercador de Veneza377 . Discussões centradas em direitos individuais
cedem para processos que vislumbram direitos coletivos, tudo sob forte impacto de uma
nova concepção de tempo processual,
(...) nunca o tempo foi tão inimigo do processo como o é
agora. Nunca a função cautelar do Judiciário foi tão
utilizada, aqui e no mundo. Nunca o tempo que o juiz tem
que ter para refletir sobre determinado conflito de interesses
foi tão custoso e tão demorado, tendente a inviabilizar a
própria prestação jurisdicional. E a utilização da função
cautelar foi determinada pela própria sociedade,
modificando também o “ velho processo “ , baseado
historicamente no processo de conhecimento378.

Discussões em torno da efetividade da justiça apontam para


um interessante paradoxo : por um lado, a grave dificuldade, para muitos, de acesso à
Justiça; por outro, o grande volume de processos nos tribunais379. Questão lateral ergue-
se por conta da reforma do regime previdenciário dos magistrados, que contam com o
apoio de advogados como Arnoldo Wald e Ives Gandra Martins, paladinos de uma nova
causa que publicamente abraçaram.

376
Diário Catarinense, 10 de outubro de 2003, a propósito das críticas do Presidente do Supremo Tribunal
Federal, Maurício Corrêa, em resposta a certa hostilidade do Presidente Luís Inácio Lula da Silva em
relação ao poder judiciário.
377
POSNER, Richard A. Law and Literature, p. 85 e ss.
378
BUENO, Carlos Scarpinella. Processo Civil e Globalização, artigo in Carlos Ari Sundfeld e Oscar
Vilhena Vieira (coord.), op.cit., p. 215.
379
MACIEL, Cláudio Baldino. Efetividade da Justiça, artigo in Folha de São Paulo, 8 de outubro de 2003.
83

Eles afirmaram que é imperativo que se considere a


necessidade de dar ao Poder Judiciário um regime previdenciário próprio380. Saulo
Ramos também saiu em defesa da toga, e para ele queiram ou não, as funções do juiz têm
direta e profunda importância para a vida de cada brasileiro381. Uma suposta erudição
vazia que historicamente marca o bacharelismo liberal na política brasileira382 também é
vista como elemento cultural que plasma um processo e um Judiciário carentes de
mudanças383, determinantes de uma revolta contra o formalismo, informada pelo
crescimento da criatividade da interpretação judiciária384.
Porque a jurisdição é expressão de poder político385, ela
recebe influências de uma contigência em que o Estado tem que lidar com a intersecção
do arcabouço legal-institucional nacional com o funcionamento dos mercados
mundiais386. Reflexo de perene crise de confiabilidade nas instituições, que é a própria de
ingovernabilidade sistêmica de entorno político periférico, o desassossego para com o
judiciário é elemento que caracteriza efeito subterrâneo do processo de mundialização do
capital.
É nesse ambiente que se discute a reforma do código de
processo civil, como pertinente à uma sonhada efetividade, subjugadora do paradoxo
processo moderno e justiça morosa387. A morosidade processual seria um mal endêmico,
comprometedor da boa imagem da justica388 e justificadora de uma nova formatação para
regime de prazos, de todos os exemplares, comuns, particulares, próprios, impróprios,
legais, convencionais, dilatórios e peremptórios.

380
WALD, Arnoldo e MARTINS, Ives Gandra. O Judiciário e a opinião pública, artigo in Folha de São
Paulo, 1º de outubro de 2003.
381
RAMOS, Saulo. Os sem-teto do Poder Judiciário, artigo in Folha de São Paulo, s.d.
382
ADORNO, Sérgio. Os Aprendizes do Poder, especialmente p. 91 e ss.
383
ZANCAN, Glaci. Quando “ O Processo “ se torna real, artigo in Folha de São Paulo, s.d.
384
CAPELLETTI, Mauro. Juízes Legisladores? , p. 31 e ss.
385
DINAMARCO, Cândido Rangel. A Instrumentalidade do Processo, p. 159.
386
COUTINHO, Luciano. Poder nacional e globalização : ideologia x fatos, artigo in Folha de São Paulo,
10 de outubro de 2003.
387
LOPES, João Batista. Efetividade do Processo e Reforma do Código de Processo Civil: como explicar
o paradoxo processo moderno- Justiça morosa?, artigo in Revista de Processo, n. 105, janeiro/março
de 2002, p. 128/138.
388
LOPES, João Batista. op. cit., p. 128.
84

A temática recursal reclamaria planisfério mais simples e


mais célere, com novas molduras de apelação, recursos adesivos, agravos, embargos
infringentes, de declaração, recursos ordinários, extraordinários e especiais.
A súmula vinculante seria mecanismo de ligeireza
processual, de açodamento procedimental. O modelo prende-se à tradicão da common
law389 e sumariza-se no constitucionalismo norte-americano390 definidor da força do
precedente391 implementado já na primeira composição da Suprema Corte daquele país,
que julgou temas que lhe eram afetos, de 1790 a 1801392 . A súmula vinculante prestar-
se-ia para obrigar tribunais inferiores e juízes monocráticos a julgarem de acordo com
decisões superiores, mantendo-se coerência na aplicação da lei, mediante o uso
institucionalizado do precedente superior.
O modelo de common law contaminaria o sistema de civil
law sob pretexto de se limitar o número de pendências judiciais, colaborando-se na
difusão da certeza jurídica e na diminuição de questões em julgamento. Essa
impregnação de direito estrangeiro parece ser comum e de tal modo,
De fato, esta alteração precisaria ser feita no sistema, no
plano constitucional, para que o legislador ordinário
pudesse dar à súmula efeito vinculante. O Brasil, então
passaria a ter também neste ponto um sistema misto, de
inspiração romano-germânica e anglo-saxônica. Isto já
ocorre em outros pontos, em que as inovações introduzidas
pela Reforma se inspiram no sistema norte-americano,
afastando-se de nosso modelo originário, por exemplo, no
que tange às class actions ou mesmo no que diz respeito à
introdução do art. 461 no CPC, relativo às ações cujo
objetivo é dar cumprimento às obrigações de fazer e de não
fazer, também fortemente inspirado nas astreintes do direito
francês393.

Pensa-se também que a súmula vinculante poderia fortalecer


a obtenção por parte do jurisdicionado de decisões idênticas para casos iguais,
oxigenando-se os princípios da legalidade e da isonomia, obtendo-se uma maior

389
CANTOR, Norman F. Imagining the Law, p. 212 e ss.
390
COX, Archibald. The Court and the Constitution, p. 44 e ss.
391
CURRIE, David P. The Constitution of the United States, A Primer for the People, p. 8 e 9.
392
SCHWARZ, Bernard. A History of the Supreme Court, p. 15/31.
393
WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. Súmula Vinculante: Desastre ou Solução? , artigo in Revista de
Processo, n. 98, abril/junho de 2000, p. 296.
85

efetividade no que toca à segurança jurídica, circunstância que pode redundar em mera
metáfora no mundo globalizado, carente a locução que é de construções legitimadoras em
âmbito pragmático, principalmente em terreno penal394.
A súmula vinculante poderia evitar a mencionada
insegurança jurídica e o descrédito do poder judiciário, e nesse sentido :
A lei é uma só (necessariamente vocacionada para
comportar um só único entendimento, no mesmo momento
histórico e nunca dois ou mais entendimentos
simultaneamente válidos,...) Todavia, no plano dos fatos,
decisões podem ser diferentes, porque os tribunais podem
decidir diferentemente. É comum haver duas ou mais
decisões, completamente diferentes, a respeito do mesmo
(mesmíssimo !!) texto, aplicáveis a casos concretos
idênticos395.

Porém, dado que a súmula vinculante hiperpotencializa os


tribunais superiores, suscitando apreensão para com eventuais ingerências políticas
nessas cortes, o que já verificado com frequência no direito norte-americano396, pretende-
se que seja absolutamente imprescindível que se tenha uma noção daquilo que pode ser
sumulado397 .
Elevadíssima cautela deve dar contornos a eventual adoção
por parte do direito brasileiro da súmula vinculante e consequentemente,
Cada vez mais e mais transparentes devem ser os critérios de
escolha dos Ministros dos Tribunais Superiores, se a eles
caberá editar súmulas, que só se podem prestar a gerar mais
segurança e previsibilidade, nunca a “ engessar “ ou
“congelar” o direito. Para isto, como vimos antes, é
necessário que se atente para a matéria que se estará
sumulando e para o modo como se estarão redigindo estas
súmulas398.

Oportuno que se registre que se verifica hoje uma migração


conceitual que afeta modelos de common law e de civil law. Porque na mesma medida em

394
ANDRADE, Vera Regina Pereira de. A Ilusão da Segurança Jurídica, p. 169 e ss.
395
WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. op.cit., p. 299.
396
BICKEL, Alexander M. The Least Dangerous Branch, The Supreme Court at the Bar of Politics, p.
29 e ss.
397
WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. op.cit., p. 302.
398
WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. op.cit., p. 306.
86

que direitos de tradição continental, como o brasileiro, procuram soluções no modelo


anglo-saxão, aquele sistema tem implementado características de nosso direito, a
exemplo de uma crise na produção normativa, caracterizada por verdadeira inflação
legislativa.
Essa explosão legisferante do direito norte-americano tem
sido objeto de frequentes denúncias, que nos dão conta de que o direito escrito estaria
sufocando a América do Norte399; de igual modo, questiona-se se a recíproca seria
verdadeira, a propósito de nossa adesão a modelos procedimentais daquele país.
Novas experiências destacam distintas formatações de espaço
e tempo400 no mundo do globalismo. Uma percepção diferenciada de tempo exige
inusitada velocidade na vida negocial, que já não pode ficar na dependência da prosaica
lentidão do modelo processual de feição mais formal.
O direito é assimilado pela economia e a ética de convicção
dessa última reformula a ética de responsabilidade daquele, a usarmos categorias
tipológicas weberianas401. O direito é pressionado a ceder para a voracidade temporal da
vida negocial, tornando-se caudatário do princípio da eficiência402. E se tempo é
dinheiro403, a maximização do lucro e a mitigação dos prejuízos dependem diretamente
da administração racional da demora e da espera. Consequentemente, o processo civil
deve caminhar em passo mais apressado.
A efetividade do processo passa a ser administrada por meio
de regimes tutelares de urgência e dessa maneira,
A tutela cautelar, até poucos anos, era um instrumento
excepcional e suficiente para evitar que a demora do
processo conduzisse à inefetividade da tutela jurisdicional.
Atualmente, porém, constata-se a proliferação das medidas
cautelares e mesmo a distorção do seu uso. Trata-se de
fenômeno oriundo das novas exigências de uma sociedade
urbana de massa, que torna inaceitável a morosidade
jurisdicional imposta pelas formas tradicionais de tutela. Na
verdade, a prática forense, sob o rótulo de ‘ tutela cautelar‘ ,

399
HOWARD, Philip K. The Death of Common Sense, especialmente p. 111 e ss.
400
HARVEY, David. A Condição Pós-Moderna, p. 185 e ss.
401
FREUND, Julien. Sociologia de Max Weber, p. 27.
402
POSNER, Richard A. Economic Analysis of Law, p. 10.
403
Essa é a lógica do capitalismo norte-americano, pretensamente impulsionado por uma ética pietista e
calvinista, conforme WEBER, Max. The Protestant Ethic and the Spirit of Capitalism, p. 17.
87

passou a conceber tutelas antecipatórias, próprias à tutela


efetiva dos direitos que precisam ser realizados de forma
urgente404.

A composição dos interesses qualificados por pretensões


resistidas exige que se afastem variações irremediáveis nos estados das pessoas e
coisas405, a exemplo do pleito de alimentos406, cuja espera esgota o detentor de suposto
benefício. Amplia-se o conceito de um princípio de inafastabilidade do controle
jurisdicional407, mote explicativo da função da jurisdição408; justiça tardia não é justiça e
o controle jurisdicional consiste também na possibilidade de o judiciário dominar o
próprio passo, conferindo ligeireza a si mesmo.
O poder judiciário no mundo globalizado passa a ser um
serviço judiciário. O direito já não pode render-se às filigranas do processo409, e nesse
aspecto recente reforma processual tem permitido a flexibilização de procedimentos
antigos, a exemplo da nova regra do artigo 230 do Código de Processo Civil que autoriza
que nas comarcas contíguas, de fácil comunicação, e nas que se situem na mesma região
metropolitana, o oficial de justiça poderá efetuar citações ou intimações em qualquer
delas410.
De igual modo, a ação monitória, amplamente conhecida no
processo civil europeu411, e entre nós normatizada na lei n. 9079/95, também fomenta
essa nova perspectiva de celeridade porque
Causa desânimo ao credor o fato de possuir documento
abalizado e de saber que o devedor não tem defesa a lhe
opor e, mesmo assim, ter de enfrentar toda a complexidade
do processo de conhecimento para, só depois dele, obter
meios para executar o inadimplente412.

404
MARINONI, Luiz Guilherme. Efetividade do Processo e Tutela de Urgência, p. 37.
405
THEODORO JÚNIOR, Humberto. Tutela Cautelar, p. 15.
406
OLIVEIRA, Carlos Alberto Álvaro de. A Ação Cautelar de Alimentos e a Nova Constituição, artigo in
Medidas Cautelares, Estudos em Homenagem ao Professor Ovidio A. Baptista da Silva, p. 61 e ss.
407
NERY JUNIOR, Nelson. Princípios do Processo Civil na Constituição Federal, p. 87 e ss.
408
ROSAS, Roberto. Direito Processual Constitucional, p. 14 e ss.
409
FORNACIARI JÚNIOR, Clio. A Reforma Processual Civil (Artigo por Artigo), p. XIII.
410
MACHADO, Antônio Cláudio da Costa. A Reforma do Processo Civil Interpretada- artigo por artigo,
parágrafo por parágrafo, p. 15.
411
FREIRE, Reis. Principais Inovações no Direito Processual Civil Brasileiro, p. 17.
412
FREIRE, Reis. op.cit., p. 19.
88

A vulgarização do uso dos meios cibernéticos de


comunicação, a exemplo dos recursos da internet, tem suscitado grande impacto no
modelo processual civil brasileiro. Tornam-se mais rápidas e dinâmicas as composições
de petições, arrazoados, decisões e recursos e a consequente concepção de todos os
imaginados tipos de peças processuais e acadêmicas.
O domínio dos recursos dos processadores de texto por parte
dos operadores jurídicos, que ainda beneficiam-se da celeridade e da confiabilidade da
pesquisa de dados on line , tem representado substancial poupança de tempo e de esforço.
Não obstante o caráter anárquico que macula as publicações acadêmicas veiculadas pela
internet, em virtude dos precários modelos de controle de qualidade, observa-se
efetivamente que o ciberespaço tem muito a contribuir para a obtenção de mais eficiência
no entorno jurídico.
As possibilidades de pesquisa jurisprudencial bem ilustram a
asssertiva, propiciando indiretamente maior eficiência para a própria administração da
justiça, por conta da estandartização que pode ser alcançada.
Essa euforia, no entanto, carece ser problematizada, porque
há riscos de que se reduza o direito à ditadura de uma informática da dominação413.
Aceitando-se que modelos técnicos são invasores414 e que o direito tende a ser matizado
como bem de consumo, teme-se a ampliação do hiato entre a justiça real e a justiça
formal.
Do mesmo modo que o direito escrito no sistema
continental415 surgiu da luta contra o absolutismo e a intolerância416, traindo depois as
esperanças na realização de uma justiça concretamente efetiva e para todos417, a
revolução cibernética pode no direito propiciar a crença em falsas promessas. A
presunção de que uma melhor dotação orçamentária para que o judiciário pudesse se
modernizar tecnologicamente seria a solução para os problemas da administração forense
contemporânea parece ser o sintoma dessa patologia.

413
MONACHESI, Juliana. Ciborgues da Resistência, artigo in Folha de São Paulo, Caderno Mais, 9 de
novembro de 2003.
414
SANTOS, Milton. Por uma outra globalização- do pensamento único à consciência universal, p. 26.
415
MONTESQUIEU, Charles Louis de. Secondat Barão de. Do Espírito das Leis, p. 52 e ss.
416
LOPES, José Reinaldo de Lima. O Direito na História, Lições Introdutórias, p. 205 e ss.
417
HORKHEIMER, Max. Eclipse of Reason, p. 9.
89

Tem-se mais um foco de tensão nos limites de um direito


418
burocrático , que doravante justifica sua inoperância e ineficiência escondidas na
muralha da velha desculpa, de que o sistema está fora do ar.
Todavia, perspectiva positiva e otimista em relação ao
mundo, qual uma soteriológica fé na racionalidade, a admitirmos premissas
habermasianas419, justifica que se identifique progressos que a internet pode suscitar na
prática procedimental.
É o caso do interrogatório on line, inovação atribuída ao juiz
Luiz Flávio Gomes420. Críticos da medida invocaram que a presença física do juiz é
imprescindível , dado que a comunicação transcende o texto escrito e que se
complementa com a observação dos gestos, olhares e comportamento do acusado.
Defensores da atitude do ousado juiz perceberam que o objetivo era garantir justiça
rápida, e nesse sentido o sacrifício de uma hermenêutica holística de compreensão do
interrogatório justificara prospectivamente a opção. Por isso,
É hora de ser admitido um relativo sacrifício aos moldes
tradicionais da realização dos atos judiciais solenes, em prol
da agilidade do processo e da prestação jurisdicional mais
célere. Acesso à justiça, relembrando mais uma vez a lição
de Kazuo Watanabe, é acesso à ordem jurídica justa, que
ficará mais perto de ser atingida, em matéria criminal, com a
adoção massiva dos interrogatórios on-line, desde que
observadas cautelas mínimas (...)421.

Tribunais passam a organizar home pages facilitando o


acompanhamento de processos, de decisões e de jurisprudência422. Listas de discussão
unem categorias de procuradores jurídicos, a exemplo de espaços cibernéticos criados e
frequentados por procuradores da fazenda nacional, advogados públicos, especialistas em
vários campos do direito, entre outros.
O uso do correio eletrônico (e-mail) pode facilitar o modelo
referente às comunicações dos atos do processo, e extensivamente a lei 9.800/99 poderia

418
UNGER, Roberto Mangabeira. Law in Modern Society, p. 64 e ss.
419
HABERMAS, Jurgen. Direito e Democracia- entre facticidade e validade, v. I, p. 139 e ss.
420
CARVALHO, Ivan Lira de. A Internet e o Acesso à Justiça, artigo in Revista de Processo, n. 100,
outubro/dezembro de 2000, p. 113.
421
CARVALHO, Ivan Lira de. op.cit., p. 117.
422
CARVALHO, Ivan Lira de. op.cit., loc.cit.
90

significar autorização nesse sentido423. Há, por fim, limites culturais, refletindo atitudes
de preconceito para com a cibernética, a par de barreiras materiais e econômicas,
decorrentes dos custos de acesso ao uso de computadores.
Refletindo uma sociedade massificada que exige um processo
de massa, proliferam mecanismos para discussão de direitos difusos e coletivos.
Interesses difusos abraçam uma série indeterminada e aberta de indivíduos424 . Interesses
coletivos são os pertinentes aos fins institucionais de determinada associação,
corporação ou grupo intermediário, decorrendo de um prévio vínculo jurídico que une
os associados425. Assim a indeterminidade é a característica fundamental dos interesses
difusos e a determinidade a daqueles que envolvem os coletivos426.
A ação civil pública é mecanismo processual que se presta a
defender interesses difusos427, com o objeto de obter condenação em dinheiro ou ordem
para o cumprimento de obrigação de fazer ou não fazer428, servindo à defesa do meio
ambiente, do patrimônio cultural e dos consumidores. No que toca a específica defesa de
consumidor, prevê o Código de Defesa (artigos 91 a 100) uma ação de classe brasileira,
inspirada na class action do modelo norte-americano429, de muita utilização nas justiças
estaduais daquele país430.
O direito processual brasileiro também flerta com o amicus
curiae, o amigo da corte, que radica no friend of court do direito norte-americano431. O
amicus curiae é aquele terceiro interessado que protocola petição em ação em que não é
parte, mas em relação à qual tem proveito no desate432. Esse instituto (...) por sua
informalidade e peculiaridades, não guarda verossimilhança com nossa intervenção de

423
CARVALHO, Ivan Lira de. op. cit., p. 122 e ss.
424
PRADE, Péricles. Conceito de Interesses Difusos, p. 49.
425
PRADE, Péricles. op. cit., p. 43.
426
DELGADO, José Augusto. Interesses Difusos e Coletivos : Evolução Conceitual. Doutrina e
Jurisprudência do STF, artigo in Revista de Processo, n. 98, abril/junho de 2000, p. 79.
427
MAZZILLI, Hugo Nigro. A Defesa dos Interesses Difusos em Juízo, p. 24 e ss.
428
MANCUSO, Rodolfo de Camargo. Ação Civil Pública, p. 26 e ss.
429
GRINOVER, Ada Pellegrini. Da Class Action for Damages à Ação de Classe Brasileira: os Requisitos
de Admissibilidade, artigo in Revista de Processo, n. 101, janeiro/março de 2001, p. 11/27.
430
CARP, Robert A. e STIDHAM, Ronald. Judicial Process in America, p. 312 e 313.
431
FARNSWORTH, E. Allan. An Introduction to the Legal System of the United States, p. 109.
432
Esse tipo de intervenção é comum em ações que discutem questões referentes às ações afirmativas.
SPANN, Girardeau A. The Law of Affirmative Action.
91

terceiros, que se desdobra em diversos institutos processuais (CPC, arts. 56/80)433. O


amicus curiae permite que terceiro participe de uma discussão cujo resultado projeta
efeitos em seus negócios.
Sua inserção em nosso modelo suscita curiosidade,
especialmente porque
O fato político e econômico da “globalização” (ou
mundialização) está impondo um revisão crítica no processo
judicial, com especial reflexão quanto aos meios necessários
para que os direitos do cidadão sejam amplamente
considerados. Nessa quadra de vigorosos comprometimentos
com os direitos, individual ou coletivamente considerados, a
ortodoxia não pode prevalecer no processo judicial e a
acomodação conduziria ao fim da jurisdição com o conteúdo
de sua efetividade434.

O volume pantagruélico de processos apreciados pelo


Supremo Tribunal Federal obriga-nos a refletir sobre outros modelos de admissibilidade,
a exemplo do writ of certiorari, que caracteriza o juízo de aceite da Suprema Corte norte-
americana. Aquela casa exerce total controle sobre os processos que julga, agindo em
regime de total discricionaridade, escolhendo os casos que quer julgar, em relação aos
quais sente-se madura e preparada para intervir435.
A carga de trabalho (work load) é controlada, a intervenção
da Suprema Corte é definitiva e vinculante. O prestígio de seus julgados é um dos
sustentáculos políticos da nação, mesmo em tempos de crise, para republicanos que não
conseguiram condenar Clinton pelo affair com Monica Lewinsky436 ou para os
democratas, que tiveram as eleições presidenciais de 2000 sequestradas437. Há também
certa atenção para com o contempt of court , pelo qual são punidos os atores processuais
que obstruem as atividades do judiciário438, indiretamente desprestigiando o papel da
justiça.

433
MACIEL, Adhemar Ferreira. Amicus Curiae : Um Instituto Democrático, artigo in Revista de
Processo, n. 106, abril/junho de 2002, p. 107.
434
PEREIRA, Milton Luiz. Amicus Curiae- Intervenção de Terceiros, artigo in Revista de Processo, n.
109, janeiro/março de 2003, p. 39.
435
REHNQUIST, William. The Supreme Court, p. 9.
436
POSNER, Richard A. An Affair of State, the Investigation, Impeachment, and Trial of President
Clinton.
437
DERSHOWITZ, Alan M. Supreme Injustice, How the High Court Hijaked Election 2000.
438
GIFIS, Steven H. Law Dictionary, p. 102.
92

Um dos maiores desafios que a globalização impõe no direito


processual brasileiro consiste na formatação e promulgação de um conjunto de normas
transnacionais de procedimento439, como concebida na Transnational Rules of Civil
Procedure, projeto dos professores Geoffrey C. Hazard Jr.e Michele Taruffo. Este último
é professor na Itália, aquele primeiro nos Estados Unidos.
O projeto pretende unificar no possível normas processuais
de várias famílias normativas. No entanto, por causa do direito constitucional ao tribunal
do júri, os Estados Unidos poderiam hostilizar o projeto. Assim,
Um aspecto que ameaça a legitimidade do projeto é que as
normas transnacionais não poderão ser adotadas
plenamente nos Estados Unidos, em um grande número de
casos. Primeiramente, em face da garantia constitucional do
júri em algumas controvérsias de natureza civil. O tribunal
do júri exige um processo até certo ponto incompatível com a
uniformização proposta pelo projeto. A própria existência do
júri já pode ser considerada como um drástico abandono do
ideal de uniformização pretendido pelas normas440.

Primeira leitura propõe certa utopia ou ingenuidade no


projeto de unificação de diplomas de processo civil441. Normas processuais internas
seriam usadas supletivamente442 e o modelo pressupõe intermináveis analogias
procedimentais, de complexo implemento na vida fática.
Desafia-se a cartografia do direito processual, na suposição
de que costumes moldados ao longo dos anos de normatividade interna cederão com
facilidade a esse direito processual da globalização.

Assim, efeitos da globalização no processo podem ser


sentidos na substancialização da busca de sua efetividade, por meio de um
instrumentalismo radical, por uma nova concepção de tempo, a justificar monitórias e
novos modelos de agravo e de antecipação de tutela, na vulgarização do uso da internet e
de outros meios cibernéticos para cumprimento de atos processuais e acompanhamento

439
GIDI, Antonio. Normas Transnacionais de Processo Civil, artigo in Revista de Processo, n. 102,
abril/junho de 2001, p. 184/196.
440
GIDI, Antonio. op.cit., p. 189.
441
GIDI, Antonio. op.cit., p. 195.
442
HAZARD JR., Geoffrey C. e TARUFFO, Michele. Normas Transnacionais de Processo Civil, artigo
in Revista de Processo n. 102, abril/junho de 2001, p. 201.
93

de processos, na concepção de um processo civil coletivo, refletindo uma sociedade de


massa, detentora de interesses difusos e coletivos, na aproximação com institutos norte-
americanos, a exemplo do amicus curiae, da contempt of court, da class action, e por fim
na tentativa de se implementar um processo civil transnacional.

2.6 Direito Civil

O direito civil brasileiro na era da globalização enfrenta uma


miríade de novos problemas, a propósito de questões de bioética, de antecessores
genéticos, de domicílio lógico, de novas relações matrimoniais, de infidelidade virtual,
tudo contraditoriamente marcado por um movimento de constitucionalização443 de temas
ordinariamente de topografia privatística444.
O monumentalismo dos códigos civis também cede a uma
plurivocidade normativa, no direito privado, o código civil perde sua centralidade,
superado por múltiplos microssistemas445. Integração de legislação civil em ambiente
normativo de processos integrativos também é tema que define a agenda de um direito
civil de mundo globalizado446.
O individual e o privado influenciam o geral e o público,
realizando-se a imagem de Guy Sormon, para quem o deslocamento de ar provocado
pelo batimento da asa de uma borboleta em Pequim pode provocar um furacão na

443
PRATA, Ana. A Tutela Constitucional da Autonomia Privada, p. 109 e ss.
444
PERLINGIERI, Pietro. Perfis do Direito Civil- Introdução ao Direito Civil Constitucional, p. 5.
445
BARROSO, Luís Roberto. Fundamentos Teóricos e Filosóficos do Novo Direito Constitucional
Brasileiro- pós-modernidade, teoria crítica e pós-positivismo, artigo in Revista Trimestral de Direito
Público, n. 29, p. 33.
446
LOBO, Paulo Luiz Netto. As Relações de Direito Civil nos Processos de Integração, artigo in Revista
da OAB, n. 66, julho/dezembro de 1997, p. 95 e ss.
94

Califórnia447. Trata-se de relação que suscita um nexo de causalidade entre ação micro e
efeito macro448. Problemas decorrentes de um grande números de efeitos que a
globalização promove, de difícil compreensão449, forçam o rompimento da dicotomia
entre direito público e privado, com reflexos conceituais e de cânone hermenêutico,
especialmente em relação a esse último, o direito privado, que regulamenta a autonomia
da vontade. É o caso de dúvidas vinculadas a questões de pessoas naturais, de
associações, de contratos, de sociedades nacionais e estrangeiras, de casamento.
Alterações conceituais exibem uma transformação de
paradigmas que supõe riscos e possibilidades450; luta o direito civil por nova raiz
antropocêntrica451 e conta nessa contingência com campos epistemológicos ancilares,
propiciadores do esboço de uma cartografia da transdisciplinaridade452 . O direito civil
de ambiente influenciado pela globalização não se isola em conteúdos normativos
estanques, e o índice sistemático do código pressupõe multivalência cultural para
compreensão de todos os assuntos que enfoca.
Temas instigantes de bioética já empolgaram a criação
literária e a imaginação artística, de uma certa forma anunciando problemas que a
contemporaniedade vive. A ciência desafia a evolução natural ( ou a complementa ) e a
difusão geográfica de suas técnicas promove questões de inquestionável projeção no
direito civil. Metodologicamente, e a propósito da referência à criação artística, a
apreensão do normativo por meio da literatura de ficção mediante a exploração de
caracteres típicos453 ou de criticismo literário de textos legais454 ou de reflexões a
propósito de um justo desejável455, articulam amplo campo especulativo.
Nesse sentido, necessária a referência a Robert Louis
Stevenson que em O Médico e o Monstro contrastou a candura do doutor Henry Jekyll

447
GAMBARO, Carlos Maria. Globalização das Economias – Análise do Pensamento de Guy Sormon,
artigo in Revista de Direito Constitucional e Internacional, n. 33, p. 46.
448
GAMBARO, Carlos Maria. op.cit., p. 50.
449
CAMPOS, Roberto. A Globalização e Nós, artigo in Folha de São Paulo, 20 de fevereiro de 2000.
450
FACHIN, Luiz Edson. Teoria Crítica do Direito Civil, p. 173.
451
FACHIN, Luiz Edson. op.cit., p. 174 e ss.
452
FACHIN, Luiz Edson. op.cit., p. 245 e ss.
453
WHITE, James Boyd. The Legal Imagination, p. 113 e ss.
454
BINDER, Guyora e WEISBERG, Robert. Literary Criticisms of Law, p. 201 e ss.
455
POSNER, Richard A. Law and Literature, p. 148 e ss.
95

com o desvario do senhor Edward Hyde456, aquele melancólico, este último maníaco, a
usarmos categorias alinhavadas por Michel Foucault457; o monstro nascera do médico, era
ele mesmo, e os caracteres insinuam limites éticos vinculados ao aproveitamento pelo
homem das descobertas científicas que faz.
Mary Shelley tocou em temas bioéticos em 1818, ano de sua
novela gótica Frankenstein , que retrata um cientista que ultrapassou os limites da ética e
da consciência moral458. O doutor Victor Frankenstein era um médico suíço que ainda
moço, fascinado pelos segredos do céu e da terra459 , sentindo-se como um Deus460,
elabora uma criatura, um monstro, cuja busca conduz a sua própria morte. A teratológica
figura sonhava em ser amada, era sensível à beleza da natureza, aos sentimentos
humanos. O monstro era desesperadamente só.
O romance retrata ambição, natureza humana, injustiças,
amizade, educação, destino. Demonstra que o homem pode artificialmente reproduzir a
vida, porém o ser que gera engendra o desconforto e o desajuste com o meio natural.
O problema ganha dimensão maior com a proliferação do uso
de tecnologias que a globalização e o maior contato entre as culturas e técnicas permite, a
exemplo de inseminação artificial, fecundação in vitro, doações de espermas, óvulos e
embriões461. Eduardo de Oliveira Leite investigou aspectos médicos, religiosos,
psicológicos, éticos e jurídicos que essa realidade prometaica estimula, questionando :
Os importantes processos ocorridos a partir da segunda
metade do século XX no setor das ciências da vida,
desafiaram pesquisadores, médicos e juristas, bem como a
opinião pública, com questões novas, graves e de difícil
resposta : pode-se e deve-se desenvolver tudo que é científica
e tecnicamente possível, em matéria de experiências sobre o
homem, de utilização do corpo humano e de procriação ? A
moral e o direito positivo estão suficientemente aptos a
enfrentar essas novas questões? Ou as novas técnicas estão a

456
STEVENSON, Robert Louis. O Médico e o Monstro, p. 18.
457
FOUCAULT, Michel. História da Loucura, p. 275. Citando H. Boerhaave e G. Van Swieten, Foucault
afirmou que A mania, portanto, não se distingue da melancolia a não ser por uma diferença de grau: é
a sequência natural desta, surge das mesmas causas e normalmente é curada pelos mesmos remédios.
458
SHELLEY, Mary. Frankenstein, especialmente p. 73: - Maldito ! Maldito criador ! Por que vivi ?
459
CAMPBELL, W. John. The Book of Great Books, p. 272.
460
E por essa razão o complemento do título original: O Moderno Prometeu. CAMPBELL, W. John.
op.cit., p. 276.
461
LEITE, Eduardo de Oliveira. Procriações Artificiais e o Direito, p. 50 e ss.
96

exigir novas regras capazes não só de contornar os


problemas daí decorrentes, como também estabelecer limites
de aplicação de novos conhecimentos?462

Propõe-se um rol de princípios463 orientadores de soluções


normativas, vinculando ética e tecnologia464. Respeito pela pessoa humana, beneficência,
justiça, autoconsciência, consentimento informado, defesa da vida física, liberdade,
responsabilidade, sociabilidade, legalidade de meios e fins, bem comum, seriam os
referenciais conceituais a inspirarem soluções para problemas concretos.
Essa principologia tende a encontrar albergue em textos
constitucionais e consequentemente aponta para outro ponto pertinente a um direito civil
de espaço globalizado, e que seja uma tendência a constitucionalização de certos nichos
do direito privado. É o caso da publicização do direito de família, hoje afetado pela
predominância do constitucionalismo465.
O direito de família também procura vencer um histórico
estranhamento com alternativas seculares de vida marital comum, moldadas em
companheirismo, concubinatos e uniões estáveis, percebidos socialmente por uma moral
impregnada de exuberante tolerância, reflexo de uma maior aceitação do outro ,
comportamento cultural que identifica aspecto positivo da chamada globalização das
culturas. Assim,
Verifica-se uma completa reformulação do conceito da
família atual. Não propriamente apenas no Brasil, mas como
um fenômeno mundial. Na maior parte dos cantos do
planeta, verifica-se que o modelo de família tradicional-
aquele que vigorava nos moldes greco-latinos,
posteriormente cristão- vem perdendo terreno para o
aparecimento de uma nova família. Uma família que
continua sendo imprescindível como célula básica da
sociedade, fundamental para a sobrevivência desta e do

462
LEITE, Eduardo de Oliveira. op.cit., p. 131.
463
FERREIRA, Jussara Suzi Assis Borges Nasser. Bioética e Biodireito, artigo in Scientia Juris, v. 2/3, p.
41/63.
464
CABOCLO, José Liberato Ferreira. Ética e Tecnologia, artigo in José Eberienos Assad (coord.),
Desafios Éticos, p. 256 e ss.
465
MORISHITA, Renata de Carvalho. Breves Considerações sobre a Constitucionalização do Direito de
Família, artigo in Intertemas, Revista do Curso de Mestrado em Direito da Associação Educacional
Toledo de Presidente Prudente, vol. 1, p. 275.
97

Estado, mas que se funda em valores e princípios diversos


daqueles outrora alicerçadores da família tradicional466.

Embora aparentemente alternativa, avançada e prospectiva, a


visão acima reproduzida mantém os cânones do conservadorismo, centralizando a família
(redimensionada) no espaço social e estatal. Conquanto que elegante e didaticamente bem
colocado, o excerto acima teima em desprezar caracteres antropológicos467, ditando uma
axiologia ocidental e homogênea para um mundo que se desdobra em plurívocas práticas
sociais.
Parece ser típico do discurso jurídico tradicional a
apropriação de relações de carinho e afeto que por opção não pretendem jurisdicização, e
que são desrespeitadas pelo brado reacionário do por que não casar 468? Estigmatiza-se o
concubinato, a união livre, a hemigamia469 , sob a falsa impressão de que há certa
aceitação, disciplinando-se o que ordinariamente pretendia-se não disciplinado. O
legislador constitucional de 1988 aproveitou-se da tendência e domesticou o que se
pretendia espaço jurídico vazio.
Fala-se contemporaneamente em um direito civil
constitucional por conta de uma dupla consideração do caráter normativo da constituição
e da presença de temas tradicionalmente civilísticos na redação constitucional. A
ingerência do texto constitucional no entorno econômico470 desenha, por exemplo, um
modelo de autonomia privada que identifica os contornos neoliberais da liberdade
negocial471, embora prenhe de intervenções modificativas de fachada472.
Sutil antinomia473 entre constituição e código civil, no
entanto, plasma a imprestabilidade de um texto codificado eminentemente
patrimonialista, em cotejo com uma redação constitucional que se propõe a concretizar a

466
GAMA, Guilherme Calmon Nogueira da. O Companheirismo- uma Espécie de Família, p. 68.
467
MEAD, Margaret. Sexo e Temperamento, especialmente p. 267 e ss.
468
PEREIRA, Rodrigo da Cunha. Concubinato e União Estável, p. 60.
469
RIEZO, Barboza. Do Concubinato, p. 7.
470
FERREIRA, Sergio D’Andréa. O Direito e a Realidade Econômica Brasileira, artigo in Oliveiros
Litrento (coord.), Perspectivas Atuais do Direito, p. 167/180.
471
PRATA, Ana. op.cit., p. 13.
472
PERLINGIERI, Pietro. op.cit., p. 24.
473
BOBBIO, Norberto. Teoria do Ordenamento Jurídico, p. 81 e ss.
98

dignidade da pessoa humana474, conteúdo que no sistema global é definido por maioria
que qualifica força e deliberação internacional como referencial de unanimidade475.
De tal modo, o poder jurídico da vontade livre apresenta-se
como característica diferenciadora do negócio jurídico476 e o negócio jurídico deixa de
representar uma simples forma de troca de bens e passa a espelhar a realização de uma
liberdade econômica477 . O problema ( ou falso problema ) é que essa liberdade
econômica varia contingencialmente com a conformação da organização do sistema
capitalista, e nesse sentido o direito brasileiro torna-se vulnerável478 a influências
externas479, produzidas nos centros do sistema, esse hodierno espaço triádico invocado
por François Chesnais480.
Engessada por essas categorias que fracionam a existência
negocial em âmbito constitucional ou privado emerge uma onda típica de nossos tempos,
inconformada, muitas e inúmeras vezes em regime de desconfiança para com a ordem
neoliberal e identificada com o nome de sociedade civil global (global civil society)481,
traduzida em modelos de terceiro setor482.
Associações civis postulam interesses difusos, coletivos e
transindividuais, perfilando personalidades jurídicas matizadas por ongs- organizações
não governamentais. As ongs podem ser metaforicamente percebidas como ordens
mendicantes da contemporaniedade, conduzindo guerras justas sem armas, sem
violência, sem fronteiras, como os domicanos na baixa idade media e os jesuítas no inicio
da idade moderna483.

474
FACHIN, Luiz Edson. Sobre o Projeto do Código Civil Brasileiro: Crítica à Racionalidade
Patrimonialista e Conceitualista, separata do Boletim da Faculdade de Direito da Universidade de
Coimbra, vol. LXXVI, p. 150.
475
CAMPILONGO, Celso Fernandes. Direito e Democracia, p. 102.
476
MALFATTI, Alexandre. Liberdade Contratual, artigo in Renan Lotufo (coord.), Cadernos de
Autonomia Privada, vol. 2, p. 16.
477
MALFATTI, Alexandre. op.cit, loc.cit.
478
FURTADO, Celso. Formação Econômica do Brasil, p. 186 e ss.
479
BRUM, Argemiro J. Desenvolvimento Econômico Brasileiro, p. 169 e ss.
480
CHESNAIS, François. A Mundialização do Capital, p. 36.
481
KALDOR, Mary. Global Civil Society, artigo in David Held e Anthony McGrew (ed.), The Global
Transformations Reader, p. 559 e ss.
482
VIANNA, Camillo Kemmer. Terceiro Setor: Do Direito Social às Associações Civis de Interesse
Público. Mimeo, trabalho de conclusão de curso, Universidade Norte do Paraná, Londrina. Orientação
de Eugênia Maria Veloso de Araújo Cunha.
483
NEGRI, Antonio e HARDT, Michael. Empire, p. 36.
99

O tão decantado aggiornamento do novo código civil


484
brasileiro , supostamente etiquetado por objetividade e contemporaniedade485 , com
base em princípios de eticidade, sociabilidade e operabilidade486 não alcançou a
realidade dessas pessoas jurídicas, genericamente rubricadas sob o título de associações,
rotuladas como realizadoras de fins não econômicos487. O terceiro setor ocupa espaços
que desidiosamente o Estado tornara neutros, promove oportunidades de emprego que os
segmentos tradicionais (público e empresarial) não conseguem gerar e se ocupam de
atividades de inegável valor social, a exemplo da defesa do meio ambiente.
Esse setor passa a ser efetivamente regulamentado por uma
profusão de normas, encontradas no código e fora do código, qualificando esses
microssistemas normativos do espaço jurídico globalizado, identificando um processo de
contínua descodificação488. Espécies de associações, estatutos, registros de atos
constitutivos, extinção, regime de trabalho ( voluntário ou remunerado ), regime
tributário, elenco de incentivos fiscais, de imunidades, de subvenções sociais, de auxílios,
de obtenção de título de utilidade pública, de certificado de entidade de fins filantrópicos,
títulos de organizações sociais, modelo de qualificações, exigências estatutárias gerais,
pedidos e perda de qualificações, termos de parcerias, são temas disciplinados por vários
diplomas legais, enobrecendo um microssistema com vida própria, embora inseridos no
modelo jurídico estatal, pelo que não se vislumbra (ainda) aquele neomedievalismo
jurídico que intriga um pluralismo conceitual que percebe vários sistemas jurídicos além
do regime estatal convencional489.
As sociedades nacionais, definidas no artigo 1126 do novo
código civil490, sofrem competição acirrada de sociedades estrangeiras, estas últimas

484
Lei 10.406, de 10 de janeiro de 2002.
485
MARINHO, Josaphat. O Projeto do Novo Código Civil, artigo in Revista de Informação Legislativa, n.
146, abril/junho de 2000, p. 13.
486
REALE, Miguel. Visão Geral do Novo Código Civil, artigo in Revista de Direito Privado, n.9,
janeiro/março/2002, p. 12 e ss.
487
Código Civil, art. 53 : Constituem-se as associações pela união de pessoas que se organizem para fins
não econômicos.
488
ANDRADE, Fábio Siebeneichler de. Da Codificação- Crônica de um Conceito, p. 111 e ss.
489
BULL, Hedley. Beyond the States System? artigo in David Held e Anthony McGrew (ed.), op.cit., p.
577 e ss.
490
Código Civil, art. 1126 : É nacional a sociedade organizada de conformidade com a lei brasileira e que
tenha no País a sede de sua administração.
100

identificas no artigo 1134 do já aludido livro de leis civís491. O capital estrangeiro se


insinua também ( e principalmente ) em nível constitucional, e essa a explicação para a
promulgação de emendas constitucionais que romperam o monopólio estatal na
distribuição de gás, nas telecomunicações e na exploração de petróleo, além do fim da
reserva de mercado da navegação interna e de benefícios para companhias brasileiras de
capital nacional. Os IDES- investimentos diretos externos492 atuam por meio das ETNS-
empresas transnacionais , na periferização de nosso modelo econômico.
A estrutura jurídica dessas pessoas morais determina que o
direito civil brasileiro preveja novos atores. De tal modo, além das figuras tradicionais,
públicas, privadas, fundacionais, de primeiro e de segundo setor, a par de modelos
organizacionais de terceiro setor, surgem também personalidades miméticas que realizam
o triunfo do capital internacional. Efetivamente,
Expressão de uma crescente necessidade internacional de
regulação, que o sistema vigente não podia satisfazer, as
organizações governamentais e não-governamentais
proliferaram rapidamente. De 1939 a 1980, as organizações
governamentais aumentaram de 80 para mais de 600,
enquanto as ONGs cresceram de 730 para 6.000. Dos anos
80 em diante, fatores que, ao lado de alguns outros
(degradação ambiental global, erosão da hegemonia norte-
americana, dificuldades de integração do Leste europeu na ‘
nova ordem mundial’ ), apontam para a revisão do sistema
internacional493.

Por fim, essas transformações redimensionam o tradicional


corte entre conteúdos de direito público e privado, determinante da saga das codificações,
que se inscrevem no planisfério das ideologias legalistas494 e que encontram no modelo

491
Código Civil, art. 1134 : A sociedade estrangeira, qualquer que seja o seu objeto, não pode, sem
autorização do Poder Executivo, funcionar no País, ainda que por estabelecimentos subordinados,
podendo, todavia, ressalvados os casos expressos em lei, ser acionista de sociedade anônima
brasileira.
492
BENAYON, Adriano. Globalização versus Desenvolvimento, p. 150 e ss.
493
VIEIRA, Liszt. Cidadania e Globalização, p. 110.
494
CARBASSE, Jean-Marie. Manuel d’introdution historique au droit, p. 276.
101

francês o exemplo mais acabado495, envolvido por tom nitidamente conservador496 e que
alcançou também a tradição germânica497.
O pós-modernismo que oxigena as tendências jurídicas
globalizantes representa uma reação contra tendências generalizadoras e racionalizadoras
da modernidade498, indicativas da apropriação do conceito romano de público e
privado499, identificado nos códigos jusracionalistas500, também produzidos na periferia
do sistema501, porém moldados na continuidade da realidade jurídico-positiva de matiz
dogmática e legalista européia502, que sempre guardou traços da tradição canônica503.
A constitucionalização do direito civil torna-o menos
privado e mais público. A descodificação torna-o menos público e mais flexibilizado,
privatizando-o portanto. Assim, descrevendo movimento pendular, oscilando entre
referenciais hermenêuticos públicos e privados, o direito civil brasileiro do mundo
globalizado vive um tempo de profundas transformações práticas e conceituais.

495
BASDEVANT-GAUDEMET, Brigitte e GAUDEMET, Jean. Introduction Historique au Droit, XIIe-
XXe siècles, p. 359.
496
CAENEGEN, R. C. van. Uma Introdução Histórica ao Direito Privado, p. 7.
497
MOLITOR, Erich e SCHLOSSER, Hans. Perfiles de la Nueva Historia del Derecho Privado, p.103 e
ss.
498
HESPANHA, António M. Panorama Histórico da Cultura Jurídica Européia, p. 246.
499
ALVES, José Carlos Moreira. Direito Romano, v. I, p. 69. MEIRA, Silvio A. B. Instituições de Direito
Romano, p. 25. F. Mackelden, Manuel de Droit Romain, p. 75 e ss. FOIGNET, René. Manuel
Elementaire de Droit Romain, p. 22.
500
WIEACKER, Franz. História do Direito Privado Moderno, p. 365 e ss.
501
EYZAGUIRRE, Jaime. Historia del Derecho, p. 208.
502
BARCHET, Bruno Aguilera. Introducción a la Historia del Derecho, p. 113.
503
GILISSEN, John. Introdução Histórica ao Direito, p. 133 e ss.
102

2.7 Direito do Consumidor

Sob forte influência da globalização, o direito do consumidor


queda-se para a cidadania como elemento fundamental da ordem jurídica504, centrando a
proteção das relações de consumo naquele que é ontologicamente menos suficiente,
fragilizado numa sociedade de risco505. A intensidade das negociações pactuadas por
meio cibernético fomenta um estatuto jurídico orientado para apreender realidades
negociais em extensões virtuais. Transferências de tecnologia e planejamento industriais
de grande nível506, com meios eletrônicos de distribuição, a exemplo da amazon.com,
pulverizam um dos pólos da relação de consumo, dificultando a intervenção do judiciário
na correção de irregularidades.
Verifica-se um impacto da globalização na ordem
contratual507, principalmente a partir da difusão do uso do contrato eletrônico, no qual as
declarações convergentes de vontades são efetuadas pela internet, seja mediante correio
eletrônico (e-mail), salas de conversação ou bate-papo (chat) e páginas eletrônicas
(web-sites)508. Tratativas comerciais de origem cibernética menoscabam a presença
estatal, enfraquecendo-o, realizando o projeto neoliberal de um Estado mínimo e de
intervenção anêmica, embora pelo menos conceitualmente subsistam inúmeras formas de
atuações políticas organizadas na atividade econômica509, como sujeito de direito dessas
relações510.

504
FARIAS, Cristiano Chaves de. A Proteção do Consumidor na Era da Globalização, artigo in Adroaldo
Leão e Rodolfo Pamplona Filho (coord.), op.cit., p. 25 e ss.
505
CASTRO, Fabiana Maria Martins Gomes de. Sociedade de Risco e o Futuro do Consumidor, artigo in
Revista de Direito do Consumidor, n. 44, outubro/dezembro de 2002, p. 122 e ss.
506
Exemplo marcante é da empresa Nike, uma das maiores produtoras de sapatos de tênis do mundo, que
não produz sequer um cadarço. Segundo Claudio Henrique de Castro, seus quinze mil funcionários
direitos constituem-se em uma estrutura de estratégia mercadológica, desenvolvimento de produtos e
subcontratação de serviços de produção, com sua terceirização gerando noventa mil empregos indiretos.
DUPAS, Gilberto. Economia Global e Exclusão Social, p. 42, apud Claudio Henrique de Castro, A
Globalização : Definição, efeitos e possibilidades no Direito, p. 30.
507
BRAGA FILHO, Pedro. Globalização e a Teoria Geral dos Contratos, artigo in Adroaldo Leão e
Rodolfo Pamplona Filho (coord.), op.cit., p. 241 e ss.
508
BRAGA FILHO, Pedro. op.cit., p. 251.
509
GRAU, Eros Roberto. op.cit., p. 135 e ss.
510
VIDIGAL, Geraldo Camargo de. op.cit., p. 63 e ss.
103

O mundo globalizado é caracterizado por novas tecnologias,


que alcançam todos os campos da vida humana, e referência faz-se também
especificamente aos alimentos geneticamente modificados, os chamados transgênicos.
Esses produtos são comercializados e encetam projeções inesperadas nas relações de
consumo.
Vínculos entre cidadania e direito do consumidor, a propósito
de informações referentes às características dos transgênicos, promovem interessantes
enquadramentos marcados por acirradas tomadas de posição. Inegável que a disciplina
jurídica da comercialização de transgênicos exija adequação ao microssistema de direito
que caracteriza o código de defesa do consumidor. De tal modo,
No caso dos alimentos transgênicos, tem-se evidenciado
inequivocadamente a percepção dos consumidores e da
sociedade em geral de que a informação sobre a natureza do
alimento é relevante para o exercício da liberdade de
escolha. Tanto assim que não somente os consumidores, mas
também os fornecedores, ainda que por motivos diversos,
têm-se mobilizado no sentido de obtenção e dação da
informação sobre a qualidade transgênica dos alimentos511.

A falta de informações por parte do consumidor, em relação


aos alimentos geneticamente modificados, tem suscitado uma onda de protestos. Tais
movimentações lembram-nos movimentos contra a fluoretação da água, a pasteurização
do leite, o bebê de proveta, as pílulas anticoncepcionais, entre outros512. Transparência de
informações ao consumidor, em âmbito de comercialização de transgênicos, demanda
esclarecimentos referentes a preconceitos, mitos e dúvidas quanto aos alimentos
geneticamente modificados.
De acordo com matéria divulgada por revista de informação
de circulação nacional513, o consumidor e o cidadão questionam se a ingestão de grão
transgênico pode provocar alergia, o destino dos grãos experimentais, as relações entre
câncer e o consumo de tais alimentos e entre esses alimentos e os genes que recebem de
bactérias resistentes a antibióticos. Pergunta-se se a ingestão de alimentos geneticamente

511
FREITAS FILHO, Roberto. Os alimentos geneticamente modificados e o direito do consumidor a
informação, artigo in Revista de Informação Legislativa, Abril-Junho/2003, n. 158, p. 150.
512
Revista Veja, 29 de outubro de 2003, p. 98.
513
Revista Veja, 29 de outubro de 2003, p. 100 e ss.
104

modificados poderia alterar a cadeia de DNA do próprio homem. Questiona-se qual o


risco de uma semente transgênica em fase de teste ser roubada de laboratório e
contaminar a natureza. Pergunta-se se o vento espalhar sementes de uma lavoura
transgênica, outras espécies naturais não poderiam sofrer mutações perigosas.
Uma perspectiva de cidadania consumerista determina o
esclarecimento de questões, como as acima elencadas. Embora, bem entendido, saiba-se
que as aludidas indagações, de altíssimo conteúdo científico, não estão presentemente
pacificadas. Assim,
A cidadania consumerista se realiza, num de suas dimensões,
por meio de efetiva participação do consumidor na relação
de consumo de forma consciente e autônoma, expressando
ampla e livremente a sua capacidade individual de escolha e
realizando a satisfação de suas necessidades e desejos. O
instrumento fundamental para a realização da cidadania
consumerista é o acesso à informação514.

As relações de consumo no mundo globalizado também


sofrem o impacto da utilização de vários meios negociais, a exemplo dos cartões de
crédito, comuns nas aquisições por meio eletrônico, via internet. Questiona-se a
aplicabilidade da disciplina do direito do consumidor ao sistema de cartões de crédito515,
tema também diretamente vinculado ao ordenamento que regulamenta o sistema
financeiro nacional, questão que é prioritariamente de fundo constitucional516.
A penosa questão da eventual inserção de administradoras de
cartões junto ao rol de instituições financeiras517 stricto sensu gera aporias no que toca a
subsunção do modelo negocial de dinheiro de plástico em esfera de normatividade de
consumo. Preocupações quanto a cobrança de multas em valores superiores aos previstos
pelo CDC, ao envio de cartões de crédito sem solicitação do consumidor, entre outras518,

514
FREITAS FILHO, Roberto. op.cit., p. 158.
515
PEDERIVA, João Henrique. O direito do consumidor, o sistema financeiro e os cartões de crédito,
artigo in Revista de Informação Legislativa, Janeiro/Março de 2002, n. 153, p. 201 e ss.
516
FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves. Direito Constitucional Econômico, p. 130 e ss.
517
OLIVEIRA, Leonardo Henrique Mundim Moraes. As Instituições Financeiras no Direito pátrio:
definição e caracterização de atividade própria ou exclusiva, artigo in Revista de Informação
Legislativa, Abril/Junho de 1999, p. 75 e ss.
518
PEDERIVA,João Henrique. op.cit., p. 214.
105

promovem releituras das relações mercantis em consonância com desideratos de


eficiência519 negocial com um mínimo de garantias constitucionais520.
A internacionalização das relações de consumo, que
acompanha a mundialização do capital faz com que o Brasil se preocupe mais ativa e
eficazmente com a normatividade da proteção ao consumidor521. Dois motivos justificam
a preocupação:
O primeiro diz respeito aos princípios básicos dos direitos
humanos estabelecidos pelas Nações Unidas, em cujos
direitos se encontram inseridos os direitos do consumidor, e
o segundo, o aumento da competitividade, melhorando a
qualidade e a segurança dos produtos em nível nacional e
internacional, segundo os padrões world-class522.

Percebe-se uma tendência salutar de exportação de qualidade,


devido a uma imperiosa necessidade de adequação do produto nacional a padrões
internacionais. Por outro lado, nem tudo o que é importado é por isso de boa
qualidade523, não obstante ambiente cultural nacional que teima em hipervalorizar a
mercadoria estrangeira, a exemplo dos pneumáticos, que no exterior são fabricados para
condições de uso em estradas distintas das nossas. O mesmo pode ser verdadeiro no que
toca ao automóvel importado. O elemento preço exerce papel importante em avaliações
qualitativas, por parte do consumidor consciente, que procura evitar cair em armadilhas
decorrentes de todas formas de fraude524.
A globalização promove alterações na estrutura produtiva e
no mercado525, redimensionando relações de consumo. Estratégias de marketing são
revistas e a receptividade do consumidor para com as investidas que sofre tem variado
substancialmente. Vislumbram-se intensas modificações nos modelos de industrialização.
Foi-se o modelo fordista, também chamado de taylorista526, baseado na grande fábrica,

519
POSNER, Richard A. Economic Analysis of Law, p. 10 e ss.
520
GRAU, Eros Roberto. op.cit., p. 216 e ss.
521
SOUZA, Miriam de Almeida. Direito do Consumidor e a Globalização, artigo in Adroaldo Leão e
Pamplona Filho (coord.), op.cit., p. 194.
522
SOUZA, Miriam de Almeida. op.cit., p. 194/195.
523
SOUZA, Miriam de Almeida. op.cit., p. 195.
524
POSNER, Richard A. Economic Analysis of Law, p. 111 e ss.
525
MACEDO JÚNIOR, Ronaldo Porto. Globalização e Direito do Consumidor, artigo in Carlos Ari
Sundfeld e Oscar Vilhena Vieira (coord.), op. cit., p. 225 e ss.
526
HOBSBAWN,Eric. The Age of Revolution, p. 42 e ss.
106

orquestrado na Inglaterra527 , de planificação periódica, com treinamento amplo, visando


tarefas rotineiras528 e fragmentadas529, nas quais verifica-se um trabalhador
530
monoqualificado , controlado por uma burocracia hierarquizada.
O fabricante definia o produto, impondo-o ao comprador. Era
quando Henry Ford afirmava que o consumidor poderia comprar o automóvel da cor que
quisesse, desde que fosse preto... Matérias-primas, gêneros tropicais exóticos e mercados
consumidores eram buscados na África e na Ásia, continentes que tanto inflamavam a
imaginação de aventureiros e viajantes ingleses531.
A mudança de paradigmas dá-se com a especialização
flexível da média e pequena fábrica, que qualifica o modelo pós-fordista. As fábricas
adaptam-se à demanda, fazendo acompanhamento de pedidos on line. Trabalhadores
recebem tratamento específico, as tarefas passam a ser variadas, exigindo
poliqualificação. Redes descentralizadas atendem necessidades ditadas pelo consumidor,
em que pese uma certa inércia desses últimos532, embora tendentes a estratégias comuns,
dado o suposto processo de interligação dos múltiplos povos ao redor do mundo533 .
Assim,
A estratégia da especialização flexível ou pós-fordista visa
fundamentalmente obter vantagens de mercado, oferecendo
um produto com tecnologia única, qualidade única, ou
apoiada por serviço único. A oferta de um bem único permite
a criação de um nicho, o que, por sua vez, permite a
manutenção de alto grau de lucratividade e estabilidade
comercial. Isso, entretanto, requer a constante mudança do
produto, a combinação de inovação com formas flexíveis de
produção534.

A sociedade de consumo adquire feições de uma sociedade


de serviços. Aumenta o volume de insatisfações, gerando-se um grande número de
conflitos, que fogem ao alcance do judiciário convencional. Direitos menos individuais e

527
BENAYON, Adriano. Globalização versus Desenvolvimento, p. 32 e ss.
528
As aludidas tarefas são magistralmente retratadas por Charlie Chaplin no filme Tempos Modernos.
529
HUNT, E.K. History of Economic Thought, p. 204 e ss.
530
DEANE,Phillis. A Revolução Industrial, p. 159 e ss.
531
LOVELL, Mary. A Rage to Live, a Biography of Richard and Isabel Burton, especialmente p. 664 e
ss.
532
POSNER, Richard A. Economic Analysis of Law, p. 546.
533
ROCHMAN, Alexandre Ratner. Globalização, uma Introdução, p. 80.
534
MACEDO JÚNIOR, Ronaldo Porto. op.cit., p. 230.
107

mais difusos apresentam aporias para a jurisdicização e composição de conflitos em


matéria de direito do consumidor.
Muito claro o impacto da globalização no ordenamento
brasileiro de direito das relações de consumo. Trata-se de categoria normativa subsumida
aos mais altos princípios de cidadania, viabilizando-se uma cidadania consumerista. No
exercício dessa modalidade política percebe-se o direito do consumidor no sentido de
obter informações, e nesse caso a questões dos transgênicos é importantíssimo exemplo.
Observa-se inequívoca diminuição do tamanho do Estado, e um dos sintomas consiste na
desjurisdização de discussões sobre relações de consumo.
Novos contratos, de formatação cibernética, suscitam
modelos hermenêuticos alternativos e pragmáticos. É o caso do entendimento em matéria
de cartão de créditos, a propósito da inserção das casas administradoras na qualidade de
instituições financeiras e da aplicação do CDC na regulamentação ancilar da matéria.
Percebe-se tendência de exportação de qualidade, por conta de exigência de padrões
internacionais, com reflexos positivos no consumidor brasileiro, no que toca à qualidade
do produto. Novas estratégias de marketing afetam o consumidor em suas decisões,
refletindo aspectos do modelo pós-fordista e certa potencialização do consumidor no que
tange a ditar gostos e tendências, embora reconheça-se que pressionados por estruturas
mediáticas.
Em todos os campos do direito fica muito claro o impacto da
globalização em questões de Estado, Nação e Soberania535, com reflexos intensos na vida
cotidiana, mesmerizada numa reforma institucional que nunca se implementa, porque
focalizada em uma esperada consolidação democrática536 de pouca factibilidade. Céticos
e globalistas ainda discutem conceitos que dividem perspectivas entre aqueles que apenas
acreditam em mitigada internacionalização, contrapostos por aqueles que se rendem à
miragem de um mundo unido por fluxos intensos, que aproximam povos e continentes537,
realizando uma utopia, qual a imagem do superlativo freudiano que analisa sonhos nunca
sonhados.

535
FARIA, José Eduardo. O Direito na Economia Globalizada, p. 16.
536
PUCEIRA, Zuleta. O Processo de Globalização e a Reforma do Estado, artigo in José Eduardo Faria
(org.), Direito e Globalização Econômica- Implicações e Perspectivas, p. 110.
537
HELD, David e McGREW, Anthony. The Global Transformations Reader, p. 38.
108

3. Conclusões

A presente abordagem dos efeitos da globalização, do

neoliberalismo e da mundialização do capital em relação ao direito brasileiro permite que


se indiquem as seguintes conclusões:
1. Nossa condição periférica torna-nos ambiente propício a
mecanismos de acumulação de capital por parte do centro do sistema;
2. Formata-se um modelo jurídico garantidor da
desregulamentação, da miniaturização do Estado, da limitação de direitos, da mitigação
de conquistas históricas, da mão-de-obra barata, do livre acesso e circulação do capital
estrangeiro;
3. O ideário neoliberal no Brasil foi divulgado por Roberto
Campos, crítico virulento do texto constitucional estatizante de 1988;
4. Uma oposição entre juristas e economistas plasma nosso
tempo. Aqueles estão mais preocupados com os meios e com valores atinentes à justiça,
estes últimos preocupam-se com os fins e com a eficiência. A usarmos categorias
weberianas, os juristas atuam nos moldes da ética da responsabilidade, os economistas
agem nas premissas da ética da convicção;
4. O direito previdenciário relê o princípio da solidariedade e
uma reforma constitucional em andamento pretende ajustar nosso modelo a um mínimo
de encargos para o Estado;
5. O direito penal plasma a internacionalização dos delitos,
um movimento de responsabilização das pessoas jurídicas e um provável modelo de
privatização ou de terceirização da justiça;
6. O direito internacional disciplina uma nova ordem
mundial, ensejadora do desmonte do projeto de direito supranacional de Hans Kelsen, por
conta da diminuição dos poderes da Organização das Nações Unidas;
109

7. O direito ambiental opõe economia e ecologia, com


desdobramentos na perspectiva de desenvolvimento sustentável;
8. O direito constitucional brasileiro promove uma
remodelação do Estado, como decorrência do implemento de novos paradigmas de
soberania e de ordem econômica;
9. Vive-se uma crise constitucional, acelerada pela
proliferação de emendas que reduzem direitos conquistados no texto original de 1988;
10. Denuncia-se que a constituição está relegada a mero
documento simbólico, reduzida a simples referencial cultural;
11. Percebe-se uma incompatibilidade entre o texto
constitucional em vigência e a ordem econômica em curso, especialmente em âmbito de
direitos subjetivos públicos plasmados nos acordos de 1988;
12. Desnacionalizar, desestatizar, desconstitucionalizar e
desregionalizar parecem ser os verbos que caracterizam as atuais tendências do direito
público brasileiro;
13. Esse realinhamento constitucional conseqüente da
globalização promove três atitudes conceituais: uma percepção neoliberal de vitória,
como se a história realmente estivesse no fim (com raízes em Fukuyama), uma leitura
nostálgica que prega incondicional retorno às linhas essenciais do texto de 1988 e uma
concepção realista que defende reformas necessárias com um mínimo de perda de direitos
conquistados;
14. Desenvolve-se um direito administrativo consensual,
mediante uma crescente delegação de serviços públicos;
15. Promove-se um açodado processo de privatizações, com
pesadíssimos encargos para interesses nacionais que podem ser reputados como
primários;
16. Proliferam as agências reguladoras, que desfrutam de boa
margem de autonomia, com diretoria com mandato fixo, com objetivo de flexibilizar o
modelo de administração pública, de modo a garantir ambiente favorável para a atração
de investimentos;
110

17. Redesenha-se o estatuto do servidor público, que perde


direitos e que vive exigências relativas ao desempenho e a eficiência;
18. O direito do trabalho brasileiro promove regras que
possibilitam o dumping social, mediante a proliferação de normas que restringem direitos
sociais;
19. Verifica-se tendência de alteração substancial de regras
de direito do trabalho em função de formação de modelo garantidor de mão-de-obra
barata;
20. Percebe-se uma diminuição da participação do
movimento sindical no sistema de reivindicação de direitos trabalhistas;
21. Há tendência de se garantir a liberdade econômica da
empresa em detrimento da liberdade do trabalho, como projetada pela tradição do direito
do trabalho;
22. O direito tributário promove mecanismos que
possibilitam o aumento das imposições fiscais, dada a necessidade do Estado em obter
recursos para atender às pressões externas;
23. O Estado brasileiro tende a ampliar sua base de
imposição mediante a utilização de contribuições, que por força de comando
constitucional não precisam ser divididas com os demais entes da federação;
24. O direito processual civil brasileiro tende a adaptar-se a
uma sociedade de massa, razão pela qual tutela direitos difusos e coletivos, ampliando os
modelos de jurisdição, em relação a esses direitos;
25. Critica-se o abstracionismo conceitual que cede espaço
ante f'órmulas de instrumentalização da atividade procedimental;
26. Expectativas de celeridade promovem a discussão em
torno da utilização da súmula vinculante por parte do direito brasileiro;
27. Cogita-se de um novo conceito de tempo processual,
categoria teórica que oxigena discussões a propósito de questões como a pertinente à
morosidade da justiça;
111

28. A revolução no controle e no gerenciamento das


informações altera substancialmente o cotidiano forense. Teme-se uma ditadura da
chamada informática da dominação, antídoto natural do proselitismo cibernético;
29. O direito processual brasileiro flerta com alguns modelos
procedimentais norte-americanos, a exemplo do amicus curiae, da class action e com o
writ of certiorari, entre outros;
30. Cresce a tendência de ser pensar um direito processual
internacional;
31. O direito civil gestiona temas que refletem a globalização
da ciência, a exemplo de aspectos de bioética, de domicílio lógico, de infidelidade virtual,
entre outros;
32. Percebe-se também uma constitucionalização do direito
civil;
33. Presenciam-se novas modalidades de identidades
jurídicas, a exemplo das ongs- organizações não governamentais;
34. O direito do consumidor passa a ser formatado em termos
de cidadania consumerista;
35. A transparência das intervenções midiáticas e a
otimização pedagógica de normas indicativas de pureza informacional exigem posturas
claras e exatas a exemplo de bens de consumo imediato, como alimentos transgênicos;
36. Novos meios negociais, como os franqueados pelo uso
da internet e dos contratos eletrônicos determinam a apreensão jurídica de relações
diferenciadas de consumo;
37. A internacionalização das relações de consumo oxigena a
formatação de modelos de exportação de proteção ao consumidor;
38. Substitui-se o modelo fordista de organização industrial
por sistemática novíssima, calcada na ditadura do consumidor;
39. Esboçam-se tarefas de pulverização da especialização do
trabalhador, cuja rotina é determinada pela demanda on line;
40. A globalização é metáfora que exprime condição
econômica e cultural, com fortíssimos reflexos no direito brasileiro.
112

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