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PSICOLOGIA COMO

CIÊNCIA
Recapitulando... De acordo com um velho provérbio: “Nós começamos confusos, e terminamos
confusos num nível mais elevado”.

◦ O conhecimento humano:
“O homem apresenta diversas formas de ver e explicar o mundo e nele construir hipóteses experimentando-as
ou não, mas sempre buscando superar os limites do conhecimento que produz. Ao procurar conhecer para
dominar o mundo que o pertence ele classifica e ordena critérios para construção de verdades sobre si e sobre
o mundo que o contém.”

Quais as formas de conhecimento humano?


Senso-comum
“Esta expressão não foi inventada pelas pessoas de senso comum. Creio que elas nunca se preocuparam em se
definir. [...] a expressão ‘senso comum’ foi criada por pessoas que, segundo seu critério, são intelectualmente
inferiores. Quando um cientista se refere ao senso comum, ele está, obviamente, pensando nas pessoas que não
passaram por um treinamento científico [...]. (ALVES, 1994, p. 13)
◦ A aprendizagem da ciência é um processo de desenvolvimento progressivo do senso comum. Só podemos
ensinar e aprender partindo do senso comum de que o aprendiz dispõe. - A raquete
Contexto do paradigma cientifico
◦ Com a crise das explicações religiosas, a ciência destaca-se como conhecimento legítimo, se afirmando como
verdade e progresso. As descobertas e os efeitos dos novos inventos, como o pára-raios e as vacinas, o
desenvolvimento da mecânica, da química e da farmácia eram amplamente verificáveis, dando credibilidade às
atividades científicas a partir do século XV, configurando o nascimento da ciência moderna.
◦ Desde então, o conhecimento da ciência se afirma como verdade.
Semmelweis X microorganismos
Muitas ideias foram aceitas e usadas durante um certo período, para serem abandonadas depois. O
fato de terem sido abandonadas significará, por acaso, que aqueles que as acolheram e com elas
trabalharam não eram cientistas?
◦ “Contra o positivismo, que para perante os fenômenos e diz: ‘Há apenas fatos’. eu digo: ‘Ao contrário,
fatos é o que não há; há apenas interpretações’.” Nietzsche

◦ Estou dizendo isto para que você compreenda algo muito simples: o conhecimento das relações causais
não exige o exercício da reflexão. Ele se encontra aquém do conhecimento científico.
Fatos neutros?
◦ “Ao enunciar um fato, da forma mais simples e direta, não o estarei já capturando com minhas teias teóricas?
Haverá uma pura descrição de fatos, livre de pressupostos? “Falar sobre as coisas (...) é aplicar a teoria do
universo, implícita em nossa linguagem, aos particulares sobre que falamos” (M. Polanyí. op. cit. p. 81)
Provocação:
◦ Carta à Einstein:
“Todas as ciências, porém, não chegam, afinal, a uma espécie de mitologia como esta? Não se pode
dizer o mesmo, atualmente, a respeito de sua física?” (Freud, 1933/1976, p. 254)
Interpretação e senso crítico
◦ “A opinião de que o progresso científico é meramente uma questão de contínuas descobertas de fatos novos,
tem o efeito de desencorajar o tipo de pensamento de que mais se necessita no trabalho científico. Os fatos
empíricos podem, no final das contas, servir apenas como matéria-prima para a ciência; em si mesmos, até
que tenham sido trabalhados e interpretados, são totalmente inúteis” (Lecky. op. cit. p. 69).
◦ Necessidade da atitude científica que leva ao desafio dos paradigmas e ao crescimento do conhecimento
científico.
Reflita
◦ “Se existe uma classe especializada em pensar de maneira correta (os cientistas), os outros indivíduos são
liberados da obrigação de pensar e podem simplesmente fazer o que os cientistas mandam. Quando o
médico lhe dá uma receita você faz perguntas? Sabe como os medicamentos funcionam? Será que você se
pergunta se o médico sabe como os medicamentos funcionam? Ele manda, a gente compra e toma. Não
pensamos. Obedecemos. Não precisamos pensar, porque acreditamos que há indivíduos especializados e
competentes em pensar. Pagamos para que ele pense por nós. E depois ainda dizem por aí que vivemos em
uma civilização científica... (...) Afinal de contas, para que serve a nossa cabeça? Ainda podemos pensar?
Adianta pensar?”
Pense nisto:
◦ O avanço da ciência está relacionado às renovações do saber, das tecnologias, das técnicas, ampliações de
teorias, bem como à prática e à crítica persistente dos pesquisadores.
◦ Esse tipo de postura analítica e crítica diante da produção do saber científico é bem comum no ambiente
acadêmico e vem contribuindo na identificação de problemas na sociedade contemporânea.
O interacionismo
◦ As teorias e os conceitos são relativos aos contextos, às ideologias, às configurações históricas e às
particularidades culturais. As verdades da ciência são historicamente contextuais e, portanto, nunca neutras.
◦ Nesse caso, as ciências humanas não precisam se angustiar, pois o seu objeto de estudo é de natureza
interpretativa e não há necessidade de se buscar uma objetividade pautada em um dos pólos do
conhecimento.
◦ O cientista nessa perspectiva é um sujeito impregnado de valores e ideologias de sua época histórica e não
um ser purificado das condições plurais que determinam a sua existência como homem e pesquisador,
quebrando assim com uma suposta neutralidade científica enfatizada na perspectiva empirista e racionalista.
O Interacionismo
◦ Essa perspectiva considera a produção do conhecimento numa interação entre sujeito e objeto do
conhecimento. Nesse sentido o método torna-se um caminho marcado por intersecções entre o pesquisador
e os fatos investigados, configurando a realidade como uma possibilidade de verdade.
◦ O conhecimento por ser uma dimensão interpretativa do sujeito e do objetivo que é múltiplo e plural torna-
se verdadeiro em circunstâncias específicas e pode ser desconstruído ou ressignificado pelo pesquisador a
partir do caminho que for traçado na investigação.
Dimensão ética do saber científico
Reflita:
◦ A ciência como saber sistemático tem uma dimensão política e ética. Desse modo, o saber científico busca
tanto encontrar respostas para problemas que comprometem a organização da vida social quanto as
implicações desse saber sobre a vida das pessoas.
Curta “A ilha das flores”
“Já que a ciência não pode encontrar a sua legitimação ao lado do conhecimento absoluto, talvez ela pudesse
fazer a experiência de tentar encontrar o seu sentido ao lado da bondade. Ela poderia, por um pouco,
abandonar a obsessão com a verdade, e se perguntar sobre o seu impacto sobre a vida das pessoas: a
preservação da natureza, a saúde dos pobres, a produção de alimentos, a liberdade, enfim, esta coisa indefinível
que se chama felicidade. Com Brecht, poderíamos afirmar: “Eu sustento que a única finalidade da ciência está
em aliviar a miséria da existência humana”.”
Rubem Alves
A psicologia é ciência?
Conhecimento científico
◦ “Nem todo conhecimento é científico, mas para que isto ocorra são necessários dois pré-requisitos: primeiro,
que o campo do conhecimento seja delimitado com objeto de estudo definido e segundo, que existam
métodos apropriados às investigações desse objeto.”

◦ Um conhecimento, para ser considerado científico, requer um objeto específico de estudo.


Qual o objeto da Astronomia?
E o objeto da Biologia?
Qual o objeto de estudo da psicologia?
◦ A Psicologia como a Antropologia, a Economia, a Sociologia e todas as ciências humanas, estuda o homem.
◦ Certamente, esta divisão é ampla demais e apenas coloca a Psicologia entre as ciências humanas. Qual é,
então, o objeto específico de estudo da Psicologia?
Se dermos a palavra a um psicólogo comportamentalista, ele dirá: “O objeto de
estudo da Psicologia é o comportamento humano”.
◦ Se a palavra for dada a um psicólogo psicanalista, ele dirá: “O objeto de estudo da
Psicologia é o inconsciente”.
◦ Outros dirão que é a consciência humana, e outros, ainda, a personalidade.
Críticas à psicologia como ciência
“No sentido mais amplo, o objeto de estudo da Psicologia é o homem, e neste caso o pesquisador está inserido
na categoria a ser estudada. O cientista — o pesquisador — pode confundir-se com o objeto a ser pesquisado.”
“Os fenômenos psicológicos são tão diversos, que não podem ser acessíveis ao mesmo nível de observação e,
portanto, não podem ser sujeitos aos mesmos padrões de descrição, medida, controle e interpretação.”
Diferentes concepções de homem

◦ Rousseau: “O homem nasce bom, a sociedade o corrompe”


◦ “Outros vêem o homem como ser abstrato, com características definidas e que não mudam, a despeito das
condições sociais a que esteja submetido.”
◦ “homem como ser datado, determinado pelas condições históricas e sociais que o cercam”
◦ Como, neste momento, há uma riqueza de valores sociais que permitem várias concepções de homem,
diríamos simplificadamente que, no caso da Psicologia, esta ciência estuda os “diversos homens” concebidos
pelo conjunto social. Assim, a Psicologia hoje se caracteriza por uma diversidade de objetos de estudo
PsicologiaS
◦ Por sólidas razões, não somente históricas mas doutrinárias, torna-se impossível à Psicologia assegurar-se
uma unidade metodológica. (...)
◦ Por isso, talvez fosse preferível falarmos, ao invés de “psicologia”, em “ciências psicológicas”.
Diferentes aspectos da psicologia
Porque os adjetivos que acompanham o termo “psicologia” podem especificar, ao mesmo tempo:
◦ Um domínio de pesquisa,
◦ Um estilo metodológico (psicologia clínica)
◦ Um campo de práticas sociais (orientação, reeducação, terapia de distúrbios comportamentais etc.),
◦ Ou mesmo quando determinada escola de pensamento que chega a definir, para seu próprio uso, tanto sua
problemática quanto seus conceitos e instrumentos de pesquisa.

Mais especificamente a Psicologia colabora com o estudo da subjetividade: é essa a sua forma particular,
específica de contribuição para a compreensão da totalidade da vida humana.
O que é subjetividade?
Tocando Em Frente - Oswaldo
Montenegro
Ando devagar porque já tive pressa Como um velho boiadeiro, levando a O sabor das massas e das maças
E levo esse sorriso, porque já chorei boiada É preciso amor pra poder pulsar, é
demais Eu vou tocando os dias pela longa preciso paz
Hoje me sinto mais forte, mais feliz estrada, eu vou Pra poder sorrir, é preciso a chuva para
quem sabe Estrada eu sou, conhecer as manhas e florir
Só levo a certeza de que muito pouco as manhãs
eu sei, ou O sabor das massas e das maças Ando devagar porque já tive pressa
Nada sei, conhecer as manhas e as É preciso amor pra puder pulsar, é E levo esse sorriso, porque já chorei
manhãs preciso paz demais
O sabor das massas e das maçãs Pra poder sorrir, é preciso a chuva para Cada um de nos compõe a sua história,
É preciso amor pra poder pulsar, é florir cada ser em si
preciso paz Carrega o dom de ser capaz, e ser feliz
Todo mundo ama um dia, todo mundo
chora
Pra poder sorrir, é preciso a chuva para Um dia a gente chega, no outro vai
florir embora
Cada um de nos compõe a sua história,
Penso que cumprir a vida, seja cada ser em si
simplesmente Carrega o dom de ser capaz, e ser feliz
Compreender a marcha, ir tocando em conhecer as manhas e as manhãs
frente
Somos constituídos pelo que fazemos?
Somos o que pensamos e sentimos?
Hoje me sinto mais forte, mais feliz quem sabe
Só levo a certeza de que muito pouco eu sei
Somos únicos?
Somos como outras pessoas?
“Todo mundo ama um dia, todo mundo chora”
◦ Você ensaia argumentos na sua cabeça, apenas no caso deles surgirem?
◦ Você programa o seu alarme para mais cedo só para você apertar o botão de soneca várias vezes?
◦ Você imediatamente esquece o nome de alguém bem depois que eles se introduziram.
Subjetividade
◦ Nossa matéria-prima, portanto, é o homem em todas as suas expressões, as visíveis (nosso comportamento) e
as invisíveis (nossos sentimentos), as singulares (porque somos o que somos) e as genéricas (porque somos
todos assim) — é o homem-corpo, homem-pensamento, homem-afeto, homem-ação e tudo isso está
sintetizado no termo subjetividade.
Subjetividade
◦ A subjetividade é a síntese singular e individual que cada um de nós vai constituindo conforme vamos nos
desenvolvendo e vivenciando as experiências da vida social e cultural;
“Ando devagar porque já tive pressa
E levo esse sorriso, porque já chorei demais”
◦ É uma síntese que nos identifica, de um lado, por ser única, e nos iguala, de outro lado, na medida em que os
elementos que a constituem são experienciados no campo comum da objetividade social.
Subjetividade
Esta síntese — a subjetividade — é o mundo de idéias, significados e emoções construído internamente pelo
sujeito a partir de suas relações sociais, de suas vivências e de sua constituição biológica; é, também, fonte de
suas manifestações afetivas e comportamentais.
Subjetividade é inata?
O que é subjetividade?
◦ O mundo social e cultural, conforme vai sendo experienciado por nós, possibilita-nos a construção de um
mundo interior. São diversos fatores que se combinam e nos levam a uma vivência muito particular. Nós
atribuímos sentido a essas experiências e vamos nos constituindo a cada dia.
“Cada um de nos compõe a sua história, cada ser em si
Carrega o dom de ser capaz, e ser feliz”

◦ A subjetividade é a maneira de sentir, pensar, fantasiar, sonhar, amar e fazer de cada um. É o que constitui o
nosso modo de ser!
Subjetividade
“E até o tempo passa arrastado
Só pra eu ficar do teu lado
Você me chora dores de outro amor
Se abre e acaba comigo
E nessa novela eu não quero
Ser teu amigo
É que eu preciso dizer que eu te amo
Te ganhar ou perder sem engano
Eu preciso dizer que eu te amo tanto
Eu já nem sei se eu tô misturando
Eu perco o sono
Tentando achar em cada gesto uma bandeira
Fechando e abrindo a geladeira
A noite inteira”
O homem é dono de si?
Perspectiva sócio-histórica
◦ Criando e transformando o mundo (externo), o homem constrói e transforma a si próprio. Ideia de homem
utópico?
Perspectiva sócio-histórica
◦ Um mundo objetivo, em movimento, porque seres humanos o movimentam permanentemente com suas
intervenções;
◦ Um mundo subjetivo em movimento porque os indivíduos estão permanentemente se apropriando de novas
matérias-primas para constituírem suas subjetividades.
◦ Movimentos de transformação:
“O importante e bonito do mundo é isso: que as pessoas não estão sempre iguais, ainda não foram terminadas, mas
que elas vão sempre mudando. Afinam e desafinam”.
Guimarães Rosa, Grande Sertão: Veredas

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